Ser ou não ser "funcionário", eis a questão

13-07-2002
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Ser Ou Não Ser "Funcionário", Eis a Questão

Por NUNO SÁ LOURENÇO

Sábado, 6 de Julho de 2002

O relatório em apreciação explica porque é que um trabalhador da televisão do Estado não pode ser considerado funcionário do... Estado

Foram necessárias 30 páginas de relatório, municiadas de citações de 13 "doutos professores" em Direito para se chegar à conclusão que "funcionário" não é a mesma coisa que "trabalhador" do Estado. É nesta diferença que se baseia o parecer do social-democrata Eugénio Marinho ao recomendar à comissão de Ética que Maria Elisa "não acarreta a incompatibilidade prevista" pelo Estatuto dos Deputados.

"É que não só a RTP não pode ser incluída no leque das 'outras pessoas colectivas públicas' além do Estado, como a deputada Maria Elisa, desempenhando funções na RTP, não pode ser considerada, para os legais efeitos 'funcionário'."

A argumentação segue, portanto, no sentido de considerar Maria Elisa trabalhadora com contrato individual de trabalho não sendo, por isso, funcionária pública ao serviço do Estado. É o próprio relator que define no relatório esta como a questão mais pertinente: "Tudo dependerá, no fundo, do sentido que se der à expressão 'funcionário... de outras pessoas colectivas públicas' em termos de definir se nela se enquadra, ou não, os trabalhadores das sociedades anónimas de capitais exclusivamente públicos, como é o caso da RTP."

Eugénio Marinho recupera Marcelo Caetano, passa por Sousa Franco e chega a Marcelo Rebelo de Sousa para defender que os trabalhadores da televisão do Estado não são funcionários do... Estado: "O pessoal da RTP é, assim, constituído não por funcionários submetidos ao regime jurídico da função pública, mas sim por trabalhadores sujeitos à legislação laboral comum. Daí que aos trabalhadores da RTP não se aplique a incompatibilidade consagrada na alínea h) do nº 1 do artigo 20º do Estatuto de Deputados." Isto porque porque a RTP não é uma empresa do... Estado: "Conclui-se portanto que não obstante integrar actualmente, por força da lei, na concepção de empresa pública, a RTP continua a ser, como sociedade anónima que é, uma pessoa colectiva privada, embora de capitais públicos."

A contestação do PS

Contra esta linha de argumentação, o grupo parlamentar socialista tinha já preparada para o próprio dia do debate e esperada votação do relatório na comissão, uma declaração de voto contrária, que não chegou a ser apresentada. Aí se podia ler os pontos em que o PS detectara "contradições demasiado chocantes" no trabalho de Eugénio Marinho.

O principal partido da oposição criticou o "conceito restritivo de funcionário" utilizado pelo relator para retirar Maria Elisa da alçada pública. Para o sustentar, a declaração de voto citou a Constituição da República "a qual refere que no exercício das suas funções os trabalhadores da administração pública e demais agentes do Estado e outras entidades públicas estão exclusivamente ao serviço do interesse público". Citação retirada para o PS deixar no ar uma pergunta: "Que sentido teria considerar abrangido por um regime de incompatibilidades o trabalhador da administração pública com estatuto de funcionário e não abranger o trabalhador da mesma administração com contrato individual de trabalho?"

Também em relação ao estatuto da RTP, os socialistas encontram outra interpretação da lei. Ao abordar "a qualificação que é dada às pessoas de direito privado mas exclusiva ou maioritariamente pertencentes ao Estado", a declaração de voto vai buscar o decreto-lei nº 558/99 para lembrar que "são consideradas empresas públicas, mesmo tratando-se de sociedades constituídas nos termos da lei comercial, aquelas empresas em que haja detenção pelo Estado ou outras entidades públicas estatais, de forma directa ou indirecta, da maioria do capital ou dos direitos de voto".

Ser Ou Não Ser "Funcionário", Eis a Questão

Por NUNO SÁ LOURENÇO

Sábado, 6 de Julho de 2002

O relatório em apreciação explica porque é que um trabalhador da televisão do Estado não pode ser considerado funcionário do... Estado

Foram necessárias 30 páginas de relatório, municiadas de citações de 13 "doutos professores" em Direito para se chegar à conclusão que "funcionário" não é a mesma coisa que "trabalhador" do Estado. É nesta diferença que se baseia o parecer do social-democrata Eugénio Marinho ao recomendar à comissão de Ética que Maria Elisa "não acarreta a incompatibilidade prevista" pelo Estatuto dos Deputados.

"É que não só a RTP não pode ser incluída no leque das 'outras pessoas colectivas públicas' além do Estado, como a deputada Maria Elisa, desempenhando funções na RTP, não pode ser considerada, para os legais efeitos 'funcionário'."

A argumentação segue, portanto, no sentido de considerar Maria Elisa trabalhadora com contrato individual de trabalho não sendo, por isso, funcionária pública ao serviço do Estado. É o próprio relator que define no relatório esta como a questão mais pertinente: "Tudo dependerá, no fundo, do sentido que se der à expressão 'funcionário... de outras pessoas colectivas públicas' em termos de definir se nela se enquadra, ou não, os trabalhadores das sociedades anónimas de capitais exclusivamente públicos, como é o caso da RTP."

Eugénio Marinho recupera Marcelo Caetano, passa por Sousa Franco e chega a Marcelo Rebelo de Sousa para defender que os trabalhadores da televisão do Estado não são funcionários do... Estado: "O pessoal da RTP é, assim, constituído não por funcionários submetidos ao regime jurídico da função pública, mas sim por trabalhadores sujeitos à legislação laboral comum. Daí que aos trabalhadores da RTP não se aplique a incompatibilidade consagrada na alínea h) do nº 1 do artigo 20º do Estatuto de Deputados." Isto porque porque a RTP não é uma empresa do... Estado: "Conclui-se portanto que não obstante integrar actualmente, por força da lei, na concepção de empresa pública, a RTP continua a ser, como sociedade anónima que é, uma pessoa colectiva privada, embora de capitais públicos."

A contestação do PS

Contra esta linha de argumentação, o grupo parlamentar socialista tinha já preparada para o próprio dia do debate e esperada votação do relatório na comissão, uma declaração de voto contrária, que não chegou a ser apresentada. Aí se podia ler os pontos em que o PS detectara "contradições demasiado chocantes" no trabalho de Eugénio Marinho.

O principal partido da oposição criticou o "conceito restritivo de funcionário" utilizado pelo relator para retirar Maria Elisa da alçada pública. Para o sustentar, a declaração de voto citou a Constituição da República "a qual refere que no exercício das suas funções os trabalhadores da administração pública e demais agentes do Estado e outras entidades públicas estão exclusivamente ao serviço do interesse público". Citação retirada para o PS deixar no ar uma pergunta: "Que sentido teria considerar abrangido por um regime de incompatibilidades o trabalhador da administração pública com estatuto de funcionário e não abranger o trabalhador da mesma administração com contrato individual de trabalho?"

Também em relação ao estatuto da RTP, os socialistas encontram outra interpretação da lei. Ao abordar "a qualificação que é dada às pessoas de direito privado mas exclusiva ou maioritariamente pertencentes ao Estado", a declaração de voto vai buscar o decreto-lei nº 558/99 para lembrar que "são consideradas empresas públicas, mesmo tratando-se de sociedades constituídas nos termos da lei comercial, aquelas empresas em que haja detenção pelo Estado ou outras entidades públicas estatais, de forma directa ou indirecta, da maioria do capital ou dos direitos de voto".

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