No Coliseu, nada de novo

07-08-2002
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No Coliseu, Nada de Novo

Por JOSÉ MANUEL FERNANDES

Segunda-feira, 15 de Julho de 2002

"A Oeste nada de novo", escrevia-se no seco relatório militar do dia em que fora morto, nas trincheiras da I Grande Guerra, o "soldado anónimo" que tinha dado corpo ao famoso romance de Erich Maria Remarque. Apetece escrever o mesmo a propósito deste XXIV Congresso do PSD, realizado nessa sala cheia de evocações históricas que é o Coliseu os Recreios de Lisboa. Sabemos que dele não saiu nada de novo - só não sabemos qual foi o soldado que morreu.

Três meses depois de uma vitória eleitoral que não esperava, sobretudo que não esperava para já, a braços com um país descrente e uma crise orçamental que se tem vindo a transformar em crise económica, o PSD e o seu líder e primeiro-ministro, Durão Barroso, chegaram a este congresso em glória e em desgraça. Em glória, porque o partido reconquistou o poder. Em desgraça, porque os primeiros meses têm sido duros e trapalhões e a opinião pública, atordoada, manifesta-se negativamente em cada sondagem.

Esta dupla condição fez do congresso um ritual de unanimidades. Não se contesta quem conquistou o poder. E tem de se dar uma mão a quem dá mostras de, por vezes, não saber como utilizar este poder.

O PSD, diz-se, está de novo unido. O que esteve no Coliseu, sem dúvida. O que lá não pôs os pés - e não foi lá nenhum dos antigos presidentes do partido - está no mínimo inquieto. Quando não abertamente descontente.

De substancial nada saiu da velha sala de espectáculos lisboeta. Barroso repetiu, mais vírgula, menos vírgula, o discurso que fizera, dias antes, no Parlamento. Há uma ou outra cara nova na direcção, mas o partido não terá ganho no seu topo gente capaz de "puxar a carroça" sem estar, ao mesmo tempo, ocupada com o Governo. Mandaram-se uns recados a quem estava ausente, aos "treinadores de bancada", num triste sinal de intolerância à crítica num partido onde ela sempre existiu e vivificou. Não se votaram as moções sectoriais, algumas delas bem interessantes. Fez-se emergir uma nova estrela, alguém capaz de ocupar no imaginário "laranja" o papel que um dia foi de Leonor Beleza: a ministra das Finanças, Manuela Ferreira Leite. E criou-se um facto político: a quase quatro anos das presidenciais, percebeu-se que Cavaco pode não ser o único "candidato natural", já que Santana Lopes se chegou à frente.

Chega isto para fazer um congresso? Duvido. Até porque a ausência de qualquer emoção sobre o resultado das votações afastou a atenção dos "media", habituados a seguir estes conclaves como emocionantes lutas de galos e de propostas alternativas. Nem sequer Alberto João Jardim destoou.

Ora tudo isto é curto para o que o PSD precisava neste momento: abrir-se mais à sociedade, falar à sociedade, mostrar ao país que, depois de "apagar o fogo", para utilizar a expressão de Ferreira Leite, sabe como consertar os móveis. Ora o que mostrou, nessa frente, foi pouco e já visto e revisto.

Daí que regresse à ideia inicial: "no Coliseu, nada de novo". Falta apenas saber se alguns dos tiros mal dirigidos atingiram fatalmente alguém - e se esse alguém é um soldado menos desconhecido do que o herói fatal de Remarque.

No Coliseu, Nada de Novo

Por JOSÉ MANUEL FERNANDES

Segunda-feira, 15 de Julho de 2002

"A Oeste nada de novo", escrevia-se no seco relatório militar do dia em que fora morto, nas trincheiras da I Grande Guerra, o "soldado anónimo" que tinha dado corpo ao famoso romance de Erich Maria Remarque. Apetece escrever o mesmo a propósito deste XXIV Congresso do PSD, realizado nessa sala cheia de evocações históricas que é o Coliseu os Recreios de Lisboa. Sabemos que dele não saiu nada de novo - só não sabemos qual foi o soldado que morreu.

Três meses depois de uma vitória eleitoral que não esperava, sobretudo que não esperava para já, a braços com um país descrente e uma crise orçamental que se tem vindo a transformar em crise económica, o PSD e o seu líder e primeiro-ministro, Durão Barroso, chegaram a este congresso em glória e em desgraça. Em glória, porque o partido reconquistou o poder. Em desgraça, porque os primeiros meses têm sido duros e trapalhões e a opinião pública, atordoada, manifesta-se negativamente em cada sondagem.

Esta dupla condição fez do congresso um ritual de unanimidades. Não se contesta quem conquistou o poder. E tem de se dar uma mão a quem dá mostras de, por vezes, não saber como utilizar este poder.

O PSD, diz-se, está de novo unido. O que esteve no Coliseu, sem dúvida. O que lá não pôs os pés - e não foi lá nenhum dos antigos presidentes do partido - está no mínimo inquieto. Quando não abertamente descontente.

De substancial nada saiu da velha sala de espectáculos lisboeta. Barroso repetiu, mais vírgula, menos vírgula, o discurso que fizera, dias antes, no Parlamento. Há uma ou outra cara nova na direcção, mas o partido não terá ganho no seu topo gente capaz de "puxar a carroça" sem estar, ao mesmo tempo, ocupada com o Governo. Mandaram-se uns recados a quem estava ausente, aos "treinadores de bancada", num triste sinal de intolerância à crítica num partido onde ela sempre existiu e vivificou. Não se votaram as moções sectoriais, algumas delas bem interessantes. Fez-se emergir uma nova estrela, alguém capaz de ocupar no imaginário "laranja" o papel que um dia foi de Leonor Beleza: a ministra das Finanças, Manuela Ferreira Leite. E criou-se um facto político: a quase quatro anos das presidenciais, percebeu-se que Cavaco pode não ser o único "candidato natural", já que Santana Lopes se chegou à frente.

Chega isto para fazer um congresso? Duvido. Até porque a ausência de qualquer emoção sobre o resultado das votações afastou a atenção dos "media", habituados a seguir estes conclaves como emocionantes lutas de galos e de propostas alternativas. Nem sequer Alberto João Jardim destoou.

Ora tudo isto é curto para o que o PSD precisava neste momento: abrir-se mais à sociedade, falar à sociedade, mostrar ao país que, depois de "apagar o fogo", para utilizar a expressão de Ferreira Leite, sabe como consertar os móveis. Ora o que mostrou, nessa frente, foi pouco e já visto e revisto.

Daí que regresse à ideia inicial: "no Coliseu, nada de novo". Falta apenas saber se alguns dos tiros mal dirigidos atingiram fatalmente alguém - e se esse alguém é um soldado menos desconhecido do que o herói fatal de Remarque.

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