Cobrança fiscal pode voltar a ser privatizada por decreto-lei

10-01-2004
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Parlamento aprovou fórmula criticada por alegada inconstitucionalidade

Cobrança Fiscal Pode Voltar a Ser Privatizada por Decreto-lei

Segunda-feira, 05 de Janeiro de 2004

Maioria concede ao Governo a possibilidade de ceder a gestão dos seus créditos por negociação ou ajuste directo

João Ramos de Almeida

O Orçamento de Estado (OE) de 2004 autorizou o Governo a legislar sobre a "contratação de prestação de serviços" relativa à "cessão de gestão de créditos e outros activos financeiros". Só que esta norma contraria os termos da lei publicada a 5 de Dezembro, que, para sanar as críticas de inconstitucionalidade do projecto inicial do Governo, fixou que a gestão e cobrança dos créditos "é assegurada" pelo Estado ou pela DGCI.

A polémica vem desde o início de 2003, com o Governo a mostrar diversas vozes sobre a questão. Em Março de 2003, o ministro da Presidência do Conselho de Ministros, Nuno Morais Sarmento, declarou numa entrevista que "muitos outros serviços devem ser prestados fora do Estado". "Há países a terem os impostos a serem cobrados fora do Estado e países que têm as cartas de condução a serem passadas por entidades privadas", afirmou ao "Diário Económico". Mas, pouco depois, fonte oficial do ministério das Finanças negava: a cedência da cobrança de impostos "não corresponde a nenhum projecto concreto em estudo no ministério das Finanças".

Depois de surgidas notícias sobre a cedência de dívidas a privados - as quais terão motivado a demissão da então secretária de Estado da Segurança Social - e de iniciados os contactos com o grupo financeiro Citigroup para realizar essa cedência, tornou-se conhecido o projecto oficial, aprovado em Conselho de Ministros a 25 de Setembro (sem ser divulgado) e entregue ao Parlamento.

O diploma permitia a privatização da gestão e cobrança, sem promover qualquer concurso público e prevendo mesmo que essa privatização pudesse ocorrer por ajuste directo ou negociação sem publicação ou anúncio. "Os créditos transmitidos pelo Estado e a Segurança Social para efeitos de titularização mantêm a sua natureza e, na falta de convenção em contrário, o processo de cobrança". Ou seja, era possível a cobrança privada desde que convencionada. Por outro lado, "a gestão e cobrança dos créditos tributários (...) é assegurada, mediante retribuição, pelo respectivo cedente ou por entidade idónea por este designada com o consentimento da entidade cessionária".

Face à polémica - Marcelo Rebelo de Sousa e outros peritos suscitaram a sua inconstitucionalidade - a ministra ainda afirmou que, apesar de estar na lei, a sua aplicação se destinava aos municípios. Mas o Governo e o PSD acabaram por recuar. Na lei aprovada pelo Parlamento e publicada a 5 de Dezembro passado, consignou-se que "a gestão e cobrança dos créditos tributários objecto de cessão pelo Estado e pela segurança social para efeitos de titularização é assegurada, mediante retribuição, pelo cedente ou pela Direcção-Geral dos Impostos". Ou seja, o Estado nunca deixaria de gerir e cobrar os seus créditos.

Apesar disso, o OE de 2004 regressou à fórmula do projecto inicial. O Parlamento autorizou o Governo a legislar, por decreto-lei, sobre a "contratação da prestação de serviços relativa à operação indicada na alínea anterior [cessão da gestão de créditos e outros activos financeiros], independentemente do seu valor, podendo esta ser precedida de procedimento por negociação, com ou sem prévia publicação de anúncio, ou realizada por ajuste directo".

Parlamento aprovou fórmula criticada por alegada inconstitucionalidade

Cobrança Fiscal Pode Voltar a Ser Privatizada por Decreto-lei

Segunda-feira, 05 de Janeiro de 2004

Maioria concede ao Governo a possibilidade de ceder a gestão dos seus créditos por negociação ou ajuste directo

João Ramos de Almeida

O Orçamento de Estado (OE) de 2004 autorizou o Governo a legislar sobre a "contratação de prestação de serviços" relativa à "cessão de gestão de créditos e outros activos financeiros". Só que esta norma contraria os termos da lei publicada a 5 de Dezembro, que, para sanar as críticas de inconstitucionalidade do projecto inicial do Governo, fixou que a gestão e cobrança dos créditos "é assegurada" pelo Estado ou pela DGCI.

A polémica vem desde o início de 2003, com o Governo a mostrar diversas vozes sobre a questão. Em Março de 2003, o ministro da Presidência do Conselho de Ministros, Nuno Morais Sarmento, declarou numa entrevista que "muitos outros serviços devem ser prestados fora do Estado". "Há países a terem os impostos a serem cobrados fora do Estado e países que têm as cartas de condução a serem passadas por entidades privadas", afirmou ao "Diário Económico". Mas, pouco depois, fonte oficial do ministério das Finanças negava: a cedência da cobrança de impostos "não corresponde a nenhum projecto concreto em estudo no ministério das Finanças".

Depois de surgidas notícias sobre a cedência de dívidas a privados - as quais terão motivado a demissão da então secretária de Estado da Segurança Social - e de iniciados os contactos com o grupo financeiro Citigroup para realizar essa cedência, tornou-se conhecido o projecto oficial, aprovado em Conselho de Ministros a 25 de Setembro (sem ser divulgado) e entregue ao Parlamento.

O diploma permitia a privatização da gestão e cobrança, sem promover qualquer concurso público e prevendo mesmo que essa privatização pudesse ocorrer por ajuste directo ou negociação sem publicação ou anúncio. "Os créditos transmitidos pelo Estado e a Segurança Social para efeitos de titularização mantêm a sua natureza e, na falta de convenção em contrário, o processo de cobrança". Ou seja, era possível a cobrança privada desde que convencionada. Por outro lado, "a gestão e cobrança dos créditos tributários (...) é assegurada, mediante retribuição, pelo respectivo cedente ou por entidade idónea por este designada com o consentimento da entidade cessionária".

Face à polémica - Marcelo Rebelo de Sousa e outros peritos suscitaram a sua inconstitucionalidade - a ministra ainda afirmou que, apesar de estar na lei, a sua aplicação se destinava aos municípios. Mas o Governo e o PSD acabaram por recuar. Na lei aprovada pelo Parlamento e publicada a 5 de Dezembro passado, consignou-se que "a gestão e cobrança dos créditos tributários objecto de cessão pelo Estado e pela segurança social para efeitos de titularização é assegurada, mediante retribuição, pelo cedente ou pela Direcção-Geral dos Impostos". Ou seja, o Estado nunca deixaria de gerir e cobrar os seus créditos.

Apesar disso, o OE de 2004 regressou à fórmula do projecto inicial. O Parlamento autorizou o Governo a legislar, por decreto-lei, sobre a "contratação da prestação de serviços relativa à operação indicada na alínea anterior [cessão da gestão de créditos e outros activos financeiros], independentemente do seu valor, podendo esta ser precedida de procedimento por negociação, com ou sem prévia publicação de anúncio, ou realizada por ajuste directo".

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