"Ferro Rodrigues não é um líder de passagem"

24-11-2002
marcar artigo

"Ferro Rodrigues Não É Um Líder de Passagem"

Segunda-feira, 11 de Novembro de 2002 Manuel Alegre deixa de sobreaviso quem decidir "entrar em estado de choque" na sequência de uma eventual derrota eleitoral de Ferro Rodrigues - uma alusão às eleições de Outubro de 1991, quando o PS liderado por Jorge Sampaio perdeu e António Guterres afirmou estar "em estado de choque". A repetir-se o cenário, Alegre anuncia que "entrará em estado de choque contra quem entre em estado de choque" e numa batalha dessas "é melhor não me terem contra". P. Seis meses depois de ter saído do Governo no estado em que saiu o PS está preparado para um cenário de eleições antecipadas? R. Eu não estou a defender o cenário de eleições antecipadas, mas os meus camaradas Ferro Rodrigues e Paulo Pedroso já disseram que o PS tem que estar preparado para eleições antecipadas. Tem que estar sempre preparado para eleições antecipadas. P. Mas ainda não está, neste momento? R. Acho que está muito mais preparado do que nas últimas eleições, em que perdemos quase à beira da meta. P. Mas PS já fez o luto dos seis anos de Governo? R. O PSD fez aquelas promessas todas em campanha eleitoral e agora está a fazer tudo ao contrário. E continua a responsabilizar o Governo do Partido Socialista e com certeza vai fazer isso durante muito tempo. O PS não pode cair nessa armadilha. Eu tenho dito que alguns dos meus camaradas que foram ministros não podem continuar a comportar-se como ministros na oposição. Isso acabou. O PS foi às urnas, perdeu, foi julgado e agora é sobre a acção do novo Governo que temos de discutir. Ninguém é governo na oposição e essa mudança tem que ser feita. P. Mas olhamos para o primeiro friso da bancada parlamentar do PS e é como se fosse uma bancada do Governo passada para o outro lado... R. Foi um erro político. As pessoas que foram ministras têm todo o direito de continuar na actividade política. Mas o facto de esse friso ser constituído por ex-ministros facilita essa estratégia do PSD que é a de fazer oposição à oposição. É uma coisa que vem dos governos anteriores, é uma estratégia inteligente e eficaz e que costuma dar resultados sobretudo quando os outros se deixam armadilhar. O PS tem que deixar de se auto-justificar e voltar-se para a frente. P. Neste Congresso, quais são os sinais de renovação mais importantes que devem ser dados? R. Há algumas medidas importantes. A redução do secretariado para dez ou onze membros permite que seja o órgão efectivo do Partido Socialista. Passa a ter responsabilidade política e a Comissão política volta a desempenhar o seu papel. Li a moção de Ferro Rodrigues com atenção e não consegui discordar no essencial. Já em relação à declaração de princípios, embora tenha sido melhorada e corrigida, eu leio aquilo e não estou em desacordo, acho que lhe falta é um suplemento de alma. Um partido socialista tem que ter pragmatismo, mas também tem que ter uma dose de utopia. Um partido socialista não pode abandonar a esperança de que é possível mudar a vida, um pouco mais de azul, como dizia o poeta Mário Sá Carneiro. Se os partidos socialistas se acomodam, se conformam, se estão a pensar que a vida é feita de ciclos políticos, hoje eles amanhã nós, torna-se historicamente dispensáveis. O mundo mudou. Os partidos social-democratas e trabalhistas falharam no essencial e perderem uma oportunidade histórica. Estamos num mundo muito complicado, há manifestações de rua, os partidos socialistas não podem estar ausentes disso. A nossa luta é institucional, mas temos de estar atentos à emergência de novos movimentos sociais e saber interpretá-los. Essas é que são as questões de modernidade, não é saber como devemos ser bem comportados, como se vai ganhar o centro. Em meu entender, o