Não as deixem levantar

07-08-2003
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Autarcas indignados com encerramento de seis pousadas regionais

Não as Deixem Levantar EM DESTAQUE

Segunda-feira, 28 de Julho de 2003

O fim de seis unidades regionais da rede da Enatur é um duro golpe no desenvolvimento do turismo nas zonas do interior do país, avisam os presidentes de câmara dos concelhos afectados, que, em alguns casos, atribuem os maus resultados a má gestão. O plano de expansão também merece críticas por acentuar a "litoralização" do investimento.

Marisa Miranda

Até ao final deste ano, seis das 25 pousadas regionais vão ser excluídas da rede de Pousadas de Portugal da Enatur. A reduzida capacidade hoteleira e os baixos níveis de rentabilidade condenaram as unidades de Monsanto, Mestre Afonso Domingues (Batalha), Nossa Senhora das Neves (Almeida), São Jerónimo (Caramulo), São Gens (Serpa) e São Pedro (Castelo de Bode) ao encerramento ou à alienação. Decisão esta que, segundo explicaram ao PÚBLICO fontes do sector, já tinha sido decidida pelo anterior conselho de administração e constava dos termos de referência do concurso de privatização da Empresa Nacional de Turismo.

Ou seja, o consórcio vencedor liderado pelo grupo Pestana está obrigado - como qualquer outro dos concorrentes estaria - a executar quer o plano de redução previsto, quer o de expansão que contemplava a abertura de oito novas pousadas (ver texto nestas páginas). Quanto ao fecho de outras unidades, e em resposta a um requerimento apresentado por deputados do PS, como Vítor Ramalho e Fernando Serrasqueiro, o ministério da Economia assegurou que "não será contratualmente tornado compulsório que o concessionário encerre quaisquer outras pousadas". Conforme o ministério de Carlos Tavares já avançou, o concessionário está impedido de fechar pousadas históricas e poderá encerrar unidades regionais caso estas apresentem resultados negativos em três anos consecutivos.

Apesar do plano de redução da Enatur ser conhecido desde o final do ano passado, altura em que foram fechadas três pousadas regionais, a decisão não deixa de surpreender os autarcas, sobretudo os do Interior, faixa do país onde está concentrado o maior número de unidades a encerrar ou a vender. À espera de receberem ainda uma informação oficial sobre o processo, os responsáveis políticos consideram esta decisão um "erro lamentável", adiantando que constitui um duro golpe no desenvolvimento do turismo nestas zonas, voltadas cada vez mais para este sector.

Para o vice-presidente da Câmara Municipal de Serpa, José Sesinando, que nunca pensou que a pousada de São Gens fosse excluída da rede nacional, "perder uma unidade com uma auréola tão especial, um emblema da vila, não é nada bom", dada a carência que a região ainda sofre ao nível do alojamento. O desconhecimento da autarquia nesta matéria contrasta com o discurso da Região de Turismo da Planície Dourada. É que, ao contrário do executivo municipal, o presidente, José Parrinha, sabia desta possibilidade e, embora lamente a decisão, adianta que está já a ser negociada a venda da pousada de São Gens, em Serpa, a uma empresa privada interessada.

Não é só o lucro que conta

Por outro lado, a baixa rentabilidade dos equipamentos avançada pela Enatur para justificar os encerramentos não convence os autarcas. "Se a pousada da Batalha tem maus resultados é porque é mal gerida, já que tem uma óptima localização junto ao mosteiro, classificado como Património Mundial da Humanidade. Há todas as condições para ser rentável desde que seja gerida profissionalmente", sustenta o presidente da câmara municipal, António Lucas.

E este índice económico não deve ser, no entender dos líderes das regiões de turismo, suficiente para sustentar esta tomada de posição da Enatur. Existem outros indicadores, nomeadamente, no caso das aldeias históricas de Monsanto e Almeida que devem ser ponderados. "Não deve ser tido em conta apenas o rendimento, se fosse esse o espírito ter-se-ia apostado em pousadas no Litoral", defende o presidente da Região de Turismo da Serra da Estrela (RTSE) que abrange o concelho de Almeida. No entanto, Jorge Patrão, que há quase um ano conhecia o risco da Pousada de Nossa Senhora das Neves poder vir a encerrar ou ser alienada, encara este cenário como uma consequência da estratégia seguida pela Enatur nos últimos 15 anos, de aposta na criação de pousadas históricas. "Esta política está correctíssima até porque só aumenta o prestígio de Portugal, mas não se pode descurar as pousadas regionais", defende.

