Assis, o mais intelectual

13-12-2003
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Assis, o Mais Intelectual

Por SÃO JOSÉ ALMEIDA

Terça-feira, 09 de Dezembro de 2003 Quando em 1997, aos 32 anos de idade, foi escolhido por António Guterres para liderar a bancada do PS que sustentava parlamentarmente o seu primeiro Governo minoritário, Francisco de Assis surpreendeu os observadores políticos e a comunicação social. Ao ar de jovem, quase imberbe, Assis juntava um discurso intelectualizado, conceptual, teórico, que demonstrava o culto da política de princípio e valores e o gosto pela oratória parlamentar clássica. Um contraste que horrorizou alguns jornalistas, mais dados a reproduzir os chamados "sound bits" num parlamento que era então farto neles, até porque tinha Paulo Portas como deputado. E logo foi vaticinado que o político precoce não sobreviveria muito tempo à frente de um grupo parlamentar que teimava em afirmar uma cultura de contrapoder, ainda que fosse a base do poder governamental de Guterres. Jorge Lacão, com anos de Parlamento e de direcções partidárias, caíra vítima da revisão constitucional, quanto tempo sobreviveria o "rapaz" chegado há dois anos de Amarante, a cuja câmara presidira durante seis anos e a que se candidatara por impulsão do vazio - conta Assis que assumiu a presidência da concelhia do PS em Amarante, em 1988, e como ninguém aceitasse candidatar-se pelos socialistas nas autárquicas, teve ele mesmo de avançar como candidato, percebendo a meio da campanha que ia ganhar e ser presidente da câmara aos 24 anos; aos 30 sobe a São Bento e ao secretariado nacional do PS. Mas, apesar do cepticismo com que foi encarado, Assis sobreviveu cinco anos, o tempo que duraram os governos de Guterres, à frente da bancada. E ainda que fosse nítido o seu desejo de ser chamado ao Governo em 1999, Guterres não prescindiu de ter ali a "almofada" que geria crises, como foi a decisão do primeiro-ministro de negociar com o líder da oposição, Marcelo Rebelo de Sousa, a submissão a referendo da lei aprovada pela AR que despenalizava o aborto ou, já depois a "guerra" dos deputados de Coimbra, liderados por Manuel Alegre contra a co-incineração, que chegaram a votar contra a decisão do Governo, bloqueando-a. Uma liderança conduzida com base no não-autoritarismo e no respeito pelos vários protagonismos que se sentavam na bancada. E que muitas vezes parecia apenas inexperiência e diletantismo. Mas Assis continuou igual a si mesmo e, sem se incluir em grupos ou tendências, foi torneando as crises. E criando outras. Como quando decidiu assumir a ruptura com o aparelho partidário, que há mais de duas décadas reinava no PS-Porto, e desafiou Narciso de Miranda, o senhor de Matosinhos, o homem que punha e dispunha do partido no distrito. Primeiro para perder, depois para ganhar: é eleito presidente da federação do PS no distrito do Porto em 2003. E foi como recém-eleito líder do PS-Porto que Assis tentou enfrentar os hábitos clientelares e promíscuos do velho aparelho socialista em Felgueiras. Vai à terra da autarca acusada de corrupção e fugida para o Brasil para tentar explicar as estruturas locais que a política é uma causa nobre com princípios e regras. Acaba vítima de agressão - há quem tenha então dito, com o risco de caricatura que estas classificações comportam, que Felgueiras foi a Marinha Grande de Assis, que curiosamente adere ao PS no ano em que Mário Soares preparou a sua passagem para a chefia do Estado, 1985. Será já no PS que é identificado com o grupo dos neoliberais de Álvaro Beleza, uma ligação que Assis garante ser só de "grande amizade". E afirma: "Nos partidos, há tendência a que se coloquem rótulos às pessoas. Nós no PS temos uma forte herança liberal e, nos anos 80, parte da esquerda reassumiu essa herança do ponto de vista político, moral, cultural e económico, sustentando o papel da economia de mercado numa sociedade em que o Estado tem funções reguladoras e sociais. Mas não faço parte de grupos, sou isolado e distante, não tenho instinto gregário." Ainda antes de completar 40 anos, Francisco José Pereira de Assis Miranda, nascido a 8 de Janeiro de 1965, afirma que tem noção plena de quanto a vida pública e política é relativa. "Na vida política tudo é muito volátil, passamos de situações em que estamos na crista da onda para outras em que ficamos debaixo dela. Às vezes, a diferença são 200 e tal votos, como agora me aconteceu no Porto." É assim com "enorme distanciamento e grande desprendimento" que este licenciado em Filosofia pela Universidade do Porto adverte: "Eu não dependo existencialmente da política, estou a fazer o doutoramento em Santiago de Compostela, sobre processos políticos contemporâneos, que me ocupará três anos." Mas assume que deseja "continuar a fazer política" e jura que está à frente do PS-Porto a cem por cento: "É evidente que enquanto estiver à frente da federação do Porto tenho enorme grau de envolvimento, quem preside a uma federação como a que eu pertenço tem sempre um enorme grau de envolvimento e de responsabilidade." Sobre o futuro, Francisco de Assis apenas diz: "Quem está na política como eu estou não exclui nenhum cargo. Mas não vivo obcecado e percebo que tudo é contingente e tem valor relativo." OUTROS TÍTULOS EM NACIONAL Juristas e magistrados reivindicam "profundas reformas" para investigação criminal

Formação de magistrados é "indispensável"

