EXPRESSO: Opinião

23-10-2002
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Os bravos do pelotão de fuzilamento

Henrique Monteiro

«Cavaco Silva, sempre prático, disse: 'Ouça, e em vez de estar com essa chatice, não preferia alinhar connosco e fuzilar o Portas um dia destes?' Pensei dois segundos e aceitei. Eis porque, caro Portas, nada mais te direi sobre este caso. Tenho um dever absoluto de lealdade em relação aos conspiradores, que aliás são um grupo interessante, com quem dá gosto falar. É a vida! E não é nada de pessoal.»

Lisboa, 23/9/2002

Caro Paulo Portas

Envio-te esta carta para o Ministério da Defesa, pois sei ser o local onde tratas dos teus problemas pessoais (espero que, em casa, trates dos assuntos políticos e, na sede do CDS, dos assuntos do Estado). Não te irrites já, antes de eu te explicar que acho muito bem que assim procedas - parece-me uma forma inteligente de despistar essas negras forças que pretendem atentar contra a tua integridade, ou mesmo contra a tua vida.

O objectivo desta missiva é dar-te a conhecer o pelotão da esquerda radical que te quer fuzilar, como muito bem denunciaste no comício de domingo. Acontece que o descobri, por acaso, quando estava sentado numa esconsa taberna em Alfama (não te direi porquê, uma vez que as razões são do meu foro pessoal).

O primeiro a chegar - ele nunca tem dúvidas, nem nunca se atrasa - foi Cavaco Silva. Pouco depois, entrou Pacheco Pereira acompanhado de Macário Correia. Segundos mais tarde, juntaram-se-lhes José António Saraiva, José Manuel Fernandes, Mário Bettencourt Resendes, Ricardo Costa e Duarte Lima. Um pouco depois, apareceram António Costa e Francisco Louçã. Por último, sempre atrasado, Marcelo Rebelo de Sousa.

Fiquei à escuta e ouvi António Costa a dizer que ninguém do PCP aparecia porque estavam traumatizados com os processos de Moscovo. «Fuzilámos muita gente nessa altura, estamos fartos!», terá dito Carvalhas. Cavaco ficou furioso: «Mas, assim, só somos 11, e toda a gente sabe que um pelotão de fuzilamento tem de ter 12 pessoas!» A argúcia do ex-primeiro-ministro deixou todos deprimidos. Foi a vez de Pacheco Pereira se lembrar de Manuel Monteiro: «Ele deve estar de acordo connosco, não acham?» Todos acharam, mas a verdade é que ninguém tinha o número do telemóvel de Monteiro. «À medida que as pessoas vão perdendo importância, a gente tem de ir cortando os números, que as memórias dos telefones não dão para tudo», disse, sabiamente, Marcelo. Todos concordaram, lamentando o facto de não terem memórias mais vastas.

«Só se for o Durão Barroso», lembrou-se, então, Macário. Mas Cavaco cortou cerce: «Ouça, você, por acaso, sabe o trabalho que dá ser primeiro-ministro? Ele não tem tempo!», exclamou. «Além de que», disse Louçã, «é capaz de não ser estritamente legal levar o Portas para a praça de touros de Vila Franca e matá-lo a tiro...»

«Disparate!», gritaram todos, ao que Duarte Lima acrescentou: «Eu sempre disse que esse gajo tinha ar de padre!» Louçã encolheu-se e nada mais disse. Até que Marcelo, dando por mim, perguntou: «Já viram quem ali está, a ouvir tudo o que dizemos?» Pacheco, subitamente ameaçador, olhou-me nos olhos: «Que raio está aqui a fazer?», e eu respondi (sou como tu, Paulo, nunca menti): «Estou a fazer um relatório para o Portas.» Mas Cavaco Silva, sempre prático, disse: «Ouça, e em vez de estar com essa chatice, não preferia alinhar connosco e fuzilar o Portas um dia destes?» Pensei dois segundos e aceitei.

Eis porque, caro Portas, nada mais te direi sobre este caso. Tenho um dever absoluto de lealdade em relação aos conspiradores, que aliás são um grupo interessante, com quem dá gosto falar. É a vida! E não é nada de pessoal.

