Estudantes que chumbam deviam pagar propinas mais altas

07-02-2003
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Estudantes Que Chumbam Deviam Pagar Propinas Mais Altas

Por ANDREIA SANCHES

Quarta-feira, 22 de Janeiro de 2003 Universidades onde membros da sociedade civil estão representados e têm poder de decisão. Um modelo de financiamento do ensino superior que tem em conta indicadores de produtividade das escolas. Uma avaliação do sistema com consequências. Uma reorganização dos modelos de ensino. Formas de combate ao insucesso escolar que passam por penalizar os alunos que mais chumbam, fazendo-os pagar mais propinas. Bolsas de mérito. A necessidade de encontrar fontes de receitas alternativas, porque o Orçamento do Estado já não chega. Chama-se "Ensino Superior: Uma Visão para a Próxima Década" e é um estudo encomendado pelo governo socialista que o executivo PSD-PP vai usar no debate público sobre a reforma do sector. Nele são enunciadas dezenas de medidas que podem ser tomadas para combater o desperdício e melhorar a qualidade. Mas o ministro da tutela, Pedro Lynce, diz que nada está decidido. O trabalho é hoje apresentado numa cerimónia presidida por Durão Barroso. A criação de "uma propina progressiva, ligada ao desempenho escolar do estudante", poderá constituir uma das vias a explorar, num futuro modelo de financiamento das universidades e politécnicos, "com razoável grau de consensualização". A proposta é apenas uma das muitas avançadas num documento que traça as linhas de uma verdadeira revolução no modo de funcionamento, financiamento e regulação do ensino superior. Encomendado pelo então ministro da Educação do governo socialista, Guilherme d'Oliveira Martins, o estudo "Ensino Superior: Uma Visão para a Próxima Década", da autoria de José Veiga Simão, António de Almeida Costa e Sérgio Machado dos Santos, é hoje apresentado ao mais alto nível em Lisboa, numa cerimónia presidida pelo primeiro-ministro, Durão Barroso. E será uma das bases para a discussão pública à volta da prometida reforma do ensino superior. No passado, a questão das propinas levantou grandes perturbações no sector. Na memória de muitos estão ainda as manifestações de estudantes que protestavam na rua contra o aumento da comparticipação nos custos do ensino. Mas a evolução da conjuntura financeira poderá implicar a reabertura do processo. É certo que o Estado tem a "responsabilidade inalienável" de garantir o direito à educação, dizem os autores do trabalho. E que nenhum estudante deve ficar de fora por carências económicas. O livro lembra ainda que as famílias já desembolsam avultados montantes em livros, alojamento, deslocações, para ter os filhos a estudar. Contudo, sublinha-se, "o crescimento explosivo do ensino superior e a multiplicidade de tarefas a que as instituições de ensino são chamadas são incompatíveis com o financiamento do sistema exclusivamente a partir do Orçamento do Estado". Universidades e politécnicos são, por isso, desafiados a procurar "fontes múltiplas de financiamento". A prestação de serviços a empresas e outras entidades é uma das mencionadas. A "participação dos estudantes ou das famílias nos custos da formação" inicial (bacharelatos e licenciaturas), outra. Mas um modelo como o apresentado - a propina ligada ao desempenho escolar - só poderá avançar em paralelo com "um sistema eficaz de acção social", sublinha-se. "Não me repugna nada essa ideia" de uma propina progressiva, limita-se a dizer o ministro da Ciência e do Ensino Superior, Pedro Lynce, comentando a proposta do grupo de trabalho. "Todas as hipóteses estão em aberto", acrescenta (ver texto nestas páginas). Actualmente, os estudantes que frequentam cursos de quatro anos levam, em média, sete a concluí-los. "Se estiver montado um esquema de avaliação da qual resulte a evidência, e isso não é difícil de fazer, de que a culpa das reprovações é do aluno, ele terá de pagar, por cada ano que chumba, muito mais. E aproximar-se progressivamente do custo real do serviço que lhe é prestado", explica Veiga Simão ao PÚBLICO. "Os alunos vão dizer assim: e se a culpa não for nossa? E eles têm razão, porque às vezes as reprovações são em tal número que qualquer coisa está a funcionar mal", continua, sublinhando que é necessário, por isso, combater os factores de insucesso. Machado dos Santos faz ainda outra ressalva: "Qualquer medida que seja tomada não pode significar uma desresponsabilização do Estado em relação ao financiamento e será difícil debater a questão das propinas num cenário em que o investimento do Estado esteja a decrescer." Para concluir: "Os parceiros e as instituições têm de explorar todas as ideias, tendo em conta o seguinte: o Estado não pode desresponsabilizar-se, mas também não pode manter os aumentos no financiamento a que se tem assistido. E não faz sentido injectar mais recursos para sustentar alunos que não têm aproveitamento." O livro sugere ainda a criação de um sistema de bolsas de mérito "que garanta o apoio financeiro, incluindo o valor das propinas, a estudantes de elevada qualidade", independentemente da natureza da instituição de ensino que frequentam. Prevê também a regulamentação de um sistema de empréstimos para autonomização financeira dos alunos, com taxas bonificadas. Recorde-se que um eventual aumento das propinas teria de ter balizas. Há, em Portugal, uma limitação de natureza constitucional a este montante: segundo um acórdão de 1994 do Tribunal Constitucional, o valor não pode ir além dos 25 por cento do custo real do ensino por aluno. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Estudantes que chumbam deviam pagar propinas mais altas

