36 anos de calvário

05-08-2002
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36 Anos de Calvário

Por JOANA AMORIM

Quinta-feira, 25 de Julho de 2002 Foram precisas quase quatro décadas para construir 233,7 kms, que custaram 375 milhões de euros. A A2 abre hoje - com um prazo, pelo menos, a ser cumprido - sem pompa e circunstância Falar da auto-estrada para o Algarve (A2) implica rever 36 anos de história, abordar os atropelos ambientais cometidos, evocar os 14 trabalhadores que morreram no último troço desta empreitada e não deixar passar em branco promessas políticas feitas quer pelos governos de Cavaco Silva quer de António Guterres. Recuemos, pois, no tempo, e paremos em 6 de Agosto de 1966. Dia em que foi inaugurado o primeiro lanço, aquando da construção da então designada Ponte Salazar (hoje, Ponte 25 de Abril), correspondente a nove kms entre Lisboa e o Fogueteiro. Em 1972, deu-se a integração na concessão da Brisa. Já em 1978, foi estendida a ligação até Palmela e no ano seguinte foi inaugurado o troço até Setúbal, num total de 20,4 kms. Em Março de 1992, o então ministro responsável pelas Obras Públicas, Ferreira do Amaral, garantia que a construção de uma auto-estrada que ligasse Lisboa ao Algarve não constava dos planos do Executivo. Contudo, apenas dois meses decorridos, o Governo propunha à Comunidade Europeia que incluísse no primeiro quadro comunitário de apoio o financiamento necessário à construção da A2. A 30 de Abril de 1994, Cavaco Silva e Ferreira do Amaral inauguravam o troço Palmela-Marateca - uma extensão de 19,3 kms que custou 35 milhões de euros. Nesse mesmo dia, Cavaco afirmava, determinado: "No final do século, Portugal terá estruturas viárias e ferroviárias de nível verdadeiramente europeu". No ano seguinte, e de acordo com o Plano Rodoviário Nacional do executivo, a A2 deveria estar concluída em Setembro de 1998. Chegados a 1996, já na "era" guterrista, o então primeiro-ministro justificava os atrasos nas obras com questões de "natureza ambiental", numa altura em que os ambientalistas declaravam guerra à A2 face à hipótese da Serra do Caldeirão ser cortada a meio. Aliás, em 1997, a Quercus propunha ao Governo a alteração do traçado da A2, mantendo-se o do IP1, isto no ano em que é inaugurado o troço Marateca-Alcácer do Sal, numa extensão de 27,1 kms. Ainda em 1997, Cravinho anunciava a conclusão da A2 em 2000. Acesa ainda a polémica por causa do Caldeirão, era inaugurada, em Julho de 1998, a ponte sobre o rio Sado, permitindo a continuidade da A2 ao nó de Grândola Sul, avançando a auto-estrada mais 37,9 kms. A 23 de Outubro do mesmo ano, o governo chumbava a travessia do Caldeirão, decidindo que a A2 iria correr ao longo do IP1. Já no final de 1999, Cravinho garantia que os 180 kms que faltavam de auto-estrada ficariam concluídos até 2001, numa altura em que a população de Paderne constestava o traçado da A2. Março de 2000 ficaria marcado pela entusiástica declaração de Guterres: "Acabaram, em Portugal, as auto-estradas feitas aos bocadinhos". Em Julho do mesmo ano, Jorge Coelho - o ministro que afirmou que se os prazos das obras públicas não fossem cumpridos se demitia - garantia que em Junho de 2002 a A2 abriria ao público. Dois meses volvidos, a CE processava o Estado português por violação da directiva Habitats na construção do troço da A2 que atravessa a Zona de Protecção Especial de Castro Verde, decorrente da queixa apresentada pela Liga para a Protecção da Natureza, Quercus e Geota. Há um ano, era inaugurada a ligação até Castro Verde, com uma extensão de 58 kms que custou 130 milhões de euros. No arranque de 2002, o Estado era "brindado" com mais um processo, desta vez com a CE a dar razão aos moradores de Paderne. Mas não só: Bruxelas aconselhou ainda o governo a parar as obras, dando-lhe um mês para explicar a alteração do traçado entre Messines e a Via do Infante. A 2 de Fevereiro a Brisa assegurava que a A2 seria inaugurada em Julho. Já em pleno século XXI, Portugal continua a não ter estruturas viárias de "nível verdadeiramente europeu". Mas passa a contar, a partir de hoje, com uma auto-estrada feita "aos bocadinhos". OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE A2 - tragédia até ao fim

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