Intervenção do Deputado Bruno Dias

17-01-2004
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Políticas de combate à droga e à toxicodependência

Intervenção do Deputado Bruno Dias

25 de Setembro de 2002

Senhor Presidente,

Senhoras e Senhores Deputados,

Senhores Membros do Governo,

O PCP tomou a iniciativa de propor este debate de urgência, por considerar que há uma discussão a fazer, e que tardava em ser feita, sobre as políticas de combate à droga e à toxicodependência. Tanto mais que a actual situação nesta matéria apresenta contornos perante os quais é indispensável agir.

A situação actual exige a consolidação e o alargamento da rede de respostas, multidisciplinar, aos problemas da toxicodependência. Por isso é motivo de séria preocupação para o PCP que o Governo, à margem das suas considerações gerais, esteja a enveredar por um caminho de marcada desestabilização das estruturas que foram construídas ao longo de anos, e que têm tido um papel de relevo na intervenção sobre esta matéria.

Praticamente quinze meses passados sobre a entrada em vigor da nova Lei da Droga, a incerteza paira sobre o sector. E as orientações apresentadas no Programa de Governo – manter a estratégia e a estrutura, cortando parte dos seus efectivos – não vêm trazer boas notícias.

O Governo fundiu o SPTT e o IPDT. Queremos afirmar que a questão essencial não estava na opção de fundir ou não os serviços. O problema decisivo está, sim, nas condições em que essa fusão se está a concretizar – num quadro em que é política geral do Governo a não renovação de contratos de trabalho.

Assim, a curto prazo, podemos ter o encerramento de diversas unidades. É isso que na prática o Governo está a decidir. Aliás, algumas dessas unidades só entraram em funcionamento através do recurso à contratação a prazo dos profissionais envolvidos.

O que isto implica na prática é a significativa redução da capacidade de resposta ao problema da toxicodependência; a diminuição do apoio e da qualidade de vida dos doentes; o acréscimo dos problemas conexos de saúde e segurança nas áreas mais afectadas.

O que isto implica é o retrocesso para um modelo mercantilista, em que as estruturas públicas venham a exercer funções meramente complementares, relativamente aos meios privados – e em que toxicodependentes e suas famílias sejam vistos como uma fonte de lucro.

Esta preocupação foi aliás o testemunho de diversos responsáveis e técnicos do sector, participantes da reunião aberta que foi promovida pelo Grupo Parlamentar do PCP, aqui mesmo na Assembleia da República, no passado dia 11 de Junho.

Senhor Presidente,

Senhoras e Senhores Deputados,

Senhores Membros do Governo,

Sendo esta a perspectiva, a Legislatura começa mal. Esta linha de actuação do Governo não augura nada de bom, e é preciso urgentemente entrar no bom caminho.

Até porque o bom caminho ficou já aberto, com os importantes avanços registados na última década. E para que fossem dados esses passos significativos, aqui esteve e está o PCP, com as propostas e contributos, a intervenção responsável e construtiva, para a melhoria do quadro legal neste sector.

Todos sabem que oportunamente afirmámos a necessidade de ir mais longe. Alertámos para as insuficiências. Defendemos medidas concretas, que melhor garantissem o funcionamento eficaz de uma estrutura de prevenção. De uma verdadeira rede pública de tratamento. De um mais efectivo combate ao tráfico e branqueamento de capitais.

Em suma, defendemos uma política assente na concepção de que um toxicodependente é um doente e não um criminoso, e que o seu tratamento e reinserção social é um dever do País, e não uma potencial fonte de receita privada.

A exigência que afirmámos ganha hoje ainda mais peso. A avaliação da capacidade de resposta das estruturas e serviços tem que ser feita no pressuposto de resolver e ultrapassar as falhas e insuficiências que existam. Nunca o PCP aceitará que a avaliação sirva de pretexto ao torpedeamento da aplicação prática do novo quadro legal, e muito menos à inversão do que de mais humanista existe na sua filosofia.

Preconizando concretamente a actuação e as medidas que se impõem, pela urgente necessidade da sua aplicação, o Grupo Parlamentar do PCP deu já entrada na Mesa de um Projecto de Resolução, que esperamos que venha a ser agendado em breve.

