EXPRESSO: País

01-09-2002
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Doença do legionário com dados subavaliados

Os surtos não chegaram a Portugal, mas a «legionella» ainda não tem rastreio

António Pedro Ferreira Os sintomas da pneumonia e da legionelose são idênticos. Só análises clínicas permitem o diagnóstico, mas poucas são feitas

A DIRECÇÃO-GERAL da Saúde (DGS) admite que os casos notificados em Portugal de doença dos legionários (ou legionelose) - um tipo de pneumonia que pode tornar-se mortal e está a afectar a região de Múrcia, em Espanha - estão bastante subestimados. Embora seja considerado desde 1999 uma doença de declaração obrigatória, a DGS apenas registou 22 casos de legionelose em 2000 e cinco desde Janeiro deste ano, tendo-se verificado sete mortes. A directora dos Serviços de Epidemiologia da DGS, Graças Freitas, justifica esta subavaliação por

Com efeito, em termos de sintomatologia não existem diferenças, nem nos raios X, entre uma pneumonia e a doença do legionário -, sendo apenas determinado o agente através de análises específicas à urina ou por comparação dos níveis de anticorpos ao fim de três a seis semanas da infecção.

Em Portugal estes testes raramente são feitos. Mesmo os poucos que se realizam demonstram que os dados divulgados pela DGS não indicam a verdadeira dimensão da doença em Portugal. «No ano passado, alguns hospitais de Lisboa enviaram-me amostras para análise e detectei nove casos positivos», diz Teresa Marques, médica do laboratório de Microbiologia do Hospital de Santa Cruz e uma das representantes nacionais do grupo europeu que investiga esta doença. Ora, segundo o registo da DGS, não foi notificado em 2000 qualquer caso no distrito de Lisboa. «A obrigatoriedade de notificação é sempre do médico, nunca do laboratório», salienta Teresa Marques.

Bactéria perigosa...

Embora não existam dados em Portugal, a legionella é, segundo estudos europeus, responsável por entre 0,5 e 5% dos casos diagnosticados de pneumonia. Os surtos são apenas responsáveis por 20% dos casos totais. É sobretudo o contacto com aerossóis (pequenas partículas) provenientes dos aparelhos de aquecimento central e de ar condicionado que provoca esta doença, sendo necessário, contudo, um tempo de exposição entre dois e 10 dias. Mas pode eclodir também em canalizações de água quente, sobretudo se o tratamento com cloro for insuficiente.

Nos Estados Unidos são detectados entre 8000 e 18.000 casos por ano - um valor relativo mais elevado que nos países europeus, devido, sobretudo, ao facto de 75% das casas norte-americanas estarem equipadas com ar condicionado.

O tratamento, regra geral, é apenas eficaz com um único tipo de antibiótico - a eritromicina -, mas nos Estados Unidos, por exemplo, entre 5 e 30% dos casos são mortais. Uma forma mais benigna da doença dos legionários é a febre de Pontiac, que, apesar do forte mal-estar, não necessita de tratamento.

...sem transmissão entre pessoas

Para Massano Cardoso, especialista em Saúde Pública da Universidade de Coimbra, «esta é uma doença típica das civilizações desenvolvidas, com tendência a aumentar». A mesma opinião tem Teresa Marques, que considera importante aumentar as fiscalizações aos aparelhos de aquecimento.

No entanto, esta especialista avisa que «não existem motivos para pânico, tanto mais que a doença é apenas causada por contacto com o agente infeccioso, não sendo transmissível entre humanos».

Embora seja impossível fazer qualquer estimativa da incidência de legionelose em Portugal - uma vez que a DGS não divulgou, em tempo útil, o número de internamentos de pneumonia nos hospitais - certo é que as mortes por doenças infecciosas pulmonares estão a aumentar. Entre 1994 e 1999, os óbitos por pneumonia cresceram de 2855 para 5011.

«A pneumonia é uma doença oportunista que afecta sobretudo as pessoas mais idosas ou com insuficiência imunitária», diz Maria João Gomes, presidente da Sociedade Portuguesa de Pneumologia. Ou seja, afecta os mesmos grupos que a legionella.

