falar ou não para o centro,

30-08-2004
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Falar Ou Não para o Centro,

Por MARIA JOSÉ OLIVEIRA, Nuno Sá Lourenço e Ana Sá Lopes

Sexta-feira, 06 de Agosto de 2004 eis a questão Do PS Na linguagem, retórica e símbolos, um mundo separa José Sócrates de Manuel Alegre, na formulação de políticas concretas ainda falta ver. O debate entre um PS mais à esquerda ou mais à direita vai estar no centro do próximo congresso do partido, que decorre em Outubro. Mas são os símbolos ou as políticas concretas que separam os principais candidatos? Por enquanto, o debate prossegue com maior incidência no domínio da simbologia. Em conversa com o PÚBLICO, Manuel Alegre nomeia as diferenças ideológicas em relação a Sócrates. "Ele diz que não há problemas ideológicos no Partido Socialista. Mas há", salienta, exemplificando com a primeira recusa de Sócrates em debater na comunicação social. "O facto de não querer discutir ideologia é já uma atitude ideológica mais à direita." Manuel Alegre considera que há sustentação ideológica no discurso de Sócrates. Mas foca o centro, diz. "Hoje o PS é o partido verdadeiramente ao centro e a ideia de que os socialistas só podem vencer ao centro é uma mistificação", alerta, argumentando: "O que está aqui em causa não é uma luta entre radicais, protagonizados por mim, e moderados, protagonizados pelo Sócrates." A questão fulcral, frisa Alegre, reside "entre quem defende as estratégias baseadas em princípios que podem implicar rupturas e quem está sempre a pactuar com o situacionismo, com o pragmatismo e com a gestão sem ideologia". Lembrando que já assistiu a "muitos ciclos políticos", Alegre aponta que as "dinâmicas de vitória" arrastam inevitavelmente o "centro sociológico", que, em termos políticos, "não tem uma expressão própria". "Se há uma dinâmica à direita, ela arrasta o centro, se há uma dinâmica à esquerda, também arrasta o centro. E o que é o centro? É aquele eleitorado flutuante que umas vezes vota à esquerda, outras vezes à direita." José Sócrates, pelo contrário, insiste em que o PS tem que falar para o centro e não apenas e só para o seu eleitorado tradicional. "O PS tem que falar para todos os portugueses", afirma, frisando que só através desta estratégia é possível ganhar as eleições legislativas. Rejeita a ideia de que é a "direita" do PS e, para o comprovar, apresenta o currículo da obra feita nos governos de António Guterres, onde a "marca" da direita não lhe foi nunca apontada, tanto na política sobre a droga como nas medidas tomadas em matéria de defesa do consumidor. O facto de ter a seu lado Sérgio Sousa Pinto, outrora o mais fracturante deputado que tanto incomodou António Guterres, o fundador do PS António Reis e até o antigo sampaísta António Costa contribuem para lhe "amenizar" a conotação de "ala direita" que lhe foi colocada neste pré-congresso. Mas, ao contrário de Alegre, é na moderação que efectivamente José Sócrates aposta, não pondo em causa - antes valorizando - a experiência guterrista e os vários governos socialistas europeus no poder nos últimos anos. Manuel Alegre repete, aqui e ali, que "o socialismo tem de mudar". De que forma? "Não se autodiluindo e não se deixando colonizar pela hegemonia ideológica do neoliberalismo", responde prontamente, não deixando, porém, de dar a entender que estas são as soluções defendidas por Sócrates. Para Alegre, as mudanças passam pelo incremento de novas formas de representação e organização, pela definição de grandes orientações estratégicas e por uma renovação do papel do Estado - o "Estado estratega", como designa -, responsável pela supressão das falhas do mercado e promotor de serviços de interesse geral. O objectivo de atribuir ao Estado as funções de promotor de justiça social obriga, necessariamente, à "realização de uma reforma fiscal". "Mais profunda do que aquela que foi feita até hoje", ressalva Alegre. Para tal, destaca, o Estado "tem de manter nas suas mãos alguns sectores", advertindo que "não se trata de o Estado se substituir à economia de mercado nem de o transformar em produtor". A ideia, explica, é, "por um lado, o Estado ser o promotor das políticas sociais, que são inseparáveis dos direitos políticos, e, por outro, suprir as falhas do mercado e estimular determinadas áreas, como a educação, a cultura ou a qualificação das pessoas". No entanto, também José Sócrates põe ênfase no papel do Estado e nos "bens públicos que estruturam a nossa sociedade". Para Sócrates, uma das funções da "esquerda moderna" é "resistir a este ataque da direita à esfera pública": "Nem tudo deve ser entregue ao mercado e à esfera individual na nossa sociedade". Defende "melhores serviços públicos", beneficiários de "boas doutrinas de gestão". João Soares avança para a corrida à liderança depois de ter perdido, com a derrota para a autarquia de Lisboa, o capital político que detinha. A sua presença no embate serve para manter a sua quota de influência no interior do partido. Esta não é a primeira vez que João Soares se candidata a secretário-geral. Foi opositor de Vítor Constâncio, tendo desde então mantido um grupo de fiéis que reaparecia de tempos a tempos em almoços no restaurante Caleidoscópio. O seu relativo peso entre as tendências do partido permitiu, por exemplo, a entrada de alguns dos seus (Rui Cunha e Acácio Barradas) nos governos de António Guterres. Este candidato mostrou pouca disponibilidade para fazer o exercício ideológico. "Não tenho balanças para fazer esse tipo de pesagens", justificou. O esforço do candidato tem sido, em contrapartida, o de marcar a diferença por outros critérios. O principal é a ideia de que João Soares é, dos três candidatos, o mais preparado para ser primeiro-ministro. "O que me distingue daqueles que se candidatam contra mim - porque surgiram depois da minha candidatura - é que tenho uma experiência muito mais alargada." O ex-presidente da Câmara de Lisboa recupera os seus 12 anos de autarca, "seis como presidente", numa actividade executiva "que tocou em todas as áreas que têm que ver com a gestão de um país". O candidato insistiu também na ideia que gerir a câmara da capital exigiu um esforço "bem superior à maioria dos ministérios". "Estão aqui três candidatos que se apresentam. Vamos lá a ver o que é que cada um fez quando teve poder. O Manuel Alegre ficou na Assembleia da República. O José Sócrates teve experiência de poder como secretário de Estado, depois lá conseguiu afastar a Elisa Ferreira e chegou a ministro, mas a sua experiência é muito limitada." Sobre o guterrismo, Soares critica concretamente Correia de Campos, ministro da Saúde de António Guterres: "Abriu a porta para que estes tipos entregassem 30 hospitais de uma só vez aos privados." A sua visão sobre este problema termina com a possibilidade de "inverter a marcha". Não o choca o Estado recuperar peso em alguns sectores económicos, até porque, recorda, isso já aconteceu na Europa. Dá o exemplo do Reino Unido nos caminhos-de-ferro. "Se for preciso, não vejo nisso nenhum drama. Não tenho nenhum preconceito à partida. A renacionalização é um instrumento interessante." OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE falar ou não para o centro,