Abraços do

Marques de Correia

(comendador@mail.expresso.pt)

Os bravos do pelotão de fuzilamento

Henrique Monteiro

«Cavaco Silva, sempre prático, disse: 'Ouça, e em vez de estar com essa chatice, não preferia alinhar connosco e fuzilar o Portas um dia destes?' Pensei dois segundos e aceitei. Eis porque, caro Portas, nada mais te direi sobre este caso. Tenho um dever absoluto de lealdade em relação aos conspiradores, que aliás são um grupo interessante, com quem dá gosto falar. É a vida! E não é nada de pessoal.»

Lisboa, 23/9/2002

Caro Paulo Portas

Envio-te esta carta para o Ministério da Defesa, pois sei ser o local onde tratas dos teus problemas pessoais (espero que, em casa, trates dos assuntos políticos e, na sede do CDS, dos assuntos do Estado). Não te irrites já, antes de eu te explicar que acho muito bem que assim procedas - parece-me uma forma inteligente de despistar essas negras forças que pretendem atentar contra a tua integridade, ou mesmo contra a tua vida.

O objectivo desta missiva é dar-te a conhecer o pelotão da esquerda radical que te quer fuzilar, como muito bem denunciaste no comício de domingo. Acontece que o descobri, por acaso, quando estava sentado numa esconsa taberna em Alfama (não te direi porquê, uma vez que as razões são do meu foro pessoal).

O primeiro a chegar - ele nunca tem dúvidas, nem nunca se atrasa - foi Cavaco Silva. Pouco depois, entrou Pacheco Pereira acompanhado de Macário Correia. Segundos mais tarde, juntaram-se-lhes José António Saraiva, José Manuel Fernandes, Mário Bettencourt Resendes, Ricardo Costa e Duarte Lima. Um pouco depois, apareceram António Costa e Francisco Louçã. Por último, sempre atrasado, Marcelo Rebelo de Sousa.

Fiquei à escuta e ouvi António Costa a dizer que ninguém do PCP aparecia porque estavam traumatizados com os processos de Moscovo. «Fuzilámos muita gente nessa altura, estamos fartos!», terá dito Carvalhas. Cavaco ficou furioso: «Mas, assim, só somos 11, e toda a gente sabe que um pelotão de fuzilamento tem de ter 12 pessoas!» A argúcia do ex-primeiro-ministro deixou todos deprimidos. Foi a vez de Pacheco Pereira se lembrar de Manuel Monteiro: «Ele deve estar de acordo connosco, não acham?» Todos acharam, mas a verdade é que ninguém tinha o número do telemóvel de Monteiro. «À medida que as pessoas vão perdendo importância, a gente tem de ir cortando os números, que as memórias dos telefones não dão para tudo», disse, sabiamente, Marcelo. Todos concordaram, lamentando o facto de não terem memórias mais vastas.

«Só se for o Durão Barroso», lembrou-se, então, Macário. Mas Cavaco cortou cerce: «Ouça, você, por acaso, sabe o trabalho que dá ser primeiro-ministro? Ele não tem tempo!», exclamou. «Além de que», disse Louçã, «é capaz de não ser estritamente legal levar o Portas para a praça de touros de Vila Franca e matá-lo a tiro...»

«Disparate!», gritaram todos, ao que Duarte Lima acrescentou: «Eu sempre disse que esse gajo tinha ar de padre!» Louçã encolheu-se e nada mais disse. Até que Marcelo, dando por mim, perguntou: «Já viram quem ali está, a ouvir tudo o que dizemos?» Pacheco, subitamente ameaçador, olhou-me nos olhos: «Que raio está aqui a fazer?», e eu respondi (sou como tu, Paulo, nunca menti): «Estou a fazer um relatório para o Portas.» Mas Cavaco Silva, sempre prático, disse: «Ouça, e em vez de estar com essa chatice, não preferia alinhar connosco e fuzilar o Portas um dia destes?» Pensei dois segundos e aceitei.

Eis porque, caro Portas, nada mais te direi sobre este caso. Tenho um dever absoluto de lealdade em relação aos conspiradores, que aliás são um grupo interessante, com quem dá gosto falar. É a vida! E não é nada de pessoal.

Abraços do

Marques de Correia

(comendador@mail.expresso.pt)

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