Constituição "aprova" novo PM da maioria ou realização de eleições antecipadas

03-08-2004
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Constituição "Aprova" Novo PM da Maioria Ou Realização de Eleições Antecipadas

Por MARIA JOSÉ OLIVEIRA E SÃO JOSÉ ALMEIDA

Terça-feira, 29 de Junho de 2004

O constitucionalista Jorge Miranda explicou ao PÚBLICO que, diante de diversos cenários especulativos, aquilo que é "absolutamente certo" é a dissolução do Governo, determinada pela demissão do primeiro-ministro Durão Barroso. "Haja ou não eleições, o Presidente da República terá de nomear um novo Governo", disse, salientando que "logo que se formalize a demissão de Durão Barroso o presidente tem de nomear um novo primeiro-ministro".

A demissão de Barroso, apontou Miranda, "coloca o Governo numa situação sem gestão, altamente diminuído na sua capacidade e ainda menos que interino". Por isso, o constitucionalista acredita que Sampaio vai aceitar o nome proposto por Barroso (Pedro Santana Lopes) para chefiar uma espécie de Governo de gestão, mas antecipará as eleições legislativas, fazendo-as coincidir com as regionais (em Outubro deste ano) ou com as autárquicas (Setembro/Outubro de 2005).

A nomeação de um novo Governo é o primeiro passo que o Presidente da República (PR) terá de realizar, referiu Miranda. Isto porque a renúncia imediata de Barroso assim obriga. Desta forma, se Sampaio optar pela convocação de eleições antecipadas terá de o fazer somente depois de ter nomeado o novo Executivo e de o programa governativo ter sido avaliado pela Assembleia da República. "O Presidente da República só poderá dissolver o Governo depois da sua nomeação e da apreciação do seu programa".

O Governo "intercalar", como o designou o constitucionalista, seria chefiado por um nome sugerido pela coligação governamental, tendo Sampaio "toda a liberdade" para agendar, até 2006, a antecipação das eleições legislativas. Neste âmbito, Miranda admitiu que "haveria vantagem" em realizar em simultâneo as eleições legislativas e as regionais ou as autárquicas, argumentando que somente neste contexto poder-se-ia "evitar a multiplicação de actos eleitorais num curto espaço de tempo".

Contudo, no entender do constitucionalista, e falando "em abstracto", "deve-se evitar a antecipação das eleições". Porquê? "Porque as legislaturas devem ir até ao fim", justificou, alertando que "a quebra da legislatura pode ser muito má para o país". E em jeito de aviso, acrescentou: "As oposições devem esperar pelo termo das legislaturas". Miranda refere, porém, uma excepção: "A não ser que o nome escolhido para primeiro-ministro seja pouco consensual e que provoque instabilidade na maioria". Neste contexto, o Presidente "poderá dissolver o Governo".

Ainda em torno dos poderes presidenciais e questionado sobre se o PR pode recusar o nome proposto para chefiar o Governo, Jorge Miranda explicou que Sampaio pode rejeitar a sugestão do primeiro-ministro cessante, embora não o possa fazer "em termos ilimitados". "É razoável que recuse uma vez, eventualmente duas", afirmou, atentando que "essa posição depende muito do juízo que [o PR] faça sobre se pretende dissolver o Governo ou não".

Quanto à hipótese de ser o próprio Presidente a escolher o novo primeiro-ministro, o professor de Direito colocou de lado essa possibilidade, explicando que o PR "não pode nomear uma pessoa à margem da escolha de um partido com maioria relativa [PSD]". "Não que a Constituição o impeça", ressalvou, "mas na prática isso representaria um envolvimento muito grande do Presidente da República na formação do Governo". Se tal acontecesse, realçou, "poder-se-ia instalar uma situação de conflito para o país e uma situação muito incómoda para o PSD".

"Os governos de iniciativa presidencial não estão previstos"

Já Assunção Esteves, recém eleita eurodeputada mas ainda presidente da comissão parlamentar dos assuntos constitucionais e ex-juiza do Tribunal Constitucional, rejeita a leitura de que a Constituição permite que sejam nomeados primeiros-ministros de iniciativa presidencial.

"Os governos de iniciativa presidencial, em termos de normalidade democrática, não estão previstos", disse ao PÚBLICO Assunção Esteves, acrescentando que "só se houvesse uma crise com pulverização do sistema partidário, que não permitisse a formação de governo" poderia pensar-se num primeiro-ministro escolhido por Jorge Sampaio, mas frisa que isso seria uma "situação excepcional".

