Uma viagem pela inovação do século XX

04-02-2003
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Exposição 'Engenho e Obra' patente na Cordoaria Nacional

Uma Viagem pela Inovação do Século XX

Segunda-feira, 13 de Janeiro de 2003

%Isabel Gorjão Santos

'Acende aí o estádio do Benfica", diz um rapaz de 11 ou 12 anos para o colega de turma. "Vá lá! Agora o do Sporting", apela outro, também entusiasmado com a brincadeira. "Ena, pá! Isto é bonito", ouve-se então numa voz de menina. A turma está toda em frente a uma maqueta da cidade de Lisboa. Esta encontra-se ligada a uma aplicação informática que permite iluminar, na maqueta, os locais que se escolhe no computador. Para muitos dos jovens alunos, este terá sido o primeiro contacto com sistemas de informação geográfica mas certamente não foi a única recordação que levaram da visita à exposição "Engenho e Obra - Engenharia em Portugal no século XX", inaugurada na passada quarta-feira na Cordoaria Nacional, em Lisboa.

A exposição é o resultado de cerca de dois anos de investigação e recolha de materiais, e pretende dar as conhecer as mais importantes obras de engenharia realizadas em Portugal no último século. A viagem é longa e vai dos primórdios da electricidade até à Internet e às comunicações móveis. "O mais importante é compreender os grandes momentos de inovação e incentivar o gosto por aprender e inovar", considera Manuel Heitor, comissário da exposição e professor no Instituto Superior Técnico (IST), de Lisboa. Aliás, esta iniciativa foi levada a cabo pelo Centro de Estudos em Inovação, Tecnologia e Políticas de Desenvolvimento do IST e pelo Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Desta junção entre a tecnologia e a história resultaram os 3 mil metros quadrados de exposição que, até ao próximo dia 2 de Março, podem ser visitados na Cordoaria Nacional.

A inauguração contou com a presença do Presidente da República, Jorge Sampaio, de David Justino, ministro da Educação, e de Manuel Fernandes Thomaz, secretário de Estado da Ciência e Tecnologia. Após visitar a exposição, Jorge Sampaio classificou-a como "um marco na história da ciência", capaz de contribuir "para realçar a importância da ciência e da inovação no desenvolvimento da sociedade portuguesa". David Justino, por sua vez, sublinhou a importância que uma iniciativa como esta poderá ter para os mais jovens.

Graças à divulgação junto das escolas, foram exactamente os mais pequenos que invadiram a Cordoaria Nacional na primeira manhã da exposição. Em grupos, ficaram a saber como funciona uma central eléctrica, simularam o enchimento da barragem do Alqueva numa aplicação multimédia, viram como era um computador fabricado nos anos em que ainda não tinham nascido e impressionaram-se com o tamanho de tijolo dos primeiros telemóveis - que, afinal, não eram assim tão móveis, já que só serviam para trazer no carro. Ao longo dos corredores da exposição, vários alunos de Engenharia e de História respondiam às perguntas e ajudavam a participar nas experiências.

Do viaduto Duarte Pacheco, de 1944, ao novo sistema de acesso ao metropolitano de Lisboa, introduzido no ano passado, dos primórdios das comunicações aos novos modelos de telemóveis, várias são as viagens que se podem fazer dentro da exposição. E por uma tão grande diversidade de temas e áreas envolvidas - construção, metalomecânica pesada, química, indústria automóvel ou do calçado, electrificação, barragens ou sistemas de informação e comunicação, entre outras - é possível que o visitante se perca um pouco face à quantidade de informação. No final, sairá com a sensação de ter passado pelos melhores momentos do século XX no que se refere à inovação científica e tecnológica em Portugal.

Na área dedicada aos sistemas de informação e comunicação, é feita uma retrospectiva da introdução dos grandes computadores de cálculo científico em Portugal - grandes no tamanho, "pois qualquer portátil hoje tem muito mais potência que aquelas máquinas", explicava Manuel Heitor, apontando para a NCR Elliot 803, um computador que equipou o Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) na década de 60, tendo sido o terceiro instalado para cálculo científico, sobretudo de estruturas. Com uma electrónica bastante simples, esta máquina utilizava transístores de germânio e não de silício, possuía perfuradores de fita e respectivos leitores como periféricos de entrada e saída de informação.

No início da década de 80, chegou a ser produzido e comercializado um computador português. É verdade que a iniciativa acabou por não ter o êxito esperado mas quem quiser conhecer a máquina poderá vê-la na Cordoaria Nacional. Chama-se Ener 1000 e foi desenvolvida por um grupo da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra liderado pelo professor Dias Figueiredo.