Nele recomendamos ao Governo um conjunto de prioridades de intervenção, desde a realização de um Estudo Nacional que defina mais claramente os novos fenómenos e tendências neste domínio, até ao desenvolvimento de novas acções de prevenção primária, ou a consolidação da rede pública de atendimento, tratamento e reinserção social de toxicodependentes.

Propomos a execução de programas de intervenção para novas áreas críticas e de risco; a intervenção mais eficaz em meio prisional; o reforço do dispositivo e meios de combate ao narcotráfico e ao branqueamento de capitais.

Defendemos a concretização efectiva da lei de despenalização do consumo de drogas, dando mais eficácia às Comissões para a Dissuasão da Toxicodependência, uma experiência que importa defender e aperfeiçoar.

Senhor Presidente,

Senhoras e Senhores Deputados,

Senhores Membros do Governo,

O País está colocado perante a necessidade – e a oportunidade – de tomar medidas urgentes. Está mais que na hora do Governo apontar, com clareza e concretamente, qual será a sua intervenção nesta matéria.

É um truque muito antigo, e muito esclarecedor quanto à ética de quem o pratica, esse de desinvestir, cortar nos financiamentos, nos meios, nos quadros de pessoal dos serviços públicos. Atacar a sua qualidade, minar a sua capacidade de resposta. E depois, encolher os ombros e dizer que o Estado deve deixar a intervenção na mão de interesses privados e desresponsabilizar-se do seu dever. O País já assistiu a isso, e não queremos que volte a assistir.

Não podemos esquecer que foi no auge dos 10 anos de governos PSD que o Casal Ventoso se tornou o maior hipermercado da droga em Portugal, e um dos maiores da Europa. E não podemos aceitar que políticas, que começam já a ser indiciadas, possam vir a criar novos “Casais Ventosos” no nosso País.

Pela nossa parte, o PCP não aceita nem se resigna a uma sociedade alienante, de seres humanos dominados pela droga, ou que se conformam com a sua inevitabilidade.

Para o PCP, as estratégias a desenvolver têm que prosseguir o objectivo de enfrentar a toxicodependência. Fazê-la recuar. Prevenir que mais jovens caiam na dependência das drogas. E abrir caminhos ao tratamento e reinserção das vítimas deste drama social.

É preciso agir nesse sentido, e é a essa urgente necessidade que o País tem que dar resposta.

Disse.

(…)

Sr.ª Presidente,

Sr. Deputado Miguel Coleta,

Ainda bem que o Sr. Deputado se congratula com a iniciativa do PCP, tendo em conta que, só agora, graças a ela, ouviremos o Governo dizer o que, de facto, vai decidir e vai fazer. Ainda bem que o Sr. Deputado concorda connosco relativamente à urgência deste debate.

Por outro lado, o Sr. Deputado disse que para nós a boa política é a que pressupõe gastar. Ó Sr. Deputado, antes de mais, queria perguntar-lhe o seguinte: gastar é manter profissionais, num sector fundamental como este, em serviços que (alguns deles) só funcionam com a manutenção de profissionais contratados a termo certo? Por outro lado, num drama como este, poupar dinheiro é concessionar aos interesses privados aquilo que é um dever fundamental do Estado perante os cidadãos e perante os toxicodependentes?

O Sr. Deputado, ao manifestar a sua concordância com a nossa afirmação de que a prevenção tem, de facto, que ser uma linha de força, certamente também estará de acordo connosco quando criticamos o Programa do Governo por dizer que o IPDT vai manter a sua estrutura e a sua organização com um corte de 50% dos seus efectivos!

Se é isto a concretização da prevenção como linha de força da actuação do Governo, cortando e desresponsabilizando efectivos e cortando financiamentos, certamente que não está a fazer coincidir a prática com as suas afirmações!

(…)

Sr.ª Presidente,

Sr. Ministro da Saúde,

Quanto às intenções declaradas, o Sr. Ministro manteve e citou em alguns princípios a própria Estratégia Nacional de Luta Contra a Droga ou o Plano de Acção Nacional — Horizonte 2004, abrindo, todavia, a porta para o alargamento de interesses privados.

