Prova escrita "Stand-up-comedy"

16-12-2003
marcar artigo

Prova Escrita "Stand-up-comedy"

Por SANTANA CASTILHO

Sábado, 13 de Dezembro de 2003

Em pouco menos de meia geração, Durão Barroso trocou a lógica maoísta pela lógica do capitalismo global. Escorregou da extrema-esquerda trauliteira para a direita tecnocrática. Se rejeito os extremos de que partiu e a que chegou, muito menos me seduz o percurso que vem traçando, a coberto do sorriso seráfico que afivela. Tenho para mim que detesta tanto os portugueses que pensam como os comunistas que, outrora, corria a pontapés.

Tome-se a falta de estudos credíveis que fundamentem as decisões, junte-se-lhe a ausência de visão estratégica, a rarefacção de competências em gestão e a endémica incapacidade para usar o simples bom senso e teremos caracterizado, grosso modo, o quadro em que opera este Governo.

Os hospitais são um poço de problemas. Médicos, enfermeiros e pacientes contestam as políticas seguidas. A continuarmos assim, do Serviço Nacional de Saúde restarão apenas escombros. Os privados exultam e os doentes desesperam.

Nas finanças, o fanatismo marca o ponto. Qualquer aprendiz de economia sabe que em época de recessão só vencem as políticas expansionistas. Alemães e franceses, os grandes, assim fizeram, mandando às malvas o nado morto pacto de estabilidade. Mas Manuela Ferreira Leite, a pequenina, não. Arrogante, obcecada, verga-se aos ricos e espreme os pobres.

No âmbito do malabarismo orçamental, em que é mestra, aí está mais uma molhada de vendas ao desbarato, ao bom estilo da silenciosa segunda revolução capitalista, geradora de riquezas descomunais e de fossos de desigualdades intoleráveis. Vale tudo para mascarar 5 por cento em 3 por cento. E ainda lhe sobra desvergonha para se curvar até ao chão ante o seu correligionário da Madeira. As eleições de 2004 pesam, afinal, muito mais que a sua coerência.

Na justiça impera a barafunda. Todos se revoltam: Presidente da República, bastonário dos advogados, provedor de Justiça, presos sem culpa formada, polícias e cidadãos comuns. O segredo de justiça é arrastado na lama dos noticiários de escândalos, ante a impotência do procurador-geral da República. As prisões estão a abarrotar e a sua desumanidade merece referência destacada nos relatórios da Amnistia Internacional. Os tribunais dizem e desdizem, numa lógica de esgrima de direito que baralha o cidadão comum e o torna, legitimamente, desconfiado. Mas a recente e prolongada ausência da ministra do seu posto de trabalho, ainda que por razões mais que justificadas, deixaram-nos a sensação de que o Governo vê normalidade onde nós antevemos a antecâmara do caos.

Enfim, deixemos de lado o Ministério do Ambiente, onde as coisas fazem que andam mas não andam, o da Administração Interna, a braços com as trapalhadas do Iraque, as guerras entre polícias e respectivo director-geral, a saga do comandante da Brigada de Trânsito da GNR, nomeado num dia e desnomeado no outro, os negócios dos bombeiros e o rescaldo do terço do país ardido, de que já ninguém se lembra, o da Cultura, com o ministro surrealista que parece nem tão-pouco dar-se conta de que existe, e o da Defesa, onde o inefável Paulo Portas usa sete vidas para continuar, e olhemos para os da Educação e do Ensino Superior, afinal meu mister prioritário.

