A mulher arco-íris na crise dos quarenta

26-06-2003
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A Mulher Arco-íris na Crise dos Quarenta

Segunda-feira, 16 de Junho de 2003 %Texto Andréia Azevedo Soares Os corações, as nuvens, as estrelas e as flores estiveram lá desde os primórdios. A designer espanhola Agatha Ruiz de la Prada já recorria a esses elementos no início dos anos 80, altura em que fez o seu primeiro desfile. "Durante muitos anos, eu fiz em Espanha o mesmo que faço agora. E ninguém comprava nenhum dos meus trabalhos. Então acostumei-me a ser livre e independente", sublinha a designer. O estilo de cores berrantes combinadas despudoramente - por vezes com um gosto próprio dos daltónicos - acabou por cair nas graças do público. Assim como as formas quase infantis que decoram hoje não só roupas e acessórios, mas também objectos para a casa, artigos de papelaria e até electrodomésticos. "Acredito que fui favorecida por um regresso do espírito estético dos anos 60. Como nasci nessa altura, foi um período que me influenciou muitíssimo com o aparecimento dos hippies e do seu espírito de liberdade", diz a artista, buscando uma explicação para o extemporâneo sucesso das suas peças. Se tivesse de escolher uma síntese para o seu sucesso de consumo - sim, o aspecto comercial não é descurado pelo discurso da estilista -, "alegria" seria talvez a palavra-chave apontada. A conjugação frenética de cores e formas caras ao imaginário colectivo transmite, na opinião de Agatha, uma contagiante alegria. É a flor gigantesca que invade a superfície da máquina de lavar roupa. É o coração mal desenhado que estampa cadernos e minúsculos calçados para bebés. É a nuvem de Magritte que aparece pintada vezes sem conta no perfume infantil "Nube". São, enfim, iconografias que dizem respeito a todos nós - seja pela simplicidade quase ingénua, seja pela assimilação instantânea de ícones que, de resto, estão sobejamente gravados nos neurónios da sociedade. E, ao que parece, essa fórmula da alegria visual vende bem. Muito bem. Agatha tem outro pormenor que torna a sua obra muito peculiar. Ao contrário dos criadores que usam fatos negros e uma t-shirt branca, Agatha veste a sua própria marca dos pés à cabeça. Tudo aquilo que a rodeia reveste-se de arco-íris. "Quem entra na minha casa em Madrid, vê que se trata de um espaço muito especial. E isso não deixa de ser uma espécie de protecção contra o resto do mundo. Cores, mil cores! A minha roupa para casa tem muito êxito em Espanha. Hoje em dia uma pessoa quer um alívio quando chega a casa. E o que busco nas cores é essa felicidade", explica. Se nos últimos anos as suas criações mantiveram uma coerência estética, algo poderá mudar nos próximos tempos. Aos 42 anos, Agatha sente-se numa senda de transição. "Estou mudando um pouco, pois agora estou na crise dos 40 anos. Tudo muda muito nessa fase. Eu quase nunca estou maquilhada e hoje fui ao salão de beleza e vim toda pintada. Está um pouco carregada, pareço um travesti", confessa Agatha, preocupada com o resultado da fotografia. Será a crise o prenúncio de mudanças? Talvez. "Eu faço opções em função da minha emoção. Passando por esta crise, pode ser que sinta as coisas de uma nova maneira." Qualquer alteração de percurso, no entanto, não prescindirá da tal alegria. E, por isso, a cor preta continuará de castigo. O negro não faz parte das suas colecções porque é "horrível" e "pesado". "Houve uma obsessão pelo preto. Só que a mulher fica muito mais sensual com cores. Os romanos não usavam peças pretas. O problema é que, nos últimos tempos, a moda feminina esteve exclusivamente nas mãos de homens - homens que, na sua maioria, não gostam de mulheres. Os homens têm construído mulheres artificiais precisamente porque não gostam delas", conclui. A mulher imaginada por Agatha é uma figura tão múltipla e versátil como nas telas de Picasso (a arte contemporânea é, aliás, uma influência incontornável no seu trabalho). "A mulher está cada vez mais escrava de uma forma única, quando é precisamente o jogo das formas que me seduz. E é por isso que acredito que, nos próximos anos, vai voltar a moda da mulher um pouco mais gorda. A mulher que preconizo é sensual porque está confortável", define. A mulher construída a partir do discurso de Agatha parece ser ela própria. Transmite sensualidade com um sapatinho de Branca de Neve vermelho às bolinhas brancas. Ri, fala com facilidade e cativa pessoas que lhe foram apresentadas há alguns minutos. Muda de assunto de forma sistemática. Tem os cabelos avermelhados, mostra-se curiosa em relação aos jornais portugueses - o marido, Pedro J. Ramírez, é conhecido pelo seu trabalho na direcção do "El Mundo". São desconexos os elementos que nos chegam quando se ensaia a comunicação com a artista. "Eu sou caótica", resume. OUTROS TÍTULOS EM PÚBLICA

Ideias Fortes Capoulas Santos Comissão Europeia não conseguirá fazer a reforma que a agricultura portuguesa necessita

O sociólogo a que chamam engenheiro

Livro

Objectivo 2008?