Quanto às decisões tomadas, neste momento o aspecto que emerge mais da linha de actuação do Governo é a decisão reiterada de dispensar profissionais contratados. Pois, para nós, o que é preciso decidir é exactamente o contrário: é a integração desses profissionais nos quadros para salvaguardar, pela sua experiência, o bom funcionamento do sector e não deitar pela borda fora a experiência acumulada ao longo dos últimos anos.

Relativamente a outro aspecto a que o Sr. Ministro se referiu, a questão de programas ditos livres de drogas, está em causa o método terapêutico de substituição por opiáceos e está em causa aquele que é conhecido por «programa da metadona». E Sr. Ministro, eu queria recordar que não foi uma opção de raiz meramente política a que foi tomada; foi uma opção técnica, proposta e defendida por técnicos (por médicos), e que veio a ser acolhida pelo governo da altura – o que, de resto, só lhe ficou bem!

Mas a questão é de ordem técnica; é de uma terapêutica e de um medicamento que estamos a falar; é da redução de danos; é do combate a gravíssimos problemas de saúde associados a este fenómeno. Por isso, perguntamos, Sr. Ministro: não considera que a decisão de raiz política que veio anunciar acaba por trazer uma ingerência política assente em pressupostos políticos, morais ou de outra ordem mas certamente que não de ordem técnica?

Não considera o Sr. Ministro que é uma confusão perigosa colocar as terapêuticas de tratamento e as terapêuticas de substituição no mesmo plano?

Não sabe o Sr. Ministro que a primeira opção apresentada ao toxicodependente é sempre o tratamento e que os programas de substituição opiácea, como a metadona, são adoptados quando as soluções de tratamento não têm êxito possível?

Não considera, para terminar, Sr. Ministro, que é retrógrado abrir a porta a uma concepção que reduza as soluções terapêuticas a critérios políticos ou económicos?

Finalmente, Sr. Ministro, não considera que o grande e principal dever do Estado é o de manter, garantir e desenvolver uma efectiva rede pública de prevenção e tratamento da toxicodependência?

(…)

Sr.ª Presidente,

Srs. Deputados

Numa altura em que o consumo de drogas continua a subir na população mais jovem e em que Portugal é o segundo país da Europa no consumo de heroína, em que os distritos com maior consumo de droga, em síntese, são Vila Real, Viseu ou Santarém, o Sr. Ministro veio dizer à Assembleia da República que em certas regiões há toxicodependentes a menos para os serviços que existem. No seu entender, 100 pessoas/ano é pouco!

Isto aponta para que conclusão? Que pretende extinguir comissões para a dissuasão da toxicodependência previstas na lei?! É assim que considera haver lugar para a rede de resposta pública, ou é com o corte de pessoal nos serviços.

O Sr. Ministro disse aqui que não inventou a pólvora, quanto a isto estamos de acordo; mas parece pretender usar a pólvora que outros inventaram para rebentar com as estruturas do País para o combate à droga e à toxicodependência.

O Sr. Ministro diz que quer lançar a discussão sobre as terapêuticas de substituição, mas o que disse na sua intervenção — e está escrito, Sr. Ministro — é que deverá ser privilegiada a opção pelos chamados «tratamentos livres de drogas». Isto não é estudar, Sr. Ministro, é decidir!

É decidir politicamente, a priori, recusando a experiência no terreno que os técnicos têm invocado para defender esta terapêutica. São os técnicos, Sr. Ministro, e não o PCP, esta bancada, estes Deputados apenas! A comunidade técnica tem defendido esta matéria.

Agora, o Sr. Deputado José António Silva, do PSD, talvez por falta de articulação política e táctica, veio pôr a nu a grave situação que existe em matéria de doenças infecto-contagiosas nesta área. Afinal, o PSD concorda com a urgente necessidade de reforçar a redução de danos.

Contamos consigo, Sr. Deputado, e contamos convosco, Srs. Deputados, para defender o programa da metadona.