Uma encomenda do PS apadrinhada pelo actual Governo

Universidades e politécnicos financiados em função da produtividade

Avaliação sem consequências descredibilizou-se

Representantes da sociedade civil com poder de decisão nas universidades

Lynce diz que "há situações perfeitamente imorais" de insucesso escolar

O ensino superior em números

Principais problemas detectados

Algumas propostas de mudança

EDITORIAL

Tempo de mudança

Estudantes Que Chumbam Deviam Pagar Propinas Mais Altas

Por ANDREIA SANCHES

Quarta-feira, 22 de Janeiro de 2003 Universidades onde membros da sociedade civil estão representados e têm poder de decisão. Um modelo de financiamento do ensino superior que tem em conta indicadores de produtividade das escolas. Uma avaliação do sistema com consequências. Uma reorganização dos modelos de ensino. Formas de combate ao insucesso escolar que passam por penalizar os alunos que mais chumbam, fazendo-os pagar mais propinas. Bolsas de mérito. A necessidade de encontrar fontes de receitas alternativas, porque o Orçamento do Estado já não chega. Chama-se "Ensino Superior: Uma Visão para a Próxima Década" e é um estudo encomendado pelo governo socialista que o executivo PSD-PP vai usar no debate público sobre a reforma do sector. Nele são enunciadas dezenas de medidas que podem ser tomadas para combater o desperdício e melhorar a qualidade. Mas o ministro da tutela, Pedro Lynce, diz que nada está decidido. O trabalho é hoje apresentado numa cerimónia presidida por Durão Barroso. A criação de "uma propina progressiva, ligada ao desempenho escolar do estudante", poderá constituir uma das vias a explorar, num futuro modelo de financiamento das universidades e politécnicos, "com razoável grau de consensualização". A proposta é apenas uma das muitas avançadas num documento que traça as linhas de uma verdadeira revolução no modo de funcionamento, financiamento e regulação do ensino superior. Encomendado pelo então ministro da Educação do governo socialista, Guilherme d'Oliveira Martins, o estudo "Ensino Superior: Uma Visão para a Próxima Década", da autoria de José Veiga Simão, António de Almeida Costa e Sérgio Machado dos Santos, é hoje apresentado ao mais alto nível em Lisboa, numa cerimónia presidida pelo primeiro-ministro, Durão Barroso. E será uma das bases para a discussão pública à volta da prometida reforma do ensino superior. No passado, a questão das propinas levantou grandes perturbações no sector. Na memória de muitos estão ainda as manifestações de estudantes que protestavam na rua contra o aumento da comparticipação nos custos do ensino. Mas a evolução da conjuntura financeira poderá implicar a reabertura do processo. É certo que o Estado tem a "responsabilidade inalienável" de garantir o direito à educação, dizem os autores do trabalho. E que nenhum estudante deve ficar de fora por carências económicas. O livro lembra ainda que as famílias já desembolsam avultados montantes em livros, alojamento, deslocações, para ter os filhos a estudar. Contudo, sublinha-se, "o crescimento explosivo do ensino superior e a multiplicidade de tarefas a que as instituições de ensino são chamadas são incompatíveis com o financiamento do sistema exclusivamente a partir do