O caso hora a hora

02-06-2004
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O Caso Hora a Hora

Por ANA CRISTINA PEREIRA

Sexta-feira, 23 de Abril de 2004 8h30 Frente ao Tribunal da Comarca de Gondomar, acotovelam-se já alguns munícipes. "Que vergonha! Andais sempre a dizer mal dele e agora ides para aí", atira uma mulher desde a entrada de um prédio do Bairro do Monte Castro. "O quê? Acha que já não se pode vir ver o padrinho?" , responde-lhe outra, de bata multicolor. Meia dúzia de mulheres iniciam uma torcida: "Gondomar! Gondomar!" Gondomar!". E logo: "Valentim! Valentim! Valentim". E ainda: "Oliveira! Oliveira! Oliveira!" 9h50 A sirene anuncia a chegada da caravana da Polícia Judiciária, que traz os detidos desde a zona das Antas, onde se encontravam no novíssimo estabelecimento prisional da PJ. Valentim Loureiro sai do carro, pára, olha, vira as costas, entra no tribunal. As palmas ecoam. "Vai-vos dar três casas com piscina!", goza uma corpulenta senhora de meias grossas e chinelos, vinda da padaria. Há quem proteste contra a barreira azul, ali montada pela PSP para separar a imprensa dos manifestantes: "Daqui a pouco isto parece o Iraque!" Os agentes não facilitam. Na véspera, um jornalista fora agredido. 10h30 O céu mostra uma carranca, a ameaçar molhar os manifestantes. Alguns recolhem a casa. "Falta aqui a mulher que grita!", queixa-se alguém. Maria Carolina Silva, que na véspera apregoara amor pelo major, mantém uma bandeira à janela de sua casa, mas ainda não se ouve. A bandeira é das autárquicas de 2001 e mostra o rosto de Valentim e a inscrição: "Sou do PSD, mas na câmara o meu partido é Gondomar". Até agora, António Araújo Ramos, advogado de José Luís Oliveira, foi o único causídico que se detivera para falar à imprensa. 11h35 Vítor Costa, marmorista, gondomarense, simpatizante do Gondomar e do Boavista, amarra dois panos, lado a lado, nas grades azuis: "Valentim amigo Valbom e Gondomar está contigo" (sic). O verbo mal conjugado não envergonha: "Isso não interessa nada!". Tirou o dia de folga para "homenagear o major" e isso, sim, "é importante", embora "um homem sozinho não faça uma guerra". Os panos estão coçados. "Isto é um lençol que o major deu há uns anos atrás - na primeira candidatura" à Câmara de Gondomar. Na mesma altura em que distribuiu frigoríficos. O símbolo do PSD está quase apagado pelo uso, as letras gordas recém-escritas é que não. "Vou ficar aqui até o major sair! Nem que venha chuva. Isto é alguém que está a tentar queimar o major, se há alguma coisa é porque ele foi enganado". 12h36 Ricardo Bexiga, vereador do PS eleito para a autarquia de Gondomar, lembra que já em 2002 denunciara a alegada existência de "promiscuidade entre a câmara, o Gondomar e o Boavista" e avisa que "isto está muito demorado". Quando Lourenço Pinto, advogado de Valentim Loureiro, sai do tribunal para almoçar, volta a dizer que ainda não sabe de que é acusado o major. Os jornalistas contestam, estala um conflito popular. "Ele amanhã está em casa, pior seria eu - ficaria atrás das grades, com certeza!", barafusta um homem. "Gondomar é uma cidade à custa do Valentim!", retorque outro. "Dói-vos! Ide trabalhar! Ide trabalhar!" . O olhar de esguelha dos polícias faz acalmar os ânimos. Lá dentro, os arguidos almoçam. 14h00 Chega uma carrinha celular. A pequena multidão agita-se, a acreditar que o veículo servirá para levar Francisco Costa, que está desde a manhã a ser ouvido. Alguns munícipes infiltram-se na zona reservada aos jornalistas. Parecem querer uns minutos de "fama". "Anda aqui para apareceres na televisão!", convida um velhote, via telemóvel, de boné branco na cabeça. Há várias pessoas com a inscrição "Valentim Loureiro estamos contigo" na cabeça - um gondomarense mandou fazê-los com o seu dinheiro. 14h40 Susana França e Márcio Ribeiro, ambos de 16 anos, colam-se às grades. Ele convencido de que Valentim "é inocente". Ela convencida de que "não é inocente, mas [que] isso não tem nada a ver com a câmara". "Se for pelo povo, ele ganha sempre", asseguram ambos. O rapaz sente-se num comício. Daqui a nada, vai a casa buscar uma bandeira das autárquicas de 2001. A pequena Vanessa, de 11 anos, colabora. Faltou às aulas para isso mesmo. 15h30 Três agentes da PJ entram no tribunal com quilos de documentação. Corre que o interrogatório de Francisco Costa terminou. Pinto de Sousa é o senhor que se segue. 17h00 A berma da rua está cheia de gente - à espera de Valentim Loureiro. "O meu filho até já me perguntou se estou apaixonada por ele!", conta uma trintona. A maior parte são mulheres, bem entradas na idade. Algumas queixam-se dos jornais que "foram desenterrar o passado do presidente". Propaga-se o rumor de que o major que haverá "uma jantarada" logo à noite, para "celebrar a saída" . 17h30 Novo movimento de carrinhas celulares volta a fazer soar falso alarme. "São os carros de Custóias" 21h00 Sousa Pinto acaba de ser ouvido. O povo continua na rua, a gritar por Valentim. Valentim transita para o dia seguinte. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Governo na expectativa do desfecho do caso de Valentim Loureiro

