Reacção Morna de Patrões, Sindicatos e Bolsa ao Adiar do Choque Fiscal
Quarta-feira, 17 de Abril de 2002
O défice justificou o choque fiscal, o défice adiou-o
A CCP-Confederação do Comércio e Serviços de Portugal deu ontem os primeiros sinais de preocupação pelo adiamento do choque fiscal, apesar de os patrões em geral pedirem mais tempo para digerir as medidas anunciadas pelo Governo. Traço comum entre sindicatos, patrões e bolsa foi o de uma reacção morna às decisões do Governo.
Anunciado pelo PSD na campanha eleitoral, como elemento central de uma política de estímulo ao crescimento económico e ao controlo da despesa pública - libertando esta de investimento que o sector privado passaria a fazer -, o choque fiscal foi adiado por o Governo entender ser necessário proceder, em primeiro lugar, a uma arrumação das contas públicas alegadamente mais deficitárias do que o previsto. O défice justificou o choque, o défice adiou-o.
A proposta, cujas medidas mais sonantes eram a descida da taxa de IRC de 28 para 20 por cento, a redução de cinco pontos percentuais da taxa do escalão máximo do IRS e a diminuição de benefícios fiscais das empresas - a consagrar no OE de 2003 e a ter efeitos práticos em 2004 -, fica assim, pelo menos, mais um ano na gaveta.
A explicação oficial dos social-democratas "adormece" uma medida que teve dificuldades em colher um entusiasmo generalizado dentro do próprio PSD. Em defesa da proposta ficaram, sobretudo, registadas as posições de Miguel Frasquilho, hoje secretário de Estado das Finanças, e de Tavares Moreira, enquanto porta-voz do PSD para a área económica. Mas ficou também registada a hesitação de Durão Barroso, actual primeiro-ministro, em manter o choque fiscal como assumida bandeira eleitoral depois das primeiras reacções à proposta.
Comércio preocupado
As principais organizações patronais adiaram para hoje posições sobre o adiamento do "choque fiscal", com o argumento de que necessitam de tempo para digerir as propostas apresentadas pela equipa de Durão Barroso. Furando a mudez geral, o presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), Vasco da Gama, mostrou-se preocupado com o adiamento do choque fiscal. "Não sei como é que o Governo pretende incentivar o investimento empresarial e o reforço financeiro das empresas sem estímulos fiscais", referiu ao PÚBLICO.
Contudo, afirmou ter ficado com "uma impressão muito positiva do Programa do Governo" e frisou compreender o adiamento do dito choque, por considerar que "a situação de equilíbrio orçamental é uma prioridade". De tal forma prioritária que "não há dúvida que terá de se sacrificar um bocadinho um choque fiscal imediato", explicou. Um sacrifício que não se poderá prolongar muito tempo, porque, de outro modo, "seria o primeiro revés para o próprio Programa do Governo". O líder da CCP adiantou ainda que "mexer, agora, no IVA seria desastroso".
Reacção modesta da bolsa
O anúncio do programa do Governo teve um reflexo reduzido na bolsa, o que é atribuído ao facto de o mercado estar à espera de medidas fiscais mais agressivas, mas também porque a situação das contas públicas implica cortes nas despesas e no investimento, o que não deixa margem para euforias.
Em declarações ao PÚBLICO, o presidente da Associação Portuguesa de Corretores, Garcia dos Santos, defendeu que a revogação da reforma fiscal, concretamente no fim da dupla tributação dos dividendos, "é positiva". Admite que, em relação à tributação sobre mais-valias, se poderia ter ido mais longe, isentando totalmente os investimentos que fossem realizados em acções de empresas portuguesas. O que passa a vigorar é a taxa liberatória de dez por cento sobre acções detidas por um período inferior a um ano. No caso da redução de IRC, Garcia dos Santos diz compreender "o drama de quem está do lado de lá" [Governo], apesar de continuar a defender a necessidade de aumentar a competitividade fiscal para relançar a economia portuguesa. Para o presidente da APC, é ainda importante o Governo "não mexer no sigilo bancário" e incrementar as privatizações.
Apesar do adiamento do "choque fiscal", a Confederação-Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP) salienta que, ainda assim, no primeiro trimestre do ano não só se verificou a queda do IRC, mas por sua vez, um aumento do IRS. Sobre a questão deixada em aberto pela ministra das Finanças, Manuela Ferreira Leite, de um provável aumento do IVA, a CGTP lamenta que se penalize de forma indirecta "tanto o trabalhador que aufere cem como o trabalhador que ganha mil". A Intersindical estranha, igualmente, o silêncio do novo Governo relativamente à situação do "offshore" da Madeira, assim como o "esquecimento" do imposto sobre o património.
J.A./L.F./D.R./R.S.