Depois da análise do plano de redução e de expansão previsto pela Enatur que contempla a construção de oito novas pousadas, sendo que sete delas se situam na faixa costeira e apenas uma no interior (Pousada da Serra da Estrela), a grande preocupação de Jorge Patrão é que haja uma "litoralização definitiva e acentuada do investimento". "O que temo é que se enverede por uma política de se fechar no interior e abrir no litoral e essa política não posso aceitar", acrescenta. Para o presidente da RTSE "estas pousadas são a principal peça de prestígio da marca Portugal e todo o país tem de usufruir desse investimento", por isso defende para Almeida uma solução idêntica à adoptada no caso de Santa Bárbara, em Oliveira do Hospital (outra das pousadas regionais inscritas no plano de redução) que apenas fechou depois de ter sido criada a pousada histórica do Convento do Desagravo.

Apesar de, neste momento, todos os esforços desenvolvidos pelas autarquias serem no sentido de encontrar uma gestão privada para aqueles espaços de forma a manter o seu funcionamento, todos os envolvidos neste processo são unânimes em considerar que a perda da marca de Pousadas de Portugal, sobejamente reconhecida no mercado externo, é algo que "vem decapitar a rede de oferta turística das regiões". Aliado ao receio de perder qualidade no serviço, este é um dos factores mais lamentado, sobretudo por aqueles que já perderam esse estatuto.

"Se estas pousadas continuassem na rede tinham a garantia de uma promoção quase gratuita, resultante do conceito que no estrangeiro o turista tem da marca Pousadas de Portugal. Corremos o risco de perder clientes", afirma o presidente da Região de Turismo do Nordeste Transmontano que em Dezembro do ano passado perdeu uma pousada regional, agora estalagem Santa Catarina. De qualquer forma, para António Afonso "o importante é que se conseguiu, através de um empresário da região, evitar perdas em termos de hotelaria e manter o nível de serviço prestado, sendo que o edifício acabou por sofrer obras que caso se mantivesse na rede não beneficiaria. Por isso o balanço não é assim tão negativo".

Perdas de 342 mil euros

O encerramento ou alienação de seis pousadas regionais deve-se, segundo a Enatur, quer à reduzida capacidade hoteleira quer à dificuldade da sua rentabilização - 16 quartos por unidade com poucos equipamentos e/ou instalações adicionais de suporte. Ao serem apagadas do mapa, a capacidade de alojamento da Enatur baixará para 492 quartos distribuídos por 19 pousadas, pelo que, consequentemente, aumentará para 26 a média de quartos por unidade. Em causa estão também os 148 trabalhadores que as pousadas abrangidas pelo plano de redução empregam.

De acordo com documentos a que o PÚBLICO teve acesso, a taxa de ocupação das pousadas regionais inseridas no plano de redução - onde constam ainda as já fechadas ou alienadas Santa Catarina (Miranda do Douro), São Tiago (Santiago do Cacém) e Santa Bárbara (Oliveira do Hospital) - ficou-se, em 2002, pelos 42,8 por cento, quando em 2000 era de 47,8 por cento. Valores que contrastam com a taxa de ocupação registada, em 2002, pelas restantes pousadas regionais e históricas, de 49,6 por cento e 54 por cento, respectivamente. As pousadas a encerrar e já fechadas deram à Enatur, em 2002, receitas líquidas totais de 2,7 milhões de euros, tendo o EBITDA, meios libertos pela exploração, sido negativo em 342 mil euros.

No final do ano transacto o valor contabilístico total das pousadas incluídas no plano de redução e que ainda não foram alienadas ascendia aos quatro milhões de euros, valor este que se estima, conforme se pode ler nos mesmos documentos, que "se encontre significativamente abaixo dos respectivo valor real de mercado", como aconteceu com as pousadas de São Tiago e de Santa Catarina foram alienadas por 1,825 milhares de euros, de que resultou numa mais-valia de 1 milhão de euros.

