Esquerda "engole sapo" da zanga com Presidente

17-09-2004
marcar artigo

Esquerda "Engole Sapo" da Zanga com Presidente

Por SÃO JOSÉ ALMEIDA

Domingo, 12 de Setembro de 2004 Uma vaia de longuíssimos segundos contra o Presidente da República marcou o encerramento da última "Festa do 'Avante!'", cuja abertura foi assinalada pelo facto de alguns militantes ostentarem camisolas onde se lia: "Shame on you mr Sampaio!". O gesto espontâneo de vaiar o Presidente, provocado pela menção pelo secretário-geral do PCP do facto de Jorge Sampaio ter optado, há dois meses, por não convocar eleições e por indigitar Pedro Santana Lopes como primeiro-ministro, foi visto como o retrato do estado de espírito que assola o povo de esquerda, ou seja, da zanga, da indignação e até da ruptura da esquerda, do eleitorado de esquerda com o seu Presidente. O corte foi de tal forma que o Presidente sentiu necessidade de se justificar perante a esquerda e fê-lo ontem no Alentejo, na visita a duas câmaras do PCP (ver texto ao lado). Mas se este corte é reconhecido por todos, políticos e observadores do fenómeno político, ele não é valorizado de igual modo por todos. E se a maioria dos analistas contactados pelo PÚBLICO consideram que há uma ruptura simbólica entre a esquerda e Sampaio (ver texto na página seguinte), os dirigentes dos partidos da esquerda parlamentar fazem questão de desvalorizar a zanga, quase dando o exemplo prático daquilo que o sociólogo e investigador Manuel Villaverde Cabral, afirmou ao PÚBLICO: "Para os políticos de profissão não há nada de irreversível ou irrecuperável. Se, amanhã, tiverem motivos nobres - ou menos nobres - para se unirem, unem, Quem está na política sabe engolir sapos, como dizia o outro." O próprio secretário-geral do PCP, Carlos Carvalhas, cujas críticas ao Presidente motivaram a vaia monumental na Quinta da Atalaia, optou por não alimentar a polémica. Contactado pelo PÚBLICO, através de uma assessora de impressa, o secretário-geral do PCP remeteu para as palavras por si proferidas no comício de encerramento da "Festa do 'Avante!'" e para a reacção que fez à declaração de Jorge Sampaio quando anunciou que ia indigitar Santana Lopes. De novo, Carvalhas apenas salientou: "O Presidente da República não é o adversário político do PCP, o adversário do PCP é a direita e a política de direita." A desvalorização do mal-estar foi também o tom das considerações feitas ao PÚBLICO pelos três candidatos à liderança do PS, eleições que se disputam na sequência da demissão do secretário-geral, Eduardo Ferro Rodrigues, como reacção precisamente ao facto de Jorge Sampaio não ter convocado eleições (ver texto nesta página). João Soares reconhece que, durante a campanha eleitoral interna tem "sentido pelo país que há muita gente profundamente zangada com Jorge Sampaio a fazer comentários extremamente desagradáveis". Mas garante: "Eu pessoalmente não tenho nenhum mal-estar contra o Presidente, não mudei de opinião sobre a pessoa". Assume que tem "boas relações com Sampaio", de quem foi, aliás, o número dois e substituto na Câmara de Lisboa, por isso, garante que "não estranhou muito a decisão" e acrescenta em tom jovial: "Naquele período das consultas, foram feitas muitas apostas, eu ganhei todas, não as cobrei porque eram almoços e tenho contenção nas coisas alimentares, porque tenho preocupações com engordar." Quanto a decisão em si ressalva que, "no plano constitucional, não há palavras a dizer. Já "no plano político recorda que foi o primeiro dirigente do PS a reclamar eleições e a opor-se a esta decisão e que afirmou mesmo que espera que "o Presidente não venha a arrepender-se". E acrescenta ainda que "se é esta a interpretação que faz dos seus poderes podia ter anunciado a decisão em 24 horas" "A função presidencial