A mulher arco-íris na crise dos quarenta

CRÓNICAS

Fronteiras Perdidas

Levante-se o réu

COCKTAIL

Cocktails de Verão

RECEITA

Receitas de Verão

CARTAS DA MAYA

Cartas da Maya

DESAFIOS

Desafios

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Segunda-feira, 16 de Junho de 2003 %Texto Andréia Azevedo Soares Os corações, as nuvens, as estrelas e as flores estiveram lá desde os primórdios. A designer espanhola Agatha Ruiz de la Prada já recorria a esses elementos no início dos anos 80, altura em que fez o seu primeiro desfile. "Durante muitos anos, eu fiz em Espanha o mesmo que faço agora. E ninguém comprava nenhum dos meus trabalhos. Então acostumei-me a ser livre e independente", sublinha a designer. O estilo de cores berrantes combinadas despudoramente - por vezes com um gosto próprio dos daltónicos - acabou por cair nas graças do público. Assim como as formas quase infantis que decoram hoje não só roupas e acessórios, mas também objectos para a casa, artigos de papelaria e até electrodomésticos. "Acredito que fui favorecida por um regresso do espírito estético dos anos 60. Como nasci nessa altura, foi um período que me influenciou muitíssimo com o aparecimento dos hippies e do seu espírito de liberdade", diz a artista, buscando uma explicação para o extemporâneo sucesso das suas peças. Se tivesse de escolher uma síntese para o seu sucesso de consumo - sim, o aspecto comercial não é descurado pelo discurso da estilista -, "alegria" seria talvez a palavra-chave apontada. A conjugação frenética de cores e formas caras ao imaginário colectivo transmite, na opinião de Agatha, uma contagiante alegria. É a flor gigantesca que invade a superfície da máquina de lavar roupa. É o coração mal desenhado que estampa cadernos e minúsculos calçados para bebés. É a nuvem de Magritte que aparece pintada vezes sem conta no perfume infantil "Nube". São, enfim, iconografias que dizem respeito a todos nós - seja pela simplicidade quase ingénua, seja pela assimilação instantânea de ícones que, de resto, estão sobejamente gravados nos neurónios da sociedade. E, ao que parece, essa fórmula da alegria visual vende bem. Muito bem. Agatha tem outro pormenor que torna a sua obra muito peculiar. Ao contrário dos criadores que usam fatos negros e uma t-shirt branca, Agatha veste a sua própria marca dos pés à cabeça. Tudo aquilo que a rodeia reveste-se de arco-íris. "Quem entra na minha casa em Madrid, vê que se trata de um espaço muito especial. E isso não deixa de ser uma espécie de protecção contra o resto do mundo. Cores, mil cores! A minha roupa para casa tem muito êxito em Espanha. Hoje em dia uma pessoa quer um alívio quando chega a casa. E o que busco nas cores é essa felicidade", explica. Se nos últimos anos as suas criações mantiveram uma coerência estética, algo poderá mudar nos próximos tempos. Aos 42 anos, Agatha sente-se numa senda de transição. "Estou mudando um pouco, pois agora estou na crise dos 40 anos. Tudo muda muito nessa fase. Eu quase nunca estou maquilhada e hoje fui ao salão de beleza e vim toda pintada. Está um pouco carregada, pareço um travesti", confessa Agatha, preocupada com o resultado da fotografia. Será a crise o prenúncio de mudanças? Talvez. "Eu faço opções em função da minha emoção. Passando por esta crise, pode ser que sinta as coisas de uma nova maneira." Qualquer alteração de percurso, no entanto, não prescindirá da tal alegria. E, por isso, a cor preta continuará de castigo. O negro não faz parte das suas colecções porque é "horrível" e "pesado". "Houve uma obsessão pelo preto. Só que a mulher fica muito mais sensual com cores. Os romanos não usavam peças pretas. O problema é que, nos últimos tempos, a moda feminina esteve exclusivamente nas mãos de homens - homens que, na sua maioria, não gostam de mulheres. Os homens têm construído mulheres artificiais precisamente porque não gostam delas", conclui. A mulher imaginada por Agatha é uma figura tão múltipla e versátil como nas telas de Picasso (a arte contemporânea é, aliás, uma influência incontornável no seu trabalho). "A mulher está cada vez mais escrava de uma forma única, quando é precisamente o jogo das formas que me seduz. E é por isso que acredito que, nos próximos anos, vai voltar a moda da mulher um pouco mais gorda. A mulher que preconizo é sensual porque está confortável", define. A mulher construída a partir do discurso de Agatha parece ser ela própria. Transmite sensualidade com um sapatinho de Branca de Neve vermelho às bolinhas brancas. Ri, fala com facilidade e cativa pessoas que lhe foram apresentadas há alguns minutos. Muda de assunto de forma sistemática. Tem os cabelos avermelhados, mostra-se curiosa em relação aos jornais portugueses - o marido, Pedro J. Ramírez, é conhecido pelo seu trabalho na direcção do "El Mundo". São desconexos os elementos que nos chegam quando se ensaia a comunicação com a artista. "Eu sou caótica", resume. OUTROS TÍTULOS EM PÚBLICA

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