É preciso contrariar a tendência para ser a primeira fila a tomar conta de tudo

12-08-2002
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É Preciso Contrariar a Tendência para Ser a Primeira Fila a Tomar Conta de Tudo

Sexta-feira, 19 de Julho de 2002 Entrevista com Mota Amaral Mota Amaral quer dar mais importância ao trabalho das comissões e fornecer-lhes mais meios técnicos, gostaria de círculos eleitorais mais pequenos mas é contra os círculos uninominais, não considera o aumento dos ordenados dos políticos uma prioridade e está contra a ideia de criar um Senado. Feliz por herdar a dinâmica de um presidente da Assembleia da República que não se cansa de elogiar - Almeida Santos -, quer também abrir o Palácio ao povo, acrescentar-lhe as marcas da democracia, ter rapidamente o museu a funcionar. Entrevista de São José Almeida e José Manuel Fernandes, fotografias de Luis Ramos Estão lá todos menos dois. Alinhados na "Galeria dos Presidentes", os retratos a óleo de quem presidiu desde o 25 de Abril à Assembleia da República alinham-se à espera do retrato que já falta - o de Almeida Santos, o último presidente - e como que guardando o acesso aos gabinetes do que ainda não pode ser retratado, o actual presidente, João Bosco Mota Amaral. Nenhum deles impressiona, mas o mesmo não se pode dizer quando entramos para a sala de visitas, onde um enorme óleo de D. Carlos logo cativa pelo seu poder. Perdão: de D. Carlos? Um rei no lugar de honra da antecâmara da segunda figura de uma República? "Está lá é um sinal de grande abertura", explicar-nos-ia Mota Amaral. "Mas está lá sobretudo por ser um belíssimo retrato, um grande José Malhoa. Para além disso, o rei era uma bela figura..." Já a pintura que cobre a outra parede não agrada ao presidente da AR - "tem lá uma inscrição em latim que é uma glorificação a Pina Manique, e o Pina Manique é que não sou capaz de engolir." Por isso tem destino traçado: vai ser removido para dar lugar a umas tapeçarias de Menez. Pequena mudança, seguramente, sobretudo quando comparamos com o que o Mota Amaral quer mudar no funcionamento da Assembleia e que nos explicou nesta entrevista. PÚBLICO - Uma das novidades do Congresso do PSD é a de sair pré-candidato a Presidente da República? Mota Amaral - Pois é. Por acaso não é a primeira vez. Mas a reflexão e o debate sobre candidaturas à Presidência da República por parte do PSD é prematura. As eleições vão ser em 2006 e nós temos tantas coisas a fazer... Mas como é que vê tantos militantes a falar disso, ter sido muito saudado no Congresso? É natural porque estou há muitos anos no PSD, sou um dos fundadores do partido. Quando se fez a refiliação, acabei por ficar com o número três ou quatro. Durante anos estive no Governo Regional dos Açores, o partido acompanhou e fico muito lisongeado por ver que me estimam e apreciam. No entanto, quero deixar muito claro o meu projecto é, neste momento, trabalhar no Parlamento. O PSD confiou-me uma tarefa da mais alta responsabilidade, a presidência da AR, fui eleito por mais de dois terços dos deputados, são para aqui todas as minhas energias. Não terá a ver com um protagonismo diferente dos seus antecessores? Talvez, mas julgo que estou dentro do que a Constituição e o regimento definem. Mas não exclui no futuro equacionar que o seu nome venha a ser apontado como candidato a PR? Não se retira desta discussão? Não me retiro, nem me coloco. Repito: é muito prematuro. Quando diz que é prematuro, isso é uma crítica a Santana Lopes? Não é crítica a ninguém. Aliás, em relação às declarações de Santana Lopes, pareceu-me haver uma certa elaboração interpretativa... O seu protagonismo tem sido marcado pelo estilo de dirigir os trabalhos. Ficou marcado pela leveza de alguns ditos. Porque lhe veio à cabeça, de repente, aquilo do "69... curioso número"? Deixe-me dizer que considero esse episódio insignificante. Não merece qualquer comentário. Mas é bom ter em conta a grande tensão que se vivia no hemiciclo e que depois deixou de se viver. Fê-lo deliberadamente para descomprimir o ambiente? Não, não fiz deliberadamente. Foi um daqueles