Intervenção da deputada Odete Santos

22-10-2003
marcar artigo

Idade da Reforma das Bordadeiras da Madeira

Intervenção da deputada Odete Santos

1 de Outubro de 1997

Senhor Presidente,

Senhores Deputados,

Entre Abril e Maio de 1.996 a Assembleia da República teve oportunidade de debater, a partir de um Projecto de Lei do P.C.P. a questão da idade da reforma das mulheres. E pronunciou-se recusando a todas, sem excepção, nem mesmo com excepção das bordadeiras, a reposição da idade de reforma nos 62 anos.

Pese embora o facto de o Projecto do C.D.S.- P.P. se limitar nas suas propostas às bordadeiras de casa da ilha da Madeira - objectivo mais justo encontramo-lo na Proposta da Assembleia Legislativa Regional da Madeira - pese embora o restrito campo de aplicação do Projecto dos senhores Deputados do CDS- PP, a verdade é que dá gosto recordar as críticas que este Partido fez, na altura, ao Projecto do P.C.P., e todos os enunciados de medidas prioritárias a favor das mulheres ( como se o P.C.P. não as conhecesse), à pála das quais o CDS/PP, se pronunciou com um rotundo não ao abaixamento da idade da reforma das mulheres.

Se o Projecto de Lei em discussão não fosse do P P, ouviríamos seguramente acusar o diploma de atacar as consequências de um trabalho penoso, e não as causas. E ouviríamos outro rotundo não, a menos que quaisquer cálculos numéricos feitos pêlos que, de 4 em 4 anos, empunham as calculadoras, actualizando percentagens, ditasse estrategicamente outra posição.

P.C.P. já demonstrou, com o seu Projecto de Lei sobre a idade da reforma das mulheres, que se torna justificada essa medida relativamente a todas as mulheres, como uma medida de discriminação positiva.

P.C.P. entende que a situação em que se encontram as mulheres portuguesas, igual à da generalidade das mulheres de todo o mundo, a sobrecarga e fadiga resultante da acumulação das tarefas profissionais com as tarefas caseiras, a contribuição do trabalho doméstico para o Produto Interno Bruto impõe, como medida de discriminação positiva, que a idade de reforma das mulheres se situe em idade inferior à dos homens.

Não deveriam ser só as bordadeiras de casa da Ilha da Madeira, nem só as outras categorias enunciadas na Proposta da Assembleia Legislativa Regional da Madeira, englobando mulheres que trabalham na própria fábrica, a beneficiar da redução da idade de reforma.

E se se percebe que a Assembleia da Madeira, se tenha preocupado de uma maneira especial, com a situação das mulheres trabalhando no bordado na sua região, já não se entende que o CDS-PP, se tenha esquecido de tantas trabalhadoras no domicílio, como as bordadeiras de Arraiolos, e tantas outras existentes no país trabalhando no sector do artesanato, que com estas iniciativas legislativas ficam excluídas sem se saber bem porquê, do descanso antecipado.

Não se entendendo também porque é que é mais penoso trabalhar em casa no bordado, do que trabalhar, por exemplo, na fábrica têxtil, a ritmos desumanos, acertando a respiração ofegante com a correria da máquina onde se acertam costuras, sem pausas e intervalos de descanso, ou com pausas e intervalos de descanso não remuneradas, que houve quem dissesse que não contam no tempo de trabalho, e com horas certas para picar o ponto à entrada e à saída da casa de banho.

Os Deputados que não votaram favoravelmente o Projecto de Lei do P.C.P., e que hoje defendem denodadamente as propostas em discussão, terão muita dificuldade em explicar por que é que este regime de excepção não se aplicará a tantas outras mulheres, nas mesmas condições .A discriminação que desta forma se cria relativamente a outras bordadeiras do continente é insuportável pela injustiça que lhe está subjacente.

Haverá mesmo dificuldade em explicar por que é que outros trabalhadores no domicílio, como os trabalhadores do calçado, absorvendo substâncias tóxicas sem quaisquer meios de protecção, não hão-de ter direito à redução da idade de reforma.

Ou por que é que as trabalhadoras das confecções no domicílio, sujeitas à penosidade de um trabalho que deforma o corpo, não devem ter direito à redução da idade de reforma.

E haverá também dificuldade em explicar por que é que a empregada de escritório, que corre do emprego para casa para coser, lavar, engomar, cozinhar, levar os filhos à consulta, dormir umas breves horas para recomeçar as tarefas caseiras, e logo, de seguida e sem descanso, as profissionais, com uma passagem pela creche onde se deixam os filhos, por que é que também essas mulheres, que trabalham em média, por semana mais 30 horas do que os homens, segundo os cálculos das Nações Unidas, não hão de ter direito à redução da idade de reforma.