O Ener 1000 possuía uma concepção modular independente, diferente da dos computadores da IBM, e foi criado tendo como base os componentes então disponíveis no mercado. Com um processador de 8 bits (sim, 8 bits!), o Ener 1000 funcionava com o sistema operativo CP/M - um antecessor do MS DOS - e dispunha de módulos adicionais e de um teclado com caracteres portugueses, podendo ser configurado para utilização multiposto. O Ener 1000 foi comercializado por uma empresa da Figueira da Foz, a Enertrónica, sendo um dos seus principais alvos o mercado do ensino.

Ao lado do Ener 1000 pode ser encontrado o Wang 22005, um minicomputador lançado em 1973, tendo sido instaladas em Portugal algumas dezenas destas máquinas na segunda metade da década de 70. Este computador possuía um interpretador de Basic integrado e tinha também um ecrã. A sua organização física era já semelhante àquilo que, anos mais tarde, vieram a ser os computadores pessoais, podendo ligar-se a impressoras e até às máquinas de escrever eléctricas de esfera Selectrix, que a IBM lançara.

A primeira central de comutação telefónica digital, do Centro de Estudos de Telecomunicações (CET), integrado na PT Inovação em 1999, pode também ser vista na exposição. Logo ao lado, uma montra de telemóveis mostra bem como estes têm evoluído. Do primeiro comercializado pela Siemens em Portugal aos modelos que hoje se traz no bolso ou na carteira, a distância é tal que se torna difícil reconhecer nos últimos uma evolução dos primeiros.

Os primeiros passos da inteligência artificial em Portugal, que tiveram lugar no LNEC nos anos 70; o nascimento do Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores (Inesc), há 20 anos; alguns passos importantes relacionados com a telemedicina e outros aspectos mais recentes, como o sucesso da rede Multibanco e da Via Verde nas auto-estradas, são também lembrados.

Tal como em todas as outras áreas que compõem a exposição "Engenho e Obra", também para os sistemas de informação e comunicação foi criada uma cronologia com os acontecimentos mais importantes do século. A lista de marcos do sector começa em 1926, com o aparecimento das primeiras estações de telegrafia sem fios, e vai até ao ano 2000, quando teve lugar a liberalização das telecomunicações.

Exposição 'Engenho e Obra' patente na Cordoaria Nacional

Uma Viagem pela Inovação do Século XX

Segunda-feira, 13 de Janeiro de 2003

%Isabel Gorjão Santos

'Acende aí o estádio do Benfica", diz um rapaz de 11 ou 12 anos para o colega de turma. "Vá lá! Agora o do Sporting", apela outro, também entusiasmado com a brincadeira. "Ena, pá! Isto é bonito", ouve-se então numa voz de menina. A turma está toda em frente a uma maqueta da cidade de Lisboa. Esta encontra-se ligada a uma aplicação informática que permite iluminar, na maqueta, os locais que se escolhe no computador. Para muitos dos jovens alunos, este terá sido o primeiro contacto com sistemas de informação geográfica mas certamente não foi a única recordação que levaram da visita à exposição "Engenho e Obra - Engenharia em Portugal no século XX", inaugurada na passada quarta-feira na Cordoaria Nacional, em Lisboa.

A exposição é o resultado de cerca de dois anos de investigação e recolha de materiais, e pretende dar as conhecer as mais importantes obras de engenharia realizadas em Portugal no último século. A viagem é longa e vai dos primórdios da electricidade até à Internet e às comunicações móveis. "O mais importante é compreender os grandes momentos de inovação e incentivar o gosto por aprender e inovar", considera Manuel Heitor, comissário da exposição e professor no Instituto Superior Técnico (IST), de Lisboa. Aliás, esta iniciativa foi levada a cabo pelo Centro de Estudos em Inovação, Tecnologia e Políticas de Desenvolvimento do IST e pelo Instituto de História Contemporânea da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Desta junção entre a tecnologia e a história resultaram os 3 mil metros quadrados de exposição que, até ao próximo dia 2 de Março, podem ser visitados na Cordoaria Nacional.

A inauguração contou com a presença do Presidente da República, Jorge Sampaio, de David Justino, ministro da Educação, e de Manuel Fernandes Thomaz, secretário de Estado da Ciência e Tecnologia. Após visitar a exposição, Jorge Sampaio classificou-a como "um marco na história da ciência", capaz de contribuir "para realçar a importância da ciência e da inovação no desenvolvimento da sociedade portuguesa". David Justino, por sua vez, sublinhou a importância que uma iniciativa como esta poderá ter para os mais jovens.

