O aeroporto da Portela faz 60 anos

02-11-2002
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O Aeroporto da Portela Faz 60 Anos

Por HENRIQUES-MATEUS

Segunda-feira, 21 de Outubro de 2002 Antes, existiam os campos de aviação de Alverca e Sintra, mais a Doca dos Olivais para os hidroaviões. Mas era pouco. E então nasceu o Aeroporto da Portela, em Lisboa. Foi há 60 anos, quando a cidade acabava no Areeiro e juntos das novíssimas pistas de cimento se vivia uma paz bucólica, com pardais a chilrearem. Aberto ao tráfego aéreo há 60 anos, o Aeroporto Internacional de Lisboa foi menos uma obra do Estado Novo do que a concretização de um velho anseio sem a qual Portugal corria o risco de ser excluído das rotas aéreas mundiais, vendo os aviões comerciais a sulcarem rotas distantes. O momento da inauguração, em plena II Guerra Mundial e no momento em que o conflito estava mais aceso e indefinido, acabou por tirar partido da posição geográfica de Portugal face ao Atlântico e à própria Europa, colocando o país numa posição privilegiada e dando-lhe a vantagem necessária para que, nos anos seguintes, pudesse desempenhar um papel relevante no mundo da aviação comercial transoceânica. A ideia de construir um aeroporto em Lisboa remontava aos anos 20, quando se pensou que os terrenos do Jockey Club, no Campo Grande, reuniam as condições necessárias para a construção de um campo de aviação internacional. Esta hipótese, que chegou a ter os seus adeptos, acabou por nunca se concretizar, vencida, na prática, pela opinião dos que anteviam um futuro mais largo para a aviação comercial e que descobriam "no planalto que se estende a norte do Campo Grande, entre a Charneca e a Portela de Sacavém" o terreno ideal para a construção de um grande aeroporto. A ideia foi ganhando forma e adeptos, de tal modo que em 1928 era ponto assente que a Portela de Sacavém era o único sítio viável para a construção de uma infra-estrutura tão importante como dispendiosa. Para essa certeza, muito contribuía a situação planáltica do lugar, com uma orografia excelente, sem obstáculos circundantes dignos de registo e com um regime de ventos constante e muito favorável para as necessidades da aviação. A isto acrescia, ainda, a grande proximidade com Lisboa e, a partir dos anos trinta, com a Doca dos Olivais (hoje Parque das Nações), onde, por esse tempo, se situava o aeroporto que servia os hidroaviões. Mas nesse ano de 1928 o Aeroporto da Portela de Sacavém pouco mais era do que uma miragem a perder-se em projecto de concretização sempre adiada, pois Alverca e Sintra ainda eram excelentes campos de aviação e iam chegando, perfeitamente, para as necessidades. O projecto do futuro aeroporto internacional só começou a ganhar forma na década de 30, quando Duarte Pacheco assumiu a presidência da Câmara Municipal de Lisboa (enquanto exercia cumulativamente o cargo de Ministro das Obras Públicas). Nessa altura, em que a cidade rompeu com o modelo herdado do início do século, foram expropriados os primeiros terrenos necessários para a construção (cujo projecto fora incluído nos planos de actividade municipal e acabaria por custar aos seus cofres cerca de setenta milhões de escudos). Quase de seguida, iniciaram-se as primeiras obras de terraplenagem e os estudos para a construção da primeira aerogare, realizados pelo arquitecto Francisco Keil do Amaral. Marcado por uma intenção modelar, onde se incluiriam as mais modernas infra-estruturas aeroportuárias, o novo aeroporto reuniu, logo desde o início (e apesar da escassez de materiais provocada pela guerra), todas as condições para acolher os passageiros, nomeadamente um excelente edifício de aerogare, muito fotografado na época, e que era constituído por dois espaçosos pisos, de onde se destacava uma fachada elegante, encimada por uma alta torre de controlo. Funcionavam no primeiro piso os postos de Alfândega e de Polícia, assim como o serviço de passageiros, o bar e o restaurante. E no piso superior, formado por uma espécie de "deck", os serviços de direcção do aeroporto, meteorológicos e radiotelegráficos. Dotado de quatro modernas pistas de cimento, cada uma delas com mais de um quilómetro, o novo aeroporto destacava-se, também, pelo facto de possuir um excelente traçado, que não só lhe permitia tirar o máximo partido do regime de ventos, como operar com qualquer tipo de condições meteorológicas. A isto, juntava-se um moderníssimo revestimento betuminoso, nas pistas e na placa de estacionamento, devidamente drenado e preparado para as piores condições climatéricas. O campo envolvente era relvado e nele tinham sido lançadas sete variedades de sementes de relva vindas dos Estados Unidos, num total de 16 toneladas. O cuidado com este espaço, que não era puramente estético, devia-se ao facto de os planos de relva permitirem, também eles, efectuar aterragens e descolagens alternativas, constituindo-se, escrevia ao tempo "O Século", em "faixas de rolagem, próprias para o inverno". As primeiras experiências na Portela com aviões aconteceram na primeira quinzena de 1942 e estiveram a cargo do Conselho Nacional do Ar, que se limitou a confirmar a excelência das pistas