Burocracia , inimiga da investigação criminal

O cancelamento

Processo da pedofilia causa baixa no Governo dos Açores

PS, a geração seguinte III

Assis, o mais intelectual

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Por SÃO JOSÉ ALMEIDA

Terça-feira, 09 de Dezembro de 2003 Quando em 1997, aos 32 anos de idade, foi escolhido por António Guterres para liderar a bancada do PS que sustentava parlamentarmente o seu primeiro Governo minoritário, Francisco de Assis surpreendeu os observadores políticos e a comunicação social. Ao ar de jovem, quase imberbe, Assis juntava um discurso intelectualizado, conceptual, teórico, que demonstrava o culto da política de princípio e valores e o gosto pela oratória parlamentar clássica. Um contraste que horrorizou alguns jornalistas, mais dados a reproduzir os chamados "sound bits" num parlamento que era então farto neles, até porque tinha Paulo Portas como deputado. E logo foi vaticinado que o político precoce não sobreviveria muito tempo à frente de um grupo parlamentar que teimava em afirmar uma cultura de contrapoder, ainda que fosse a base do poder governamental de Guterres. Jorge Lacão, com anos de Parlamento e de direcções partidárias, caíra vítima da revisão constitucional, quanto tempo sobreviveria o "rapaz" chegado há dois anos de Amarante, a cuja câmara presidira durante seis anos e a que se candidatara por impulsão do vazio - conta Assis que assumiu a presidência da concelhia do PS em Amarante, em 1988, e como ninguém aceitasse candidatar-se pelos socialistas nas autárquicas, teve ele mesmo de avançar como candidato, percebendo a meio da campanha que ia ganhar e ser presidente da câmara aos 24 anos; aos 30 sobe a São Bento e ao secretariado nacional do PS. Mas, apesar do cepticismo com que foi encarado, Assis sobreviveu cinco anos, o tempo que duraram os governos de Guterres, à frente da bancada. E ainda que fosse nítido o seu desejo de ser chamado ao Governo em 1999, Guterres não prescindiu de ter ali a "almofada" que geria crises, como foi a decisão do primeiro-ministro de negociar com o líder da oposição, Marcelo Rebelo de Sousa, a submissão a referendo da lei aprovada pela AR que despenalizava o aborto ou, já depois a "guerra" dos deputados de Coimbra, liderados por Manuel Alegre contra a co-incineração, que chegaram a votar contra a decisão do Governo, bloqueando-a. Uma liderança conduzida com base no não-autoritarismo e no respeito pelos vários protagonismos que se sentavam na bancada. E que muitas vezes parecia apenas inexperiência e diletantismo. Mas Assis continuou igual a si mesmo e, sem se incluir em grupos ou tendências, foi torneando as crises. E criando outras. Como quando decidiu assumir a ruptura com o aparelho partidário, que há mais de duas décadas reinava no PS-Porto, e desafiou Narciso de Miranda, o senhor de Matosinhos, o homem que punha e dispunha do partido no distrito. Primeiro para perder, depois para ganhar: é eleito presidente da federação do PS no distrito do Porto em 2003. E foi como recém-eleito líder do PS-Porto que Assis tentou enfrentar os hábitos clientelares e promíscuos do velho aparelho socialista em Felgueiras. Vai à terra da autarca acusada de corrupção e fugida para o Brasil para tentar explicar as estruturas locais que a política é uma causa nobre com princípios e regras. Acaba vítima de agressão - há quem tenha então dito, com o risco de caricatura que estas classificações comportam, que Felgueiras foi a Marinha Grande de Assis, que curiosamente adere ao PS no ano em que Mário Soares preparou a sua passagem para a chefia do Estado, 1985. Será já no PS que é identificado com o grupo dos neoliberais de Álvaro Beleza, uma ligação que Assis garante ser só de "grande amizade". E afirma: "Nos partidos, há tendência a que se coloquem rótulos às pessoas. Nós no PS temos uma forte herança liberal e, nos anos 80, parte da esquerda reassumiu essa herança do ponto de vista político, moral, cultural e económico, sustentando o papel da economia de mercado numa sociedade em que o Estado tem funções reguladoras e sociais. Mas não faço parte de grupos, sou isolado e distante, não tenho instinto gregário." Ainda antes de completar 40 anos, Francisco José Pereira de Assis Miranda, nascido a 8 de Janeiro de 1965, afirma que tem noção plena de quanto a vida pública e política é relativa. "Na vida política tudo é muito volátil, passamos de situações em que estamos na crista da onda para outras em que ficamos debaixo dela. Às vezes, a diferença são 200 e tal votos, como agora me aconteceu no Porto." É assim com "enorme distanciamento e grande desprendimento" que este licenciado em Filosofia pela Universidade do Porto adverte: "Eu não dependo existencialmente da política, estou a fazer o doutoramento em Santiago de Compostela, sobre processos políticos contemporâneos, que me ocupará três anos." Mas assume que deseja "continuar a fazer política" e jura que está à frente do PS-Porto a cem por cento: "É evidente que enquanto estiver à frente da federação do Porto tenho enorme grau de envolvimento, quem preside a uma federação como a que eu pertenço tem sempre um enorme grau de envolvimento e de responsabilidade." Sobre o futuro, Francisco de Assis apenas diz: "Quem está na política como eu estou não exclui nenhum cargo. Mas não vivo obcecado e percebo que tudo é contingente e tem valor relativo." OUTROS TÍTULOS EM NACIONAL Juristas e magistrados reivindicam "profundas reformas" para investigação criminal

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