ditos que ocorrem. Tem pouco a ver com a sua imagem... Exactamente por isso é que terá causado surpresa. Como sabe o humor está muito ligado à surpresa, ao inesperado. Guilherme Silva, líder parlamentar do PSD, pediu, na sequência desse episódio, que fossem alteradas as regras de acesso às galerias. O senhor disse que não. Mantém o não? Devemos manter a regra do Parlamento aberto. As sessões são públicas, as galerias são acessíveis aos cidadãos. O meu ponto de partida é não introduzir quaisquer critérios restritivos. As pessoas sabem é que quando aqui vêm as regras do jogo são que o público não se pode manifestar, sabem que desacatos no Parlamento são um crime punido pelo Código Penal. Prefiro mil vezes manter facilidades no acesso e proceder à evacuação das galerias se necessário. Se houvesse dificuldades à entrada, o Parlamento adquiriria a imagem de uma casa fechada, de uma fortaleza. Não precisamos disso. A nossa democracia é suficientemente adulta e incidentes desse tipo aconteceram em todos os parlamentos democráticos. Agora os responsáveis pela organização de tais incidente é que têm que ter a noção clara de que essas coisas não se podem acontecer - e eu não vou ficar na minha cadeira a ver e sem actuar. Vai levá-los a tribunal? Os organizadores sim, se existirem. Se porventura tal for necessário, responsabilizarei os dirigentes da CGTP. Apresentou várias propostas ao Regimento. O quê? Apresentei um documento que está na primeira comissão e faz parte dos meus projectos acompanhar atentamente a revisão do regimento para que possa ser votada a 18 de Setembro. Quando ao que proponho é que o presidente da AR deve ter um poder claro de acompanhar os trabalhos das comissões, reunindo com os seus presidentes, comissão a comissão. O presidente tem também a obrigação de organizar, acompanhar e velar por que estas delegações que visitem outros países tenham um desempenho que prestigie o Parlamento. Há também duas áreas novas introduzidas pelo eficientíssimo trabalho do meu antecessor: o Canal Parlamento e o website da AR, cuja tutela não está atribuída e acho que deve do presidente. Defendo também uma subida de nível das competências dos vice-presidentes, nomeadamente no aconselhamento do presidente. Presentemente apenas tem poder de justificar as faltas e de encaminhar para as comissões as petições. Nas suas propostas já deixou cair a eliminação das sessões plenárias às sextas-feiras... Sim. Se o Parlamento está tão empenhado em reunir às sextas-feiras, pois que seja. A valorização do trabalho das comissões é uma preocupação sua. Como vê a proposta feita a última legislatura por António Capucho de o debate em hemiciclo ficar reservado aos grandes temas, passando o debate sectorial para as comissões? Com muito agrado. Acho que isso seria óptimo. Nos últimos meses tivémos trinta e três sessões plenárias, 145 reuniões de comissões, 16 conferências de líderes. As comissões ocuparam-se do detalhe dos diplomas e as sessões plenárias foram dedicadas às grandes questões da arrancada desta nova maioria. Já houve vários debates com o primeiro-ministro e também consegui repescar a norma do regimento - que tinha caído em desuso - de realização mensal de um debate sobre assuntos de actualidade. O primeiro foi sobre o Médio Oriente, o segundo sobre política europeia de pescas, em Outubro faremos um sobre escolas e associações de pais. Hoje as comissões trabalham quase sempre abertas à comunicação social, e há quem diga que por isso tendem a transformar-se em mini-plenários onde não há espaço para o debate que aproxime posições... Tem razão. Esse problema é delicado pois a abertura das comissões, como ponto de partida, é um bom princípio. Até porque vamos poder transmitir no Canal Parlamento algumas dessas sessões, como as audições de membros do Governo. Isso será importante para os cidadãos perceberem que o Parlamento não é só a sessão plenária com toda aquela pompa... Mas há matérias nas quais a busca do equilíbrio na definição das leis, do direito, não se pode fazer com base do extremar de posições para efeitos mediáticos, tem de se fazer na