Graças à divulgação junto das escolas, foram exactamente os mais pequenos que invadiram a Cordoaria Nacional na primeira manhã da exposição. Em grupos, ficaram a saber como funciona uma central eléctrica, simularam o enchimento da barragem do Alqueva numa aplicação multimédia, viram como era um computador fabricado nos anos em que ainda não tinham nascido e impressionaram-se com o tamanho de tijolo dos primeiros telemóveis - que, afinal, não eram assim tão móveis, já que só serviam para trazer no carro. Ao longo dos corredores da exposição, vários alunos de Engenharia e de História respondiam às perguntas e ajudavam a participar nas experiências.

Do viaduto Duarte Pacheco, de 1944, ao novo sistema de acesso ao metropolitano de Lisboa, introduzido no ano passado, dos primórdios das comunicações aos novos modelos de telemóveis, várias são as viagens que se podem fazer dentro da exposição. E por uma tão grande diversidade de temas e áreas envolvidas - construção, metalomecânica pesada, química, indústria automóvel ou do calçado, electrificação, barragens ou sistemas de informação e comunicação, entre outras - é possível que o visitante se perca um pouco face à quantidade de informação. No final, sairá com a sensação de ter passado pelos melhores momentos do século XX no que se refere à inovação científica e tecnológica em Portugal.

Na área dedicada aos sistemas de informação e comunicação, é feita uma retrospectiva da introdução dos grandes computadores de cálculo científico em Portugal - grandes no tamanho, "pois qualquer portátil hoje tem muito mais potência que aquelas máquinas", explicava Manuel Heitor, apontando para a NCR Elliot 803, um computador que equipou o Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) na década de 60, tendo sido o terceiro instalado para cálculo científico, sobretudo de estruturas. Com uma electrónica bastante simples, esta máquina utilizava transístores de germânio e não de silício, possuía perfuradores de fita e respectivos leitores como periféricos de entrada e saída de informação.

No início da década de 80, chegou a ser produzido e comercializado um computador português. É verdade que a iniciativa acabou por não ter o êxito esperado mas quem quiser conhecer a máquina poderá vê-la na Cordoaria Nacional. Chama-se Ener 1000 e foi desenvolvida por um grupo da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra liderado pelo professor Dias Figueiredo.

O Ener 1000 possuía uma concepção modular independente, diferente da dos computadores da IBM, e foi criado tendo como base os componentes então disponíveis no mercado. Com um processador de 8 bits (sim, 8 bits!), o Ener 1000 funcionava com o sistema operativo CP/M - um antecessor do MS DOS - e dispunha de módulos adicionais e de um teclado com caracteres portugueses, podendo ser configurado para utilização multiposto. O Ener 1000 foi comercializado por uma empresa da Figueira da Foz, a Enertrónica, sendo um dos seus principais alvos o mercado do ensino.

Ao lado do Ener 1000 pode ser encontrado o Wang 22005, um minicomputador lançado em 1973, tendo sido instaladas em Portugal algumas dezenas destas máquinas na segunda metade da década de 70. Este computador possuía um interpretador de Basic integrado e tinha também um ecrã. A sua organização física era já semelhante àquilo que, anos mais tarde, vieram a ser os computadores pessoais, podendo ligar-se a impressoras e até às máquinas de escrever eléctricas de esfera Selectrix, que a IBM lançara.

A primeira central de comutação telefónica digital, do Centro de Estudos de Telecomunicações (CET), integrado na PT Inovação em 1999, pode também ser vista na exposição. Logo ao lado, uma montra de telemóveis mostra bem como estes têm evoluído. Do primeiro comercializado pela Siemens em Portugal aos modelos que hoje se traz no bolso ou na carteira, a distância é tal que se torna difícil reconhecer nos últimos uma evolução dos primeiros.

Os primeiros passos da inteligência artificial em Portugal, que tiveram lugar no LNEC nos anos 70; o nascimento do Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores (Inesc), há 20 anos; alguns passos importantes relacionados com a telemedicina e outros aspectos mais recentes, como o sucesso da rede Multibanco e da Via Verde nas auto-estradas, são também lembrados.

Tal como em todas as outras áreas que compõem a exposição "Engenho e Obra", também para os sistemas de informação e comunicação foi criada uma cronologia com os acontecimentos mais importantes do século. A lista de marcos do sector começa em 1926, com o aparecimento das primeiras estações de telegrafia sem fios, e vai até ao ano 2000, quando teve lugar a liberalização das telecomunicações.

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