Financiamento partidário: PS quis tirar aos pequenos para dar aos grandes

28-02-2018
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As alterações sobre reembolso de IVA aos partidos, um dos pontos mais polémicos da nova lei de financiamento partidário que foi negociada em segredo no Parlamento, foram sugeridas pelo PS. O Expresso teve acesso ao documento distribuído a 7 de junho com as principais propostas de alterações (divididas em propostas A, B e C) e que revela quais eram as intenções originais dos vários partidos e como houve moedas de troca.

O PS propôs inicialmente alterações ao IVA dos partidos e também às regras de distribuição das subvenções, retirando dinheiro aos pequenos partidos para o dar aos maiores. Queria o reembolso de “75% do IVA suportado na totalidade de aquisição de bens e serviços para a sua atividade incluindo nas campanhas eleitorais”. E propunha ainda diminuir a fatia da subvenção que é igual para todos os partidos: passava de 25% para 15% nas legislativas e de 25% para 20% nas autárquicas, ou seja, aumentava assim a percentagem da subvenção que seria conferida em função do número de votos, beneficiando os partidos grandes como o PS ou PSD. Esta é a proposta que ficou com a designação B.

Na redação final, porém, ficou escrito que o reembolso de IVA será aplicado “na totalidade de aquisições de bens e serviços para a sua atividade”, uma fórmula mais lata do que estava anteriormente e que, mesmo sem ter a referência explícita a campanhas eleitorais, deixou o PS satisfeito pois considera que engloba as despesas de campanha. “Clarificou-se a norma sem alterar a regra da isenção já existente”, insistiu esta semana a secretária-geral-adjunta, Ana Catarina Mendes.

O PS, que tem um passivo de 20 milhões de euros, está em litígio com o fisco para devolução do IVA com 38 processos, 25 sobre acertos de IVA em atividade corrente e 13 sobre despesas de campanha, em que reclama cerca de 4 milhões de euros. Isto porque, depois de 2011, a Autoridade Tributária mudou de posição e entendeu que, de acordo com a lei que já havia, os partidos só tinham direito a reembolso em algumas despesas correntes e em nada quando se trate de campanha eleitoral. O PS contestou e vai continuar a contestar em tribunal, embora garanta que a nova lei não foi feita com intenções de retroatividade.

A proposta C foi negociada fundamentalmente entre PSD e PCP e sugeria o fim do limite de angariação de fundos bem como aumentar os gastos em outdoors (em vez do atual limite de 25% da subvenção sugeria “20% do limite máximo de despesa de campanha eleitoral”, o que na prática se traduz em mais dinheiro) e distribuir pelos vários partidos o excedente das subvenções, fruto dos acertos que são feitos depois dos partidos apresentarem faturas de despesa. As duas últimas sugestões não viram a luz do dia por falta de consenso.

Nenhum outro partido tem a capacidade de angariação de fundos do PCP (10,3 milhões entre 2011 e 2015), sendo o que menos depende das subvenções estatais que representam apenas 10% das suas receitas. A capacidade de financiamento próprio é, aliás, um objetivo político do PCP, sempre renovado em congresso. Para este fim contribuem todos os militantes através da quotização obrigatória, mas também todos os eleitos, que têm de doar ao partido uma parte do vencimento. Os cofres partidários são ainda reforçados pelas habituais campanhas para angariação de fundos, seja para a construção de uma sede ou a compra de terrenos necessários para o alargamento da Festa do “Avante!”.

A terceira proposta, a A, dizia respeito às alterações que o Tribunal Constitucional havia proposto sobre a Entidade das Contas, e que levou a que os partidos aproveitassem a boleia para mexer pela enésima vez nesta lei (a última foi em 2013).

O Expresso contactou os vários membros do grupo de trabalho que funcionou à porta fechada e que tratou do assunto em dois meses (entre abril quando o TC apresentou a sua proposta e junho, quando finalizou o trabalho que não submeteu a votação final por ser em vésperas de eleições autárquicas). Ana Catarina Mendes (PS) limitou-se a confirmar que PS entregou uma proposta sobre IVA, António Filipe (PCP), Matos Rosa (PSD) e Jorge Costa (BE) não responderam. António Carlos Monteiro (CDS) garantiu que foi favorável às alterações propostas pelo TC e à cedência gratuita de espaços públicos aos partidos. O CDS, tal como o PAN, acabou por votar contra na votação final da lei devido às alterações ao IVA e ao fim do limite à angariação de fundos que considera “inadmissíveis e escandalosas”, tendo por isso apelado ao veto presidencial.

