Há uma insurreição internacional que usa o terrorismo Fred Halliday

12-12-2004
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Há Uma Insurreição Internacional Que Usa o Terrorismo Fred Halliday

Domingo, 05 de Dezembro de 2004 %Sofia Lorena Defende que não há motivos para uma política externa americana mais conciliadora durante o segundo mandato do Presidente George W. Bush. O que é que podemos esperar? Bush já mostrou duas coisas no primeiro mandato: tem uma agenda clara, que é a agenda dos neo-conservadores e, segundo, é capaz de enganar as pessoas sobre as suas intenções. E agora tem a autoridade de ter sido eleito de um forma clara, tem o Congresso. Em termos internacionais, penso que as coisas são um pouco incertas, não porque ele queira consultar outros estados mas porque reconhece, em algum nível, os limites do poder americano. E temos dois exemplos óbvios: um prende-se com a China, país que já não critica e com que desenvolveu uma relação bastante especial. Outro, o Irão. penso que analisa duas opções em relação a esse país. Pode avançar para uma confrontação? Não estamos a falar de uma invasão mas de uma possível acção militar - sabemos que a Força Aérea americana preparou várias centenas de mísseis de penetração para atacar as suspeitas localizações nucleares do Irão e tem estado a levar a cabo voos muito cuidadosos no país. Penso que gostaria de atacar o Irão, penso que os seus colaboradores pró-israelitas gostariam que ele atacasse o Irão. Mas por outro lado, reconhece os riscos - isto provocaria inúmeros problemas no Iraque, onde os iranianos retaliariam, e em segundo lugar, retaliariam contra Israel, têm centenas de mísseis com o Hezbollah no Líbano. Não mudou de ideias nem começou a consultar outros estados, mas reconhece os limites do poder americano. A situação actual no Iraque, com as dificuldades que os americanos enfrentam, não chega para travar outra confrontação preventiva? Todas as crises produzem lições. Mas cada um pode retirar lições diferentes das crises. Em relação ao Iraque, algumas pessoas diriam que é preciso ser mais cuidadoso e enfrentar os problemas com instrumentos políticos, mas outras pessoas poderão dizer que é preciso usar mais força militar. Por exemplo, há agora a questão de encerrar as fronteiras entre o Iraque e os outros países. Antes de mais, isso é impossível, sempre houve contrabando de pessoas e armas naquela parte do mundo e, depois, esse não é o problema principal. Importante é construir instituições políticas que envolvam o maior número possível de grupos, e, em segundo lugar, ganhar a boa vontade e a cooperação dos estados vizinhos. Selar as fronteiras é, francamente, uma irrelevância. De qualquer forma já há tantas armas dentro do Iraque... As lições certas não foram tiradas? Não tenho a certeza de que tenham sido. A um nível mais abrangente, e isso é o que me preocupa mais, ele [Bush] não aprendeu nenhuma lição sobre a guerra contra o terrorismo. Há uma verdadeira ameaça de insurreição que usa o terrorismo em países como o Afeganistão, o Irão ou o Iémen, e que opera internacionalmente. Por outro lado, há condições políticas que deviam ser tidas em conta, e duas em particular. Primeiro, não é possível resolver o problema dos muçulmanos e da insurreição no mundo islâmico se não se enfrentar seriamente a questão da Palestina. [O primeiro-ministro israelita, Ariel] Sharon é o melhor agente de recrutamento de Bin Laden. Em segundo lugar, não é possível compreender este terrorismo se não se vir que as origens estão na Guerra Fria e que os Estados Unidos, o Reino Unido e a Arábia Saudita carregam uma responsabilidade