EXPRESSO: País

01-09-2002
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Políticos não isolam Savimbi A COMUNIDADE internacional em geral condenou o brutal ataque contra um comboio em Senza do Itombe, Angola, reivindicado pela UNITA, em que foram chacinadas mais de 300 pessoas, como tinha condenado, em Maio, o ataque contra a cidade de Caxito, e não deixará de condenar a emboscada e destruição, esta semana, de um autocarro civil e a morte de 50 dos passageiros. O Governo angolano quer que o líder histórico da UNITA , Jonas Savimbi, seja responsabilizado por estes crimes, preso e julgado por um Tribunal Penal Internacional. Perante o silêncio do Governo e das forças políticas portuguesas, que não reagiram nem às notícias dos atentados, nem à proposta de Luanda, o EXPRESSO colocou directamente a questão do eventual julgamento de Savimbi por crimes de guerra a um grupo de personalidades políticas, de vários partidos. Com excepção de João Soares, ninguém encontra atenuantes para estes actos de terrorismo, mas todos se recusam a aplicar a Savimbi o rótulo de criminoso de guerra Luiz Carvalho Jonas Savimbi visita João Soares, internado num hospital de Lisboa, em 1991, na sequência do acidente de avião na Jamba CONFRONTADO com a questão, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Jaime Gama, reitera, através do seu porta-voz autorizado, Horácio César, aquilo que já se sabia, que «Portugal sempre tem defendido uma solução política para alcançar a paz em Angola» e que «o completamento dos acordos de paz e do Protocolo de Lusaka é a via mais adequada para atingir esse fim». A ideia de constituição de um Tribunal Penal Internacional destinado a julgar Jonas Savimbi e os generais da UNITA não faz grande sentido para Jaime Gama. CONFRONTADO com a questão, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Jaime Gama, reitera, através do seu porta-voz autorizado, Horácio César, aquilo que já se sabia, quee que. A ideia de constituição de um Tribunal Penal Internacional destinado a julgar Jonas Savimbi e os generais da UNITA não faz grande sentido para Jaime Gama. Na opinião do titular da pasta dos Negócios Estrangeiros, «estando em curso o processo internacional de ratificação do Tribunal Penal Internacional, a sua entrada em vigor fará precluir a formação de tribunais 'ad hoc', nesse domínio». O que equivale a dizer que, a haver julgamento, ele não deverá ser realizado por um tribunal exclusivamente constituído para a questão angolana, mas por um tribunal único, que julgue os crimes cometidos em todo o mundo. PSD pela negociação Em sintonia com Gama está Marques Mendes, presidente da comissão parlamentar dos Negócios Estrangeiros. O deputado do PSD diz que «a paz em Angola passa por uma solução política», que terá de ser «construída pelos angolanos, na base de um compromisso corajoso, envolvendo as partes em conflito e os militares de ambos os lados, com a ajuda, sempre que necessária, da comunidade internacional». O dirigente social-democrata considera fundamental o cumprimento integral dos acordos de Bicesse e Lusaka, «por mais difícil que seja e por maior paciência e persistência que exija». E diz que a que a criação de um TPI 'ad-hoc', específico para Angola, «não faz sentido», uma vez que se prevê que o futuro Tribunal Penal Internacional entre «em funcionamento até 2004». Soares e a 3ª Via João Soares considera que a paz em Angola «só pode construir-se, na liberdade, na tolerância, no respeito pela diferença, na capacidade de aceitar o outro». Em sua opinião, «ver o líder de um partido beligerante reclamar um tribunal internacional para julgar o outro só pode ser, para além da mais amarga das ironias (que não poderá senão virar-se contra o proponente) mais uma erupção do velho maniqueísmo intolerante». O presidente da Câmara de Lisboa lembra que foi o Congresso do MPLA que decidiu, há dois anos, «retomar a guerra, em nome da extensão da responsabilidade da administração ao todo do território nacional angolano» e recorda as ameaças de morte que pairam sobre Savimbi, para quem «é tempo de admitir a necessidade de encontrar um espaço, de segurança pessoal e de liberdade política». Embora reconhecendo que o líder da UNITA tem «manchas de sangue nas mãos», João Soares pergunta-se: «Quem as não tem em Angola?» E recorda que «no fim-de-semana em que foi esmagada a revolta de Nito Alves foram mortas mais pessoas, nas ruas de Luanda, do que nos 13 anos de guerra colonial». Concluindo que «o caminho do ressentimento e da vingança só pode levar a mais guerra», João Soares manifesta-se a favor de uma terceira via, propondo que «se reconheça a quadros com a qualidade intelectual e a fibra de Lukamba Gato, Alcides Sakala, Bock ou Dembo, o direito de exercerem actividade política em liberdade». E sugere a Savimbi que não se candidate também às Presidenciais, optando ambos - ele e José Eduardo dos Santos - por seguir o conselho de escreverem as suas memórias. «Pode ser que assim os angolanos lhes perdoem». Portas com a Igreja Na opinião do líder do PP, «José Eduardo dos Santos é a última pessoa neste mundo com autoridade para falar em responsabilidade penal de alguém quanto à destruição de um povo e de uma nação». «Tudo o que eu acho que Portugal e os políticos portugueses devem fazer», diz Paulo Portas, «é encorajar todas as iniciativas de paz da Igreja católica e da sociedade civil angolana e não contribuir para extremar uma situação que só traz a desgraça ao povo angolano». PCP não concorda «Não creio que seja esse o caminho», ajuíza o dirigente comunista Albano Nunes, ressalvando todavia que «a ideia permite chamar a atenção para a actual duplicidade de critérios e preocupações em matéria da controversa criação e actuação de tribunais penais internacionais. Mas pouco mais que isso». Solidário com o MPLA, como é já costume, o PCP considera que «já não seria mau que as sanções e isolamento político decididos pela ONU contra a UNITA fossem efectivamente aplicados». Monteiro e os outros Manuel Monteiro assume-se contrário, por princípio, à existência de vários TPI, que em sua opinião põem em causa o funcionamento dos ordenamentos jurídicos nacionais dos Estados soberanos. «A proliferação de TPI», ajuíza, «pode ser claramente perigosa para o entendimento do que é ou não a justiça». Quanto à questão concreta de Angola, o ex-líder do CDS, confessa-se dividido: «Não nego a defesa pública que sempre fiz de uma solução que pusesse à mesma mesa a UNITA. Mas não posso aceitar o que foi feito no ataque ao comboio - uma coisa é a guerra, outra actos de terrorismo.» Monteiro conclui que, «se um dia Savimbi fosse a julgamento, talvez não devesse estar lá sozinho: outros líderes africanos deveriam acompanhá-lo e se calhar também o próprio Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos». BE pela justiça total Luís Fazenda,dirigente do Bloco de Esquerda, é a favor dos TPI, desde que sejam «para julgar todos os crimes contra a humanidade, praticados por todos os beligerantes em Angola». Repudiando embora «os atentados especialmente bárbaros da UNITA», que deverá ser condenada por não cumprir as resoluções da ONU, o dirigente bloquista diz que, «para criar um TPI, terá primeiro de ser feito um levantamento de tudo o que aconteceu em Angola nestes anos, de forma a que não seja um tribunal meramente para os vencedores».