Valentim terá influenciado adjudicação de obras do Governo

O que diz a lei

Construtor referenciado pelo MP edificou prédios do Boavista

O caso hora a hora

Os arguidos

Suspensão de funções de Valentim pode levar a eleições intercalares na Liga

O Caso Hora a Hora

Por ANA CRISTINA PEREIRA

Sexta-feira, 23 de Abril de 2004 8h30 Frente ao Tribunal da Comarca de Gondomar, acotovelam-se já alguns munícipes. "Que vergonha! Andais sempre a dizer mal dele e agora ides para aí", atira uma mulher desde a entrada de um prédio do Bairro do Monte Castro. "O quê? Acha que já não se pode vir ver o padrinho?" , responde-lhe outra, de bata multicolor. Meia dúzia de mulheres iniciam uma torcida: "Gondomar! Gondomar!" Gondomar!". E logo: "Valentim! Valentim! Valentim". E ainda: "Oliveira! Oliveira! Oliveira!" 9h50 A sirene anuncia a chegada da caravana da Polícia Judiciária, que traz os detidos desde a zona das Antas, onde se encontravam no novíssimo estabelecimento prisional da PJ. Valentim Loureiro sai do carro, pára, olha, vira as costas, entra no tribunal. As palmas ecoam. "Vai-vos dar três casas com piscina!", goza uma corpulenta senhora de meias grossas e chinelos, vinda da padaria. Há quem proteste contra a barreira azul, ali montada pela PSP para separar a imprensa dos manifestantes: "Daqui a pouco isto parece o Iraque!" Os agentes não facilitam. Na véspera, um jornalista fora agredido. 10h30 O céu mostra uma carranca, a ameaçar molhar os manifestantes. Alguns recolhem a casa. "Falta aqui a mulher que grita!", queixa-se alguém. Maria Carolina Silva, que na véspera apregoara amor pelo major, mantém uma bandeira à janela de sua casa, mas ainda não se ouve. A bandeira é das autárquicas de 2001 e mostra o rosto de Valentim e a inscrição: "Sou do PSD, mas na câmara o meu partido é Gondomar". Até agora, António Araújo Ramos, advogado de José Luís Oliveira, foi o único causídico que se detivera para falar à imprensa. 11h35 Vítor Costa, marmorista, gondomarense, simpatizante do Gondomar e do Boavista, amarra dois panos, lado a lado, nas grades azuis: "Valentim amigo Valbom e Gondomar está contigo" (sic). O verbo mal conjugado não envergonha: "Isso não interessa nada!". Tirou o dia de folga para "homenagear o major" e isso, sim, "é importante", embora "um homem sozinho não faça uma guerra". Os panos estão coçados. "Isto é um lençol que o major deu há uns anos atrás - na primeira candidatura" à Câmara de Gondomar. Na mesma altura em que distribuiu frigoríficos. O símbolo do PSD está quase apagado pelo uso, as letras gordas recém-escritas é que não. "Vou ficar aqui até o major sair! Nem que venha chuva. Isto é alguém que está a tentar queimar o major, se há alguma coisa é porque ele foi enganado". 