não é instrumento de nenhum partido" Enquanto João Soares fala abertamente do mal-estar que encontra no eleitorado em relação a Sampaio, José Sócrates nem sequer aborda esta questão e trata de contrariar que haja qualquer problema entre o PS e o Presidente: "Somos de uma esquerda que tem entendimento de que a função presidencial não é instrumento de nenhum partido." E acrescenta: "Era o que faltava que o PS não aceitasse que o Presidente, por ser do partido, não tomasse decisões contrárias ao PS.O Presidente têm autonomia para fazer as suas avaliações e tomar as suas decisões." Sócrates sustenta mesmo que é normal a existência de divergências e afirma: "A discordância é normal em política, a esquerda democrática está muito habituada a viver a discordância. Não vemos o Presidente como uma extensão do partido que contribuiu para a sua eleição." Recusa-se, todavia, a falar sobre a generalidade da esquerda, argumentando: "Não posso falar sobre a outra esquerda, não sei o que se passa no PCP, isso não é problema do PS." Mas frisa, referindo-se as socialistas: "Não vemos o Presidente da República como um adversário. Houve declarações emotivas naquela noite da demissão de Ferro, mas não representam o PS." Não deixa de frisar que considera que "o Presidente teria feito melhor se tivesse dissolvido o Parlamento" e que o actual executivo "é um Governo fraco e que o país precisa de um Governo com autoridade dada pela legitimidade política dos votos ou pela autoridade natural dada pela competência e pelo prestígio, que não existe." Também Manuel Alegre reconhece a autonomia de Jorge Sampaio, ao ponto de considerar: "Não penso que a esquerda possa fazer de Sampaio um adversário político e acho que é um erro fazê-lo." Lembra que é amigo de Sampaio há 45 anos e reconhece que a decisão o "irritou muito", porque defende que devia ter sido dada "a palavra ao povo", mas alerta para que, a decisão de Sampaio, "do ponto de vista constitucional, é inatacável." Quanto as razões do Presidente diz que não as conhece, mas admite que ele "não tenha tido confiança no PS." E avança: "Talvez por isso Ferro se demitiu." Revendo a sua posição considera agora que esta decisão teve lados positivos: "Tem havido uma perversão do parlamentarismo desde Cavaco Silva com a adopção de um presidencialismo de primeiro-ministro. Isto pode ser um reforço do parlamentarismo." Sobre Sampaio afirma que este "não deixou de ser um homem de esquerda". E explica: "Sei que é um homem escrupuloso, é de esquerda, mas não um radical, sempre procurou consensos." E conclui que a desilusão que reconhece existir no eleitorado "não é irreversível". Já para o dirigente e deputado do Bloco de Esquerda, Francisco Louçã, quebrou-se algo entre Sampaio e o seu eleitorado que, na sua opinião não é recuperável, ainda que o Presidente não vá de novo ser sufragado e isto não possa ser medido nas urnas. Explica, contudo, que "não há um corte de relações institucionais entre o Bloco de Esquerda e o Presidente". O que existe, na opinião de Louçã, é "uma modificação do quadro político" pelo que afirma: "A nossa critica e o nosso desagrado não tem a ver com ele não obedecer ao eleitorado de esquerda, quem vota num Presidente não fica credor, é errado pensar que Sampaio é devedor do seu eleitorado". O problema é, para Louçã, político pois esta decisão "afirma uma estratégia de esbatimento presidencial e de governamentalização e partidarização da política, num momento de grave crise." E revela que vê "com tristeza que os dois mandatos do Presidente vão ficar marcados com este facto e que Sampaio termine o mandato subordinado à estratégia de Pedro Santana Lopes". OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE PR passou por câmaras comunistas após ter sido vaiado na Festa do "Avante!"