ORLANDO RAIMUNDO, ANA PAULA AZEVEDO, CRISTINA FIGUEIREDO e NICOLE GUARDIOLA

52% dos portugueses pensam que Portugal se deveria empenhar na resolução do conflito angolano como fez em Timor. Ainda assim, 39% acham que não o deveria fazer. Dados que resultam da consulta de Agosto ao Painel EXPRESSO/Euroexpansão

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Políticos não isolam Savimbi A COMUNIDADE internacional em geral condenou o brutal ataque contra um comboio em Senza do Itombe, Angola, reivindicado pela UNITA, em que foram chacinadas mais de 300 pessoas, como tinha condenado, em Maio, o ataque contra a cidade de Caxito, e não deixará de condenar a emboscada e destruição, esta semana, de um autocarro civil e a morte de 50 dos passageiros. O Governo angolano quer que o líder histórico da UNITA , Jonas Savimbi, seja responsabilizado por estes crimes, preso e julgado por um Tribunal Penal Internacional. Perante o silêncio do Governo e das forças políticas portuguesas, que não reagiram nem às notícias dos atentados, nem à proposta de Luanda, o EXPRESSO colocou directamente a questão do eventual julgamento de Savimbi por crimes de guerra a um grupo de personalidades políticas, de vários partidos. Com excepção de João Soares, ninguém encontra atenuantes para estes actos de terrorismo, mas todos se recusam a aplicar a Savimbi o rótulo de criminoso de guerra Luiz Carvalho Jonas Savimbi visita João Soares, internado num hospital de Lisboa, em 1991, na sequência do acidente de avião na Jamba CONFRONTADO com a questão, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Jaime Gama, reitera, através do seu porta-voz autorizado, Horácio César, aquilo que já se sabia, que «Portugal sempre tem defendido uma solução política para alcançar a paz em Angola» e que «o completamento dos acordos de paz e do Protocolo de Lusaka é a via mais adequada para atingir esse fim». A ideia de constituição de um Tribunal Penal Internacional destinado a julgar Jonas Savimbi e os generais da UNITA não faz grande sentido para Jaime Gama. CONFRONTADO com a questão, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Jaime Gama, reitera, através do seu porta-voz autorizado, Horácio César, aquilo que já se sabia, quee que. A ideia de constituição de um Tribunal Penal Internacional destinado a julgar Jonas Savimbi e os generais da UNITA não faz grande sentido para Jaime Gama. Na opinião do titular da pasta dos Negócios Estrangeiros, «estando em curso o processo internacional de ratificação do Tribunal Penal Internacional, a sua entrada em vigor fará precluir a formação de tribunais 'ad hoc', nesse domínio». O que equivale a dizer que, a haver julgamento, ele não deverá ser realizado por um tribunal exclusivamente constituído para a questão angolana, mas por um tribunal único, que julgue os crimes cometidos em todo o mundo. PSD pela negociação Em sintonia com Gama está Marques Mendes, presidente da comissão parlamentar dos Negócios Estrangeiros. O deputado do PSD diz que «a paz em Angola passa por uma solução política», que terá de ser «construída pelos angolanos, na base de um compromisso corajoso, envolvendo as partes em conflito e os militares de ambos os lados, com a ajuda, sempre que necessária, da comunidade internacional». O dirigente social-democrata considera fundamental o cumprimento integral dos acordos de Bicesse e Lusaka, «por mais difícil que seja e por maior paciência e persistência que exija». E diz que a que a criação de um TPI 'ad-hoc', específico para Angola, «não faz sentido», uma vez que se prevê que o futuro Tribunal Penal Internacional entre «em funcionamento até 2004». Soares e a 3ª Via João Soares considera que a paz em Angola «só pode construir-se, na liberdade, na tolerância, no respeito pela diferença, na capacidade de aceitar o outro». Em sua opinião, «ver o líder de um partido beligerante reclamar um tribunal internacional para julgar o outro só pode ser, para além da mais amarga das ironias (que não poderá senão virar-se