O Governo parece querer anunciar uma nova mezinha para tanta fadiga. Agora que se fala tanto em trabalho parcial, sabe-se já que serão as mulheres as mais duramente atingidas com tal medida. Que parecendo ser a solução para a sobreocupação das mulheres, mais não é do que um verdadeiro ataque aos seus direitos. Um ataque à sua participação na vida cívica e política, uma ataque ao seu direito à cidadania.

Os trabalhadores no domicílio, muitos dos quais verdadeiros trabalhadores por conta de outrem, como já tive oportunidade de afirmar aquando da discussão de um outro diploma, têm estado completamente desprotegidos no que toca às condições em que desenvolvem o seu trabalho. Não têm tido nenhuma protecção em matéria de segurança e de saúde no trabalho. Para já não se falar nos outros direitos, hoje constantes da Convenção 177 da OIT e da Recomendação 184 da mesma Organização, ambas de 1996.

É, pois natural que a total desprotecção de que têm sido vítimas, os coloque em condições de saúde ( no sentido usado pela O.M.S., e não apenas no sentido vulgar de ausência de doença) que determinem o abaixamento da idade de reforma.

As bordadeiras de casa da Ilha da Madeira encontram-se seguramente nessas condições. Bem como as mulheres, com as profissões identificadas na Proposta da Assembleia Legislativa da Madeira, que trabalhando na fábrica terão até mais dificuldade de conciliar as tarefas caseiras com a sineta que toca em hora aprazada.

Mas há um universo muito maior, relativamente ao qual se encontra a mesma justificação para alargar o âmbito do diploma que sair da Assembleia da República.

Há as mulheres que trabalham em rendas de bilros, ou noutras rendas tradicionais, mantendo valores culturais.

Há as trabalhadoras do Norte do País que trabalham em bordados regionais.

Há as trabalhadoras disseminadas por todo o País que fazem tapetes de Arraiolos.

que quer dizer que, na especialidade, a Proposta da Assembleia Legislativa da Madeira terá de sofrer alterações, por forma a que o diploma não gere desigualdades.

Se assim for, se a Assembleia produzir um diploma justo, teremos sem dúvida dado o primeiro passo para que seja feita justiça ao trabalho das mulheres, repondo a idade da reforma nos 62 anos.

Sem quaisquer condições, e muito menos aquelas que parecem querer estimular a fertilidade.

Disse.

Idade da Reforma das Bordadeiras da Madeira

Intervenção da deputada Odete Santos

1 de Outubro de 1997

Senhor Presidente,

Senhores Deputados,

Entre Abril e Maio de 1.996 a Assembleia da República teve oportunidade de debater, a partir de um Projecto de Lei do P.C.P. a questão da idade da reforma das mulheres. E pronunciou-se recusando a todas, sem excepção, nem mesmo com excepção das bordadeiras, a reposição da idade de reforma nos 62 anos.

Pese embora o facto de o Projecto do C.D.S.- P.P. se limitar nas suas propostas às bordadeiras de casa da ilha da Madeira - objectivo mais justo encontramo-lo na Proposta da Assembleia Legislativa Regional da Madeira - pese embora o restrito campo de aplicação do Projecto dos senhores Deputados do CDS- PP, a verdade é que dá gosto recordar as críticas que este Partido fez, na altura, ao Projecto do P.C.P., e todos os enunciados de medidas prioritárias a favor das mulheres ( como se o P.C.P. não as conhecesse), à pála das quais o CDS/PP, se pronunciou com um rotundo não ao abaixamento da idade da reforma das mulheres.

Se o Projecto de Lei em discussão não fosse do P P, ouviríamos seguramente acusar o diploma de atacar as consequências de um trabalho penoso, e não as causas. E ouviríamos outro rotundo não, a menos que quaisquer cálculos numéricos feitos pêlos que, de 4 em 4 anos, empunham as calculadoras, actualizando percentagens, ditasse estrategicamente outra posição.

P.C.P. já demonstrou, com o seu Projecto de Lei sobre a idade da reforma das mulheres, que se torna justificada essa medida relativamente a todas as mulheres, como uma medida de discriminação positiva.

P.C.P. entende que a situação em que se encontram as mulheres portuguesas, igual à da generalidade das mulheres de todo o mundo, a sobrecarga e fadiga resultante da acumulação das tarefas profissionais com as tarefas caseiras, a contribuição do trabalho doméstico para o Produto Interno Bruto impõe, como medida de discriminação positiva, que a idade de reforma das mulheres se situe em idade inferior à dos homens.

Não deveriam ser só as bordadeiras de casa da Ilha da Madeira, nem só as outras categorias enunciadas na Proposta da Assembleia Legislativa Regional da Madeira, englobando mulheres que trabalham na própria fábrica, a beneficiar da redução da idade de reforma.