significativa na sua emergência porque o promoveram nos anos 80 contra a União Soviética. Até que se reconheçam estes dois níveis políticos não se farão progressos. Bush está a conduzir o autocarro da luta do mundo contra o terrorismo, mas está a levá-lo na direcção errada. É bastante mais optimista em relação aos desenvolvimentos no Iraque do que no Afeganistão. O Afeganistão é um país sem um estado centralizado, onde a maior fonte de rendimentos é o ópio e onde o desarmamento das milícias é uma anedota. De momento, há uma espécie de trégua que permite ao Governo de [Hamid] Karzai manter-se, mas não vejo nenhuma possibilidade de transição para um estado moderno. Quando a comunidade internacional perder o interesse, os senhores da guerra vão tornar-se mais poderosos outra vez e, mais importante, os taliban vão aproveitar-se disso. Não há um verdadeiro compromisso internacional: as forças da NATO estão estacionadas em poucas áreas, o dinheiro para os grandes projectos de reconstrução não está lá. E em relação ao Iraque, a transição é possível, apesar da guerra? Há uma possibilidade de se conseguir uma transição para algum tipo de sistema político legítimo no próximo ano. Mas isso requer a incorporação das forças não governamentais no processo político e, claro, a boa vontade dos vizinhos. E aí regressamos aos Estados Unidos: se eles provocam os iranianos há uma receita para a explosão. Há condições para realizar eleições a 30 de Janeiro? Um escrutínio que seja considerado legítimo pela generalidade da população, incluindo os sunitas, concentrados nas áreas onde decorrem as grandes intervenções militares? Não há eleições perfeitas mas elas têm que permitir que os eleitos tenham legitimidade suficiente. O principal problema não é a situação de segurança em certas cidades sunitas, mas saber se os representantes das principais forças concordam com o princípio de apoiar as eleições e de aceitar o seu resultado e se são incorporadas no governo. Ou seja, é perfeitamente possível ter umas eleições ganhas de força esmagadora pelos xiitas e em que os sunitas não votam mas em que, depois do escrutínio, os xiitas convidem os sunitas. Não é certo que isso aconteça. Os sunitas estão subrepresentados em todos os órgãos desde a queda do regime. Na minha opinião não há grandes problemas em adiar as eleições por alguns meses. Se as eleições receberem o apoio generalizado da Arábia Saudita, Jordânia, Turquia, Irão, não interessa os americanos. Preservar a boa vontade e o empenhamento dos países vizinhos é absolutamente fundamental. No que diz respeito aos grupos armados, a maioria dos iraquianos não os apoia. O apoio está a crescer, particularmente em algumas áreas da população. Entre alguns sim. Isso deve-se em parte aos atrasos no processo económico, ao desemprego... E aos erros no terreno? Sim. Mas acho que ainda é possível isolar ou incorporar os grupos armados no processo político. Fez-se isso com Muqtada al-Sadr [líder radical xiita], por que não incorporar os grupos sunitas? Aí voltamos aos vizinhos, à Jordânia e à Arábia Saudita, porque se eles estão dispostos a encorajar os sunitas pode reunir-se apoio suficiente. Mas a questão é saber se eles querem uma boa relação com o Iraque ou se pretendem adoptar uma postura de confrontação. O factor regional é muito importante. E qual deve ser o papel da Europa? A visão informada europeia do Iraque não pode ser apenas dizer 'vamos sair do Iraque'. É preciso pensar no que se pode oferecer ao Iraque, no que é que é mais importante para os iraquianos e para a estabilidade da região. A Europa, que também apoiou Saddam Hussein, deve perceber