Texto publicado originalmente na edição impressa de 30 de dezembro de 2017

As alterações sobre reembolso de IVA aos partidos, um dos pontos mais polémicos da nova lei de financiamento partidário que foi negociada em segredo no Parlamento, foram sugeridas pelo PS. O Expresso teve acesso ao documento distribuído a 7 de junho com as principais propostas de alterações (divididas em propostas A, B e C) e que revela quais eram as intenções originais dos vários partidos e como houve moedas de troca.

O PS propôs inicialmente alterações ao IVA dos partidos e também às regras de distribuição das subvenções, retirando dinheiro aos pequenos partidos para o dar aos maiores. Queria o reembolso de “75% do IVA suportado na totalidade de aquisição de bens e serviços para a sua atividade incluindo nas campanhas eleitorais”. E propunha ainda diminuir a fatia da subvenção que é igual para todos os partidos: passava de 25% para 15% nas legislativas e de 25% para 20% nas autárquicas, ou seja, aumentava assim a percentagem da subvenção que seria conferida em função do número de votos, beneficiando os partidos grandes como o PS ou PSD. Esta é a proposta que ficou com a designação B.

Na redação final, porém, ficou escrito que o reembolso de IVA será aplicado “na totalidade de aquisições de bens e serviços para a sua atividade”, uma fórmula mais lata do que estava anteriormente e que, mesmo sem ter a referência explícita a campanhas eleitorais, deixou o PS satisfeito pois considera que engloba as despesas de campanha. “Clarificou-se a norma sem alterar a regra da isenção já existente”, insistiu esta semana a secretária-geral-adjunta, Ana Catarina Mendes.

O PS, que tem um passivo de 20 milhões de euros, está em litígio com o fisco para devolução do IVA com 38 processos, 25 sobre acertos de IVA em atividade corrente e 13 sobre despesas de campanha, em que reclama cerca de 4 milhões de euros. Isto porque, depois de 2011, a Autoridade Tributária mudou de posição e entendeu que, de acordo com a lei que já havia, os partidos só tinham direito a reembolso em algumas despesas correntes e em nada quando se trate de campanha eleitoral. O PS contestou e vai continuar a contestar em tribunal, embora garanta que a nova lei não foi feita com intenções de retroatividade.

A proposta C foi negociada fundamentalmente entre PSD e PCP e sugeria o fim do limite de angariação de fundos bem como aumentar os gastos em outdoors (em vez do atual limite de 25% da subvenção sugeria “20% do limite máximo de despesa de campanha eleitoral”, o que na prática se traduz em mais dinheiro) e distribuir pelos vários partidos o excedente das subvenções, fruto dos acertos que são feitos depois dos partidos apresentarem faturas de despesa. As duas últimas sugestões não viram a luz do dia por falta de consenso.

Nenhum outro partido tem a capacidade de angariação de fundos do PCP (10,3 milhões entre 2011 e 2015), sendo o que menos depende das subvenções estatais que representam apenas 10% das suas receitas. A capacidade de financiamento próprio é, aliás, um objetivo político do PCP, sempre renovado em congresso. Para este fim contribuem todos os militantes através da quotização obrigatória, mas também todos os eleitos, que têm de doar ao partido uma parte do vencimento. Os cofres partidários são ainda reforçados pelas habituais campanhas para angariação de fundos, seja para a construção de uma sede ou a compra de terrenos necessários para o alargamento da Festa do “Avante!”.

A terceira proposta, a A, dizia respeito às alterações que o Tribunal Constitucional havia proposto sobre a Entidade das Contas, e que levou a que os partidos aproveitassem a boleia para mexer pela enésima vez nesta lei (a última foi em 2013).

O Expresso contactou os vários membros do grupo de trabalho que funcionou à porta fechada e que tratou do assunto em dois meses (entre abril quando o TC apresentou a sua proposta e junho, quando finalizou o trabalho que não submeteu a votação final por ser em vésperas de eleições autárquicas). Ana Catarina Mendes (PS) limitou-se a confirmar que PS entregou uma proposta sobre IVA, António Filipe (PCP), Matos Rosa (PSD) e Jorge Costa (BE) não responderam. António Carlos Monteiro (CDS) garantiu que foi favorável às alterações propostas pelo TC e à cedência gratuita de espaços públicos aos partidos. O CDS, tal como o PAN, acabou por votar contra na votação final da lei devido às alterações ao IVA e ao fim do limite à angariação de fundos que considera “inadmissíveis e escandalosas”, tendo por isso apelado ao veto presidencial.

Texto publicado originalmente na edição impressa de 30 de dezembro de 2017

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