Não há dados fidedignos sobre a interrupção da gravidez

02-06-2002
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Não Há Dados Fidedignos Sobre a Interrupção da Gravidez

Por ALEXANDRA CAMPOS

Sexta-feira, 17 de Maio de 2002 Duas décadas após primeira legislação Hospitais e maternidades públicos continuam a não responder ao Instituto Nacional de Estatística Conseguir informação detalhada e circunstanciada sobre os abortos praticados em Portugal, mesmo os legais, afigura-se uma tarefa deveras complicada. Ou melhor: é uma missão quase impossível. A problemática descreve-se em poucas linhas: todos os estabelecimentos de saúde oficiais a quem o PÚBLICO solicitou, por escrito, dados sobre os pedidos de interrupção voluntária de gravidez (IVG) no quadro legal recebidos, rejeitados e praticados não responderam; a Direcção-Geral da Saúde, entidade que recebe os relatórios estatísticos dos hospitais e maternidades públicos, apenas disponibilizou o total de IVG praticadas no quadro da lei, a nível nacional, de 1993 a 2000; e o Ministério da Saúde limitou-se a enviar dados sintéticos relativos ao segundo semestre de 2001 (ver caixa). O problema é que as unidades de saúde com serviços de Obstetrícia não informam a DGS sobre o número de pedidos de IVG formulados e recusados. Do gabinete de imprensa da direcção-geral a resposta é lacónica: "Só o hospital é que pode saber", e, além disso a lei não estabelece a quem compete fiscalizar o seu cumprimento. De qualquer forma, a responsável da Divisão de Saúde Materno-Infantil da DGS assegura que nunca recebeu queixas de utentes do Serviço Nacional de Saúde por lhes ter sido recusado um aborto ao abrigo da lei. Mas a relutância em adiantar dados sobre tão melindrosa matéria já não é de hoje: em 1996, quando pediu um levantamento completo da situação para perceber se a lei estava a ser cumprida, a própria ministra da Saúde foi confrontada com a ausência de resposta por parte de alguns serviços de Obstetrícia. Ainda hoje, aliás, o Instituto Nacional de Estatística (INE) continua a não receber dados sobre os abortos realizados nos hospitais e maternidades, apesar de formular a pergunta todos os anos, como confirmou ao PÚBLICO uma fonte da instituição. Comentando que "o aborto ainda parece ser um tema tabu". Também os números do INE sobre as mortes por aborto devem pecar por defeito. Veja-se o caso de 2000, ano em que não há registos de óbitos por este motivo. Justamente em Agosto desse ano, e com direito até a grandes parangonas na comunicação social, foi noticiado o caso de uma mulher de Viseu que morreu na sequência de um aborto clandestino, caso que motivou mesmo a abertura de um inquérito judicial. À excepção desse ano, o número de óbitos registados pelo INE desde 1995 oscilou entre um e três casos por ano. Mas, curiosamente, apenas no primeiro semestre do ano passado, há registos de três mortes por este motivo. "Oceano de ilegalidade" Em 1999, quando, pela terceira vez consecutiva, quis fazer um levantamento sobre esta matéria, o director executivo da Associação para o Planeamento da Família, Duarte Vilar, não teve mais sorte: responderam ao questionário 26 hospitais distritais e centrais, tendo quase outros tantos (20) recusado enviar as informações pretendidas. Mas este levantamento demorou longos meses, recorda Duarte Vilar, que quis comparar os dados daquela altura com os que obtivera em dois levantamentos anteriores, efectuados em 1991 e 1993. O estudo permitiu-lhe concluir que a adesão dos hospitais à lei - o aborto está despenalizado em quatro circunstâncias desde 1984 - foi "bastante lenta". O reduzido número de IVG realizadas por questões relacionadas com a saúde física ou psíquica da mulher grávida (21 por cento) mostravam que os hospitais portugueses continuavam a interpretar a legislação sobre IVG "de forma muito estrita, nomeadamente no âmbito da saúde psíquica". O número de IVG legais estava a aumentar nos hospitais sobretudo por razões relacionadas com a malformação ou doença fetal, o que, por sua vez, se relacionava com a expansão dos serviços e consultas de diagnóstico pré-natal (DPN). Os dados vinham reafirmar - concluía Duarte Vilar - "a enorme discrepância entre esta pequena ilha de legalidade e segurança e o oceano de ilegalidade e insegurança". OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Parlamento aprova estudo sobre aborto, planeamento e educação sexual

Baixa à comissão salva proposta de Helena Roseta

Casos de aborto clandestino foram mais do dobro dos legais

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Porto: poucos abortos, raras recusas em 2001

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