A caminho da recessão!?

04-08-2002
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A Caminho da Recessão!?

Por LINO DE CARVALHO, Deputado do PCP

Segunda-feira, 22 de Julho de 2002

No final da primeira parte da sessão legislativa, cerca de três meses após o início de funções do Governo do PSD/CDS-PP, nas vésperas da divulgação do Relatório Anual do Banco de Portugal é oportuno fazer-se um primeiro balanço da situação e das perspectivas económicas do País.

A nova maioria de direita dramatizou, por razões meramente políticas, o quadro orçamental e financeiro que herdou do Governo do Partido Socialista. E a repetição até à exaustão de um discurso tremendista e, de certo modo, irresponsável, não poderia deixar de abalar ainda mais a já desequilibrada expectativa dos investidores, das empresas e dos consumidores.

O discurso, entretanto, procurou dar cobertura a decisões, erradas, que contribuíram ainda mais para uma séria travagem das perspectivas económicas e sociais. O aumento do IVA [imposto sobre o valor acrescentado] e o corte nas bonificações do crédito à habitação, com um limitado ou nulo contributo imediato para o aumento das receitas públicas mas com evidente impacto negativo ao nível do aumento da inflação e na construção e habitação; a revogação da tributação das mais valias (já congelada anteriormente) e uma regulamentação para as zonas francas que, no primeiro caso, retira ao Estado a possibilidade de arrecadar mais receita fiscal e, no segundo, abre ainda mais as possibilidades de poupança fiscal às entidades financeiras que operam no off-shore da Madeira; o anúncio de um conjunto de 41 medidas no âmbito do denominado Programa para a Produtividade e Crescimento da Economia cujo impacto concreto ninguém vislumbra mas em que avulta a transferência para a banca da análise das candidaturas ao Programa Operacional de Economia o que, seguramente, pelos critérios financeiristas usados, vai contribuir para um afunilamento das possibilidades de investimento designadamente ao nível das pequenas e micro empresas, a aceleração do processo de privatizações e a ausência de medidas no âmbito da formação e valorização dos trabalhadores; propostas no âmbito da Segurança Social e da legislação laboral que já estão a contribuir para o aumento da conflitualidade social, são alguns dos exemplos que se podem dar.

A evolução dos indicadores económicos que têm vindo a ser divulgados pelo INE [Instituto Nacional de Estatística] e pelo Banco de Portugal não enganam: o inquérito mensal de conjuntura à Construção e Obras Públicas apresenta em Junho o valor mais baixo observado desde 1997; o número total de Obras (incluindo habitação) concluídas no 1.º trimestre de 2002 tem uma variação negativa de 25% em relação há dois anos; o inquérito mensal de conjuntura à Indústria Transformadora suplantou, em Junho, o anterior mínimo dos últimos seis anos; o inquérito ao Comércio revela uma continuada tendência descendente nas expectativas das empresas com quebras de encomendas aos fornecedores; o inquérito aos Consumidores alcançou, em Junho, o indicador de confiança mais baixo desde Agosto de 1994. Entretanto, o último Boletim Económico do Banco de Portugal revê em baixa todas as projecções prevendo para este ano uma evolução do PIB de 0 a 1 por cento (veremos se não cairá ainda para valores negativos) contra a perspectiva de 1 a 2 % de Dezembro passado; uma FBCF [formação bruta de capital fixo, fundamentalmente investimento] negativa; uma inflação a disparar. Se o enquadramento internacional melhorar em 2003 tal pode constituir um estímulo para a procura externa mas de todo insuficiente para constituir um factor de aceleração sensível da economia. Com a quebra do poder de compra, a retracção do consumo e o aumento do nível de endividamento das famílias e das empresas temos pela frente um cenário se não, para já, de recessão pelo menos de forte abrandamento económico.

Entretanto, e muito previsivelmente, virá aí um Orçamento restritivo para 2003 tendo como pretexto o cumprimento do irracional Pacto de Estabilidade que em vez de constituir uma alavanca para o crescimento económico será mais um factor de travagem e de agravamento das condições de vida dos portugueses. O Governo não só não cumpre nenhum dos seus compromissos eleitorais como está a conduzir o País para uma situação económica, financeira e social mais grave do que aquela que recebeu. E nem a mudança de agulha no discurso do Primeiro-ministro será suficiente para a inversão do quadro preocupante que os portugueses têm pela frente.

linocarvalho@mail.telepac.pt

A Caminho da Recessão!?