busca da razão. As comissões têm neste momento os meios de que necessitam? Não. É preciso reforçar as assessorias. Temos um núcleo de funcionários de qualidade, mas precisamos de ter aqui "la creme de la creme". O Parlamento tem que ter a capacidade de estudar os assuntos em profundidade, pelo que precisa do apoio de um "staff" forte em cada uma das comissões, sobretudo as que são mais solicitadas por diplomas mais melindrosos. Como mais antigo deputado em funções, acha que o Parlamento tem "la creme de la creme" da classe política? Como vê a evolução do Parlamento? Houve um corte epistemológico com o 25 de Abril. E costumo dizer que a minha participação no período anterior, na Ala Liberal, correspondeu a uma anterior encarnação. Com a revolução iniciámos um capítulo novo, com um Parlamento eleito realmente pelo povo. Nessa fase o Parlamento tem um paradigma elevadíssimo na Constituinte, onde todas as forças políticas colocaram o melhor que havia em Portugal. Havia uma pulsão participativa para a construção da democracia e para iniciar um capítulo novo na história do país. Posteriormente as circunstâncias foram mudando e é óbvio que hoje o quadro político é completamente diferente. Há uma normalização. Há uma normalização. Há pessoas que consideram que estão a fazer um trabalho excelente na universidade, nas empresas, em milhentas coisas, e que não se motivam para o trabalho no Parlamento. Será porque os ordenados não são atractivos? Ou porque falta aos deputados poder de iniciativa, real autonomia, apenas têm dez minutos por sessão legislativa para falar fora do tempo das bancada... Que raramente utilizam. Há quem passe por aqui e diga que o trabalho que faz não é tão útil como poderia ser... A minha mensagem aos grupos parlamentares é que nenhum deputado deve estar aqui sem uma tarefa distribuída. E é preciso contrariar a tendência para a primeira fila tomar conta de tudo e os que estão atrás só lá estarem para votar. Isso dá descrédito à Assembleia? É evidente. A mim aconteceu-me, lá na última fila que eu frequentava, estar na altura das votações e nem sequer ter o guião do que estava a votar. É um papel absurdo e para, muitas pessoas, frustrante. Ainda estamos muito no paradigma do século XIX, em que o deputado representava a sua circunscrição, fazia um discurso sobre as carências das respectivas populações, e pronto. Ora não é isso que se espera de um deputado hoje em dia. Espera-se que tenha capacidade de intervenção nas comissões, que tenha assessoramento para os trabalhos que lhe são atribuídos. Já quanto ao poder de iniciativa, a tendência normal é serem iniciativas avulsas, pontuais, que perturbem a lógica do programa legislativo do executivo. Mesmo assim acho que dar mais poder aos deputados para agendarem as suas próprias iniciativas é uma belíssima ideia. A questão dos ordenados dos políticos também o preocupa? Não é a mais importante para a melhorar o funcionamento do Parlamento. O senhor Presidente da República resuscitou-a. Eu por mim tinha-a enterrado, mas dou precedência ao senhor Presidente da República, pelo que o assunto está confiado à comissão eventual para a reforma do sistema político. Tinha enterrado porquê? Acha que os salários são justos ou por que acha que são suficientes para quem leva uma vida monástica? Os salários são os possíveis no estado geral do país. Sobre esta matéria não vale a pena ter dúvidas: a generalidade dos cidadãos acha que os políticos ganham de mais e é obvio que os responsáveis, antes de pensarem em corrigir esta deficiência. devem tentar corrigir a percepção que os cidadãos fazem dela. É sobre isso que nos devemos concentrar. De resto, quem vem para a política não vem para fazer fortuna e, se pensar nisso, bateu na porta errada, na minha opinião. Por outro lado, penso que uma decisão nesta matéria não pode ficar ligada a quem a toma. Teria sempre de só ter efeitos a partir das eleições subsequentes. Como viu o chamado "caso Maria Elisa"? Não acompanhei em pormenor. Julgo que se resolveu bem. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Jovens vêem a Net como meio de diversão