Esquerda "engole sapo" da zanga com Presidente

Sampaio e Ferro: Ruptura total

Sampaio rompeu simbolicamente com a esquerda

Esquerda "Engole Sapo" da Zanga com Presidente

Por SÃO JOSÉ ALMEIDA

Domingo, 12 de Setembro de 2004 Uma vaia de longuíssimos segundos contra o Presidente da República marcou o encerramento da última "Festa do 'Avante!'", cuja abertura foi assinalada pelo facto de alguns militantes ostentarem camisolas onde se lia: "Shame on you mr Sampaio!". O gesto espontâneo de vaiar o Presidente, provocado pela menção pelo secretário-geral do PCP do facto de Jorge Sampaio ter optado, há dois meses, por não convocar eleições e por indigitar Pedro Santana Lopes como primeiro-ministro, foi visto como o retrato do estado de espírito que assola o povo de esquerda, ou seja, da zanga, da indignação e até da ruptura da esquerda, do eleitorado de esquerda com o seu Presidente. O corte foi de tal forma que o Presidente sentiu necessidade de se justificar perante a esquerda e fê-lo ontem no Alentejo, na visita a duas câmaras do PCP (ver texto ao lado). Mas se este corte é reconhecido por todos, políticos e observadores do fenómeno político, ele não é valorizado de igual modo por todos. E se a maioria dos analistas contactados pelo PÚBLICO consideram que há uma ruptura simbólica entre a esquerda e Sampaio (ver texto na página seguinte), os dirigentes dos partidos da esquerda parlamentar fazem questão de desvalorizar a zanga, quase dando o exemplo prático daquilo que o sociólogo e investigador Manuel Villaverde Cabral, afirmou ao PÚBLICO: "Para os políticos de profissão não há nada de irreversível ou irrecuperável. Se, amanhã, tiverem motivos nobres - ou menos nobres - para se unirem, unem, Quem está na política sabe engolir sapos, como dizia o outro." O próprio secretário-geral do PCP, Carlos Carvalhas, cujas críticas ao Presidente motivaram a vaia monumental na Quinta da Atalaia, optou por não alimentar a polémica. Contactado pelo PÚBLICO, através de uma assessora de impressa, o secretário-geral do PCP remeteu para as palavras por si proferidas no comício de encerramento da "Festa do 'Avante!'" e para a reacção que fez à declaração de Jorge Sampaio quando anunciou que ia indigitar Santana Lopes. De novo, Carvalhas apenas salientou: "O Presidente da República não é o adversário político do PCP, o adversário do PCP é a direita e a política de direita." A desvalorização do mal-estar foi também o tom das considerações feitas ao PÚBLICO pelos três candidatos à liderança do PS, eleições que se disputam na sequência da demissão do secretário-geral, Eduardo Ferro Rodrigues, como reacção precisamente ao facto de Jorge Sampaio não ter convocado eleições (ver texto nesta página). João Soares reconhece que, durante a campanha eleitoral interna tem "sentido pelo país que há muita gente profundamente zangada com Jorge Sampaio a fazer comentários extremamente desagradáveis". Mas garante: "Eu pessoalmente não tenho nenhum mal-estar contra o Presidente, não mudei de opinião sobre a pessoa". Assume que tem "boas relações com Sampaio", de quem foi, aliás, o número dois e substituto na Câmara de Lisboa, por isso, garante que "não estranhou muito a decisão" e acrescenta em tom jovial: "Naquele período das consultas, foram feitas muitas apostas, eu ganhei todas, não as cobrei porque eram almoços e tenho contenção nas coisas alimentares, porque tenho preocupações com engordar." Quanto a decisão em si ressalva que, "no plano constitucional, não há palavras a dizer. Já "no plano político recorda que foi o primeiro dirigente do PS a reclamar eleições e a opor-se a esta decisão e que afirmou mesmo que espera que "o Presidente não venha a arrepender-se". E acrescenta ainda que "se é esta a interpretação que faz dos seus poderes podia ter anunciado a decisão em 24 horas" "A função presidencial não é instrumento de nenhum partido" Enquanto