O Comércio do Porto

18-11-2004
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AS TERTÚLIAS DO COMERCIAL

"Guterres vai ser candidato a Belém" SERVIÇOS Imprimir esta página Contactar Anterior Voltar Seguinte

Na segunda noite das "Tertúlias do Comercial" Gomes afirmou que Guterres não abandonará Sócrates:

"É seu filho adoptivo".

PAULA ESTEVES (TEXTOS)

Fernando Gomes considera que a candidatura presidencial de António Guterres é "irreversível".

O ex-ministro socialista diz mais: "Sócrates é uma espécie de filho adoptivo" do antigo chefe de Governo, pelo que o tabu deixa de existir.

Só faria sentido, admite Gomes, questionar o avanço de Guterres se fosse outro o secretário-geral. Com Sócrates "é irreversível".

Gomes falava na qualidade de membro do painel de comentadores das "Tertúlias do Comercial", cuja segunda sessão decorreu na noite de segunda-feira no Palácio da Bolsa, numa organização conjunta da Associação Comercial do Porto (ACP) e do COMÉRCIO.

Os cicerones, Rui Moreira, presidente da ACP, e Rogério Gomes, director do COMÉRCIO, propuseram para a segunda tertúlia deste ciclo o tema da mudança das lideranças no espectro da esquerda portuguesa, para além da integração da Turquia na União Europeia e da discussão em torno do pagamento de portagens nas SCUT.

Ao falar do novo secretário-geral do PS, Gomes não fez transparecer grande entusiasmo, mas garantiu que "Sócrates chegou a líder do PS num momento ideal. Há um Governo desgastado e um calendário eleitoral favorável. Sócrates não vai esperar muito tempo" - garantiu.

Apoiante do novo líder, que contudo o afastou da comissão política nacional, Gomes referiu que "Sócrates foi um ministro com algum sucesso" e beneficia de "uma forte imagem televisiva".

Com recados internos dirigidos à Distrital do PS, o ex-autarca do Porto não deixou de questionar: "Como é possível que as clivagens internas continuem a existir?" Uma pergunta em jeito de desafio ao lembrar que a vitória de Sócrates teve no Porto a expressiva dimensão de 88 por cento.

Os comentadores do painel (para além de Gomes estiveram presentes Alcino Soutinho, Cristina Azevedo e Sílvio Cervan) responderam ao desafio do director do COMÉRCIO para desenvolver o tema da importâncioa primordial do Porto no próximo combate autárquico: "O élan da nova liderança socialista vai ser jogado no distrito e na região" - disse Rogério Gomes.

Rui Moreira partilha deste ponto de vista e para segurar Rui Rio no Porto, ou seja a reeleição do actual "vice" do PSD, o presidente da ACP frisou que o "Governo terá que investir muito".

Apesar de pertencer à área ideológica da coligação governamental, Sílvio Cervan admitiu "estar descrente" em relação a "muitas coisas" praticadas por este Governo e acabou por corroborar a tese do actual secretário-geral do PS: "Santana dá a ideia que está num lugar emprestado" - comentou Cervan.

Avante ortodoxia

A mudança de liderança joga-se também mais à esquerda. Após o anúncio da saída de Carlos Carvalhas do cargo de secretário-geral do PCP, a tertúlia chegou a duas conclusões. Para Sócrates e a par do futuro do PCP, não é igual ter Carvalho da Silva ou Jerónimo de Sousa como o próximo líder eleito pelo Comité Central do partido.

O sentimento maioritário é o de que o PCP não vai ultrapassar a sua própria ortodoxia: "O PCP tem pouca vontade de mudar. Vai continuar na ortodoxia e, sendo assim, talvez o PS disponha aí de mais um nicho de mercado" - resumiu Fernando Gomes.

O palco foi depois para as guerras internas partidárias. Da assistência veio a visão de quem olha a efervescência dos partidos pelo lado de fora. Com propriedade, ou sem ela, alguém referiu: "O PS é, no Porto, um case-study. Era bom que começassem a discutir assuntos que não tenham a ver com eles próprios, só para variar".

A propósito da rotatividade no poder dos dois principais partidos, Rui Moreira não hesitou em salientar: "Caminhamos para a mexicanização do PS e do PSD".

Adesão da Turquia à UE ou o terror do Islão

A tertúlia - saborosa e com aroma a café - abriu com o alargamento da União Europeia para Oriente, concretamente absorvendo o gigante turco.