e a "deslumbrante" iluminação das mesmas, que além de permitir o movimento aéreo nocturno facilitava as aterragens e descolagens em condições de pouca visibilidade. Mas faltavam a "aparelhagem de protecção à navegação aérea" (radar), que ainda não tinha chegado dos Estados Unidos, e os hangares para recolha e reparação dos aviões, que não tinha sido possível construir devido à extrema falta de materiais. Considerado apto a funcionar, a data para a inauguração oficial seria agendada para 25 de Outubro, mas os primeiros aviões começaram a chegar antes. Em "O Século" de 19 de Outubro podia ler-se: "Do Aeroporto de Lisboa partem hoje os primeiros aviões de carreira. Milhares de pessoas acorreram ontem à Portela de Sacavém para admirar o novo aeroporto, que hoje passará a ser, efectivamente, utilizado pelo tráfego aéreo comercial com escala no nosso país. Tão grande era o número de pessoas, que os elementos da Guarda Fiscal e da GNR, a cavalo, aos quais estava confiada a guarda do aeroporto, se viram em sérias dificuldades no desempenho da sua missão. Numa das pistas encontrava-se um avião da companhia Ibéria, que assegura o transporte de passageiros entre Madrid e Lisboa, e que, depois de ter deixado aqueles em Sintra (...) demandou o Aeroporto da Portela de Sacavém. Dali sairá hoje de manhã com carga e passageiros para a capital espanhola. Vindos de Sintra, igualmente de madrugada, desceram ali os aparelhos da Aéro-Portuguesa e da Ala Litória a-fim-de seguirem viagem mais tarde." Dias volvidos começaram a cruzar-se na Placa da Portela aparelhos de diferentes nacionalidades, por vezes com bandeiras inimigas, mas que ali tinham um refúgio de paz. Nesses primeiros tempos, vezes houve em que se registaram episódios de algum dramatismo, como aquele que Carlos Bleck relata no seu livro "Rumo à Índia" e que aconteceu quando um quadrimotor Liberator da RAF, com bastante combustível e bombas a bordo, foi obrigado a aterrar de emergência por causa de avarias graves sofridas no decurso de um ataque inimigo. "Entre os estragos, eram bem visíveis um motor parado e um dos trens de aterragem recolhido. Uma vez iniciada a aterragem, e depois de um toque-de-pista que parecia normal, o bombardeiro começou a ficar descomandado e à medida que ia perdendo velocidade iniciou um cavalo de pau violentíssimo, até que se imobilizou, bruscamente, num dos lados do asfalto; acto contínuo começaram a sair pela porta larga da retaguarda, que logo vimos abrir-se, grossos rolos de fumo e algumas labaredas, ao passo que a tripulação, composta por de cinco homens, saltava para o chão e iniciava uma corrida desordenada , fazendo sinais para que a equipa de socorro - que se encontrava a uns escassos 50 metros - se afastasse, pois a tripulação já estava "safa" e o avião continha bombas e combustível bastante para pulverizar tudo, a qualquer segundo, num raio de muitos metros". E sem esperar resposta, os homens desapareceram em direcção ao edifício da aerogare que distava dali quase um quilómetro, enquanto o director do aeroporto, o coronel Beja, Carlos Bleck e cinco bombeiros da equipa de socorro ficavam perplexos. "Ciente do perigo, e uma vez que não havia vidas em risco, o coronel Beja deu ordens para retirar, mas qual não foi a surpresa (...) quando o chefe de piquete dos Bombeiros, em acto de grave indisciplina mas simultaneamente de grande beleza, afirmou decidido, enquanto avançava o pronto-socorro para o avião sinistrado: 'Se há fogo, apaga-se o fogo, com bombas ou sem bombas a bordo!'" Uma vez dentro da aeronave, depressa se verificou que o fogo tinha sido ateado propositadamente pela tripulação antes de abandonar o aparelho - procedimento usual e que tinha por fim evitar que o avião caísse em mãos de estranhos. Enquanto os bombeiros dominavam os focos de incêndio, Beja e Bleck cortavam os contactos e desligavam os motores. O avião não explodiu, mas também não teve qualquer proveito. E a odisseia, que durante uns 15 ou 20 minutos trouxe os homens atarefados, foi um dos maiores sustos que Carlos Bleck experimentou na vida e, se para alguma coisa serviu, foi para a pista ter permanecido novinha e intacta, sem qualquer beliscadura! Outras histórias marcam esses primeiros tempos. Algumas, conta-as o comandante Silva Soares no seu livro "Histórias com Asas", onde, referindo-se aos primeiros tempos da TAP, escreve sobre os "anos verdes" da Portela, quando a transportadora aérea estava instalada em duas barracas de madeira de dez metros por cinco, feitas com os caixotes onde tinham vindo embalados alguns aviões para a Aeronáutica Militar. Nesse tempo, não havia transportes públicos para o aeroporto e a companhia fretava um autocarro à empresa Táxis Palhinhas para levar toda a gente para o trabalho. Uma vez na Portela, havia que palmilhar centenas de metros, sobre barrancos e lombas de aterros e de entulhos, sempre enlameados no inverno. Era o tempo em que a cidade acabava no Areeiro e em que (no dizer de um antigo director da Portela) a vida no aeroporto era de uma pacatez bucólica, onde os pardais chilreavam todo o dia e os rouxinóis para ali iam celebrar a madrugada. OUTROS TÍTULOS EM PÚBLICA