12h36 Ricardo Bexiga, vereador do PS eleito para a autarquia de Gondomar, lembra que já em 2002 denunciara a alegada existência de "promiscuidade entre a câmara, o Gondomar e o Boavista" e avisa que "isto está muito demorado". Quando Lourenço Pinto, advogado de Valentim Loureiro, sai do tribunal para almoçar, volta a dizer que ainda não sabe de que é acusado o major. Os jornalistas contestam, estala um conflito popular. "Ele amanhã está em casa, pior seria eu - ficaria atrás das grades, com certeza!", barafusta um homem. "Gondomar é uma cidade à custa do Valentim!", retorque outro. "Dói-vos! Ide trabalhar! Ide trabalhar!" . O olhar de esguelha dos polícias faz acalmar os ânimos. Lá dentro, os arguidos almoçam. 14h00 Chega uma carrinha celular. A pequena multidão agita-se, a acreditar que o veículo servirá para levar Francisco Costa, que está desde a manhã a ser ouvido. Alguns munícipes infiltram-se na zona reservada aos jornalistas. Parecem querer uns minutos de "fama". "Anda aqui para apareceres na televisão!", convida um velhote, via telemóvel, de boné branco na cabeça. Há várias pessoas com a inscrição "Valentim Loureiro estamos contigo" na cabeça - um gondomarense mandou fazê-los com o seu dinheiro. 14h40 Susana França e Márcio Ribeiro, ambos de 16 anos, colam-se às grades. Ele convencido de que Valentim "é inocente". Ela convencida de que "não é inocente, mas [que] isso não tem nada a ver com a câmara". "Se for pelo povo, ele ganha sempre", asseguram ambos. O rapaz sente-se num comício. Daqui a nada, vai a casa buscar uma bandeira das autárquicas de 2001. A pequena Vanessa, de 11 anos, colabora. Faltou às aulas para isso mesmo. 15h30 Três agentes da PJ entram no tribunal com quilos de documentação. Corre que o interrogatório de Francisco Costa terminou. Pinto de Sousa é o senhor que se segue. 17h00 A berma da rua está cheia de gente - à espera de Valentim Loureiro. "O meu filho até já me perguntou se estou apaixonada por ele!", conta uma trintona. A maior parte são mulheres, bem entradas na idade. Algumas queixam-se dos jornais que "foram desenterrar o passado do presidente". Propaga-se o rumor de que o major que haverá "uma jantarada" logo à noite, para "celebrar a saída" . 17h30 Novo movimento de carrinhas celulares volta a fazer soar falso alarme. "São os carros de Custóias" 21h00 Sousa Pinto acaba de ser ouvido. O povo continua na rua, a gritar por Valentim. Valentim transita para o dia seguinte. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Governo na expectativa do desfecho do caso de Valentim Loureiro

Valentim terá influenciado adjudicação de obras do Governo

O que diz a lei

Construtor referenciado pelo MP edificou prédios do Boavista

O caso hora a hora

Os arguidos

Suspensão de funções de Valentim pode levar a eleições intercalares na Liga

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