O Acossado

17-11-2004
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Segunda-feira, 15 de Novembro de 2004 O poder estraga a vida aos "enfants terribles": Santana Lopes chorou-se durante três dias em Barcelos e no congresso da consagração respirava-se um clima de fim de ciclo. Não se deve menosprezar Pedro Santana Lopes, mas Santana Lopes desprezou-se muito em Barcelos e o povo social-democrata, habituado a prezá-lo, alheou-se. Por Ana Sá Lopes Defensivo, choroso, vítima permanente de ofensas cabalísticas - foi este Santana Lopes que apareceu em Barcelos, um dos congressos onde menos conseguiu entusiasmar as bases do PSD. No congresso da consagração, onde foi eleito por mais de 80 por cento dos votos, o incendiário-mor dos conclaves do PSD deixou o partido várias vezes absorto, longe do entusiasmo que provocava nos tempos em que, sozinho, lançava ofensivas em todas as direcções (e contra todas as direcções). É um líder partidário obcecado com as críticas dos comentadores e dos opositores internos, a quem acusa de perseguição "ad hominen". O Orçamento do Estado para 2005, afirma repetidas vezes, não seria um alvo se fosse assinado por Durão Barroso. Faz, de resto, um desafio brutal a Marques Mendes: "Não me passa pela cabeça que alguém que tenha carácter possa aprovar o orçamento se considerar que atenta contra o rumo fundamental que o país deve seguir." A este desafio sucede um suspiro, repetido em várias modulações durante todo o Congresso: "É muito difícil governar um país nos tempos de hoje." O homem sofre e ninguém o percebe, nem percebe a sua solidão. Por exemplo - "Muitas vezes um primeiro-ministro tem que viver momentos sozinho, que dizem respeito à segurança dos cidadãos e só os pode partilhar com o Presidente da República...". É um primeiro-ministro que precisa de dizer que manda no Governo. Repete-o uma e outra vez, sofrido. "A generalidade das decisões que foram tomadas foram primeiramente da minha responsabilidade"; "Só os inconscientes podem admitir que haja um primeiro-ministro que faça declarações sobre política fiscal sem articular com o ministro das Finanças", afirma, numa urgência, rara num primeiro-ministro, em provar que tem poder e autoridade. Antes disto, já o ministro-adjunto Henrique Chaves tinha proclamado: "Muito difícil tem sido para nós o momento que atravessamos" e "nunca antes um governo foi objecto de tão feroz tentativa de ataque e destruição". O homem que anuncia querer governar até 2014 está frágil e só, embora não tenha real oposição interna e Marques Mendes tenha vindo apenas servir de escape. No final, Lopes justifica as angústias: lembra que "o poder é algo efémero" e que "acima de tudo somos seres humanos, que temos família, amigos, choramos, rimos, entristecemo-nos". "Grande luso pequenino" Portugal, Portugal, geração Portugal, orgulho, pátria. Com Lopes, as expressões patrióticas repetem-se à exaustão e sempre foi assim. Para Barcelos, a organização inventou um hino dedicado ao novo líder que eleva o ênfase patrioteiro a limites ainda não antes atingidos (no PSD). Portugal é "o grande luso pequenino", "nós" (o PSD, o país?) "somos actores da História, de coragem e glórias, pátrio orgulho do passado abraçado pelo mar", e Santana Lopes "é a voz na vanguarda do futuro de norte a sul de todos nós". Os congressistas foram azucrinados com o novo hino, uma inovação a que se juntou também a "Lusitana Paixão", interpretada por Dulce Pontes: "Não condeno essa paixão/essa mágoa nas palavras/ que a guitarra vai gemendo...". No discurso final, Santana leva a voragem patriótica ao ponto de quase anular as diferenças entre PSD e PS - "não há caminhos muito separados para conduzir a sociedade" e, afinal, estar num lado ou noutro "é querer o bem de Portugal". O linguajar apela aos sentimentos primitivos, mas algo não passa. Por mais de uma vez, Santana Lopes recorda que o PSD "nasceu das entranhas deste povo" e por várias vezes recorda e estimula a comparação com o "único ídolo que teve", para lá das "pessoas da família", Francisco Sá Carneiro. (Nesse "paralelismo" incentivado por Santana e por outros delegados, António Preto, presidente da distrital de Lisboa, chegou a comparar as críticas de que foi alvo Sá Carneiro por, ainda casado, viver em união de facto com Snu Abecasis, com os ataques feitos à "vida pessoal" de Santana Lopes). Mas, em Barcelos, os delegados que aplaudem Santana Lopes não ficam toldados pela emoção que, em anteriores congressos, o agora líder e primeiro-ministro lhes provocou, quando era um "enfant terrible" que afrontava as estratégias instaladas. Mal Lopes acaba de falar e termina o hino nacional, começa a debandada de delegados para fora do pavilhão de Barcelos, nem o congresso tinha sido ainda encerrado. O poder pode matar os "enfants terribles". OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Hipótese de nova AD ameaça liderança de Santana Lopes

"Quero um país que vá subindo no seu astral"