Bem-vindos à nossa prisão - Uma ilha de liberdade em Tires

Quem é o serial-killer de Washington?

"Só haverá casino se o povo de Lisboa quiser"

O jogo não me diverte

Egoísta é um imperativo

O aeroporto da Portela faz 60 anos

CRÓNICAS

Uma cega que não vê

Souvenirs pieux

HISTÓRIAS DE AMOR

Linguagem Universal

COCKTAIL

Grandes bebedores - Janis Joplin (1943-1970)

RECEITA

Frango Vietname

CARTAS DA MAYA

Cartas da Maya

DESAFIOS

Jogo em 3x3

O Aeroporto da Portela Faz 60 Anos

Por HENRIQUES-MATEUS

Segunda-feira, 21 de Outubro de 2002 Antes, existiam os campos de aviação de Alverca e Sintra, mais a Doca dos Olivais para os hidroaviões. Mas era pouco. E então nasceu o Aeroporto da Portela, em Lisboa. Foi há 60 anos, quando a cidade acabava no Areeiro e juntos das novíssimas pistas de cimento se vivia uma paz bucólica, com pardais a chilrearem. Aberto ao tráfego aéreo há 60 anos, o Aeroporto Internacional de Lisboa foi menos uma obra do Estado Novo do que a concretização de um velho anseio sem a qual Portugal corria o risco de ser excluído das rotas aéreas mundiais, vendo os aviões comerciais a sulcarem rotas distantes. O momento da inauguração, em plena II Guerra Mundial e no momento em que o conflito estava mais aceso e indefinido, acabou por tirar partido da posição geográfica de Portugal face ao Atlântico e à própria Europa, colocando o país numa posição privilegiada e dando-lhe a vantagem necessária para que, nos anos seguintes, pudesse desempenhar um papel relevante no mundo da aviação comercial transoceânica. A ideia de construir um aeroporto em Lisboa remontava aos anos 20, quando se pensou que os terrenos do Jockey Club, no Campo Grande, reuniam as condições necessárias para a construção de um campo de aviação internacional. Esta hipótese, que chegou a ter os seus adeptos, acabou por nunca se concretizar, vencida, na prática, pela opinião dos que anteviam um futuro mais largo para a aviação comercial e que descobriam "no planalto que se estende a norte do Campo Grande, entre a Charneca e a Portela de Sacavém" o terreno ideal para a construção de um grande aeroporto. A ideia foi ganhando forma e adeptos, de tal modo que em 1928 era ponto assente que a Portela de Sacavém era o único sítio viável para a construção de uma infra-estrutura tão importante como dispendiosa. Para essa certeza, muito contribuía a situação planáltica do lugar, com uma orografia excelente, sem obstáculos circundantes dignos de registo e com um regime de ventos constante e muito favorável para as necessidades da aviação. A isto acrescia, ainda, a grande proximidade com Lisboa e, a partir dos anos trinta, com a Doca dos Olivais (hoje Parque das Nações), onde, por esse tempo, se situava o aeroporto que servia os hidroaviões. Mas nesse ano de 1928 o Aeroporto da Portela de Sacavém pouco mais era do que uma miragem a perder-se em projecto de concretização sempre adiada, pois Alverca e Sintra ainda eram excelentes campos de aviação e iam chegando, perfeitamente, para as necessidades. O projecto do futuro aeroporto internacional só começou a ganhar forma na década de 30, quando Duarte Pacheco assumiu a presidência da Câmara Municipal de Lisboa (enquanto exercia cumulativamente o cargo de Ministro das Obras Públicas). Nessa altura, em que a cidade rompeu com o modelo herdado do início do século, foram expropriados os primeiros terrenos necessários para a construção (cujo projecto fora incluído nos planos de actividade municipal e acabaria por custar aos seus cofres cerca de setenta milhões de escudos). Quase de seguida, iniciaram-se as primeiras obras de terraplenagem e os estudos para a construção da primeira aerogare, realizados pelo arquitecto Francisco Keil do Amaral. Marcado por uma