Meio milhão de portugueses sofre de diabetes tipo II

07-09-2004
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Meio Milhão de Portugueses Sofre de Diabetes Tipo II

Por PAULA TORRES DE CARVALHO

Domingo, 05 de Setembro de 2004

A diabetes tipo II - em que não há dependência de insulina - transformou-se num problema de saúde pública em Portugal, alertam os especialistas. As estatísticas mais recentes referem a existência de cerca de 500 mil pessoas que sofrem desta doença, considerada "nitidamente civilizacional". Mas o problema não é exclusivo de Portugal, alargando-se à grande maioria dos países europeus. Os números disponíveis referem a existência de 150 milhões de diabéticos em todo o Mundo e a Organização Mundial de Saúde prevê que, em 2010, este número atinja os 300 milhões.

O alastramento da diabetes foi um dos assuntos em destaque no congresso internacional de Endocrinologia que terminou ontem, em Lisboa. A Endocrinologia é a especialidade médica que estuda e investiga as glândulas endócrinas e as hormonas. Especialistas de cerca de 90 países debateram, durante cinco dias, os grandes temas da Endocrinologia, nomeadamente os relacionados com a obesidade, as doenças da tiróide, as glândulas supra-renais e os ovários, a impotência sexual ou a osteoporose. Neste encontro, que reuniu todas as sociedades científicas de cada um dos países representados, realizaram-se 52 simpósios.

Mas a abordagem dos problemas provocados pela diabetes tipo II - distinta da de tipo I, por afectar sobretudo o adulto, quase sempre obeso, e por se controlar através de comprimidos, sem necessidade de recorrer à insulina - ocupou lugar especial, bem como a discussão acerca das suas consequências. Estas estão a revelar-se cada vez mais inquietantes, adquirindo maior gravidade com a doença cardiovascular.

Entre os primeiros sinais da doença, destaca-se a obesidade. Os números mais actuais referem que a percentagem de obesos entre a população portuguesa já se situa entre entre os 20 e os 25 por cento. Cerca de 40 por cento tem peso superior ao que devia. Os acidentes vasculares cerebrais (AVC) revelam-se como o resultado mais alarmante desta patologia. A cada hora que passa, ocorrem, em Portugal, seis AVC, três dos quais são fatais. É uma realidade que "não faz primeiras páginas dos jornais", nota o médico e investigador Pedro Marques da Silva. "Estão a roubar-nos anos de vida", alerta.

Doença civilizacional

Esta não é, contudo, uma realidade exclusiva de Portugal, mas de grande parte dos países europeus. Na América Latina, em alguns países de África não subsariana, na Ásia, a Organização Mundial de Saúde e as organizações de diabetes "prevêem saltos na ordem dos 150, 200 por cento, nos próximos anos, da prevalência da diabetes de grande risco", salienta Pedro Marques da Silva.

Este médico nota que o aumento desta patologia "tem a ver com a opção por determinados valores culturais", revelando-se uma "doença nitidamente civilizacional".

A base genética é muito importante na explicação do surgimento da diabetes, mas não define tudo. O investigador explica que a base genética "define uma susceptibilidade que abre uma janela para determinados comportamentos exprimirem a doença". Existem, pois, várias causas, como a mudança de estilos de vida que se verifica na sociedade portuguesa, a par da que se observa na generalidade dos países da Europa.

"Não tínhamos praticamente obesidade mórbida" - que existe quando o índice de massa corporal é superior a 30 por cento do peso do que a pessoa devia ter, o que significa que tem grandes repercussões em termos de saúde para o coração, rins, pâncreas, ossos. Mas hoje, sublinha, "há crianças que desenvolvem diabetes com 15 anos". É a consequência da opção por um tipo de alimentação divulgado pelas campanhas de determinadas cadeias alimentares, os efeitos das longas horas passadas em frente da televisão e do computador e da falta de exercício físico.

O resultado é que "40 por cento da população portuguesa tem sobrecarga ponderal, o que significa que tem peso superior ao que devia ter e há 20 por cento, já a chegar aos 25 por cento, de obesos. É um número assustador", nota Pedro Marques da Silva.