Primeiro-ministro quer governar até 2014

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Comissão política nacional

Sociais-democratas do Porto numa encruzilhada

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Segunda-feira, 15 de Novembro de 2004 O poder estraga a vida aos "enfants terribles": Santana Lopes chorou-se durante três dias em Barcelos e no congresso da consagração respirava-se um clima de fim de ciclo. Não se deve menosprezar Pedro Santana Lopes, mas Santana Lopes desprezou-se muito em Barcelos e o povo social-democrata, habituado a prezá-lo, alheou-se. Por Ana Sá Lopes Defensivo, choroso, vítima permanente de ofensas cabalísticas - foi este Santana Lopes que apareceu em Barcelos, um dos congressos onde menos conseguiu entusiasmar as bases do PSD. No congresso da consagração, onde foi eleito por mais de 80 por cento dos votos, o incendiário-mor dos conclaves do PSD deixou o partido várias vezes absorto, longe do entusiasmo que provocava nos tempos em que, sozinho, lançava ofensivas em todas as direcções (e contra todas as direcções). É um líder partidário obcecado com as críticas dos comentadores e dos opositores internos, a quem acusa de perseguição "ad hominen". O Orçamento do Estado para 2005, afirma repetidas vezes, não seria um alvo se fosse assinado por Durão Barroso. Faz, de resto, um desafio brutal a Marques Mendes: "Não me passa pela cabeça que alguém que tenha carácter possa aprovar o orçamento se considerar que atenta contra o rumo fundamental que o país deve seguir." A este desafio sucede um suspiro, repetido em várias modulações durante todo o Congresso: "É muito difícil governar um país nos tempos de hoje." O homem sofre e ninguém o percebe, nem percebe a sua solidão. Por exemplo - "Muitas vezes um primeiro-ministro tem que viver momentos sozinho, que dizem respeito à segurança dos cidadãos e só os pode partilhar com o Presidente da República...". É um primeiro-ministro que precisa de dizer que manda no Governo. Repete-o uma e outra vez, sofrido. "A generalidade das decisões que foram tomadas foram primeiramente da minha responsabilidade"; "Só os inconscientes podem admitir que haja um primeiro-ministro que faça declarações sobre política fiscal sem articular com o ministro das Finanças", afirma, numa urgência, rara num primeiro-ministro, em provar que tem poder e autoridade. Antes disto, já o ministro-adjunto Henrique Chaves tinha proclamado: "Muito difícil tem sido para nós o momento que atravessamos" e "nunca antes um governo foi objecto de tão feroz tentativa de ataque e destruição". O homem que anuncia querer governar até 2014 está frágil e só, embora não tenha real oposição interna e Marques Mendes tenha vindo apenas servir de escape. No final, Lopes justifica as angústias: lembra que "o poder é algo efémero" e que "acima de tudo somos seres humanos, que temos família, amigos, choramos, rimos, entristecemo-nos". "Grande luso pequenino" Portugal, Portugal, geração Portugal, orgulho, pátria. Com Lopes, as expressões patrióticas repetem-se à exaustão e sempre foi assim. Para Barcelos, a organização inventou um hino dedicado ao novo líder que eleva o ênfase patrioteiro a limites ainda não antes atingidos (no PSD). Portugal é "o grande luso pequenino", "nós" (o PSD, o país?) "somos actores da História, de coragem e glórias, pátrio orgulho do passado abraçado pelo mar", e Santana Lopes "é a voz na vanguarda do futuro de norte a sul de todos nós". Os congressistas foram azucrinados com o novo hino, uma inovação a que se juntou também a "Lusitana Paixão", interpretada por Dulce Pontes: "Não condeno essa paixão/essa mágoa nas palavras/ que a guitarra vai gemendo...". No discurso final, Santana leva a voragem patriótica ao ponto de quase anular as diferenças entre PSD e PS - "não há caminhos muito separados para conduzir a sociedade" e, afinal, estar num lado ou noutro "é querer o bem de Portugal". O linguajar apela aos sentimentos primitivos, mas algo não passa. Por mais de uma vez, Santana Lopes recorda que o PSD "nasceu das entranhas deste povo" e por várias vezes recorda e estimula a comparação com o "único ídolo que teve", para lá das "pessoas da família", Francisco Sá Carneiro. (Nesse "paralelismo" incentivado por Santana e por outros delegados, António Preto, presidente da distrital de Lisboa, chegou a comparar as críticas de que foi alvo Sá Carneiro por, ainda casado, viver em união de facto com Snu Abecasis, com os ataques feitos à "vida pessoal" de Santana Lopes). Mas, em Barcelos, os delegados que aplaudem Santana Lopes não ficam toldados pela emoção que, em anteriores congressos, o agora líder e primeiro-ministro lhes provocou, quando era um "enfant terrible" que afrontava as estratégias instaladas. Mal Lopes acaba de falar e termina o hino nacional, começa a debandada de delegados para fora do pavilhão de Barcelos, nem o congresso tinha sido ainda encerrado. O poder pode matar os "enfants terribles". OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Hipótese de nova AD ameaça liderança de Santana Lopes

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