Números

"Media" influenciam representação da Internet

Discurso Directo

É preciso contrariar a tendência para ser a primeira fila a tomar conta de tudo

Programa de Simoneta para o museu está adjudicado

"Prefiro mil vezes os círculos pequenos, como o meu círculo dos Açores"

"Legado de Maria Adelina será aprofundado por Isabel Corte-Real"

Independentismo dos Açores "um devaneio romântico"

É Preciso Contrariar a Tendência para Ser a Primeira Fila a Tomar Conta de Tudo

Sexta-feira, 19 de Julho de 2002 Entrevista com Mota Amaral Mota Amaral quer dar mais importância ao trabalho das comissões e fornecer-lhes mais meios técnicos, gostaria de círculos eleitorais mais pequenos mas é contra os círculos uninominais, não considera o aumento dos ordenados dos políticos uma prioridade e está contra a ideia de criar um Senado. Feliz por herdar a dinâmica de um presidente da Assembleia da República que não se cansa de elogiar - Almeida Santos -, quer também abrir o Palácio ao povo, acrescentar-lhe as marcas da democracia, ter rapidamente o museu a funcionar. Entrevista de São José Almeida e José Manuel Fernandes, fotografias de Luis Ramos Estão lá todos menos dois. Alinhados na "Galeria dos Presidentes", os retratos a óleo de quem presidiu desde o 25 de Abril à Assembleia da República alinham-se à espera do retrato que já falta - o de Almeida Santos, o último presidente - e como que guardando o acesso aos gabinetes do que ainda não pode ser retratado, o actual presidente, João Bosco Mota Amaral. Nenhum deles impressiona, mas o mesmo não se pode dizer quando entramos para a sala de visitas, onde um enorme óleo de D. Carlos logo cativa pelo seu poder. Perdão: de D. Carlos? Um rei no lugar de honra da antecâmara da segunda figura de uma República? "Está lá é um sinal de grande abertura", explicar-nos-ia Mota Amaral. "Mas está lá sobretudo por ser um belíssimo retrato, um grande José Malhoa. Para além disso, o rei era uma bela figura..." Já a pintura que cobre a outra parede não agrada ao presidente da AR - "tem lá uma inscrição em latim que é uma glorificação a Pina Manique, e o Pina Manique é que não sou capaz de engolir." Por isso tem destino traçado: vai ser removido para dar lugar a umas tapeçarias de Menez. Pequena mudança, seguramente, sobretudo quando comparamos com o que o Mota Amaral quer mudar no funcionamento da Assembleia e que nos explicou nesta entrevista. PÚBLICO - Uma das novidades do Congresso do PSD é a de sair pré-candidato a Presidente da República? Mota Amaral - Pois é. Por acaso não é a primeira vez. Mas a reflexão e o debate sobre candidaturas à Presidência da República por parte do PSD é prematura. As eleições vão ser em 2006 e nós temos tantas coisas a fazer... Mas como é que vê tantos militantes a falar disso, ter sido muito saudado no Congresso? É natural porque estou há muitos anos no PSD, sou um dos fundadores do partido. Quando se fez a refiliação, acabei por ficar com o número três ou quatro. Durante anos estive no Governo Regional dos Açores, o partido acompanhou e fico muito lisongeado por ver que me estimam e apreciam. No entanto, quero deixar muito claro o meu projecto é, neste momento, trabalhar no Parlamento. O PSD confiou-me uma tarefa da mais alta responsabilidade, a presidência da AR, fui eleito por mais de dois terços dos deputados, são para aqui todas as minhas energias. Não terá a ver com um protagonismo diferente dos seus antecessores? Talvez, mas julgo que estou dentro do que a Constituição e o regimento definem. Mas não exclui no futuro equacionar que o seu nome venha a ser apontado como candidato a PR? Não se retira desta discussão? Não me retiro, nem me coloco. Repito: é muito prematuro. Quando diz que é prematuro, isso é uma crítica a Santana Lopes? Não é crítica a ninguém. Aliás, em relação às declarações de Santana Lopes, pareceu-me haver uma certa elaboração interpretativa... O seu protagonismo tem sido marcado pelo estilo de dirigir os trabalhos. Ficou marcado pela leveza de alguns ditos. Porque lhe veio à cabeça, de repente, aquilo do "69... curioso número"? Deixe-me dizer que considero esse episódio insignificante. Não merece qualquer comentário. Mas é bom ter em conta a grande tensão que se vivia no hemiciclo e que depois deixou de se viver. Fê-lo deliberadamente para descomprimir o ambiente? Não, não fiz deliberadamente. Foi