O bico d'obra das portagens virtuais

14-08-2004
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SCUT

O Bico D'obra das Portagens Virtuais

Segunda-feira, 21 de Junho de 2004

O Governo diz que as dificuldades orçamentais obrigam a acabar com cinco das sete auto-estradas sem custos para o utilizador mas o Tribunal de Contas alerta que o rompimento dos contratos assinados com os concessionários pode obrigar a indemnizações milionárias

L.P.

"A verba paga às concessionárias na construção, manutenção e exploração das auto-estradas onde não é aplicado o pagamento de portagem é uma verdadeira punção às finanças públicas". Foi desta forma que o ministro das Obras Públicas, Carmona Rodrigues, mais recentemente justificou a necessidade de introduzir portagens reais em cinco das sete SCUT já concessionadas - mantendo a promessa assumida por Durão Barroso de que a SCUT do Algarve (A22) e a SCUT da Beira Interior (A23) não seriam portajadas. O Conselho de Ministros ainda não discutiu com qual das duas hipóteses preparadas pelo ministério de Carmona Rodrigues vai evitar a anunciada punção, mas o governante tinha intenção de arrancar com o processo ainda antes das férias do Verão, para uma posterior discussão na Assembleia da República.

As alternativas em estudo, que devem ser aplicadas a cinco das sete SCUT já concessionadas, envolvem questões negociais exaustivas mas também questões técnicas de alguma complexidade. A ideia é aplicar-lhes o princípio de "utilizador-pagador", sendo necessário definir quem paga, como paga, quanto paga e onde paga. Em discussão está também a possibilidade de haver discriminações positivas e criar, por exemplo, a isenção a uma figura ainda a criar de "trânsito local". Vai também ser equacionada a melhor forma de ultrapassar os pesados custos de construção das tradicionais praças de portagens o que, segundo o PÚBLICO apurou, passará por soluções tecnológicas e meios electrónicos, como a Via Verde, ou outros sistemas de rádio.

Modelo penalizante para o Estado

A introdução de portagens em auto-estradas que foram concebidas para não terem custos para o utilizador não recebe nenhuma oposição por parte dos consórcios a quem foram concessionadas, até porque o contrato estabelecido entre eles e o Estado deixou as regras bem definidas. Essas regras foram analisadas pelo Tribunal de Contas há pouco mais de um ano, num auditoria em que este sistema, baptizado pelo próprio tribunal como uma "fuga para o direito privado" foi muito criticado, sobretudo devido ao modelo contratual de partilha de riscos, considerado penalizante para o Estado.

O TC considerou "razoável" que o Estado assuma os riscos de modificação unilateral dos projectos, mas apontou muitas "reservas" o facto de o estado acabar por assumir, com estes contratos, o congelamento do Plano Rodoviário Nacional durante 30 anos. Isto porque o Estado ficou obrigado a compensar financeiramente as concessionárias caso abrisse vias novas e alternativas. Por maioria de razão, terá de fazê-lo caso inclua portagens. Tudo isto porque o contrato assenta em previsões de volume de tráfego - "uma variável exógena que constituiu um risco acrescido para o Estado, que acaba por se reflectir, naturalmente, num preço mais elevado dos contratos a pagar por ele", como acusa o TC. Uma auto-estrada portajada tem menos tráfego, à partida do que uma que não represente custos para o utilizador.

Para além de todos estes aspectos, em matéria de negociação, o Estado está sempre muito fragilizado: "Caso não haja acordo, para além dos compromissos assumidos com as portagens SCUT, o Estado poderá ainda ter de suportar o risco de acumular os pagamentos daquelas portagens com os encargos directos de uma empreitada nacional", pode ler-se no relatório da auditoria do TC.

João Cravinho, o "pai" deste modelo, continua a defendê-lo lembrando que sai mais barato ao Estado a construção em modelo SCUT, em cerca de 25 por cento, do que o método de empreitada nacional, e que é com a introdução de portagens nestas vias, alterando o processo quando ele já está em curso que será mais penalizante.