E se se percebe que a Assembleia da Madeira, se tenha preocupado de uma maneira especial, com a situação das mulheres trabalhando no bordado na sua região, já não se entende que o CDS-PP, se tenha esquecido de tantas trabalhadoras no domicílio, como as bordadeiras de Arraiolos, e tantas outras existentes no país trabalhando no sector do artesanato, que com estas iniciativas legislativas ficam excluídas sem se saber bem porquê, do descanso antecipado.

Não se entendendo também porque é que é mais penoso trabalhar em casa no bordado, do que trabalhar, por exemplo, na fábrica têxtil, a ritmos desumanos, acertando a respiração ofegante com a correria da máquina onde se acertam costuras, sem pausas e intervalos de descanso, ou com pausas e intervalos de descanso não remuneradas, que houve quem dissesse que não contam no tempo de trabalho, e com horas certas para picar o ponto à entrada e à saída da casa de banho.

Os Deputados que não votaram favoravelmente o Projecto de Lei do P.C.P., e que hoje defendem denodadamente as propostas em discussão, terão muita dificuldade em explicar por que é que este regime de excepção não se aplicará a tantas outras mulheres, nas mesmas condições .A discriminação que desta forma se cria relativamente a outras bordadeiras do continente é insuportável pela injustiça que lhe está subjacente.

Haverá mesmo dificuldade em explicar por que é que outros trabalhadores no domicílio, como os trabalhadores do calçado, absorvendo substâncias tóxicas sem quaisquer meios de protecção, não hão-de ter direito à redução da idade de reforma.

Ou por que é que as trabalhadoras das confecções no domicílio, sujeitas à penosidade de um trabalho que deforma o corpo, não devem ter direito à redução da idade de reforma.

E haverá também dificuldade em explicar por que é que a empregada de escritório, que corre do emprego para casa para coser, lavar, engomar, cozinhar, levar os filhos à consulta, dormir umas breves horas para recomeçar as tarefas caseiras, e logo, de seguida e sem descanso, as profissionais, com uma passagem pela creche onde se deixam os filhos, por que é que também essas mulheres, que trabalham em média, por semana mais 30 horas do que os homens, segundo os cálculos das Nações Unidas, não hão de ter direito à redução da idade de reforma.

O Governo parece querer anunciar uma nova mezinha para tanta fadiga. Agora que se fala tanto em trabalho parcial, sabe-se já que serão as mulheres as mais duramente atingidas com tal medida. Que parecendo ser a solução para a sobreocupação das mulheres, mais não é do que um verdadeiro ataque aos seus direitos. Um ataque à sua participação na vida cívica e política, uma ataque ao seu direito à cidadania.

Os trabalhadores no domicílio, muitos dos quais verdadeiros trabalhadores por conta de outrem, como já tive oportunidade de afirmar aquando da discussão de um outro diploma, têm estado completamente desprotegidos no que toca às condições em que desenvolvem o seu trabalho. Não têm tido nenhuma protecção em matéria de segurança e de saúde no trabalho. Para já não se falar nos outros direitos, hoje constantes da Convenção 177 da OIT e da Recomendação 184 da mesma Organização, ambas de 1996.

É, pois natural que a total desprotecção de que têm sido vítimas, os coloque em condições de saúde ( no sentido usado pela O.M.S., e não apenas no sentido vulgar de ausência de doença) que determinem o abaixamento da idade de reforma.

As bordadeiras de casa da Ilha da Madeira encontram-se seguramente nessas condições. Bem como as mulheres, com as profissões identificadas na Proposta da Assembleia Legislativa da Madeira, que trabalhando na fábrica terão até mais dificuldade de conciliar as tarefas caseiras com a sineta que toca em hora aprazada.

Mas há um universo muito maior, relativamente ao qual se encontra a mesma justificação para alargar o âmbito do diploma que sair da Assembleia da República.

Há as mulheres que trabalham em rendas de bilros, ou noutras rendas tradicionais, mantendo valores culturais.

Há as trabalhadoras do Norte do País que trabalham em bordados regionais.

Há as trabalhadoras disseminadas por todo o País que fazem tapetes de Arraiolos.

que quer dizer que, na especialidade, a Proposta da Assembleia Legislativa da Madeira terá de sofrer alterações, por forma a que o diploma não gere desigualdades.

Se assim for, se a Assembleia produzir um diploma justo, teremos sem dúvida dado o primeiro passo para que seja feita justiça ao trabalho das mulheres, repondo a idade da reforma nos 62 anos.

Sem quaisquer condições, e muito menos aquelas que parecem querer estimular a fertilidade.

Disse.

marcar artigo