que é preciso encontrar uma forma de construir um centro político poderoso no Iraque, integrando os nacionalistas, sunitas e outros grupos. Os americanos não vão fazer isso. Nós temos uma oportunidade para fazer isso. Diz que há hoje um mundo não europeu que ataca a dominação ocidental, e aqui inclui a ofensiva militar e política da Al-Qaeda e a ofensiva económica da China. Tem escrito que a mais significativa é a da China. A China é um enorme poder regional que exclui os EUA. Quer ser uma potência económica mas não evoluiu politicamente. Eventualmente deverá falhar por ter falhado aí. Mas por muito tempo, a não ser que haja uma grande crise no país, o que não é do interesse de ninguém, vai continuar a ser um enorme poder económico. No que diz respeito à Al-Qaeda, defende que o projecto que protagoniza vai falhar. Mas não há um movimento de insurreição disperso, formado mesmo por grupos anteriores à Al-Qaeda, que está a crescer? Sim. Em primeiro lugar, é preciso distinguir quando se avalia a Al-Qaeda, entre as suas actividades e o fundamentalismo sunita em geral, activo no Médio Oriente nos últimos 20 anos. É certo que não estamos a lidar com uma organização mas com aquilo a que podemos chamar uma insurreição internacional. Não é uma guerra, mas é uma insurreição muito alargada capaz de recrutar pessoas do Médio Oriente ao Ocidente e que pode desenvolver diferentes tipos de acções militares. Existe uma coisa chamada Al-Qaeda, existe essa organização, mas tornou-se o centro de uma estrutura mais descentralizada que, em última análise, se apoia na inspiração como força de exemplo. Talvez isto continue por muito tempo, mas não penso que vão destruir as economias ou o sistema político do Ocidente. Têm os seus sucessos, claro, Bin Laden conseguiu reeleger George Bush, isso foi um sucesso, que lhe permite continuar a confrontar um Ocidente muito militarizado. E pode continuar por muito tempo? Sim, mas isso é diferente de dizer que vai destruir o nosso modo de vida. Claro que permanece aqui uma grande questão, para a qual eu não tenho respostas. Quais foram as consequências desta guerra contra o terrorismo no Ocidente? Não apenas politica ou economicamente, mas psicologicamente. E isso nem sequer sei como é que se mede. A minha impressão é que estamos de regresso ao medo dos anos 60 [Guerra Fria]. O mundo que o Ocidente não estudou Fred Halliday nasceu em Dublin em 1946. Estudou Política, Filosofia e Economia em Oxford e passou ainda pela London School of Economics, onde é desde 1983 professor de Relações Internacionais. Com uma obra vasta, a reflectir interesses que passam pelo estudo das revoluções contemporâneas e da teoria das relações internacionais, dedica-se há mais de três décadas ao estudo dos países do Médio Oriente. Lamenta, como académico, "o fracasso completo da sociedade ocidental, da universidade ocidental, em produzir peritos nestes países". Diz que não há hoje em todo o mundo mais de 30 - "um número catastrófico, se comparado com o número de pessoas que durante a Guerra Fria estudavam a Rússia". Inclui-se neste grupo e assume a responsabilidade de não ter conseguido ajudar a formar verdadeiros especialistas dedicados ao mundo árabe e muçulmano, cujos problemas serão por "muito tempo" os mais importantes para a Europa. É autor, entre muitos outros de "Islam and the Mith of Confrontation" e "Two Hours That Shook the World: 11 September 2001, Causes and Consequences". Esteve em Lisboa a convite da Universidade Nova e da Fundação Mário Soares para participar no VII Curso de História Contemporânea, "Portugal, a Europa e o Atlântico". OUTROS TÍTULOS EM PÚBLICA