contra o proponente) mais uma erupção do velho maniqueísmo intolerante». O presidente da Câmara de Lisboa lembra que foi o Congresso do MPLA que decidiu, há dois anos, «retomar a guerra, em nome da extensão da responsabilidade da administração ao todo do território nacional angolano» e recorda as ameaças de morte que pairam sobre Savimbi, para quem «é tempo de admitir a necessidade de encontrar um espaço, de segurança pessoal e de liberdade política». Embora reconhecendo que o líder da UNITA tem «manchas de sangue nas mãos», João Soares pergunta-se: «Quem as não tem em Angola?» E recorda que «no fim-de-semana em que foi esmagada a revolta de Nito Alves foram mortas mais pessoas, nas ruas de Luanda, do que nos 13 anos de guerra colonial». Concluindo que «o caminho do ressentimento e da vingança só pode levar a mais guerra», João Soares manifesta-se a favor de uma terceira via, propondo que «se reconheça a quadros com a qualidade intelectual e a fibra de Lukamba Gato, Alcides Sakala, Bock ou Dembo, o direito de exercerem actividade política em liberdade». E sugere a Savimbi que não se candidate também às Presidenciais, optando ambos - ele e José Eduardo dos Santos - por seguir o conselho de escreverem as suas memórias. «Pode ser que assim os angolanos lhes perdoem». Portas com a Igreja Na opinião do líder do PP, «José Eduardo dos Santos é a última pessoa neste mundo com autoridade para falar em responsabilidade penal de alguém quanto à destruição de um povo e de uma nação». «Tudo o que eu acho que Portugal e os políticos portugueses devem fazer», diz Paulo Portas, «é encorajar todas as iniciativas de paz da Igreja católica e da sociedade civil angolana e não contribuir para extremar uma situação que só traz a desgraça ao povo angolano». PCP não concorda «Não creio que seja esse o caminho», ajuíza o dirigente comunista Albano Nunes, ressalvando todavia que «a ideia permite chamar a atenção para a actual duplicidade de critérios e preocupações em matéria da controversa criação e actuação de tribunais penais internacionais. Mas pouco mais que isso». Solidário com o MPLA, como é já costume, o PCP considera que «já não seria mau que as sanções e isolamento político decididos pela ONU contra a UNITA fossem efectivamente aplicados». Monteiro e os outros Manuel Monteiro assume-se contrário, por princípio, à existência de vários TPI, que em sua opinião põem em causa o funcionamento dos ordenamentos jurídicos nacionais dos Estados soberanos. «A proliferação de TPI», ajuíza, «pode ser claramente perigosa para o entendimento do que é ou não a justiça». Quanto à questão concreta de Angola, o ex-líder do CDS, confessa-se dividido: «Não nego a defesa pública que sempre fiz de uma solução que pusesse à mesma mesa a UNITA. Mas não posso aceitar o que foi feito no ataque ao comboio - uma coisa é a guerra, outra actos de terrorismo.» Monteiro conclui que, «se um dia Savimbi fosse a julgamento, talvez não devesse estar lá sozinho: outros líderes africanos deveriam acompanhá-lo e se calhar também o próprio Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos». BE pela justiça total Luís Fazenda,dirigente do Bloco de Esquerda, é a favor dos TPI, desde que sejam «para julgar todos os crimes contra a humanidade, praticados por todos os beligerantes em Angola». Repudiando embora «os atentados especialmente bárbaros da UNITA», que deverá ser condenada por não cumprir as resoluções da ONU, o dirigente bloquista diz que, «para criar um TPI, terá primeiro de ser feito um levantamento de tudo o que aconteceu em Angola nestes anos, de forma a que não seja um tribunal meramente para os vencedores».

ORLANDO RAIMUNDO, ANA PAULA AZEVEDO, CRISTINA FIGUEIREDO e NICOLE GUARDIOLA

52% dos portugueses pensam que Portugal se deveria empenhar na resolução do conflito angolano como fez em Timor. Ainda assim, 39% acham que não o deveria fazer. Dados que resultam da consulta de Agosto ao Painel EXPRESSO/Euroexpansão

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