centro não existe. É uma ficção política, é a hesitação, o cinzento, vai atrás das dinâmicas de vitória. Quando os partidos socialistas deixam de ser eles próprios para ganhar o centro, perdem. É fatal como o destino. P. Mas António Guterres é a prova de uma vitória eleitoral conseguida à custa de "recentrar" o Partido Socialista. R. Mas agora estamos onde estamos. P. Muitos dos seus camaradas consideram que se o PS não for "recentrado" nunca poderá voltar a ganhar as eleições... R. Isso significa que não perceberam nada daquilo que aconteceu nem do que está a acontecer no mundo e em Portugal. Veja as manifestações que estão a ocorrer, veja o papel do Carvalho da Silva que está a emergir como um grande líder social. Como é que surgiram historicamente os partidos socialistas? Surgiram aliados aos movimentos sociais. Hoje são mais interclassistas, mas não podem estar desatentos em relação aos movimentos sociais. Lula ganhou no Brasil. Amanhã, essas pessoas bem-comportadas do Partido Socialista que estão à espera de ter votos da direita e do centro ficarão muito surpreendidas se novos líderes emergirem e vieram da rua para o Parlamento e para o poder. P. A moção de Ferro Rodrigues diz que o PS deve concorrer sozinho às eleições, mas vai combater uma frente de direita. Deve preparar a coligação pós-eleitoral à esquerda? R. O PS deve ir sozinho às eleições. Agora, se o PS tiver uma vitória por maioria relativa deve ver se há ou não possibilidades de fazer uma aliança que lhe permita governar com apoio parlamentar maioritário. E deve dizê-lo antes das eleições. P. Uma coligação com o Bloco de Esquerda? R. Com o Bloco de Esquerda e com o Partido Comunista. O Partido Socialista como maior partido da oposição tem que tomar essa iniciativa. Até aqui dizia-se 'eles têm de mudar'. Mas nós também temos de mudar! Desde o desaparecimento da União Soviética e da queda do muro de Berlim não há nenhuma razão extra-nacional para que a esquerda não se entenda. Se a direita faz maiorias, se conseguiram fazer um pacto com o dr. Paulo Portas que era o inimigo fidagal de alguns dos principais dirigentes do PSD, se conseguiram fazê-lo não há razão nenhuma para, se amanhã o PS tiver uma maioria relativa, não faça um entendimento político quer com o Partido Comunista quer com o Bloco de Esquerda. Agora isso não depende só de nós, há as dificuldades do PCP em relação às questões europeias, também nem tudo são rosas com o Bloco de Esquerda. Mas o PS deve tomar essa iniciativa. Por muito que isso desagrade à direita. Eu apoio Ferro Rodrigues para este Congresso, mas também apoio-o para o outro, se ele se mantiver fiel a esta linha política. Qualquer que seja o resultado das próximas eleições, se alguém entrar em estado de choque, eu entro em estado de choque contra quem entrar em estado de choque. Eu fiz uma aposta na minha vida literária, mas estive numa reunião no Porto que teve mais gente do que qualquer outro, incluindo o secretário-geral. Há muitos que falam em nome das bases, mas se eu me meter a sério numa batalha dessas, é melhor não me terem contra! P. O dr. Manuel Alegre está a dizer que voltará ao combate se alguém quiser combater Ferro Rodrigues daqui a quatro anos. R. Para mim, Ferro Rodrigues não é um líder de passagem. tenho confiança nele, pela sua integridade, pela sua autenticidade e as suas convicções. Não quer dizer que eu esteja de acordo com ele em tudo. Mas neste momento é importante consolidar a sua liderança. Podemos ganhar ou perder eleições. Se perdermos alguma eleição e alguém entrar em estado de choque, vai-me ter contra e eu vou entrar a sério na vida política e estarei com Ferro Rodrigues se ele estiver disposto a bater-se. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Manuel Alegre: "Estamos a chegar ao limite do apodrecimento da vida política"

