Suplemento Economia

12-04-2002
marcar artigo

Ser Sério

Por PAULO MIGUEL MADEIRA

Segunda-feira, 8 de Abril de 2002

Devido às diferenças de posicionamento entre o PS de Guterres e a coligação de Barroso quanto às políticas económicas e sociais, é de esperar que agora o pólo da oposição não partidária se desloque dos meios empresariais para os meios sindicais. O lado que pode ser mais problemático é o modo como os interesses que este Governo aparentemente mais vai privilegiar - e com a legitimidade que lhe assiste por ter ganho as eleições sem o ocultar - com ele se poderão relacionar. Não será de espantar que a pressão dos movimentos empresariais - os tais "lobbies" que combateram Guterres - se atenue, até porque o contexto lhes passará a ser mais favorável. Mas se calhar também porque a satisfação dos seus interesses poderá ser negociada fora da sede própria, em conversas entre amigos ou, pelo menos, conhecidos. Ou até numa das sedes próprias - o Conselho de Ministros -, mas de um modo algo ínvio. Isto porque nalgumas pastas os novos governantes transitam de meios empresariais com interesses directos nos assuntos respectivos, ou noutros que provavelmente podem vir a estar em causa.

Que pensar do facto de o ministro da Economia, Carlos Tavares, transitar da banca, quando se sabe que a eventual privatização da CGD foi um tópico da campanha eleitoral? Ou, pior ainda, que quando concebeu, em parceria com Horta Osório, a venda do grupo Champalimaud ao Banco Santander, desconhecia, ou quis ver se passava por cima de, uma lei que obrigava a comunicar o negócio às autoridades?

E que pensar de o ministro da Saúde, Luís Filipe Pereira, vir do Grupo Melo, com interesses na gestão hospitalar, num contexto em que se discute o aumento da prestação de cuidados de saúde pública por privados? E de o ministro da Segurança Social e Trabalho ter uma larga experiência no sector segurador, num momento em que está em cima da mesa uma eventual privatização de parte do sistema de segurança social?

E a lista poderia continuar. Estaremos apenas a ser maldosos? Esperemos bem que sim. Diz-se dos tempos do Império Romano que à mulher de César não bastava ser séria... mas tratava-se de questões domésticas. Agora falamos de negócios de Estado e, de facto, mais importante do que parecer sério é ser sério. Por isso mesmo, os personagens em questão até deverão agradecer que sobre a sua governação incida o maior escrutínio público, para que sobre eles não possa cair a suspeita de que foram fazer "lobbying" privado para o Conselho de Ministros. Boa sorte!

Paulo Miguel Madeira

Ser Sério

Por PAULO MIGUEL MADEIRA

Segunda-feira, 8 de Abril de 2002

Devido às diferenças de posicionamento entre o PS de Guterres e a coligação de Barroso quanto às políticas económicas e sociais, é de esperar que agora o pólo da oposição não partidária se desloque dos meios empresariais para os meios sindicais. O lado que pode ser mais problemático é o modo como os interesses que este Governo aparentemente mais vai privilegiar - e com a legitimidade que lhe assiste por ter ganho as eleições sem o ocultar - com ele se poderão relacionar. Não será de espantar que a pressão dos movimentos empresariais - os tais "lobbies" que combateram Guterres - se atenue, até porque o contexto lhes passará a ser mais favorável. Mas se calhar também porque a satisfação dos seus interesses poderá ser negociada fora da sede própria, em conversas entre amigos ou, pelo menos, conhecidos. Ou até numa das sedes próprias - o Conselho de Ministros -, mas de um modo algo ínvio. Isto porque nalgumas pastas os novos governantes transitam de meios empresariais com interesses directos nos assuntos respectivos, ou noutros que provavelmente podem vir a estar em causa.

Que pensar do facto de o ministro da Economia, Carlos Tavares, transitar da banca, quando se sabe que a eventual privatização da CGD foi um tópico da campanha eleitoral? Ou, pior ainda, que quando concebeu, em parceria com Horta Osório, a venda do grupo Champalimaud ao Banco Santander, desconhecia, ou quis ver se passava por cima de, uma lei que obrigava a comunicar o negócio às autoridades?

E que pensar de o ministro da Saúde, Luís Filipe Pereira, vir do Grupo Melo, com interesses na gestão hospitalar, num contexto em que se discute o aumento da prestação de cuidados de saúde pública por privados? E de o ministro da Segurança Social e Trabalho ter uma larga experiência no sector segurador, num momento em que está em cima da mesa uma eventual privatização de parte do sistema de segurança social?

E a lista poderia continuar. Estaremos apenas a ser maldosos? Esperemos bem que sim. Diz-se dos tempos do Império Romano que à mulher de César não bastava ser séria... mas tratava-se de questões domésticas. Agora falamos de negócios de Estado e, de facto, mais importante do que parecer sério é ser sério. Por isso mesmo, os personagens em questão até deverão agradecer que sobre a sua governação incida o maior escrutínio público, para que sobre eles não possa cair a suspeita de que foram fazer "lobbying" privado para o Conselho de Ministros. Boa sorte!

Paulo Miguel Madeira

marcar artigo