Das relutâncias mais duras, como as de Sílvio Cervan, que classificou a eventual adesão - cujos trâmites só começarão a ser delineados a partir de 2014-2020 - como "um erro histórico", até à posição de Fernando Gomes, que na tabela do deve e do haver diz-se favorável à adesão da Turquia à UE, a tertúlia proporcionou uma divagação pelos valores históricos, filosóficos e religiosos.

Portugal não tem um posição privilegiada neste domínio. A placa geo-estratégica da Europa, com a adesão da Turquia, irá deslocar-se para Oriente. De acordo com um estudo apresentado por Fernando Gomes, Portugal perde em termos claros. Até há uma percentagem negativa (menos quatro por cento) que estima o que Portugal lucra, depreciativamente, com a entrada da Turquia na UE).

Por isso, Gomes defende a negociação de um novo pacote de apoios, no âmbito do Quadro Comunitário de Apoio para 2007, aproveitando a boleia política dos países nórdicos que não encaram com bons olhos a aproximação à Turquia.

Será que a ameaça do radicalismo islâmico é razão suficiente e poderosa para integrar este colosso, cujos valores ficam tão distantes do sentir e do pensar europeu?

Alguém lançou para a mesa a perspectiva "interesseira" da adesão num aspecto biunívoco.

Sílvio Cervan acentuava: "Não podemos ser mais eurofóbicos do que os eurofóbicos. Há mais de 2000 anos que eles, os turcos, estão do lado de lá". Entre a assistência, o socialista Pedro Baptista gracejava e admitia ver no presidente da Assembleia Municipal de Gaia um cruzado do século XII rumo à Terra Santa.

E em tempo de reabilitação de referendos, Cristina Azevedo e Rogério Gomes deixaram o desafio: "Se calhar já é tarde para decidir, mas será que vamos ter um referendo para votar o alargamento?"

Pagamento das SCUT equivale ao lançamento de novo imposto

Em Portugal "existe unicamente o princípio do pagador-pagador". A frase, proferida por Carlos Abreu Amorim, do Partido Nova Democracia, que participava na discussão do último tema proposto para as "Tertúlias do Comercial" de segunda-feira passada, resumia o rumo da conversa sobre o pagamento de portagens nas polémicas SCUT.

Um assunto que não conhece as fronteiras da esquerda ou da direita e que se justifica, como explicou Fernando Gomes, pela existência de um défice.

"Em vez de lançar mais um imposto, o que seria um escândalo, então o Governo optou por atacar os automobilistas" - disse Gomes.

As contas até estavam feitas pelo deputado socialista: "Em 2004 os automobilistas pagarão seis vezes mais (em impostos sobre os automóveis e sobre o combustível) do que o investimento feito pelo Governo, através do Instituto de Estradas de Portugal, nas vias rodoviárias nacionais" - salientou.

Já antes, Cristina Azevedo estudou o assunto e reflectiu sobre a opção política e de investimento feita ao tempo do ministro da tutela, o socialista João Cravinho.

Ou seja, explicou a técnica, a vantagem teórica de antecipar investimentos em infra-estruturas, recorrendo aos privados, e um claro benefício relativamente aos moldes em que se desenrolam as empreitadas tradicionais com o seu habitual cortejo de acréscimo de custos, são razões suficientes para optar pelas SCUT.

"O que aconteceu de então para cá? Houve engano nas contas? Há dois ou três troços que têm de ser financiados de forma avulsa? Preocupa-me saber o que aconteceu e é isso que não nos explicam" - referiu Cristina Azevedo

Sílvio Cervan tem uma visão crítica: "É profundamente lamentável que este assunto seja politicamente instrumentalizado". Cervan votou a favor do plano de Cravinho que concebia e introduzia o modelo das SCUT no quadro de um plano rodoviário integrado a nível nacional.

O presidente da Associação Comercial do Porto cola este dossier das SCUT às taxas moderadoras e à oscilação das margens de cobrança consoante os rendimentos de cada um.

Face à argumentação de Fernando Gomes, Rui Moreira questionou: "Então pagamos a SCUT três vezes?", referindo que o estafado princípio do utilizador -pagador é invocado a propósito e a despropósito.

Alcino Soutinho rematava: "Agora fico a saber o quanto sou espoliado" e Rogério Gomes colocou uma questão pertinente, que talvez se explique devido à clarificação interna em que o principal partido da oposição tem andado envolvido: "Porque é que a oposição não explica tudo isto?"

Por "isto" entende-se, claro, "as portagens pára-quedistas, exemplo de um modelo falido, de um Estado esgotado" - sublinhou Rui Moreira.

Talvez seja este "um prémio que eles (o Governo) vão dar à oposição" - concluiu.

