3, 2, 1... Strindbergs voando dentro de malas

08-06-2003
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3, 2, 1... Strindbergs Voando Dentro de Malas

Sexta-feira, 23 de Maio de 2003

%Joana Gorjão Henriques

Parte-se de um triângulo amoroso, passa-se por um duelo masculino e termina-se num monólogo feminino. Estamos a falar de três peças de August Strindberg. A primeira, "Credores", estreia hoje em Coimbra, e põe em cena três personagens, dois homens e uma mulher: o triângulo é manipulado por um deles.

Mas isto é só o princípio do projecto de um novo grupo, a Mala Voadora. O actor Jorge Andrade e o arquitecto José Capela (responsável pela concepção plástica) são os seus directores artísticos.

E o que leva na bagagem este grupo sediado em Lisboa? Por agora, leva o triângulo amoroso de "Credores", que começa por misturar tragédia e comédia mas que acaba tragicamente; alguns dos convidados - entre eles, o encenador Rogério de Carvalho e os actores Anabela Almeida e Manuel Wiborg. E a promessa de mais tarde apresentar um espectáculo único, que viajará pelo país, a partir deste texto e outros dois ("Pária", o tal duelo masculino, e "A Mais Forte", o monólogo em que Isabel Castro vai aparecer como um vulto - peças do já citado Strindberg, que não serão encenadas por Rogério de Carvalho mas "coordenadas" por Jorge Andrade).

Numa mala não cabe o mundo, cabem poucas coisas: um cenário despojado, um elenco mínimo (o minimalismo nasce do "carácter conciso do teatro de Strindberg") que permutarão de espectáculo para espectáculo. Uma mala é pequena: a relação com o espectador será de proximidade.

Convidar actores, encenadores, artistas plásticos, e outros faz parte do espírito desta estrutura de produção com um nome lírico, que vai funcionar como um "laboratório". Dentro da mala, guardam experiências que vão coleccionando. "Estive vários anos no Teatro da Garagem, apeteceu-me fazer uma coisa completamente diferente", diz Jorge Andrade, quando lhe perguntamos: porquê aquele encenador, porquê Strindberg? "Há muito tempo que tinha vontade de trabalhar com Rogério de Carvalho. Era o tipo de texto para ele".

O dramaturgo sueco aparece via Manuel Wiborg, que teve nas mãos "A Menina Júlia" (Andrade foi assistente de encenação no último espectáculo de Wiborg, que através da APA co-produz a trilogia, com a Casa das Artes de Famalicão). "Comecei a ler as peças, 'Credores' foi aquela de que gostei mais. Apeteceu-nos fazer as três. Interessa-nos mais os conflitos e as tensões do que propriamente a história." A culpa, a expiação, o ajuste de contas, as relações de poder, são algumas das linhas que desenham um teatro que se centra no interior das personagens e na tensão e conflito que surge das suas relações (sem moralizar, defendem). E que exige do actor um tipo de representação que é novo para Jorge Andrade. "Tive vontade de trabalhar com Rogério de Carvalho porque ele é de um rigor na construção psicológica das personagens.... Agradou-me que ele chegasse aos ensaios sem ter uma ideia definida, encontrámos um caminho com ele. Faz um trabalho muito exaustivo: trabalha com aquele actor, que tem aquele corpo, aquela voz para, a partir daí, encontrar aquilo que acontece entre o actor e o texto", acrescenta. José Capela continua: "Ele não é nada determinista a trabalhar o texto, que para ele é uma espécie de base cuja resolução passa pelo trabalho dos actores. Permite aos actores ir descobrindo as personagens. É brilhante na direcção de actores. Faz um trabalho muito formativo." Autor do cenário e dos figurinos, José Capela fala de um anulamento de estilo - não interessava reconstruir a época (século XIX): "O facto do tema ser universal, dá-nos uma enorme liberdade. Não é preciso comprometermo-nos com nada."

Paralelamente à construção de espectáculos, a Mala Voadora tem programas para adolescentes, em parceria com escolas e autarquias. No final, seguem viagem para mais um voo: Coimbra (a Capital Nacional da Cultura é co-produtora de "Credores"), Famalicão, Paredes de Coura, Idanha-a-Nova, Porto, Faro e Lisboa são as paragens previstas.