Prossegue salientando que Portugal é uma "democracia partidária" pelo que "o Presidente é o receptador de propostas sem iniciativa" e sublinha que "a Constituição prevê que mesmo para demitir o Governo, o Presidente só o pode fazer por razões excepcionais".

Quanto às saídas constitucionais, Assunção Esteves diz que são duas e hierarquiza-as: nomear um primeiro-ministro indicado pelo partido maioritário ou, se não for possível, convocar eleições intercalares. E explica: "Há uma alternativa com dois termos: alguém indicado pelo partido maioritário, ou a convocação de eleições."

Aprofundando, Assunção Esteves advoga que "o Presidente para escolher uma pessoa tem que ter em conta a normalidade estatutária do partido e a vontade transparente do colectivo partidário do partido que lhe propõe o primeiro-ministro". Isto porque, alerta, "a normalidade estatutária pode existir, mas haver vários dirigentes a porem em causa a solução". E conclui: "O Presidente tem hipótese sempre de convocar eleições , mas não tem de o fazer necessariamente. Mas a primeira alternativa é nomear alguém da maioria. Se achar que as condições não são as melhores, se não houver um projecto de governabilidade, então convoca eleições. Mas a legislatura é de quatro anos e tem base partidária".

O PÚBLICO tentou contactar o constitucionalista Vital Moreira, mas até à hora de fecho desta edição tal não foi possível. No artigo publicado hoje no PÚBLICO, porém, o professor da Faculdade de Direito de Coimbra escreve que "em condições normais", e perante uma maioria parlamentar, "a solução passaria naturalmente pela formação de um segundo Executivo". Até porque, frisa logo a seguir, Jorge Sampaio "prefere" o cumprimento integral das legislaturas, entendendo a antecipação de eleições como um "último recurso".

Em termos constitucionais, Vital Moreira diz que "está tudo em aberto", cabendo exclusivamente ao presidente a responsabilidade pela "resolução da crise governativa". A posição do PR pode passar, segundo o constitucionalista, por duas vias: "(...) é perfeitamente admissível a formação de um novo Governo no quadro parlamentar existente, com outro primeiro-ministro"; ou, escreve, "conferindo a Constituição ao PR uma grande liberdade de actuação nesta matéria (...) não é menos lícita a opção pela convocação de eleições antecipadas". Portanto, sublinha Vital Moreira, "a questão é exclusivamente política", estando dependente do julgamento de Sampaio diante das "alternativas disponíveis".

Constituição "Aprova" Novo PM da Maioria Ou Realização de Eleições Antecipadas

Por MARIA JOSÉ OLIVEIRA E SÃO JOSÉ ALMEIDA

Terça-feira, 29 de Junho de 2004

O constitucionalista Jorge Miranda explicou ao PÚBLICO que, diante de diversos cenários especulativos, aquilo que é "absolutamente certo" é a dissolução do Governo, determinada pela demissão do primeiro-ministro Durão Barroso. "Haja ou não eleições, o Presidente da República terá de nomear um novo Governo", disse, salientando que "logo que se formalize a demissão de Durão Barroso o presidente tem de nomear um novo primeiro-ministro".

A demissão de Barroso, apontou Miranda, "coloca o Governo numa situação sem gestão, altamente diminuído na sua capacidade e ainda menos que interino". Por isso, o constitucionalista acredita que Sampaio vai aceitar o nome proposto por Barroso (Pedro Santana Lopes) para chefiar uma espécie de Governo de gestão, mas antecipará as eleições legislativas, fazendo-as coincidir com as regionais (em Outubro deste ano) ou com as autárquicas (Setembro/Outubro de 2005).

A nomeação de um novo Governo é o primeiro passo que o Presidente da República (PR) terá de realizar, referiu Miranda. Isto porque a renúncia imediata de Barroso assim obriga. Desta forma, se Sampaio optar pela convocação de eleições antecipadas terá de o fazer somente depois de ter nomeado o novo Executivo e de o programa governativo ter sido avaliado pela Assembleia da República. "O Presidente da República só poderá dissolver o Governo depois da sua nomeação e da apreciação do seu programa".