Texto

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O Bico D'obra das Portagens Virtuais

Segunda-feira, 21 de Junho de 2004

O Governo diz que as dificuldades orçamentais obrigam a acabar com cinco das sete auto-estradas sem custos para o utilizador mas o Tribunal de Contas alerta que o rompimento dos contratos assinados com os concessionários pode obrigar a indemnizações milionárias

L.P.

"A verba paga às concessionárias na construção, manutenção e exploração das auto-estradas onde não é aplicado o pagamento de portagem é uma verdadeira punção às finanças públicas". Foi desta forma que o ministro das Obras Públicas, Carmona Rodrigues, mais recentemente justificou a necessidade de introduzir portagens reais em cinco das sete SCUT já concessionadas - mantendo a promessa assumida por Durão Barroso de que a SCUT do Algarve (A22) e a SCUT da Beira Interior (A23) não seriam portajadas. O Conselho de Ministros ainda não discutiu com qual das duas hipóteses preparadas pelo ministério de Carmona Rodrigues vai evitar a anunciada punção, mas o governante tinha intenção de arrancar com o processo ainda antes das férias do Verão, para uma posterior discussão na Assembleia da República.

As alternativas em estudo, que devem ser aplicadas a cinco das sete SCUT já concessionadas, envolvem questões negociais exaustivas mas também questões técnicas de alguma complexidade. A ideia é aplicar-lhes o princípio de "utilizador-pagador", sendo necessário definir quem paga, como paga, quanto paga e onde paga. Em discussão está também a possibilidade de haver discriminações positivas e criar, por exemplo, a isenção a uma figura ainda a criar de "trânsito local". Vai também ser equacionada a melhor forma de ultrapassar os pesados custos de construção das tradicionais praças de portagens o que, segundo o PÚBLICO apurou, passará por soluções tecnológicas e meios electrónicos, como a Via Verde, ou outros sistemas de rádio.

Modelo penalizante para o Estado

A introdução de portagens em auto-estradas que foram concebidas para não terem custos para o utilizador não recebe nenhuma oposição por parte dos consórcios a quem foram concessionadas, até porque o contrato estabelecido entre eles e o Estado deixou as regras bem definidas. Essas regras foram analisadas pelo Tribunal de Contas há pouco mais de um ano, num auditoria em que este sistema, baptizado pelo próprio tribunal como uma "fuga para o direito privado" foi muito criticado, sobretudo devido ao modelo contratual de partilha de riscos, considerado penalizante para o Estado.

O TC considerou "razoável" que o Estado assuma os riscos de modificação unilateral dos projectos, mas apontou muitas "reservas" o facto de o estado acabar por assumir, com estes contratos, o congelamento do Plano Rodoviário Nacional durante 30 anos. Isto porque o Estado ficou obrigado a compensar financeiramente as concessionárias caso abrisse vias novas e alternativas. Por maioria de razão, terá de fazê-lo caso inclua portagens. Tudo isto porque o contrato assenta em previsões de volume de tráfego - "uma variável exógena que constituiu um risco acrescido para o Estado, que acaba por se reflectir, naturalmente, num preço mais elevado dos contratos a pagar por ele", como acusa o TC. Uma auto-estrada portajada tem menos tráfego, à partida do que uma que não represente custos para o utilizador.

Para além de todos estes aspectos, em matéria de negociação, o Estado está sempre muito fragilizado: "Caso não haja acordo, para além dos compromissos assumidos com as portagens SCUT, o Estado poderá ainda ter de suportar o risco de acumular os pagamentos daquelas portagens com os encargos directos de uma empreitada nacional", pode ler-se no relatório da auditoria do TC.

João Cravinho, o "pai" deste modelo, continua a defendê-lo lembrando que sai mais barato ao Estado a construção em modelo SCUT, em cerca de 25 por cento, do que o método de empreitada nacional, e que é com a introdução de portagens nestas vias, alterando o processo quando ele já está em curso que será mais penalizante.

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