um daqueles ditos que ocorrem. Tem pouco a ver com a sua imagem... Exactamente por isso é que terá causado surpresa. Como sabe o humor está muito ligado à surpresa, ao inesperado. Guilherme Silva, líder parlamentar do PSD, pediu, na sequência desse episódio, que fossem alteradas as regras de acesso às galerias. O senhor disse que não. Mantém o não? Devemos manter a regra do Parlamento aberto. As sessões são públicas, as galerias são acessíveis aos cidadãos. O meu ponto de partida é não introduzir quaisquer critérios restritivos. As pessoas sabem é que quando aqui vêm as regras do jogo são que o público não se pode manifestar, sabem que desacatos no Parlamento são um crime punido pelo Código Penal. Prefiro mil vezes manter facilidades no acesso e proceder à evacuação das galerias se necessário. Se houvesse dificuldades à entrada, o Parlamento adquiriria a imagem de uma casa fechada, de uma fortaleza. Não precisamos disso. A nossa democracia é suficientemente adulta e incidentes desse tipo aconteceram em todos os parlamentos democráticos. Agora os responsáveis pela organização de tais incidente é que têm que ter a noção clara de que essas coisas não se podem acontecer - e eu não vou ficar na minha cadeira a ver e sem actuar. Vai levá-los a tribunal? Os organizadores sim, se existirem. Se porventura tal for necessário, responsabilizarei os dirigentes da CGTP. Apresentou várias propostas ao Regimento. O quê? Apresentei um documento que está na primeira comissão e faz parte dos meus projectos acompanhar atentamente a revisão do regimento para que possa ser votada a 18 de Setembro. Quando ao que proponho é que o presidente da AR deve ter um poder claro de acompanhar os trabalhos das comissões, reunindo com os seus presidentes, comissão a comissão. O presidente tem também a obrigação de organizar, acompanhar e velar por que estas delegações que visitem outros países tenham um desempenho que prestigie o Parlamento. Há também duas áreas novas introduzidas pelo eficientíssimo trabalho do meu antecessor: o Canal Parlamento e o website da AR, cuja tutela não está atribuída e acho que deve do presidente. Defendo também uma subida de nível das competências dos vice-presidentes, nomeadamente no aconselhamento do presidente. Presentemente apenas tem poder de justificar as faltas e de encaminhar para as comissões as petições. Nas suas propostas já deixou cair a eliminação das sessões plenárias às sextas-feiras... Sim. Se o Parlamento está tão empenhado em reunir às sextas-feiras, pois que seja. A valorização do trabalho das comissões é uma preocupação sua. Como vê a proposta feita a última legislatura por António Capucho de o debate em hemiciclo ficar reservado aos grandes temas, passando o debate sectorial para as comissões? Com muito agrado. Acho que isso seria óptimo. Nos últimos meses tivémos trinta e três sessões plenárias, 145 reuniões de comissões, 16 conferências de líderes. As comissões ocuparam-se do detalhe dos diplomas e as sessões plenárias foram dedicadas às grandes questões da arrancada desta nova maioria. Já houve vários debates com o primeiro-ministro e também consegui repescar a norma do regimento - que tinha caído em desuso - de realização mensal de um debate sobre assuntos de actualidade. O primeiro foi sobre o Médio Oriente, o segundo sobre política europeia de pescas, em Outubro faremos um sobre escolas e associações de pais. Hoje as comissões trabalham quase sempre abertas à comunicação social, e há quem diga que por isso tendem a transformar-se em mini-plenários onde não há espaço para o debate que aproxime posições... Tem razão. Esse problema é delicado pois a abertura das comissões, como ponto de partida, é um bom princípio. Até porque vamos poder transmitir no Canal Parlamento algumas dessas sessões, como as audições de membros do Governo. Isso será importante para os cidadãos perceberem que o Parlamento não é só a sessão plenária com toda aquela pompa... Mas há matérias nas quais a busca do equilíbrio na definição das leis, do direito, não se pode fazer com base do extremar de posições para efeitos mediáticos, tem de se fazer na busca da razão. As comissões têm neste momento os meios de que necessitam? Não. É preciso reforçar as assessorias. Temos um núcleo de funcionários de qualidade, mas precisamos de ter aqui "la creme de la creme". O