intenção modelar, onde se incluiriam as mais modernas infra-estruturas aeroportuárias, o novo aeroporto reuniu, logo desde o início (e apesar da escassez de materiais provocada pela guerra), todas as condições para acolher os passageiros, nomeadamente um excelente edifício de aerogare, muito fotografado na época, e que era constituído por dois espaçosos pisos, de onde se destacava uma fachada elegante, encimada por uma alta torre de controlo. Funcionavam no primeiro piso os postos de Alfândega e de Polícia, assim como o serviço de passageiros, o bar e o restaurante. E no piso superior, formado por uma espécie de "deck", os serviços de direcção do aeroporto, meteorológicos e radiotelegráficos. Dotado de quatro modernas pistas de cimento, cada uma delas com mais de um quilómetro, o novo aeroporto destacava-se, também, pelo facto de possuir um excelente traçado, que não só lhe permitia tirar o máximo partido do regime de ventos, como operar com qualquer tipo de condições meteorológicas. A isto, juntava-se um moderníssimo revestimento betuminoso, nas pistas e na placa de estacionamento, devidamente drenado e preparado para as piores condições climatéricas. O campo envolvente era relvado e nele tinham sido lançadas sete variedades de sementes de relva vindas dos Estados Unidos, num total de 16 toneladas. O cuidado com este espaço, que não era puramente estético, devia-se ao facto de os planos de relva permitirem, também eles, efectuar aterragens e descolagens alternativas, constituindo-se, escrevia ao tempo "O Século", em "faixas de rolagem, próprias para o inverno". As primeiras experiências na Portela com aviões aconteceram na primeira quinzena de 1942 e estiveram a cargo do Conselho Nacional do Ar, que se limitou a confirmar a excelência das pistas e a "deslumbrante" iluminação das mesmas, que além de permitir o movimento aéreo nocturno facilitava as aterragens e descolagens em condições de pouca visibilidade. Mas faltavam a "aparelhagem de protecção à navegação aérea" (radar), que ainda não tinha chegado dos Estados Unidos, e os hangares para recolha e reparação dos aviões, que não tinha sido possível construir devido à extrema falta de materiais. Considerado apto a funcionar, a data para a inauguração oficial seria agendada para 25 de Outubro, mas os primeiros aviões começaram a chegar antes. Em "O Século" de 19 de Outubro podia ler-se: "Do Aeroporto de Lisboa partem hoje os primeiros aviões de carreira. Milhares de pessoas acorreram ontem à Portela de Sacavém para admirar o novo aeroporto, que hoje passará a ser, efectivamente, utilizado pelo tráfego aéreo comercial com escala no nosso país. Tão grande era o número de pessoas, que os elementos da Guarda Fiscal e da GNR, a cavalo, aos quais estava confiada a guarda do aeroporto, se viram em sérias dificuldades no desempenho da sua missão. Numa das pistas encontrava-se um avião da companhia Ibéria, que assegura o transporte de passageiros entre Madrid e Lisboa, e que, depois de ter deixado aqueles em Sintra (...) demandou o Aeroporto da Portela de Sacavém. Dali sairá hoje de manhã com carga e passageiros para a capital espanhola. Vindos de Sintra, igualmente de madrugada, desceram ali os aparelhos da Aéro-Portuguesa e da Ala Litória a-fim-de seguirem viagem mais tarde." Dias volvidos começaram a cruzar-se na Placa da Portela aparelhos de diferentes nacionalidades, por vezes com bandeiras inimigas, mas que ali tinham um refúgio de paz. Nesses primeiros tempos, vezes houve em que se registaram episódios de algum dramatismo, como aquele que Carlos Bleck relata no seu livro "Rumo à Índia" e que aconteceu quando um quadrimotor Liberator da RAF, com bastante combustível e bombas a bordo, foi obrigado a aterrar de emergência