Sócrates fará coligações à esquerda, mas não quer falar antes

Maria de Belém

Peso da 'esquerda' pode determinar posicionamentos do PS

1- O sistema público de pensões tal como está encontra-se condenado?

Falar Ou Não para o Centro,

Por MARIA JOSÉ OLIVEIRA, Nuno Sá Lourenço e Ana Sá Lopes

Sexta-feira, 06 de Agosto de 2004 eis a questão Do PS Na linguagem, retórica e símbolos, um mundo separa José Sócrates de Manuel Alegre, na formulação de políticas concretas ainda falta ver. O debate entre um PS mais à esquerda ou mais à direita vai estar no centro do próximo congresso do partido, que decorre em Outubro. Mas são os símbolos ou as políticas concretas que separam os principais candidatos? Por enquanto, o debate prossegue com maior incidência no domínio da simbologia. Em conversa com o PÚBLICO, Manuel Alegre nomeia as diferenças ideológicas em relação a Sócrates. "Ele diz que não há problemas ideológicos no Partido Socialista. Mas há", salienta, exemplificando com a primeira recusa de Sócrates em debater na comunicação social. "O facto de não querer discutir ideologia é já uma atitude ideológica mais à direita." Manuel Alegre considera que há sustentação ideológica no discurso de Sócrates. Mas foca o centro, diz. "Hoje o PS é o partido verdadeiramente ao centro e a ideia de que os socialistas só podem vencer ao centro é uma mistificação", alerta, argumentando: "O que está aqui em causa não é uma luta entre radicais, protagonizados por mim, e moderados, protagonizados pelo Sócrates." A questão fulcral, frisa Alegre, reside "entre quem defende as estratégias baseadas em princípios que podem implicar rupturas e quem está sempre a pactuar com o situacionismo, com o pragmatismo e com a gestão sem ideologia". Lembrando que já assistiu a "muitos ciclos políticos", Alegre aponta que as "dinâmicas de vitória" arrastam inevitavelmente o "centro sociológico", que, em termos políticos, "não tem uma expressão própria". "Se há uma dinâmica à direita, ela arrasta o centro, se há uma dinâmica à esquerda, também arrasta o centro. E o que é o centro? É aquele eleitorado flutuante que umas vezes vota à esquerda, outras vezes à direita." José Sócrates, pelo contrário, insiste em que o PS tem que falar para o centro e não apenas e só para o seu eleitorado tradicional. "O PS tem que falar para todos os portugueses", afirma, frisando que só através desta estratégia é possível ganhar as eleições legislativas. Rejeita a ideia de que é a "direita" do PS e, para o comprovar, apresenta o currículo da obra feita nos governos de António Guterres, onde a "marca" da direita não lhe foi nunca apontada, tanto na política sobre a droga como nas medidas tomadas em matéria de defesa do consumidor. O facto de ter a seu lado Sérgio Sousa Pinto, outrora o mais fracturante deputado que tanto incomodou António Guterres, o fundador do PS António Reis e até o antigo sampaísta António Costa contribuem para lhe "amenizar" a conotação de "ala direita" que lhe foi colocada neste pré-congresso. Mas, ao contrário de Alegre, é na moderação que efectivamente José Sócrates aposta, não pondo em causa - antes valorizando - a experiência guterrista e os vários governos socialistas europeus no poder nos últimos anos. Manuel Alegre repete, aqui e ali, que "o socialismo tem de mudar". De que forma? "Não se autodiluindo e não se deixando colonizar pela hegemonia ideológica do neoliberalismo", responde prontamente, não deixando, porém, de dar a entender que estas são as soluções defendidas por Sócrates. Para Alegre, as mudanças passam pelo incremento de novas formas de representação e organização, pela definição de grandes orientações estratégicas e por uma renovação do papel do Estado - o "Estado estratega", como designa -, responsável pela supressão das falhas do mercado e promotor de