Na diabetes tipo II, a componente metabólica passa necessariamente pela hipertensão e pelas gorduras no sangue. A conjunção destes factores e, às vezes, do tabagismo, "quadriplica o risco de ter um evento cardiovascular", diz Marques da Silva, especificando: enfarte de miocárdio, AVC, doença vascular dos membros inferiores.

Pelas mesmas razões, surgem a doença renal e a cegueira. "O peso social, económico e familiar da diabetes tipo II é marcante", nota este especialista, observando que a situação é lida tardiamente. "Se a pessoa se preocupar só com o desenvolvimento da diabetes quando os açúcares estão alterados, preocupa-se tarde de mais", afirma o médico.

Prevenção e fita métrica

Ao referir que a diabetes é sempre antecedida daquilo a que se chama doença metabólica, Marques da Silva especifica: "É a doença dos bocadinhos". Traduz-se num discurso em que se diz: "não sou hipertensa mas já tenho um bocadinho da tensão alta, ainda não tenho colesterol elevado mas já tenho um bocadinho de... não sou diabética mas já tenho um bocadinho de..." Esta "doença dos bocadinhos" é a soma de pequenos efeitos das alterações que se vão sentindo à medida que a doença se instala e ninguém liga", diz.

Na perspectiva do médico Pedro Marques da Silva, o programa de prevenção da doença cardiovascular anunciada pela Direcção-Geral de Saúde, assim como o programa que se prepara de combate à obesidade, "só poderá produzir resultados" com a colaboração do especialista da medicina familiar. Ele precisa de conhecer "o conceito de síndrome metabólico".

O que significa que, a par de medir a tensão e de auscultar o doente, o médico de família tem de pegar numa fita métrica, medir-lhe a cintura e pesá-lo. E tem de "perceber que um perímetro de cintura a partir de determinados limites que hoje estão perfeitamente consignados representa perigo. O fundamental para definirmos intervenção na população é uma fita métrica", defende Pedro Marques da Silva.

Meio Milhão de Portugueses Sofre de Diabetes Tipo II

Por PAULA TORRES DE CARVALHO

Domingo, 05 de Setembro de 2004

A diabetes tipo II - em que não há dependência de insulina - transformou-se num problema de saúde pública em Portugal, alertam os especialistas. As estatísticas mais recentes referem a existência de cerca de 500 mil pessoas que sofrem desta doença, considerada "nitidamente civilizacional". Mas o problema não é exclusivo de Portugal, alargando-se à grande maioria dos países europeus. Os números disponíveis referem a existência de 150 milhões de diabéticos em todo o Mundo e a Organização Mundial de Saúde prevê que, em 2010, este número atinja os 300 milhões.

O alastramento da diabetes foi um dos assuntos em destaque no congresso internacional de Endocrinologia que terminou ontem, em Lisboa. A Endocrinologia é a especialidade médica que estuda e investiga as glândulas endócrinas e as hormonas. Especialistas de cerca de 90 países debateram, durante cinco dias, os grandes temas da Endocrinologia, nomeadamente os relacionados com a obesidade, as doenças da tiróide, as glândulas supra-renais e os ovários, a impotência sexual ou a osteoporose. Neste encontro, que reuniu todas as sociedades científicas de cada um dos países representados, realizaram-se 52 simpósios.

Mas a abordagem dos problemas provocados pela diabetes tipo II - distinta da de tipo I, por afectar sobretudo o adulto, quase sempre obeso, e por se controlar através de comprimidos, sem necessidade de recorrer à insulina - ocupou lugar especial, bem como a discussão acerca das suas consequências. Estas estão a revelar-se cada vez mais inquietantes, adquirindo maior gravidade com a doença cardiovascular.