por causa de avarias graves sofridas no decurso de um ataque inimigo. "Entre os estragos, eram bem visíveis um motor parado e um dos trens de aterragem recolhido. Uma vez iniciada a aterragem, e depois de um toque-de-pista que parecia normal, o bombardeiro começou a ficar descomandado e à medida que ia perdendo velocidade iniciou um cavalo de pau violentíssimo, até que se imobilizou, bruscamente, num dos lados do asfalto; acto contínuo começaram a sair pela porta larga da retaguarda, que logo vimos abrir-se, grossos rolos de fumo e algumas labaredas, ao passo que a tripulação, composta por de cinco homens, saltava para o chão e iniciava uma corrida desordenada , fazendo sinais para que a equipa de socorro - que se encontrava a uns escassos 50 metros - se afastasse, pois a tripulação já estava "safa" e o avião continha bombas e combustível bastante para pulverizar tudo, a qualquer segundo, num raio de muitos metros". E sem esperar resposta, os homens desapareceram em direcção ao edifício da aerogare que distava dali quase um quilómetro, enquanto o director do aeroporto, o coronel Beja, Carlos Bleck e cinco bombeiros da equipa de socorro ficavam perplexos. "Ciente do perigo, e uma vez que não havia vidas em risco, o coronel Beja deu ordens para retirar, mas qual não foi a surpresa (...) quando o chefe de piquete dos Bombeiros, em acto de grave indisciplina mas simultaneamente de grande beleza, afirmou decidido, enquanto avançava o pronto-socorro para o avião sinistrado: 'Se há fogo, apaga-se o fogo, com bombas ou sem bombas a bordo!'" Uma vez dentro da aeronave, depressa se verificou que o fogo tinha sido ateado propositadamente pela tripulação antes de abandonar o aparelho - procedimento usual e que tinha por fim evitar que o avião caísse em mãos de estranhos. Enquanto os bombeiros dominavam os focos de incêndio, Beja e Bleck cortavam os contactos e desligavam os motores. O avião não explodiu, mas também não teve qualquer proveito. E a odisseia, que durante uns 15 ou 20 minutos trouxe os homens atarefados, foi um dos maiores sustos que Carlos Bleck experimentou na vida e, se para alguma coisa serviu, foi para a pista ter permanecido novinha e intacta, sem qualquer beliscadura! Outras histórias marcam esses primeiros tempos. Algumas, conta-as o comandante Silva Soares no seu livro "Histórias com Asas", onde, referindo-se aos primeiros tempos da TAP, escreve sobre os "anos verdes" da Portela, quando a transportadora aérea estava instalada em duas barracas de madeira de dez metros por cinco, feitas com os caixotes onde tinham vindo embalados alguns aviões para a Aeronáutica Militar. Nesse tempo, não havia transportes públicos para o aeroporto e a companhia fretava um autocarro à empresa Táxis Palhinhas para levar toda a gente para o trabalho. Uma vez na Portela, havia que palmilhar centenas de metros, sobre barrancos e lombas de aterros e de entulhos, sempre enlameados no inverno. Era o tempo em que a cidade acabava no Areeiro e em que (no dizer de um antigo director da Portela) a vida no aeroporto era de uma pacatez bucólica, onde os pardais chilreavam todo o dia e os rouxinóis para ali iam celebrar a madrugada. OUTROS TÍTULOS EM PÚBLICA

Bem-vindos à nossa prisão - Uma ilha de liberdade em Tires

Quem é o serial-killer de Washington?

"Só haverá casino se o povo de Lisboa quiser"

O jogo não me diverte

Egoísta é um imperativo

O aeroporto da Portela faz 60 anos

CRÓNICAS

Uma cega que não vê

Souvenirs pieux

HISTÓRIAS DE AMOR

Linguagem Universal

COCKTAIL

Grandes bebedores - Janis Joplin (1943-1970)

RECEITA

Frango Vietname

CARTAS DA MAYA

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DESAFIOS

Jogo em 3x3

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