serviços de interesse geral. O objectivo de atribuir ao Estado as funções de promotor de justiça social obriga, necessariamente, à "realização de uma reforma fiscal". "Mais profunda do que aquela que foi feita até hoje", ressalva Alegre. Para tal, destaca, o Estado "tem de manter nas suas mãos alguns sectores", advertindo que "não se trata de o Estado se substituir à economia de mercado nem de o transformar em produtor". A ideia, explica, é, "por um lado, o Estado ser o promotor das políticas sociais, que são inseparáveis dos direitos políticos, e, por outro, suprir as falhas do mercado e estimular determinadas áreas, como a educação, a cultura ou a qualificação das pessoas". No entanto, também José Sócrates põe ênfase no papel do Estado e nos "bens públicos que estruturam a nossa sociedade". Para Sócrates, uma das funções da "esquerda moderna" é "resistir a este ataque da direita à esfera pública": "Nem tudo deve ser entregue ao mercado e à esfera individual na nossa sociedade". Defende "melhores serviços públicos", beneficiários de "boas doutrinas de gestão". João Soares avança para a corrida à liderança depois de ter perdido, com a derrota para a autarquia de Lisboa, o capital político que detinha. A sua presença no embate serve para manter a sua quota de influência no interior do partido. Esta não é a primeira vez que João Soares se candidata a secretário-geral. Foi opositor de Vítor Constâncio, tendo desde então mantido um grupo de fiéis que reaparecia de tempos a tempos em almoços no restaurante Caleidoscópio. O seu relativo peso entre as tendências do partido permitiu, por exemplo, a entrada de alguns dos seus (Rui Cunha e Acácio Barradas) nos governos de António Guterres. Este candidato mostrou pouca disponibilidade para fazer o exercício ideológico. "Não tenho balanças para fazer esse tipo de pesagens", justificou. O esforço do candidato tem sido, em contrapartida, o de marcar a diferença por outros critérios. O principal é a ideia de que João Soares é, dos três candidatos, o mais preparado para ser primeiro-ministro. "O que me distingue daqueles que se candidatam contra mim - porque surgiram depois da minha candidatura - é que tenho uma experiência muito mais alargada." O ex-presidente da Câmara de Lisboa recupera os seus 12 anos de autarca, "seis como presidente", numa actividade executiva "que tocou em todas as áreas que têm que ver com a gestão de um país". O candidato insistiu também na ideia que gerir a câmara da capital exigiu um esforço "bem superior à maioria dos ministérios". "Estão aqui três candidatos que se apresentam. Vamos lá a ver o que é que cada um fez quando teve poder. O Manuel Alegre ficou na Assembleia da República. O José Sócrates teve experiência de poder como secretário de Estado, depois lá conseguiu afastar a Elisa Ferreira e chegou a ministro, mas a sua experiência é muito limitada." Sobre o guterrismo, Soares critica concretamente Correia de Campos, ministro da Saúde de António Guterres: "Abriu a porta para que estes tipos entregassem 30 hospitais de uma só vez aos privados." A sua visão sobre este problema termina com a possibilidade de "inverter a marcha". Não o choca o Estado recuperar peso em alguns sectores económicos, até porque, recorda, isso já aconteceu na Europa. Dá o exemplo do Reino Unido nos caminhos-de-ferro. "Se for preciso, não vejo nisso nenhum drama. Não tenho nenhum preconceito à partida. A renacionalização é um instrumento interessante." OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE falar ou não para o centro,

Sócrates fará coligações à esquerda, mas não quer falar antes

Maria de Belém

Peso da 'esquerda' pode determinar posicionamentos do PS

1- O sistema público de pensões tal como está encontra-se condenado?

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