#"A batalha presidencial vai ser difícil para a esquerda"

"Ferro Rodrigues não é um líder de passagem"

Se Costa tem outros horizontes políticos não deveria ir para Estrasburgo

"Ferro Rodrigues Não É Um Líder de Passagem"

Segunda-feira, 11 de Novembro de 2002 Manuel Alegre deixa de sobreaviso quem decidir "entrar em estado de choque" na sequência de uma eventual derrota eleitoral de Ferro Rodrigues - uma alusão às eleições de Outubro de 1991, quando o PS liderado por Jorge Sampaio perdeu e António Guterres afirmou estar "em estado de choque". A repetir-se o cenário, Alegre anuncia que "entrará em estado de choque contra quem entre em estado de choque" e numa batalha dessas "é melhor não me terem contra". P. Seis meses depois de ter saído do Governo no estado em que saiu o PS está preparado para um cenário de eleições antecipadas? R. Eu não estou a defender o cenário de eleições antecipadas, mas os meus camaradas Ferro Rodrigues e Paulo Pedroso já disseram que o PS tem que estar preparado para eleições antecipadas. Tem que estar sempre preparado para eleições antecipadas. P. Mas ainda não está, neste momento? R. Acho que está muito mais preparado do que nas últimas eleições, em que perdemos quase à beira da meta. P. Mas PS já fez o luto dos seis anos de Governo? R. O PSD fez aquelas promessas todas em campanha eleitoral e agora está a fazer tudo ao contrário. E continua a responsabilizar o Governo do Partido Socialista e com certeza vai fazer isso durante muito tempo. O PS não pode cair nessa armadilha. Eu tenho dito que alguns dos meus camaradas que foram ministros não podem continuar a comportar-se como ministros na oposição. Isso acabou. O PS foi às urnas, perdeu, foi julgado e agora é sobre a acção do novo Governo que temos de discutir. Ninguém é governo na oposição e essa mudança tem que ser feita. P. Mas olhamos para o primeiro friso da bancada parlamentar do PS e é como se fosse uma bancada do Governo passada para o outro lado... R. Foi um erro político. As pessoas que foram ministras têm todo o direito de continuar na actividade política. Mas o facto de esse friso ser constituído por ex-ministros facilita essa estratégia do PSD que é a de fazer oposição à oposição. É uma coisa que vem dos governos anteriores, é uma estratégia inteligente e eficaz e que costuma dar resultados sobretudo quando os outros se deixam armadilhar. O PS tem que deixar de se auto-justificar e voltar-se para a frente. P. Neste Congresso, quais são os sinais de renovação mais importantes que devem ser dados? R. Há algumas medidas importantes. A redução do secretariado para dez ou onze membros permite que seja o órgão efectivo do Partido Socialista. Passa a ter responsabilidade política e a Comissão política volta a desempenhar o seu papel. Li a moção de Ferro Rodrigues com atenção e não consegui discordar no essencial. Já em relação à declaração de princípios, embora tenha sido melhorada e corrigida, eu leio aquilo e não estou em desacordo, acho que lhe falta é um suplemento de alma. Um partido socialista tem que ter pragmatismo, mas também tem que ter uma dose de utopia. Um partido socialista não pode abandonar a esperança de que é possível mudar a vida, um pouco mais de azul, como dizia o poeta Mário Sá Carneiro. Se os partidos socialistas se acomodam, se conformam, se estão a pensar que a vida é feita de ciclos políticos, hoje eles amanhã nós, torna-se historicamente dispensáveis. O mundo mudou. Os partidos social-democratas e trabalhistas falharam no essencial e perderem uma oportunidade histórica. Estamos num mundo muito complicado, há manifestações de rua, os partidos socialistas não podem estar ausentes disso. A nossa luta é institucional, mas temos de estar atentos à emergência de novos movimentos sociais e saber interpretá-los. Essas é que são as questões de modernidade, não é saber como devemos ser bem comportados, como se vai ganhar o centro. Em meu entender, o centro não existe. É uma ficção política, é