Vegetais primaveris

10-05-2004
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Vegetais Primaveris

Domingo, 11 de Abril de 2004

%Davis Lopes Ramos

Num domingo festivo para os católicos, o da Páscoa, em que se comemora a Ressurreição de Jesus Cristo, saia um prato vegetariano para assinalar a chegada da Primavera com as suas primícias hortícolas. Atendendo às comidas rituais da época, poder-nos-íamos ter lembrado do cordeiro assado no forno com um arroz açafroado servido na pingadeira de barro; ou de uns folares salgados ou doces; ou até de umas amêndoas, que os açorianos da Terceira colorem com cores vivas, as mesmas que usam nas barras das suas casas, numa grande percentagem caiadas de branco.

O caso, porém, é que a proposta é de um "gratinado da horta", um prato desintoxicante, uma celebração do que nasce na terra e se cria ao ritmo dos caprichos da Natureza e amadurece ao sol. Era bom, era. Mas, infelizmente, nos dias de hoje quase nunca é. É tudo criado em estufas e é difícil identificar os aromas e sabores naturais. O tomate, então, salvo o colorido, não sabe a nada e desfaz-se em água. Como se trata de um gratinado, esteja-se muito atento a este pormenor, pois, se os "pomos de ouro" não forem bem escorridos fica o cozinhado sem a menor graça.

Como se sabe, o gratinado é aquela película dourada que se forma por acção do calor do forno à superfície de pratos que são em geral cobertos com uma camada de queijo ou pão ralados. Antes, porém, ao menos em França, o "gratin" era nem mais nem menos do que o que ficava colado às paredes ou ao fundo dos recipientes durante as cozeduras ou assaduras, e que era rapado e comido como uma guloseima. Nós, que somos mais prosaicos, chamamos-lhe "rapar o tacho" e, em certos casos, até nos lambemos todos.

Um caso famoso de gratinado português é o do bacalhau à Zé do Pipo. Conheço também, como prato de algumas famílias minhotas, um frango guisado, que é desossado, e de seguida metido, num recipiente que possa ir ao forno e à mesa, no meio de massa de meada cozida em água abundante com sal e devidamente escorrida, sendo tudo coberto com uma camada de pão ralado. Quando este ficar dourado, vai à mesa de imediato, tendo por companhia uma salada de alface fresca e de cebola às rodelas finas, coisa de apetite.

Bem, voltando ao nosso "gratinado da horta", de tomates, "courgettes" e cebolas, com temperos de azeite, tomilho, sal e pimenta, surge-me aparentado com um senhor prato de legumes, nada mais nada menos do que a célebre "ratatouille", cozinhado da cozinha provençal, mais propriamente de Nice, a qual, além dos legumes nomeados, leva pimentos verdes, beringelas, dentes de alho, um ramo de cheiros em que predomine o tomilho. A receita original manda dar uma pequena fritura aos legumes, deixando-os, de seguida, estufar lentamente. Mas também já a comi, seguindo uma receita de uma cozinheira que teve um restaurante muito popular nas imediações do mercado parisiense "des Halles", que cozinhava a "ratatouille" no forno, e o resultado final é muito bom.

Estes pratos de legumes valem só por si e pão de boa qualidade faz-lhe óptima companhia, embora também sejam bons amigos de peixes e carnes. Faça cada um segundo o seu gosto. Vale a pena ainda não esquecer que, voltando às novidades da Primavera, estamos no tempo das ervilhas de quebrar, das favas, das batatinhas novas... Tudo muito simples, tudo muito bom.

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Vegetais Primaveris

Domingo, 11 de Abril de 2004

%Davis Lopes Ramos

Num domingo festivo para os católicos, o da Páscoa, em que se comemora a Ressurreição de Jesus Cristo, saia um prato vegetariano para assinalar a chegada da Primavera com as suas primícias hortícolas. Atendendo às comidas rituais da época, poder-nos-íamos ter lembrado do cordeiro assado no forno com um arroz açafroado servido na pingadeira de barro; ou de uns folares salgados ou doces; ou até de umas amêndoas, que os açorianos da Terceira colorem com cores vivas, as mesmas que usam nas barras das suas casas, numa grande percentagem caiadas de branco.

O caso, porém, é que a proposta é de um "gratinado da horta", um prato desintoxicante, uma celebração do que nasce na terra e se cria ao ritmo dos caprichos da Natureza e amadurece ao sol. Era bom, era. Mas, infelizmente, nos dias de hoje quase nunca é. É tudo criado em estufas e é difícil identificar os aromas e sabores naturais. O tomate, então, salvo o colorido, não sabe a nada e desfaz-se em água. Como se trata de um gratinado, esteja-se muito atento a este pormenor, pois, se os "pomos de ouro" não forem bem escorridos fica o cozinhado sem a menor graça.

Como se sabe, o gratinado é aquela película dourada que se forma por acção do calor do forno à superfície de pratos que são em geral cobertos com uma camada de queijo ou pão ralados. Antes, porém, ao menos em França, o "gratin" era nem mais nem menos do que o que ficava colado às paredes ou ao fundo dos recipientes durante as cozeduras ou assaduras, e que era rapado e comido como uma guloseima. Nós, que somos mais prosaicos, chamamos-lhe "rapar o tacho" e, em certos casos, até nos lambemos todos.

Um caso famoso de gratinado português é o do bacalhau à Zé do Pipo. Conheço também, como prato de algumas famílias minhotas, um frango guisado, que é desossado, e de seguida metido, num recipiente que possa ir ao forno e à mesa, no meio de massa de meada cozida em água abundante com sal e devidamente escorrida, sendo tudo coberto com uma camada de pão ralado. Quando este ficar dourado, vai à mesa de imediato, tendo por companhia uma salada de alface fresca e de cebola às rodelas finas, coisa de apetite.

Bem, voltando ao nosso "gratinado da horta", de tomates, "courgettes" e cebolas, com temperos de azeite, tomilho, sal e pimenta, surge-me aparentado com um senhor prato de legumes, nada mais nada menos do que a célebre "ratatouille", cozinhado da cozinha provençal, mais propriamente de Nice, a qual, além dos legumes nomeados, leva pimentos verdes, beringelas, dentes de alho, um ramo de cheiros em que predomine o tomilho. A receita original manda dar uma pequena fritura aos legumes, deixando-os, de seguida, estufar lentamente. Mas também já a comi, seguindo uma receita de uma cozinheira que teve um restaurante muito popular nas imediações do mercado parisiense "des Halles", que cozinhava a "ratatouille" no forno, e o resultado final é muito bom.

Estes pratos de legumes valem só por si e pão de boa qualidade faz-lhe óptima companhia, embora também sejam bons amigos de peixes e carnes. Faça cada um segundo o seu gosto. Vale a pena ainda não esquecer que, voltando às novidades da Primavera, estamos no tempo das ervilhas de quebrar, das favas, das batatinhas novas... Tudo muito simples, tudo muito bom.

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