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Sexta-feira, 23 de Maio de 2003

%Joana Gorjão Henriques

Parte-se de um triângulo amoroso, passa-se por um duelo masculino e termina-se num monólogo feminino. Estamos a falar de três peças de August Strindberg. A primeira, "Credores", estreia hoje em Coimbra, e põe em cena três personagens, dois homens e uma mulher: o triângulo é manipulado por um deles.

Mas isto é só o princípio do projecto de um novo grupo, a Mala Voadora. O actor Jorge Andrade e o arquitecto José Capela (responsável pela concepção plástica) são os seus directores artísticos.

E o que leva na bagagem este grupo sediado em Lisboa? Por agora, leva o triângulo amoroso de "Credores", que começa por misturar tragédia e comédia mas que acaba tragicamente; alguns dos convidados - entre eles, o encenador Rogério de Carvalho e os actores Anabela Almeida e Manuel Wiborg. E a promessa de mais tarde apresentar um espectáculo único, que viajará pelo país, a partir deste texto e outros dois ("Pária", o tal duelo masculino, e "A Mais Forte", o monólogo em que Isabel Castro vai aparecer como um vulto - peças do já citado Strindberg, que não serão encenadas por Rogério de Carvalho mas "coordenadas" por Jorge Andrade).

Numa mala não cabe o mundo, cabem poucas coisas: um cenário despojado, um elenco mínimo (o minimalismo nasce do "carácter conciso do teatro de Strindberg") que permutarão de espectáculo para espectáculo. Uma mala é pequena: a relação com o espectador será de proximidade.

Convidar actores, encenadores, artistas plásticos, e outros faz parte do espírito desta estrutura de produção com um nome lírico, que vai funcionar como um "laboratório". Dentro da mala, guardam experiências que vão coleccionando. "Estive vários anos no Teatro da Garagem, apeteceu-me fazer uma coisa completamente diferente", diz Jorge Andrade, quando lhe perguntamos: porquê aquele encenador, porquê Strindberg? "Há muito tempo que tinha vontade de trabalhar com Rogério de Carvalho. Era o tipo de texto para ele".

O dramaturgo sueco aparece via Manuel Wiborg, que teve nas mãos "A Menina Júlia" (Andrade foi assistente de encenação no último espectáculo de Wiborg, que através da APA co-produz a trilogia, com a Casa das Artes de Famalicão). "Comecei a ler as peças, 'Credores' foi aquela de que gostei mais. Apeteceu-nos fazer as três. Interessa-nos mais os conflitos e as tensões do que propriamente a história." A culpa, a expiação, o ajuste de contas, as relações de poder, são algumas das linhas que desenham um teatro que se centra no interior das personagens e na tensão e conflito que surge das suas relações (sem moralizar, defendem). E que exige do actor um tipo de representação que é novo para Jorge Andrade. "Tive vontade de trabalhar com Rogério de Carvalho porque ele é de um rigor na construção psicológica das personagens.... Agradou-me que ele chegasse aos ensaios sem ter uma ideia definida, encontrámos um caminho com ele. Faz um trabalho muito exaustivo: trabalha com aquele actor, que tem aquele corpo, aquela voz para, a partir daí, encontrar aquilo que acontece entre o actor e o texto", acrescenta. José Capela continua: "Ele não é nada determinista a trabalhar o texto, que para ele é uma espécie de base cuja resolução passa pelo trabalho dos actores. Permite aos actores ir descobrindo as personagens. É brilhante na direcção de actores. Faz um trabalho muito formativo." Autor do cenário e dos figurinos, José Capela fala de um anulamento de estilo - não interessava reconstruir a época (século XIX): "O facto do tema ser universal, dá-nos uma enorme liberdade. Não é preciso comprometermo-nos com nada."

Paralelamente à construção de espectáculos, a Mala Voadora tem programas para adolescentes, em parceria com escolas e autarquias. No final, seguem viagem para mais um voo: Coimbra (a Capital Nacional da Cultura é co-produtora de "Credores"), Famalicão, Paredes de Coura, Idanha-a-Nova, Porto, Faro e Lisboa são as paragens previstas.

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