Entre os primeiros sinais da doença, destaca-se a obesidade. Os números mais actuais referem que a percentagem de obesos entre a população portuguesa já se situa entre entre os 20 e os 25 por cento. Cerca de 40 por cento tem peso superior ao que devia. Os acidentes vasculares cerebrais (AVC) revelam-se como o resultado mais alarmante desta patologia. A cada hora que passa, ocorrem, em Portugal, seis AVC, três dos quais são fatais. É uma realidade que "não faz primeiras páginas dos jornais", nota o médico e investigador Pedro Marques da Silva. "Estão a roubar-nos anos de vida", alerta.

Doença civilizacional

Esta não é, contudo, uma realidade exclusiva de Portugal, mas de grande parte dos países europeus. Na América Latina, em alguns países de África não subsariana, na Ásia, a Organização Mundial de Saúde e as organizações de diabetes "prevêem saltos na ordem dos 150, 200 por cento, nos próximos anos, da prevalência da diabetes de grande risco", salienta Pedro Marques da Silva.

Este médico nota que o aumento desta patologia "tem a ver com a opção por determinados valores culturais", revelando-se uma "doença nitidamente civilizacional".

A base genética é muito importante na explicação do surgimento da diabetes, mas não define tudo. O investigador explica que a base genética "define uma susceptibilidade que abre uma janela para determinados comportamentos exprimirem a doença". Existem, pois, várias causas, como a mudança de estilos de vida que se verifica na sociedade portuguesa, a par da que se observa na generalidade dos países da Europa.

"Não tínhamos praticamente obesidade mórbida" - que existe quando o índice de massa corporal é superior a 30 por cento do peso do que a pessoa devia ter, o que significa que tem grandes repercussões em termos de saúde para o coração, rins, pâncreas, ossos. Mas hoje, sublinha, "há crianças que desenvolvem diabetes com 15 anos". É a consequência da opção por um tipo de alimentação divulgado pelas campanhas de determinadas cadeias alimentares, os efeitos das longas horas passadas em frente da televisão e do computador e da falta de exercício físico.

O resultado é que "40 por cento da população portuguesa tem sobrecarga ponderal, o que significa que tem peso superior ao que devia ter e há 20 por cento, já a chegar aos 25 por cento, de obesos. É um número assustador", nota Pedro Marques da Silva.

Na diabetes tipo II, a componente metabólica passa necessariamente pela hipertensão e pelas gorduras no sangue. A conjunção destes factores e, às vezes, do tabagismo, "quadriplica o risco de ter um evento cardiovascular", diz Marques da Silva, especificando: enfarte de miocárdio, AVC, doença vascular dos membros inferiores.

Pelas mesmas razões, surgem a doença renal e a cegueira. "O peso social, económico e familiar da diabetes tipo II é marcante", nota este especialista, observando que a situação é lida tardiamente. "Se a pessoa se preocupar só com o desenvolvimento da diabetes quando os açúcares estão alterados, preocupa-se tarde de mais", afirma o médico.

Prevenção e fita métrica

Ao referir que a diabetes é sempre antecedida daquilo a que se chama doença metabólica, Marques da Silva especifica: "É a doença dos bocadinhos". Traduz-se num discurso em que se diz: "não sou hipertensa mas já tenho um bocadinho da tensão alta, ainda não tenho colesterol elevado mas já tenho um bocadinho de... não sou diabética mas já tenho um bocadinho de..." Esta "doença dos bocadinhos" é a soma de pequenos efeitos das alterações que se vão sentindo à medida que a doença se instala e ninguém liga", diz.

Na perspectiva do médico Pedro Marques da Silva, o programa de prevenção da doença cardiovascular anunciada pela Direcção-Geral de Saúde, assim como o programa que se prepara de combate à obesidade, "só poderá produzir resultados" com a colaboração do especialista da medicina familiar. Ele precisa de conhecer "o conceito de síndrome metabólico".

O que significa que, a par de medir a tensão e de auscultar o doente, o médico de família tem de pegar numa fita métrica, medir-lhe a cintura e pesá-lo. E tem de "perceber que um perímetro de cintura a partir de determinados limites que hoje estão perfeitamente consignados representa perigo. O fundamental para definirmos intervenção na população é uma fita métrica", defende Pedro Marques da Silva.

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