a hesitação, o cinzento, vai atrás das dinâmicas de vitória. Quando os partidos socialistas deixam de ser eles próprios para ganhar o centro, perdem. É fatal como o destino. P. Mas António Guterres é a prova de uma vitória eleitoral conseguida à custa de "recentrar" o Partido Socialista. R. Mas agora estamos onde estamos. P. Muitos dos seus camaradas consideram que se o PS não for "recentrado" nunca poderá voltar a ganhar as eleições... R. Isso significa que não perceberam nada daquilo que aconteceu nem do que está a acontecer no mundo e em Portugal. Veja as manifestações que estão a ocorrer, veja o papel do Carvalho da Silva que está a emergir como um grande líder social. Como é que surgiram historicamente os partidos socialistas? Surgiram aliados aos movimentos sociais. Hoje são mais interclassistas, mas não podem estar desatentos em relação aos movimentos sociais. Lula ganhou no Brasil. Amanhã, essas pessoas bem-comportadas do Partido Socialista que estão à espera de ter votos da direita e do centro ficarão muito surpreendidas se novos líderes emergirem e vieram da rua para o Parlamento e para o poder. P. A moção de Ferro Rodrigues diz que o PS deve concorrer sozinho às eleições, mas vai combater uma frente de direita. Deve preparar a coligação pós-eleitoral à esquerda? R. O PS deve ir sozinho às eleições. Agora, se o PS tiver uma vitória por maioria relativa deve ver se há ou não possibilidades de fazer uma aliança que lhe permita governar com apoio parlamentar maioritário. E deve dizê-lo antes das eleições. P. Uma coligação com o Bloco de Esquerda? R. Com o Bloco de Esquerda e com o Partido Comunista. O Partido Socialista como maior partido da oposição tem que tomar essa iniciativa. Até aqui dizia-se 'eles têm de mudar'. Mas nós também temos de mudar! Desde o desaparecimento da União Soviética e da queda do muro de Berlim não há nenhuma razão extra-nacional para que a esquerda não se entenda. Se a direita faz maiorias, se conseguiram fazer um pacto com o dr. Paulo Portas que era o inimigo fidagal de alguns dos principais dirigentes do PSD, se conseguiram fazê-lo não há razão nenhuma para, se amanhã o PS tiver uma maioria relativa, não faça um entendimento político quer com o Partido Comunista quer com o Bloco de Esquerda. Agora isso não depende só de nós, há as dificuldades do PCP em relação às questões europeias, também nem tudo são rosas com o Bloco de Esquerda. Mas o PS deve tomar essa iniciativa. Por muito que isso desagrade à direita. Eu apoio Ferro Rodrigues para este Congresso, mas também apoio-o para o outro, se ele se mantiver fiel a esta linha política. Qualquer que seja o resultado das próximas eleições, se alguém entrar em estado de choque, eu entro em estado de choque contra quem entrar em estado de choque. Eu fiz uma aposta na minha vida literária, mas estive numa reunião no Porto que teve mais gente do que qualquer outro, incluindo o secretário-geral. Há muitos que falam em nome das bases, mas se eu me meter a sério numa batalha dessas, é melhor não me terem contra! P. O dr. Manuel Alegre está a dizer que voltará ao combate se alguém quiser combater Ferro Rodrigues daqui a quatro anos. R. Para mim, Ferro Rodrigues não é um líder de passagem. tenho confiança nele, pela sua integridade, pela sua autenticidade e as suas convicções. Não quer dizer que eu esteja de acordo com ele em tudo. Mas neste momento é importante consolidar a sua liderança. Podemos ganhar ou perder eleições. Se perdermos alguma eleição e alguém entrar em estado de choque, vai-me ter contra e eu vou entrar a sério na vida política e estarei com Ferro Rodrigues se ele estiver disposto a bater-se. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Manuel Alegre: "Estamos a chegar ao limite do apodrecimento da vida política"

#"A batalha presidencial vai ser difícil para a esquerda"

"Ferro Rodrigues não é um líder de passagem"

Se Costa tem outros horizontes políticos não deveria ir para Estrasburgo

marcar artigo