Políticas de combate à droga e à toxicodependência

Intervenção do Deputado Bruno Dias

25 de Setembro de 2002

Senhor Presidente,

Senhoras e Senhores Deputados,

Senhores Membros do Governo,

O PCP tomou a iniciativa de propor este debate de urgência, por considerar que há uma discussão a fazer, e que tardava em ser feita, sobre as políticas de combate à droga e à toxicodependência. Tanto mais que a actual situação nesta matéria apresenta contornos perante os quais é indispensável agir.

A situação actual exige a consolidação e o alargamento da rede de respostas, multidisciplinar, aos problemas da toxicodependência. Por isso é motivo de séria preocupação para o PCP que o Governo, à margem das suas considerações gerais, esteja a enveredar por um caminho de marcada desestabilização das estruturas que foram construídas ao longo de anos, e que têm tido um papel de relevo na intervenção sobre esta matéria.

Praticamente quinze meses passados sobre a entrada em vigor da nova Lei da Droga, a incerteza paira sobre o sector. E as orientações apresentadas no Programa de Governo – manter a estratégia e a estrutura, cortando parte dos seus efectivos – não vêm trazer boas notícias.

O Governo fundiu o SPTT e o IPDT. Queremos afirmar que a questão essencial não estava na opção de fundir ou não os serviços. O problema decisivo está, sim, nas condições em que essa fusão se está a concretizar – num quadro em que é política geral do Governo a não renovação de contratos de trabalho.

Assim, a curto prazo, podemos ter o encerramento de diversas unidades. É isso que na prática o Governo está a decidir. Aliás, algumas dessas unidades só entraram em funcionamento através do recurso à contratação a prazo dos profissionais envolvidos.

O que isto implica na prática é a significativa redução da capacidade de resposta ao problema da toxicodependência; a diminuição do apoio e da qualidade de vida dos doentes; o acréscimo dos problemas conexos de saúde e segurança nas áreas mais afectadas.

O que isto implica é o retrocesso para um modelo mercantilista, em que as estruturas públicas venham a exercer funções meramente complementares, relativamente aos meios privados – e em que toxicodependentes e suas famílias sejam vistos como uma fonte de lucro.

Esta preocupação foi aliás o testemunho de diversos responsáveis e técnicos do sector, participantes da reunião aberta que foi promovida pelo Grupo Parlamentar do PCP, aqui mesmo na Assembleia da República, no passado dia 11 de Junho.

Senhor Presidente,

Senhoras e Senhores Deputados,

Senhores Membros do Governo,

Sendo esta a perspectiva, a Legislatura começa mal. Esta linha de actuação do Governo não augura nada de bom, e é preciso urgentemente entrar no bom caminho.

Até porque o bom caminho ficou já aberto, com os importantes avanços registados na última década. E para que fossem dados esses passos significativos, aqui esteve e está o PCP, com as propostas e contributos, a intervenção responsável e construtiva, para a melhoria do quadro legal neste sector.

Todos sabem que oportunamente afirmámos a necessidade de ir mais longe. Alertámos para as insuficiências. Defendemos medidas concretas, que melhor garantissem o funcionamento eficaz de uma estrutura de prevenção. De uma verdadeira rede pública de tratamento. De um mais efectivo combate ao tráfico e branqueamento de capitais.

Em suma, defendemos uma política assente na concepção de que um toxicodependente é um doente e não um criminoso, e que o seu tratamento e reinserção social é um dever do País, e não uma potencial fonte de receita privada.

A exigência que afirmámos ganha hoje ainda mais peso. A avaliação da capacidade de resposta das estruturas e serviços tem que ser feita no pressuposto de resolver e ultrapassar as falhas e insuficiências que existam. Nunca o PCP aceitará que a avaliação sirva de pretexto ao torpedeamento da aplicação prática do novo quadro legal, e muito menos à inversão do que de mais humanista existe na sua filosofia.

Preconizando concretamente a actuação e as medidas que se impõem, pela urgente necessidade da sua aplicação, o Grupo Parlamentar do PCP deu já entrada na Mesa de um Projecto de Resolução, que esperamos que venha a ser agendado em breve.