Autarcas indignados com encerramento de seis pousadas regionais

Não as Deixem Levantar EM DESTAQUE

Segunda-feira, 28 de Julho de 2003

O fim de seis unidades regionais da rede da Enatur é um duro golpe no desenvolvimento do turismo nas zonas do interior do país, avisam os presidentes de câmara dos concelhos afectados, que, em alguns casos, atribuem os maus resultados a má gestão. O plano de expansão também merece críticas por acentuar a "litoralização" do investimento.

Marisa Miranda

Até ao final deste ano, seis das 25 pousadas regionais vão ser excluídas da rede de Pousadas de Portugal da Enatur. A reduzida capacidade hoteleira e os baixos níveis de rentabilidade condenaram as unidades de Monsanto, Mestre Afonso Domingues (Batalha), Nossa Senhora das Neves (Almeida), São Jerónimo (Caramulo), São Gens (Serpa) e São Pedro (Castelo de Bode) ao encerramento ou à alienação. Decisão esta que, segundo explicaram ao PÚBLICO fontes do sector, já tinha sido decidida pelo anterior conselho de administração e constava dos termos de referência do concurso de privatização da Empresa Nacional de Turismo.

Ou seja, o consórcio vencedor liderado pelo grupo Pestana está obrigado - como qualquer outro dos concorrentes estaria - a executar quer o plano de redução previsto, quer o de expansão que contemplava a abertura de oito novas pousadas (ver texto nestas páginas). Quanto ao fecho de outras unidades, e em resposta a um requerimento apresentado por deputados do PS, como Vítor Ramalho e Fernando Serrasqueiro, o ministério da Economia assegurou que "não será contratualmente tornado compulsório que o concessionário encerre quaisquer outras pousadas". Conforme o ministério de Carlos Tavares já avançou, o concessionário está impedido de fechar pousadas históricas e poderá encerrar unidades regionais caso estas apresentem resultados negativos em três anos consecutivos.

Apesar do plano de redução da Enatur ser conhecido desde o final do ano passado, altura em que foram fechadas três pousadas regionais, a decisão não deixa de surpreender os autarcas, sobretudo os do Interior, faixa do país onde está concentrado o maior número de unidades a encerrar ou a vender. À espera de receberem ainda uma informação oficial sobre o processo, os responsáveis políticos consideram esta decisão um "erro lamentável", adiantando que constitui um duro golpe no desenvolvimento do turismo nestas zonas, voltadas cada vez mais para este sector.

Para o vice-presidente da Câmara Municipal de Serpa, José Sesinando, que nunca pensou que a pousada de São Gens fosse excluída da rede nacional, "perder uma unidade com uma auréola tão especial, um emblema da vila, não é nada bom", dada a carência que a região ainda sofre ao nível do alojamento. O desconhecimento da autarquia nesta matéria contrasta com o discurso da Região de Turismo da Planície Dourada. É que, ao contrário do executivo municipal, o presidente, José Parrinha, sabia desta possibilidade e, embora lamente a decisão, adianta que está já a ser negociada a venda da pousada de São Gens, em Serpa, a uma empresa privada interessada.

Não é só o lucro que conta

Por outro lado, a baixa rentabilidade dos equipamentos avançada pela Enatur para justificar os encerramentos não convence os autarcas. "Se a pousada da Batalha tem maus resultados é porque é mal gerida, já que tem uma óptima localização junto ao mosteiro, classificado como Património Mundial da Humanidade. Há todas as condições para ser rentável desde que seja gerida profissionalmente", sustenta o presidente da câmara municipal, António Lucas.

E este índice económico não deve ser, no entender dos líderes das regiões de turismo, suficiente para sustentar esta tomada de posição da Enatur. Existem outros indicadores, nomeadamente, no caso das aldeias históricas de Monsanto e Almeida que devem ser ponderados. "Não deve ser tido em conta apenas o rendimento, se fosse esse o espírito ter-se-ia apostado em pousadas no Litoral", defende o presidente da Região de Turismo da Serra da Estrela (RTSE) que abrange o concelho de Almeida. No entanto, Jorge Patrão, que há quase um ano conhecia o risco da Pousada de Nossa Senhora das Neves poder vir a encerrar ou ser alienada, encara este cenário como uma consequência da estratégia seguida pela Enatur nos últimos 15 anos, de aposta na criação de pousadas históricas. "Esta política está correctíssima até porque só aumenta o prestígio de Portugal, mas não se pode descurar as pousadas regionais", defende.