Nesta área, para não destoar do resto do Governo, chovem os problemas e rareiam as soluções. O último tem todos os ingredientes para ainda fazer correr muita tinta. Refiro-me ao processo de transformação da Cooperativa de Ensino Universidade Lusíada em Fundação Minerva. Discute-se se a metamorfose é legal ou ilegal e se foi pré-ordenada ou não para favorecer uns senhores e respectivo séquito de amigos. Não vou por aí, porque estou cansado de ver a técnica jurídica travestir de legal o que o vulgar dos mortais acha inaceitável (o safado alemão que comeu o amigo na praça pública vai provavelmente ficar à solta a breve trecho... porque a lei não prevê o canibalismo e não o qualifica, portanto, como crime, para além de que... houve consentimento prévio do outro safado, o que foi comido). Vou, antes, por aqui:

1. Martins da Cruz, ex-ministro de Durão Barroso, saiu do Governo por causa de a filha ter tentado entrar na universidade à revelia do que a lei vigente dispunha. Martins da Cruz é filho de António Martins da Cruz, que preside à Fundação Minerva. Pedro Lynce, ex-ministro de Durão Barroso, saiu do Governo por ter assinado o despacho que faria entrar na universidade a filha de Martins da Cruz. Durão Barroso foi director do Departamento de Relações Internacionais da Universidade Lusíada. Durão Barroso e Pedro Lynce assinaram, com Celeste Cardona e Manuela Ferreira Leite, o D.L. que permitiu a passagem da cooperativa a fundação. Mas o ministro que tutela as cooperativas e o ministro que tutela as fundações, que como é de geral conhecimento deveriam ter assinado o diploma, não o fizeram. Muitos membros do actual Governo tiveram ligações à Universidade Lusíada.

2. O anterior quadro recomendaria, em sede de elementar bom senso, que o que se viesse a fazer não pudesse, nunca, deixar perplexidades em ninguém. Mas elas são pertinentes porque, entre outros aspectos:

a) A lei prevê a permanência de parte do património das cooperativas extintas no sector cooperativo, o que não se verificou.

b) A lei prevê a partilha do património das cooperativas extintas entre os cooperantes, o que não se verificou.

c) A lei prevê que a autorização de funcionamento de cursos nunca pode ser transmitida entre entidades instituidoras diferentes e foi.

Este Governo começa a ficar só no palco, representando uma comédia que tornará trágico o futuro dos que estão na plateia e dos que dele discordam, e são cada vez mais em maior número.

Professor do ensino superior

Prova Escrita "Stand-up-comedy"

Por SANTANA CASTILHO

Sábado, 13 de Dezembro de 2003

Em pouco menos de meia geração, Durão Barroso trocou a lógica maoísta pela lógica do capitalismo global. Escorregou da extrema-esquerda trauliteira para a direita tecnocrática. Se rejeito os extremos de que partiu e a que chegou, muito menos me seduz o percurso que vem traçando, a coberto do sorriso seráfico que afivela. Tenho para mim que detesta tanto os portugueses que pensam como os comunistas que, outrora, corria a pontapés.

Tome-se a falta de estudos credíveis que fundamentem as decisões, junte-se-lhe a ausência de visão estratégica, a rarefacção de competências em gestão e a endémica incapacidade para usar o simples bom senso e teremos caracterizado, grosso modo, o quadro em que opera este Governo.

Os hospitais são um poço de problemas. Médicos, enfermeiros e pacientes contestam as políticas seguidas. A continuarmos assim, do Serviço Nacional de Saúde restarão apenas escombros. Os privados exultam e os doentes desesperam.

Nas finanças, o fanatismo marca o ponto. Qualquer aprendiz de economia sabe que em época de recessão só vencem as políticas expansionistas. Alemães e franceses, os grandes, assim fizeram, mandando às malvas o nado morto pacto de estabilidade. Mas Manuela Ferreira Leite, a pequenina, não. Arrogante, obcecada, verga-se aos ricos e espreme os pobres.

No âmbito do malabarismo orçamental, em que é mestra, aí está mais uma molhada de vendas ao desbarato, ao bom estilo da silenciosa segunda revolução capitalista, geradora de riquezas descomunais e de fossos de desigualdades intoleráveis. Vale tudo para mascarar 5 por cento em 3 por cento. E ainda lhe sobra desvergonha para se curvar até ao chão ante o seu correligionário da Madeira. As eleições de 2004 pesam, afinal, muito mais que a sua coerência.