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Reacção Morna de Patrões, Sindicatos e Bolsa ao Adiar do Choque Fiscal
Quarta-feira, 17 de Abril de 2002
O défice justificou o choque fiscal, o défice adiou-o
A CCP-Confederação do Comércio e Serviços de Portugal deu ontem os primeiros sinais de preocupação pelo adiamento do choque fiscal, apesar de os patrões em geral pedirem mais tempo para digerir as medidas anunciadas pelo Governo. Traço comum entre sindicatos, patrões e bolsa foi o de uma reacção morna às decisões do Governo.
Anunciado pelo PSD na campanha eleitoral, como elemento central de uma política de estímulo ao crescimento económico e ao controlo da despesa pública - libertando esta de investimento que o sector privado passaria a fazer -, o choque fiscal foi adiado por o Governo entender ser necessário proceder, em primeiro lugar, a uma arrumação das contas públicas alegadamente mais deficitárias do que o previsto. O défice justificou o choque, o défice adiou-o.
A proposta, cujas medidas mais sonantes eram a descida da taxa de IRC de 28 para 20 por cento, a redução de cinco pontos percentuais da taxa do escalão máximo do IRS e a diminuição de benefícios fiscais das empresas - a consagrar no OE de 2003 e a ter efeitos práticos em 2004 -, fica assim, pelo menos, mais um ano na gaveta.
A explicação oficial dos social-democratas "adormece" uma medida que teve dificuldades em colher um entusiasmo generalizado dentro do próprio PSD. Em defesa da proposta ficaram, sobretudo, registadas as posições de Miguel Frasquilho, hoje secretário de Estado das Finanças, e de Tavares Moreira, enquanto porta-voz do PSD para a área económica. Mas ficou também registada a hesitação de Durão Barroso, actual primeiro-ministro, em manter o choque fiscal como assumida bandeira eleitoral depois das primeiras reacções à proposta.
Comércio preocupado
As principais organizações patronais adiaram para hoje posições sobre o adiamento do "choque fiscal", com o argumento de que necessitam de tempo para digerir as propostas apresentadas pela equipa de Durão Barroso. Furando a mudez geral, o presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), Vasco da Gama, mostrou-se preocupado com o adiamento do choque fiscal. "Não sei como é que o Governo pretende incentivar o investimento empresarial e o reforço financeiro das empresas sem estímulos fiscais", referiu ao PÚBLICO.
Contudo, afirmou ter ficado com "uma impressão muito positiva do Programa do Governo" e frisou compreender o adiamento do dito choque, por considerar que "a situação de equilíbrio orçamental é uma prioridade". De tal forma prioritária que "não há dúvida que terá de se sacrificar um bocadinho um choque fiscal imediato", explicou. Um sacrifício que não se poderá prolongar muito tempo, porque, de outro modo, "seria o primeiro revés para o próprio Programa do Governo". O líder da CCP adiantou ainda que "mexer, agora, no IVA seria desastroso".
Reacção modesta da bolsa
O anúncio do programa do Governo teve um reflexo reduzido na bolsa, o que é atribuído ao facto de o mercado estar à espera de medidas fiscais mais agressivas, mas também porque a situação das contas públicas implica cortes nas despesas e no investimento, o que não deixa margem para euforias.
Em declarações ao PÚBLICO, o presidente da Associação Portuguesa de Corretores, Garcia dos Santos, defendeu que a revogação da reforma fiscal, concretamente no fim da dupla tributação dos dividendos, "é positiva". Admite que, em relação à tributação sobre mais-valias, se poderia ter ido mais longe, isentando totalmente os investimentos que fossem realizados em acções de empresas portuguesas. O que passa a vigorar é a taxa liberatória de dez por cento sobre acções detidas por um período inferior a um ano. No caso da redução de IRC, Garcia dos Santos diz compreender "o drama de quem está do lado de lá" [Governo], apesar de continuar a defender a necessidade de aumentar a competitividade fiscal para relançar a economia portuguesa. Para o presidente da APC, é ainda importante o Governo "não mexer no sigilo bancário" e incrementar as privatizações.
Apesar do adiamento do "choque fiscal", a Confederação-Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP) salienta que, ainda assim, no primeiro trimestre do ano não só se verificou a queda do IRC, mas por sua vez, um aumento do IRS. Sobre a questão deixada em aberto pela ministra das Finanças, Manuela Ferreira Leite, de um provável aumento do IVA, a CGTP lamenta que se penalize de forma indirecta "tanto o trabalhador que aufere cem como o trabalhador que ganha mil". A Intersindical estranha, igualmente, o silêncio do novo Governo relativamente à situação do "offshore" da Madeira, assim como o "esquecimento" do imposto sobre o património.
J.A./L.F./D.R./R.S.