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O Comércio do Porto é um produto da Editorial Prensa Ibérica.

Fica expressamente proibida a reprodução total ou parcial dos conteúdos oferecidos através deste meio, salvo autorização expressa de O Comércio do Porto

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Na segunda noite das "Tertúlias do Comercial" Gomes afirmou que Guterres não abandonará Sócrates:

"É seu filho adoptivo".

PAULA ESTEVES (TEXTOS)

Fernando Gomes considera que a candidatura presidencial de António Guterres é "irreversível".

O ex-ministro socialista diz mais: "Sócrates é uma espécie de filho adoptivo" do antigo chefe de Governo, pelo que o tabu deixa de existir.

Só faria sentido, admite Gomes, questionar o avanço de Guterres se fosse outro o secretário-geral. Com Sócrates "é irreversível".

Gomes falava na qualidade de membro do painel de comentadores das "Tertúlias do Comercial", cuja segunda sessão decorreu na noite de segunda-feira no Palácio da Bolsa, numa organização conjunta da Associação Comercial do Porto (ACP) e do COMÉRCIO.

Os cicerones, Rui Moreira, presidente da ACP, e Rogério Gomes, director do COMÉRCIO, propuseram para a segunda tertúlia deste ciclo o tema da mudança das lideranças no espectro da esquerda portuguesa, para além da integração da Turquia na União Europeia e da discussão em torno do pagamento de portagens nas SCUT.

Ao falar do novo secretário-geral do PS, Gomes não fez transparecer grande entusiasmo, mas garantiu que "Sócrates chegou a líder do PS num momento ideal. Há um Governo desgastado e um calendário eleitoral favorável. Sócrates não vai esperar muito tempo" - garantiu.

Apoiante do novo líder, que contudo o afastou da comissão política nacional, Gomes referiu que "Sócrates foi um ministro com algum sucesso" e beneficia de "uma forte imagem televisiva".

Com recados internos dirigidos à Distrital do PS, o ex-autarca do Porto não deixou de questionar: "Como é possível que as clivagens internas continuem a existir?" Uma pergunta em jeito de desafio ao lembrar que a vitória de Sócrates teve no Porto a expressiva dimensão de 88 por cento.

Os comentadores do painel (para além de Gomes estiveram presentes Alcino Soutinho, Cristina Azevedo e Sílvio Cervan) responderam ao desafio do director do COMÉRCIO para desenvolver o tema da importâncioa primordial do Porto no próximo combate autárquico: "O élan da nova liderança socialista vai ser jogado no distrito e na região" - disse Rogério Gomes.

Rui Moreira partilha deste ponto de vista e para segurar Rui Rio no Porto, ou seja a reeleição do actual "vice" do PSD, o presidente da ACP frisou que o "Governo terá que investir muito".

Apesar de pertencer à área ideológica da coligação governamental, Sílvio Cervan admitiu "estar descrente" em relação a "muitas coisas" praticadas por este Governo e acabou por corroborar a tese do actual secretário-geral do PS: "Santana dá a ideia que está num lugar emprestado" - comentou Cervan.

Avante ortodoxia

A mudança de liderança joga-se também mais à esquerda. Após o anúncio da saída de Carlos Carvalhas do cargo de secretário-geral do PCP, a tertúlia chegou a duas conclusões. Para Sócrates e a par do futuro do PCP, não é igual ter Carvalho da Silva ou Jerónimo de Sousa como o próximo líder eleito pelo Comité Central do partido.

O sentimento maioritário é o de que o PCP não vai ultrapassar a sua própria ortodoxia: "O PCP tem pouca vontade de mudar. Vai continuar na ortodoxia e, sendo assim, talvez o PS disponha aí de mais um nicho de mercado" - resumiu Fernando Gomes.

O palco foi depois para as guerras internas partidárias. Da assistência veio a visão de quem olha a efervescência dos partidos pelo lado de fora. Com propriedade, ou sem ela, alguém referiu: "O PS é, no Porto, um case-study. Era bom que começassem a discutir assuntos que não tenham a ver com eles próprios, só para variar".

A propósito da rotatividade no poder dos dois principais partidos, Rui Moreira não hesitou em salientar: "Caminhamos para a mexicanização do PS e do PSD".

Adesão da Turquia à UE ou o terror do Islão

A tertúlia - saborosa e com aroma a café - abriu com o alargamento da União Europeia para Oriente, concretamente absorvendo o gigante turco.