Polar Express

O passado como modo de vida

Do negócio à identidade

Imperador

Maria Sharapova

Arte

Há uma insurreição internacional que usa o terrorismo Fred Halliday

O Índex Paulo Anunciação 05 Dez 04

Presos pelo alfinete

Escanção Manuel Moreira

Recuperar o clitóris

Ordem na cozinha

O homem do saco

Mexilhões com leite de coco

Artigo

Descontrair os músculos

CRÓNICAS

O comboio é muito longe

CARTAS DA MAYA

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Não estamos a falar de uma invasão mas de uma possível acção militar - sabemos que a Força Aérea americana preparou várias centenas de mísseis de penetração para atacar as suspeitas localizações nucleares do Irão e tem estado a levar a cabo voos muito cuidadosos no país. Penso que gostaria de atacar o Irão, penso que os seus colaboradores pró-israelitas gostariam que ele atacasse o Irão. Mas por outro lado, reconhece os riscos - isto provocaria inúmeros problemas no Iraque, onde os iranianos retaliariam, e em segundo lugar, retaliariam contra Israel, têm centenas de mísseis com o Hezbollah no Líbano. Não mudou de ideias nem começou a consultar outros estados, mas reconhece os limites do poder americano. A situação actual no Iraque, com as dificuldades que os americanos enfrentam, não chega para travar outra confrontação preventiva? Todas as crises produzem lições. Mas cada um pode retirar lições diferentes das crises. Em relação ao Iraque, algumas pessoas diriam que é preciso ser mais cuidadoso e enfrentar os problemas com instrumentos políticos, mas outras pessoas poderão dizer que é preciso usar mais força militar. Por exemplo, há agora a questão de encerrar as fronteiras entre o Iraque e os outros países. Antes de mais, isso é impossível, sempre houve contrabando de pessoas e armas naquela parte do mundo e, depois, esse não é o problema principal. Importante é construir instituições políticas que envolvam o maior número possível de grupos, e, em segundo lugar, ganhar a boa vontade e a cooperação dos estados vizinhos. Selar as fronteiras é, francamente, uma irrelevância. De qualquer forma já há tantas armas dentro do Iraque... As lições certas não foram tiradas? Não tenho a certeza de que tenham sido. A um nível mais abrangente, e isso é o que me preocupa mais, ele [Bush] não aprendeu nenhuma lição sobre a guerra contra o terrorismo. Há uma verdadeira ameaça de insurreição que usa o terrorismo em países como o Afeganistão, o Irão ou o Iémen, e que opera internacionalmente. Por outro lado, há condições políticas que deviam ser tidas em conta, e duas em particular. Primeiro, não é possível resolver o problema dos muçulmanos e da insurreição no mundo islâmico se não se enfrentar seriamente a questão da Palestina. [O primeiro-ministro israelita, Ariel] Sharon é o melhor agente de recrutamento de Bin Laden. Em segundo lugar, não é possível compreender este terrorismo se não se vir que as origens estão na Guerra Fria e que os Estados Unidos, o Reino Unido e a Arábia Saudita carregam uma responsabilidade significativa na sua emergência porque o promoveram nos anos 80 contra a União Soviética. Até que se reconheçam estes dois níveis políticos não se farão progressos. Bush está a conduzir o autocarro da luta do mundo contra o terrorismo, mas está a levá-lo na direcção errada. É bastante mais optimista em relação aos desenvolvimentos no Iraque do que no Afeganistão. O Afeganistão é um país sem um estado centralizado, onde a maior fonte de rendimentos é o ópio e onde o desarmamento das milícias é uma anedota. De momento, há uma espécie de trégua que permite ao Governo de [Hamid] Karzai manter-se, mas não vejo nenhuma possibilidade de transição para um estado moderno. Quando a comunidade internacional perder o interesse, os senhores da guerra vão tornar-se mais poderosos outra vez e, mais importante, os taliban vão aproveitar-se disso. Não há um verdadeiro compromisso internacional: as forças da NATO estão estacionadas em poucas áreas, o dinheiro para os grandes projectos de reconstrução não está lá. E em relação ao Iraque, a transição é possível, apesar da guerra? Há uma possibilidade de se conseguir uma transição para algum tipo de sistema político legítimo no próximo ano. Mas isso requer a incorporação das forças não governamentais no processo político e, claro, a boa vontade dos vizinhos. E aí regressamos aos Estados Unidos: se eles provocam os iranianos há uma receita para a explosão. Há condições para realizar eleições a 30 de Janeiro? Um escrutínio que seja considerado legítimo pela generalidade da população, incluindo os sunitas, concentrados nas áreas onde decorrem as grandes intervenções militares? Não há eleições perfeitas mas elas têm que permitir que os eleitos tenham legitimidade suficiente. O principal problema não é a situação de segurança em certas cidades sunitas, mas saber se os representantes das principais forças concordam com o princípio de apoiar as eleições e de aceitar o seu resultado e se são incorporadas no governo. Ou seja, é perfeitamente possível ter umas eleições ganhas de força esmagadora pelos xiitas e em que os sunitas não votam mas em que, depois do escrutínio, os xiitas convidem os sunitas. Não é certo que isso aconteça. Os sunitas estão subrepresentados em todos os órgãos desde a queda do regime. Na minha opinião