Nele recomendamos ao Governo um conjunto de prioridades de intervenção, desde a realização de um Estudo Nacional que defina mais claramente os novos fenómenos e tendências neste domínio, até ao desenvolvimento de novas acções de prevenção primária, ou a consolidação da rede pública de atendimento, tratamento e reinserção social de toxicodependentes.

Propomos a execução de programas de intervenção para novas áreas críticas e de risco; a intervenção mais eficaz em meio prisional; o reforço do dispositivo e meios de combate ao narcotráfico e ao branqueamento de capitais.

Defendemos a concretização efectiva da lei de despenalização do consumo de drogas, dando mais eficácia às Comissões para a Dissuasão da Toxicodependência, uma experiência que importa defender e aperfeiçoar.

Senhor Presidente,

Senhoras e Senhores Deputados,

Senhores Membros do Governo,

O País está colocado perante a necessidade – e a oportunidade – de tomar medidas urgentes. Está mais que na hora do Governo apontar, com clareza e concretamente, qual será a sua intervenção nesta matéria.

É um truque muito antigo, e muito esclarecedor quanto à ética de quem o pratica, esse de desinvestir, cortar nos financiamentos, nos meios, nos quadros de pessoal dos serviços públicos. Atacar a sua qualidade, minar a sua capacidade de resposta. E depois, encolher os ombros e dizer que o Estado deve deixar a intervenção na mão de interesses privados e desresponsabilizar-se do seu dever. O País já assistiu a isso, e não queremos que volte a assistir.

Não podemos esquecer que foi no auge dos 10 anos de governos PSD que o Casal Ventoso se tornou o maior hipermercado da droga em Portugal, e um dos maiores da Europa. E não podemos aceitar que políticas, que começam já a ser indiciadas, possam vir a criar novos “Casais Ventosos” no nosso País.

Pela nossa parte, o PCP não aceita nem se resigna a uma sociedade alienante, de seres humanos dominados pela droga, ou que se conformam com a sua inevitabilidade.

Para o PCP, as estratégias a desenvolver têm que prosseguir o objectivo de enfrentar a toxicodependência. Fazê-la recuar. Prevenir que mais jovens caiam na dependência das drogas. E abrir caminhos ao tratamento e reinserção das vítimas deste drama social.

É preciso agir nesse sentido, e é a essa urgente necessidade que o País tem que dar resposta.

Disse.

(…)

Sr.ª Presidente,

Sr. Deputado Miguel Coleta,

Ainda bem que o Sr. Deputado se congratula com a iniciativa do PCP, tendo em conta que, só agora, graças a ela, ouviremos o Governo dizer o que, de facto, vai decidir e vai fazer. Ainda bem que o Sr. Deputado concorda connosco relativamente à urgência deste debate.

Por outro lado, o Sr. Deputado disse que para nós a boa política é a que pressupõe gastar. Ó Sr. Deputado, antes de mais, queria perguntar-lhe o seguinte: gastar é manter profissionais, num sector fundamental como este, em serviços que (alguns deles) só funcionam com a manutenção de profissionais contratados a termo certo? Por outro lado, num drama como este, poupar dinheiro é concessionar aos interesses privados aquilo que é um dever fundamental do Estado perante os cidadãos e perante os toxicodependentes?

O Sr. Deputado, ao manifestar a sua concordância com a nossa afirmação de que a prevenção tem, de facto, que ser uma linha de força, certamente também estará de acordo connosco quando criticamos o Programa do Governo por dizer que o IPDT vai manter a sua estrutura e a sua organização com um corte de 50% dos seus efectivos!

Se é isto a concretização da prevenção como linha de força da actuação do Governo, cortando e desresponsabilizando efectivos e cortando financiamentos, certamente que não está a fazer coincidir a prática com as suas afirmações!

(…)

Sr.ª Presidente,

Sr. Ministro da Saúde,

Quanto às intenções declaradas, o Sr. Ministro manteve e citou em alguns princípios a própria Estratégia Nacional de Luta Contra a Droga ou o Plano de Acção Nacional — Horizonte 2004, abrindo, todavia, a porta para o alargamento de interesses privados.