Depois da análise do plano de redução e de expansão previsto pela Enatur que contempla a construção de oito novas pousadas, sendo que sete delas se situam na faixa costeira e apenas uma no interior (Pousada da Serra da Estrela), a grande preocupação de Jorge Patrão é que haja uma "litoralização definitiva e acentuada do investimento". "O que temo é que se enverede por uma política de se fechar no interior e abrir no litoral e essa política não posso aceitar", acrescenta. Para o presidente da RTSE "estas pousadas são a principal peça de prestígio da marca Portugal e todo o país tem de usufruir desse investimento", por isso defende para Almeida uma solução idêntica à adoptada no caso de Santa Bárbara, em Oliveira do Hospital (outra das pousadas regionais inscritas no plano de redução) que apenas fechou depois de ter sido criada a pousada histórica do Convento do Desagravo.

Apesar de, neste momento, todos os esforços desenvolvidos pelas autarquias serem no sentido de encontrar uma gestão privada para aqueles espaços de forma a manter o seu funcionamento, todos os envolvidos neste processo são unânimes em considerar que a perda da marca de Pousadas de Portugal, sobejamente reconhecida no mercado externo, é algo que "vem decapitar a rede de oferta turística das regiões". Aliado ao receio de perder qualidade no serviço, este é um dos factores mais lamentado, sobretudo por aqueles que já perderam esse estatuto.

"Se estas pousadas continuassem na rede tinham a garantia de uma promoção quase gratuita, resultante do conceito que no estrangeiro o turista tem da marca Pousadas de Portugal. Corremos o risco de perder clientes", afirma o presidente da Região de Turismo do Nordeste Transmontano que em Dezembro do ano passado perdeu uma pousada regional, agora estalagem Santa Catarina. De qualquer forma, para António Afonso "o importante é que se conseguiu, através de um empresário da região, evitar perdas em termos de hotelaria e manter o nível de serviço prestado, sendo que o edifício acabou por sofrer obras que caso se mantivesse na rede não beneficiaria. Por isso o balanço não é assim tão negativo".

Perdas de 342 mil euros

O encerramento ou alienação de seis pousadas regionais deve-se, segundo a Enatur, quer à reduzida capacidade hoteleira quer à dificuldade da sua rentabilização - 16 quartos por unidade com poucos equipamentos e/ou instalações adicionais de suporte. Ao serem apagadas do mapa, a capacidade de alojamento da Enatur baixará para 492 quartos distribuídos por 19 pousadas, pelo que, consequentemente, aumentará para 26 a média de quartos por unidade. Em causa estão também os 148 trabalhadores que as pousadas abrangidas pelo plano de redução empregam.

De acordo com documentos a que o PÚBLICO teve acesso, a taxa de ocupação das pousadas regionais inseridas no plano de redução - onde constam ainda as já fechadas ou alienadas Santa Catarina (Miranda do Douro), São Tiago (Santiago do Cacém) e Santa Bárbara (Oliveira do Hospital) - ficou-se, em 2002, pelos 42,8 por cento, quando em 2000 era de 47,8 por cento. Valores que contrastam com a taxa de ocupação registada, em 2002, pelas restantes pousadas regionais e históricas, de 49,6 por cento e 54 por cento, respectivamente. As pousadas a encerrar e já fechadas deram à Enatur, em 2002, receitas líquidas totais de 2,7 milhões de euros, tendo o EBITDA, meios libertos pela exploração, sido negativo em 342 mil euros.

No final do ano transacto o valor contabilístico total das pousadas incluídas no plano de redução e que ainda não foram alienadas ascendia aos quatro milhões de euros, valor este que se estima, conforme se pode ler nos mesmos documentos, que "se encontre significativamente abaixo dos respectivo valor real de mercado", como aconteceu com as pousadas de São Tiago e de Santa Catarina foram alienadas por 1,825 milhares de euros, de que resultou numa mais-valia de 1 milhão de euros.

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