João Soares fala abertamente do mal-estar que encontra no eleitorado em relação a Sampaio, José Sócrates nem sequer aborda esta questão e trata de contrariar que haja qualquer problema entre o PS e o Presidente: "Somos de uma esquerda que tem entendimento de que a função presidencial não é instrumento de nenhum partido." E acrescenta: "Era o que faltava que o PS não aceitasse que o Presidente, por ser do partido, não tomasse decisões contrárias ao PS.O Presidente têm autonomia para fazer as suas avaliações e tomar as suas decisões." Sócrates sustenta mesmo que é normal a existência de divergências e afirma: "A discordância é normal em política, a esquerda democrática está muito habituada a viver a discordância. Não vemos o Presidente como uma extensão do partido que contribuiu para a sua eleição." Recusa-se, todavia, a falar sobre a generalidade da esquerda, argumentando: "Não posso falar sobre a outra esquerda, não sei o que se passa no PCP, isso não é problema do PS." Mas frisa, referindo-se as socialistas: "Não vemos o Presidente da República como um adversário. Houve declarações emotivas naquela noite da demissão de Ferro, mas não representam o PS." Não deixa de frisar que considera que "o Presidente teria feito melhor se tivesse dissolvido o Parlamento" e que o actual executivo "é um Governo fraco e que o país precisa de um Governo com autoridade dada pela legitimidade política dos votos ou pela autoridade natural dada pela competência e pelo prestígio, que não existe." Também Manuel Alegre reconhece a autonomia de Jorge Sampaio, ao ponto de considerar: "Não penso que a esquerda possa fazer de Sampaio um adversário político e acho que é um erro fazê-lo." Lembra que é amigo de Sampaio há 45 anos e reconhece que a decisão o "irritou muito", porque defende que devia ter sido dada "a palavra ao povo", mas alerta para que, a decisão de Sampaio, "do ponto de vista constitucional, é inatacável." Quanto as razões do Presidente diz que não as conhece, mas admite que ele "não tenha tido confiança no PS." E avança: "Talvez por isso Ferro se demitiu." Revendo a sua posição considera agora que esta decisão teve lados positivos: "Tem havido uma perversão do parlamentarismo desde Cavaco Silva com a adopção de um presidencialismo de primeiro-ministro. Isto pode ser um reforço do parlamentarismo." Sobre Sampaio afirma que este "não deixou de ser um homem de esquerda". E explica: "Sei que é um homem escrupuloso, é de esquerda, mas não um radical, sempre procurou consensos." E conclui que a desilusão que reconhece existir no eleitorado "não é irreversível". Já para o dirigente e deputado do Bloco de Esquerda, Francisco Louçã, quebrou-se algo entre Sampaio e o seu eleitorado que, na sua opinião não é recuperável, ainda que o Presidente não vá de novo ser sufragado e isto não possa ser medido nas urnas. Explica, contudo, que "não há um corte de relações institucionais entre o Bloco de Esquerda e o Presidente". O que existe, na opinião de Louçã, é "uma modificação do quadro político" pelo que afirma: "A nossa critica e o nosso desagrado não tem a ver com ele não obedecer ao eleitorado de esquerda, quem vota num Presidente não fica credor, é errado pensar que Sampaio é devedor do seu eleitorado". O problema é, para Louçã, político pois esta decisão "afirma uma estratégia de esbatimento presidencial e de governamentalização e partidarização da política, num momento de grave crise." E revela que vê "com tristeza que os dois mandatos do Presidente vão ficar marcados com este facto e que Sampaio termine o mandato subordinado à estratégia de Pedro Santana Lopes". OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE PR passou por câmaras comunistas após ter sido vaiado na Festa do "Avante!"

Esquerda "engole sapo" da zanga com Presidente

Sampaio e Ferro: Ruptura total

Sampaio rompeu simbolicamente com a esquerda

marcar artigo