Quanto às decisões tomadas, neste momento o aspecto que emerge mais da linha de actuação do Governo é a decisão reiterada de dispensar profissionais contratados. Pois, para nós, o que é preciso decidir é exactamente o contrário: é a integração desses profissionais nos quadros para salvaguardar, pela sua experiência, o bom funcionamento do sector e não deitar pela borda fora a experiência acumulada ao longo dos últimos anos.

Relativamente a outro aspecto a que o Sr. Ministro se referiu, a questão de programas ditos livres de drogas, está em causa o método terapêutico de substituição por opiáceos e está em causa aquele que é conhecido por «programa da metadona». E Sr. Ministro, eu queria recordar que não foi uma opção de raiz meramente política a que foi tomada; foi uma opção técnica, proposta e defendida por técnicos (por médicos), e que veio a ser acolhida pelo governo da altura – o que, de resto, só lhe ficou bem!

Mas a questão é de ordem técnica; é de uma terapêutica e de um medicamento que estamos a falar; é da redução de danos; é do combate a gravíssimos problemas de saúde associados a este fenómeno. Por isso, perguntamos, Sr. Ministro: não considera que a decisão de raiz política que veio anunciar acaba por trazer uma ingerência política assente em pressupostos políticos, morais ou de outra ordem mas certamente que não de ordem técnica?

Não considera o Sr. Ministro que é uma confusão perigosa colocar as terapêuticas de tratamento e as terapêuticas de substituição no mesmo plano?

Não sabe o Sr. Ministro que a primeira opção apresentada ao toxicodependente é sempre o tratamento e que os programas de substituição opiácea, como a metadona, são adoptados quando as soluções de tratamento não têm êxito possível?

Não considera, para terminar, Sr. Ministro, que é retrógrado abrir a porta a uma concepção que reduza as soluções terapêuticas a critérios políticos ou económicos?

Finalmente, Sr. Ministro, não considera que o grande e principal dever do Estado é o de manter, garantir e desenvolver uma efectiva rede pública de prevenção e tratamento da toxicodependência?

(…)

Sr.ª Presidente,

Srs. Deputados

Numa altura em que o consumo de drogas continua a subir na população mais jovem e em que Portugal é o segundo país da Europa no consumo de heroína, em que os distritos com maior consumo de droga, em síntese, são Vila Real, Viseu ou Santarém, o Sr. Ministro veio dizer à Assembleia da República que em certas regiões há toxicodependentes a menos para os serviços que existem. No seu entender, 100 pessoas/ano é pouco!

Isto aponta para que conclusão? Que pretende extinguir comissões para a dissuasão da toxicodependência previstas na lei?! É assim que considera haver lugar para a rede de resposta pública, ou é com o corte de pessoal nos serviços.

O Sr. Ministro disse aqui que não inventou a pólvora, quanto a isto estamos de acordo; mas parece pretender usar a pólvora que outros inventaram para rebentar com as estruturas do País para o combate à droga e à toxicodependência.

O Sr. Ministro diz que quer lançar a discussão sobre as terapêuticas de substituição, mas o que disse na sua intervenção — e está escrito, Sr. Ministro — é que deverá ser privilegiada a opção pelos chamados «tratamentos livres de drogas». Isto não é estudar, Sr. Ministro, é decidir!

É decidir politicamente, a priori, recusando a experiência no terreno que os técnicos têm invocado para defender esta terapêutica. São os técnicos, Sr. Ministro, e não o PCP, esta bancada, estes Deputados apenas! A comunidade técnica tem defendido esta matéria.

Agora, o Sr. Deputado José António Silva, do PSD, talvez por falta de articulação política e táctica, veio pôr a nu a grave situação que existe em matéria de doenças infecto-contagiosas nesta área. Afinal, o PSD concorda com a urgente necessidade de reforçar a redução de danos.

Contamos consigo, Sr. Deputado, e contamos convosco, Srs. Deputados, para defender o programa da metadona.

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