não há grandes problemas em adiar as eleições por alguns meses. Se as eleições receberem o apoio generalizado da Arábia Saudita, Jordânia, Turquia, Irão, não interessa os americanos. Preservar a boa vontade e o empenhamento dos países vizinhos é absolutamente fundamental. No que diz respeito aos grupos armados, a maioria dos iraquianos não os apoia. O apoio está a crescer, particularmente em algumas áreas da população. Entre alguns sim. Isso deve-se em parte aos atrasos no processo económico, ao desemprego... E aos erros no terreno? Sim. Mas acho que ainda é possível isolar ou incorporar os grupos armados no processo político. Fez-se isso com Muqtada al-Sadr [líder radical xiita], por que não incorporar os grupos sunitas? Aí voltamos aos vizinhos, à Jordânia e à Arábia Saudita, porque se eles estão dispostos a encorajar os sunitas pode reunir-se apoio suficiente. Mas a questão é saber se eles querem uma boa relação com o Iraque ou se pretendem adoptar uma postura de confrontação. O factor regional é muito importante. E qual deve ser o papel da Europa? A visão informada europeia do Iraque não pode ser apenas dizer 'vamos sair do Iraque'. É preciso pensar no que se pode oferecer ao Iraque, no que é que é mais importante para os iraquianos e para a estabilidade da região. A Europa, que também apoiou Saddam Hussein, deve perceber que é preciso encontrar uma forma de construir um centro político poderoso no Iraque, integrando os nacionalistas, sunitas e outros grupos. Os americanos não vão fazer isso. Nós temos uma oportunidade para fazer isso. Diz que há hoje um mundo não europeu que ataca a dominação ocidental, e aqui inclui a ofensiva militar e política da Al-Qaeda e a ofensiva económica da China. Tem escrito que a mais significativa é a da China. A China é um enorme poder regional que exclui os EUA. Quer ser uma potência económica mas não evoluiu politicamente. Eventualmente deverá falhar por ter falhado aí. Mas por muito tempo, a não ser que haja uma grande crise no país, o que não é do interesse de ninguém, vai continuar a ser um enorme poder económico. No que diz respeito à Al-Qaeda, defende que o projecto que protagoniza vai falhar. Mas não há um movimento de insurreição disperso, formado mesmo por grupos anteriores à Al-Qaeda, que está a crescer? Sim. Em primeiro lugar, é preciso distinguir quando se avalia a Al-Qaeda, entre as suas actividades e o fundamentalismo sunita em geral, activo no Médio Oriente nos últimos 20 anos. É certo que não estamos a lidar com uma organização mas com aquilo a que podemos chamar uma insurreição internacional. Não é uma guerra, mas é uma insurreição muito alargada capaz de recrutar pessoas do Médio Oriente ao Ocidente e que pode desenvolver diferentes tipos de acções militares. Existe uma coisa chamada Al-Qaeda, existe essa organização, mas tornou-se o centro de uma estrutura mais descentralizada que, em última análise, se apoia na inspiração como força de exemplo. Talvez isto continue por muito tempo, mas não penso que vão destruir as economias ou o sistema político do Ocidente. Têm os seus sucessos, claro, Bin Laden conseguiu reeleger George Bush, isso foi um sucesso, que lhe permite continuar a confrontar um Ocidente muito militarizado. E pode continuar por muito tempo? Sim, mas isso é diferente de dizer que vai destruir o nosso modo de vida. Claro que permanece aqui uma grande questão, para a qual eu não tenho respostas. Quais foram as consequências desta guerra contra o terrorismo no Ocidente? Não apenas politica ou economicamente, mas psicologicamente. E isso nem sequer sei como é que se mede. A minha impressão é que estamos de regresso ao medo dos anos 60 [Guerra Fria]. O mundo que o Ocidente não estudou Fred Halliday nasceu em Dublin em 1946. Estudou Política, Filosofia e Economia em Oxford e passou ainda pela London School of Economics, onde é desde 1983 professor de Relações Internacionais. Com uma obra vasta, a reflectir interesses que passam pelo estudo das revoluções contemporâneas e da teoria das relações internacionais, dedica-se há mais de três décadas ao estudo dos países do Médio Oriente. Lamenta, como académico, "o fracasso completo da sociedade ocidental, da universidade ocidental, em produzir peritos nestes países". Diz que não há hoje em todo o mundo mais de 30 - "um número catastrófico, se comparado com o número de pessoas que durante a Guerra Fria estudavam a Rússia". Inclui-se neste grupo e assume a responsabilidade de não ter conseguido ajudar a formar verdadeiros especialistas dedicados ao mundo árabe e muçulmano, cujos problemas serão por "muito tempo" os mais importantes para a Europa. É autor, entre muitos outros de "Islam and the Mith of Confrontation" e "Two Hours That Shook the World: 11 September 2001, Causes and Consequences". Esteve em Lisboa a convite da Universidade Nova e da Fundação Mário Soares para participar no VII Curso de História Contemporânea, "Portugal, a Europa e o Atlântico". OUTROS TÍTULOS EM PÚBLICA

Polar Express

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Há uma insurreição internacional que usa o terrorismo Fred Halliday

O Índex Paulo Anunciação 05 Dez 04

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Escanção Manuel Moreira

Recuperar o clitóris

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