Orçamento do Estado". Universidades e politécnicos são, por isso, desafiados a procurar "fontes múltiplas de financiamento". A prestação de serviços a empresas e outras entidades é uma das mencionadas. A "participação dos estudantes ou das famílias nos custos da formação" inicial (bacharelatos e licenciaturas), outra. Mas um modelo como o apresentado - a propina ligada ao desempenho escolar - só poderá avançar em paralelo com "um sistema eficaz de acção social", sublinha-se. "Não me repugna nada essa ideia" de uma propina progressiva, limita-se a dizer o ministro da Ciência e do Ensino Superior, Pedro Lynce, comentando a proposta do grupo de trabalho. "Todas as hipóteses estão em aberto", acrescenta (ver texto nestas páginas). Actualmente, os estudantes que frequentam cursos de quatro anos levam, em média, sete a concluí-los. "Se estiver montado um esquema de avaliação da qual resulte a evidência, e isso não é difícil de fazer, de que a culpa das reprovações é do aluno, ele terá de pagar, por cada ano que chumba, muito mais. E aproximar-se progressivamente do custo real do serviço que lhe é prestado", explica Veiga Simão ao PÚBLICO. "Os alunos vão dizer assim: e se a culpa não for nossa? E eles têm razão, porque às vezes as reprovações são em tal número que qualquer coisa está a funcionar mal", continua, sublinhando que é necessário, por isso, combater os factores de insucesso. Machado dos Santos faz ainda outra ressalva: "Qualquer medida que seja tomada não pode significar uma desresponsabilização do Estado em relação ao financiamento e será difícil debater a questão das propinas num cenário em que o investimento do Estado esteja a decrescer." Para concluir: "Os parceiros e as instituições têm de explorar todas as ideias, tendo em conta o seguinte: o Estado não pode desresponsabilizar-se, mas também não pode manter os aumentos no financiamento a que se tem assistido. E não faz sentido injectar mais recursos para sustentar alunos que não têm aproveitamento." O livro sugere ainda a criação de um sistema de bolsas de mérito "que garanta o apoio financeiro, incluindo o valor das propinas, a estudantes de elevada qualidade", independentemente da natureza da instituição de ensino que frequentam. Prevê também a regulamentação de um sistema de empréstimos para autonomização financeira dos alunos, com taxas bonificadas. Recorde-se que um eventual aumento das propinas teria de ter balizas. Há, em Portugal, uma limitação de natureza constitucional a este montante: segundo um acórdão de 1994 do Tribunal Constitucional, o valor não pode ir além dos 25 por cento do custo real do ensino por aluno. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Estudantes que chumbam deviam pagar propinas mais altas

Uma encomenda do PS apadrinhada pelo actual Governo

Universidades e politécnicos financiados em função da produtividade

Avaliação sem consequências descredibilizou-se

Representantes da sociedade civil com poder de decisão nas universidades

Lynce diz que "há situações perfeitamente imorais" de insucesso escolar

O ensino superior em números

Principais problemas detectados

Algumas propostas de mudança

EDITORIAL

Tempo de mudança

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