Por LINO DE CARVALHO, Deputado do PCP

Segunda-feira, 22 de Julho de 2002

No final da primeira parte da sessão legislativa, cerca de três meses após o início de funções do Governo do PSD/CDS-PP, nas vésperas da divulgação do Relatório Anual do Banco de Portugal é oportuno fazer-se um primeiro balanço da situação e das perspectivas económicas do País.

A nova maioria de direita dramatizou, por razões meramente políticas, o quadro orçamental e financeiro que herdou do Governo do Partido Socialista. E a repetição até à exaustão de um discurso tremendista e, de certo modo, irresponsável, não poderia deixar de abalar ainda mais a já desequilibrada expectativa dos investidores, das empresas e dos consumidores.

O discurso, entretanto, procurou dar cobertura a decisões, erradas, que contribuíram ainda mais para uma séria travagem das perspectivas económicas e sociais. O aumento do IVA [imposto sobre o valor acrescentado] e o corte nas bonificações do crédito à habitação, com um limitado ou nulo contributo imediato para o aumento das receitas públicas mas com evidente impacto negativo ao nível do aumento da inflação e na construção e habitação; a revogação da tributação das mais valias (já congelada anteriormente) e uma regulamentação para as zonas francas que, no primeiro caso, retira ao Estado a possibilidade de arrecadar mais receita fiscal e, no segundo, abre ainda mais as possibilidades de poupança fiscal às entidades financeiras que operam no off-shore da Madeira; o anúncio de um conjunto de 41 medidas no âmbito do denominado Programa para a Produtividade e Crescimento da Economia cujo impacto concreto ninguém vislumbra mas em que avulta a transferência para a banca da análise das candidaturas ao Programa Operacional de Economia o que, seguramente, pelos critérios financeiristas usados, vai contribuir para um afunilamento das possibilidades de investimento designadamente ao nível das pequenas e micro empresas, a aceleração do processo de privatizações e a ausência de medidas no âmbito da formação e valorização dos trabalhadores; propostas no âmbito da Segurança Social e da legislação laboral que já estão a contribuir para o aumento da conflitualidade social, são alguns dos exemplos que se podem dar.

A evolução dos indicadores económicos que têm vindo a ser divulgados pelo INE [Instituto Nacional de Estatística] e pelo Banco de Portugal não enganam: o inquérito mensal de conjuntura à Construção e Obras Públicas apresenta em Junho o valor mais baixo observado desde 1997; o número total de Obras (incluindo habitação) concluídas no 1.º trimestre de 2002 tem uma variação negativa de 25% em relação há dois anos; o inquérito mensal de conjuntura à Indústria Transformadora suplantou, em Junho, o anterior mínimo dos últimos seis anos; o inquérito ao Comércio revela uma continuada tendência descendente nas expectativas das empresas com quebras de encomendas aos fornecedores; o inquérito aos Consumidores alcançou, em Junho, o indicador de confiança mais baixo desde Agosto de 1994. Entretanto, o último Boletim Económico do Banco de Portugal revê em baixa todas as projecções prevendo para este ano uma evolução do PIB de 0 a 1 por cento (veremos se não cairá ainda para valores negativos) contra a perspectiva de 1 a 2 % de Dezembro passado; uma FBCF [formação bruta de capital fixo, fundamentalmente investimento] negativa; uma inflação a disparar. Se o enquadramento internacional melhorar em 2003 tal pode constituir um estímulo para a procura externa mas de todo insuficiente para constituir um factor de aceleração sensível da economia. Com a quebra do poder de compra, a retracção do consumo e o aumento do nível de endividamento das famílias e das empresas temos pela frente um cenário se não, para já, de recessão pelo menos de forte abrandamento económico.

Entretanto, e muito previsivelmente, virá aí um Orçamento restritivo para 2003 tendo como pretexto o cumprimento do irracional Pacto de Estabilidade que em vez de constituir uma alavanca para o crescimento económico será mais um factor de travagem e de agravamento das condições de vida dos portugueses. O Governo não só não cumpre nenhum dos seus compromissos eleitorais como está a conduzir o País para uma situação económica, financeira e social mais grave do que aquela que recebeu. E nem a mudança de agulha no discurso do Primeiro-ministro será suficiente para a inversão do quadro preocupante que os portugueses têm pela frente.

linocarvalho@mail.telepac.pt

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