Doença do legionário com dados subavaliados

Os surtos não chegaram a Portugal, mas a «legionella» ainda não tem rastreio

António Pedro Ferreira Os sintomas da pneumonia e da legionelose são idênticos. Só análises clínicas permitem o diagnóstico, mas poucas são feitas

A DIRECÇÃO-GERAL da Saúde (DGS) admite que os casos notificados em Portugal de doença dos legionários (ou legionelose) - um tipo de pneumonia que pode tornar-se mortal e está a afectar a região de Múrcia, em Espanha - estão bastante subestimados. Embora seja considerado desde 1999 uma doença de declaração obrigatória, a DGS apenas registou 22 casos de legionelose em 2000 e cinco desde Janeiro deste ano, tendo-se verificado sete mortes. A directora dos Serviços de Epidemiologia da DGS, Graças Freitas, justifica esta subavaliação por

Com efeito, em termos de sintomatologia não existem diferenças, nem nos raios X, entre uma pneumonia e a doença do legionário -, sendo apenas determinado o agente através de análises específicas à urina ou por comparação dos níveis de anticorpos ao fim de três a seis semanas da infecção.

Em Portugal estes testes raramente são feitos. Mesmo os poucos que se realizam demonstram que os dados divulgados pela DGS não indicam a verdadeira dimensão da doença em Portugal. «No ano passado, alguns hospitais de Lisboa enviaram-me amostras para análise e detectei nove casos positivos», diz Teresa Marques, médica do laboratório de Microbiologia do Hospital de Santa Cruz e uma das representantes nacionais do grupo europeu que investiga esta doença. Ora, segundo o registo da DGS, não foi notificado em 2000 qualquer caso no distrito de Lisboa. «A obrigatoriedade de notificação é sempre do médico, nunca do laboratório», salienta Teresa Marques.

Bactéria perigosa...

Embora não existam dados em Portugal, a legionella é, segundo estudos europeus, responsável por entre 0,5 e 5% dos casos diagnosticados de pneumonia. Os surtos são apenas responsáveis por 20% dos casos totais. É sobretudo o contacto com aerossóis (pequenas partículas) provenientes dos aparelhos de aquecimento central e de ar condicionado que provoca esta doença, sendo necessário, contudo, um tempo de exposição entre dois e 10 dias. Mas pode eclodir também em canalizações de água quente, sobretudo se o tratamento com cloro for insuficiente.

Nos Estados Unidos são detectados entre 8000 e 18.000 casos por ano - um valor relativo mais elevado que nos países europeus, devido, sobretudo, ao facto de 75% das casas norte-americanas estarem equipadas com ar condicionado.

O tratamento, regra geral, é apenas eficaz com um único tipo de antibiótico - a eritromicina -, mas nos Estados Unidos, por exemplo, entre 5 e 30% dos casos são mortais. Uma forma mais benigna da doença dos legionários é a febre de Pontiac, que, apesar do forte mal-estar, não necessita de tratamento.

...sem transmissão entre pessoas

Para Massano Cardoso, especialista em Saúde Pública da Universidade de Coimbra, «esta é uma doença típica das civilizações desenvolvidas, com tendência a aumentar». A mesma opinião tem Teresa Marques, que considera importante aumentar as fiscalizações aos aparelhos de aquecimento.

No entanto, esta especialista avisa que «não existem motivos para pânico, tanto mais que a doença é apenas causada por contacto com o agente infeccioso, não sendo transmissível entre humanos».

Embora seja impossível fazer qualquer estimativa da incidência de legionelose em Portugal - uma vez que a DGS não divulgou, em tempo útil, o número de internamentos de pneumonia nos hospitais - certo é que as mortes por doenças infecciosas pulmonares estão a aumentar. Entre 1994 e 1999, os óbitos por pneumonia cresceram de 2855 para 5011.

«A pneumonia é uma doença oportunista que afecta sobretudo as pessoas mais idosas ou com insuficiência imunitária», diz Maria João Gomes, presidente da Sociedade Portuguesa de Pneumologia. Ou seja, afecta os mesmos grupos que a legionella.

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