Na justiça impera a barafunda. Todos se revoltam: Presidente da República, bastonário dos advogados, provedor de Justiça, presos sem culpa formada, polícias e cidadãos comuns. O segredo de justiça é arrastado na lama dos noticiários de escândalos, ante a impotência do procurador-geral da República. As prisões estão a abarrotar e a sua desumanidade merece referência destacada nos relatórios da Amnistia Internacional. Os tribunais dizem e desdizem, numa lógica de esgrima de direito que baralha o cidadão comum e o torna, legitimamente, desconfiado. Mas a recente e prolongada ausência da ministra do seu posto de trabalho, ainda que por razões mais que justificadas, deixaram-nos a sensação de que o Governo vê normalidade onde nós antevemos a antecâmara do caos.

Enfim, deixemos de lado o Ministério do Ambiente, onde as coisas fazem que andam mas não andam, o da Administração Interna, a braços com as trapalhadas do Iraque, as guerras entre polícias e respectivo director-geral, a saga do comandante da Brigada de Trânsito da GNR, nomeado num dia e desnomeado no outro, os negócios dos bombeiros e o rescaldo do terço do país ardido, de que já ninguém se lembra, o da Cultura, com o ministro surrealista que parece nem tão-pouco dar-se conta de que existe, e o da Defesa, onde o inefável Paulo Portas usa sete vidas para continuar, e olhemos para os da Educação e do Ensino Superior, afinal meu mister prioritário.

Nesta área, para não destoar do resto do Governo, chovem os problemas e rareiam as soluções. O último tem todos os ingredientes para ainda fazer correr muita tinta. Refiro-me ao processo de transformação da Cooperativa de Ensino Universidade Lusíada em Fundação Minerva. Discute-se se a metamorfose é legal ou ilegal e se foi pré-ordenada ou não para favorecer uns senhores e respectivo séquito de amigos. Não vou por aí, porque estou cansado de ver a técnica jurídica travestir de legal o que o vulgar dos mortais acha inaceitável (o safado alemão que comeu o amigo na praça pública vai provavelmente ficar à solta a breve trecho... porque a lei não prevê o canibalismo e não o qualifica, portanto, como crime, para além de que... houve consentimento prévio do outro safado, o que foi comido). Vou, antes, por aqui:

1. Martins da Cruz, ex-ministro de Durão Barroso, saiu do Governo por causa de a filha ter tentado entrar na universidade à revelia do que a lei vigente dispunha. Martins da Cruz é filho de António Martins da Cruz, que preside à Fundação Minerva. Pedro Lynce, ex-ministro de Durão Barroso, saiu do Governo por ter assinado o despacho que faria entrar na universidade a filha de Martins da Cruz. Durão Barroso foi director do Departamento de Relações Internacionais da Universidade Lusíada. Durão Barroso e Pedro Lynce assinaram, com Celeste Cardona e Manuela Ferreira Leite, o D.L. que permitiu a passagem da cooperativa a fundação. Mas o ministro que tutela as cooperativas e o ministro que tutela as fundações, que como é de geral conhecimento deveriam ter assinado o diploma, não o fizeram. Muitos membros do actual Governo tiveram ligações à Universidade Lusíada.

2. O anterior quadro recomendaria, em sede de elementar bom senso, que o que se viesse a fazer não pudesse, nunca, deixar perplexidades em ninguém. Mas elas são pertinentes porque, entre outros aspectos:

a) A lei prevê a permanência de parte do património das cooperativas extintas no sector cooperativo, o que não se verificou.

b) A lei prevê a partilha do património das cooperativas extintas entre os cooperantes, o que não se verificou.

c) A lei prevê que a autorização de funcionamento de cursos nunca pode ser transmitida entre entidades instituidoras diferentes e foi.

Este Governo começa a ficar só no palco, representando uma comédia que tornará trágico o futuro dos que estão na plateia e dos que dele discordam, e são cada vez mais em maior número.

Professor do ensino superior

marcar artigo