Das relutâncias mais duras, como as de Sílvio Cervan, que classificou a eventual adesão - cujos trâmites só começarão a ser delineados a partir de 2014-2020 - como "um erro histórico", até à posição de Fernando Gomes, que na tabela do deve e do haver diz-se favorável à adesão da Turquia à UE, a tertúlia proporcionou uma divagação pelos valores históricos, filosóficos e religiosos.

Portugal não tem um posição privilegiada neste domínio. A placa geo-estratégica da Europa, com a adesão da Turquia, irá deslocar-se para Oriente. De acordo com um estudo apresentado por Fernando Gomes, Portugal perde em termos claros. Até há uma percentagem negativa (menos quatro por cento) que estima o que Portugal lucra, depreciativamente, com a entrada da Turquia na UE).

Por isso, Gomes defende a negociação de um novo pacote de apoios, no âmbito do Quadro Comunitário de Apoio para 2007, aproveitando a boleia política dos países nórdicos que não encaram com bons olhos a aproximação à Turquia.

Será que a ameaça do radicalismo islâmico é razão suficiente e poderosa para integrar este colosso, cujos valores ficam tão distantes do sentir e do pensar europeu?

Alguém lançou para a mesa a perspectiva "interesseira" da adesão num aspecto biunívoco.

Sílvio Cervan acentuava: "Não podemos ser mais eurofóbicos do que os eurofóbicos. Há mais de 2000 anos que eles, os turcos, estão do lado de lá". Entre a assistência, o socialista Pedro Baptista gracejava e admitia ver no presidente da Assembleia Municipal de Gaia um cruzado do século XII rumo à Terra Santa.

E em tempo de reabilitação de referendos, Cristina Azevedo e Rogério Gomes deixaram o desafio: "Se calhar já é tarde para decidir, mas será que vamos ter um referendo para votar o alargamento?"

Pagamento das SCUT equivale ao lançamento de novo imposto

Em Portugal "existe unicamente o princípio do pagador-pagador". A frase, proferida por Carlos Abreu Amorim, do Partido Nova Democracia, que participava na discussão do último tema proposto para as "Tertúlias do Comercial" de segunda-feira passada, resumia o rumo da conversa sobre o pagamento de portagens nas polémicas SCUT.

Um assunto que não conhece as fronteiras da esquerda ou da direita e que se justifica, como explicou Fernando Gomes, pela existência de um défice.

"Em vez de lançar mais um imposto, o que seria um escândalo, então o Governo optou por atacar os automobilistas" - disse Gomes.

As contas até estavam feitas pelo deputado socialista: "Em 2004 os automobilistas pagarão seis vezes mais (em impostos sobre os automóveis e sobre o combustível) do que o investimento feito pelo Governo, através do Instituto de Estradas de Portugal, nas vias rodoviárias nacionais" - salientou.

Já antes, Cristina Azevedo estudou o assunto e reflectiu sobre a opção política e de investimento feita ao tempo do ministro da tutela, o socialista João Cravinho.

Ou seja, explicou a técnica, a vantagem teórica de antecipar investimentos em infra-estruturas, recorrendo aos privados, e um claro benefício relativamente aos moldes em que se desenrolam as empreitadas tradicionais com o seu habitual cortejo de acréscimo de custos, são razões suficientes para optar pelas SCUT.

"O que aconteceu de então para cá? Houve engano nas contas? Há dois ou três troços que têm de ser financiados de forma avulsa? Preocupa-me saber o que aconteceu e é isso que não nos explicam" - referiu Cristina Azevedo

Sílvio Cervan tem uma visão crítica: "É profundamente lamentável que este assunto seja politicamente instrumentalizado". Cervan votou a favor do plano de Cravinho que concebia e introduzia o modelo das SCUT no quadro de um plano rodoviário integrado a nível nacional.

O presidente da Associação Comercial do Porto cola este dossier das SCUT às taxas moderadoras e à oscilação das margens de cobrança consoante os rendimentos de cada um.

Face à argumentação de Fernando Gomes, Rui Moreira questionou: "Então pagamos a SCUT três vezes?", referindo que o estafado princípio do utilizador -pagador é invocado a propósito e a despropósito.

Alcino Soutinho rematava: "Agora fico a saber o quanto sou espoliado" e Rogério Gomes colocou uma questão pertinente, que talvez se explique devido à clarificação interna em que o principal partido da oposição tem andado envolvido: "Porque é que a oposição não explica tudo isto?"

Por "isto" entende-se, claro, "as portagens pára-quedistas, exemplo de um modelo falido, de um Estado esgotado" - sublinhou Rui Moreira.

Talvez seja este "um prémio que eles (o Governo) vão dar à oposição" - concluiu.

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