Parlamento tem que ter a capacidade de estudar os assuntos em profundidade, pelo que precisa do apoio de um "staff" forte em cada uma das comissões, sobretudo as que são mais solicitadas por diplomas mais melindrosos. Como mais antigo deputado em funções, acha que o Parlamento tem "la creme de la creme" da classe política? Como vê a evolução do Parlamento? Houve um corte epistemológico com o 25 de Abril. E costumo dizer que a minha participação no período anterior, na Ala Liberal, correspondeu a uma anterior encarnação. Com a revolução iniciámos um capítulo novo, com um Parlamento eleito realmente pelo povo. Nessa fase o Parlamento tem um paradigma elevadíssimo na Constituinte, onde todas as forças políticas colocaram o melhor que havia em Portugal. Havia uma pulsão participativa para a construção da democracia e para iniciar um capítulo novo na história do país. Posteriormente as circunstâncias foram mudando e é óbvio que hoje o quadro político é completamente diferente. Há uma normalização. Há uma normalização. Há pessoas que consideram que estão a fazer um trabalho excelente na universidade, nas empresas, em milhentas coisas, e que não se motivam para o trabalho no Parlamento. Será porque os ordenados não são atractivos? Ou porque falta aos deputados poder de iniciativa, real autonomia, apenas têm dez minutos por sessão legislativa para falar fora do tempo das bancada... Que raramente utilizam. Há quem passe por aqui e diga que o trabalho que faz não é tão útil como poderia ser... A minha mensagem aos grupos parlamentares é que nenhum deputado deve estar aqui sem uma tarefa distribuída. E é preciso contrariar a tendência para a primeira fila tomar conta de tudo e os que estão atrás só lá estarem para votar. Isso dá descrédito à Assembleia? É evidente. A mim aconteceu-me, lá na última fila que eu frequentava, estar na altura das votações e nem sequer ter o guião do que estava a votar. É um papel absurdo e para, muitas pessoas, frustrante. Ainda estamos muito no paradigma do século XIX, em que o deputado representava a sua circunscrição, fazia um discurso sobre as carências das respectivas populações, e pronto. Ora não é isso que se espera de um deputado hoje em dia. Espera-se que tenha capacidade de intervenção nas comissões, que tenha assessoramento para os trabalhos que lhe são atribuídos. Já quanto ao poder de iniciativa, a tendência normal é serem iniciativas avulsas, pontuais, que perturbem a lógica do programa legislativo do executivo. Mesmo assim acho que dar mais poder aos deputados para agendarem as suas próprias iniciativas é uma belíssima ideia. A questão dos ordenados dos políticos também o preocupa? Não é a mais importante para a melhorar o funcionamento do Parlamento. O senhor Presidente da República resuscitou-a. Eu por mim tinha-a enterrado, mas dou precedência ao senhor Presidente da República, pelo que o assunto está confiado à comissão eventual para a reforma do sistema político. Tinha enterrado porquê? Acha que os salários são justos ou por que acha que são suficientes para quem leva uma vida monástica? Os salários são os possíveis no estado geral do país. Sobre esta matéria não vale a pena ter dúvidas: a generalidade dos cidadãos acha que os políticos ganham de mais e é obvio que os responsáveis, antes de pensarem em corrigir esta deficiência. devem tentar corrigir a percepção que os cidadãos fazem dela. É sobre isso que nos devemos concentrar. De resto, quem vem para a política não vem para fazer fortuna e, se pensar nisso, bateu na porta errada, na minha opinião. Por outro lado, penso que uma decisão nesta matéria não pode ficar ligada a quem a toma. Teria sempre de só ter efeitos a partir das eleições subsequentes. Como viu o chamado "caso Maria Elisa"? Não acompanhei em pormenor. Julgo que se resolveu bem. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Jovens vêem a Net como meio de diversão

Números

"Media" influenciam representação da Internet

Discurso Directo

É preciso contrariar a tendência para ser a primeira fila a tomar conta de tudo

Programa de Simoneta para o museu está adjudicado

"Prefiro mil vezes os círculos pequenos, como o meu círculo dos Açores"

"Legado de Maria Adelina será aprofundado por Isabel Corte-Real"

Independentismo dos Açores "um devaneio romântico"

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