O Governo "intercalar", como o designou o constitucionalista, seria chefiado por um nome sugerido pela coligação governamental, tendo Sampaio "toda a liberdade" para agendar, até 2006, a antecipação das eleições legislativas. Neste âmbito, Miranda admitiu que "haveria vantagem" em realizar em simultâneo as eleições legislativas e as regionais ou as autárquicas, argumentando que somente neste contexto poder-se-ia "evitar a multiplicação de actos eleitorais num curto espaço de tempo".

Contudo, no entender do constitucionalista, e falando "em abstracto", "deve-se evitar a antecipação das eleições". Porquê? "Porque as legislaturas devem ir até ao fim", justificou, alertando que "a quebra da legislatura pode ser muito má para o país". E em jeito de aviso, acrescentou: "As oposições devem esperar pelo termo das legislaturas". Miranda refere, porém, uma excepção: "A não ser que o nome escolhido para primeiro-ministro seja pouco consensual e que provoque instabilidade na maioria". Neste contexto, o Presidente "poderá dissolver o Governo".

Ainda em torno dos poderes presidenciais e questionado sobre se o PR pode recusar o nome proposto para chefiar o Governo, Jorge Miranda explicou que Sampaio pode rejeitar a sugestão do primeiro-ministro cessante, embora não o possa fazer "em termos ilimitados". "É razoável que recuse uma vez, eventualmente duas", afirmou, atentando que "essa posição depende muito do juízo que [o PR] faça sobre se pretende dissolver o Governo ou não".

Quanto à hipótese de ser o próprio Presidente a escolher o novo primeiro-ministro, o professor de Direito colocou de lado essa possibilidade, explicando que o PR "não pode nomear uma pessoa à margem da escolha de um partido com maioria relativa [PSD]". "Não que a Constituição o impeça", ressalvou, "mas na prática isso representaria um envolvimento muito grande do Presidente da República na formação do Governo". Se tal acontecesse, realçou, "poder-se-ia instalar uma situação de conflito para o país e uma situação muito incómoda para o PSD".

"Os governos de iniciativa presidencial não estão previstos"

Já Assunção Esteves, recém eleita eurodeputada mas ainda presidente da comissão parlamentar dos assuntos constitucionais e ex-juiza do Tribunal Constitucional, rejeita a leitura de que a Constituição permite que sejam nomeados primeiros-ministros de iniciativa presidencial.

"Os governos de iniciativa presidencial, em termos de normalidade democrática, não estão previstos", disse ao PÚBLICO Assunção Esteves, acrescentando que "só se houvesse uma crise com pulverização do sistema partidário, que não permitisse a formação de governo" poderia pensar-se num primeiro-ministro escolhido por Jorge Sampaio, mas frisa que isso seria uma "situação excepcional".

Prossegue salientando que Portugal é uma "democracia partidária" pelo que "o Presidente é o receptador de propostas sem iniciativa" e sublinha que "a Constituição prevê que mesmo para demitir o Governo, o Presidente só o pode fazer por razões excepcionais".

Quanto às saídas constitucionais, Assunção Esteves diz que são duas e hierarquiza-as: nomear um primeiro-ministro indicado pelo partido maioritário ou, se não for possível, convocar eleições intercalares. E explica: "Há uma alternativa com dois termos: alguém indicado pelo partido maioritário, ou a convocação de eleições."

Aprofundando, Assunção Esteves advoga que "o Presidente para escolher uma pessoa tem que ter em conta a normalidade estatutária do partido e a vontade transparente do colectivo partidário do partido que lhe propõe o primeiro-ministro". Isto porque, alerta, "a normalidade estatutária pode existir, mas haver vários dirigentes a porem em causa a solução". E conclui: "O Presidente tem hipótese sempre de convocar eleições , mas não tem de o fazer necessariamente. Mas a primeira alternativa é nomear alguém da maioria. Se achar que as condições não são as melhores, se não houver um projecto de governabilidade, então convoca eleições. Mas a legislatura é de quatro anos e tem base partidária".

O PÚBLICO tentou contactar o constitucionalista Vital Moreira, mas até à hora de fecho desta edição tal não foi possível. No artigo publicado hoje no PÚBLICO, porém, o professor da Faculdade de Direito de Coimbra escreve que "em condições normais", e perante uma maioria parlamentar, "a solução passaria naturalmente pela formação de um segundo Executivo". Até porque, frisa logo a seguir, Jorge Sampaio "prefere" o cumprimento integral das legislaturas, entendendo a antecipação de eleições como um "último recurso".

Em termos constitucionais, Vital Moreira diz que "está tudo em aberto", cabendo exclusivamente ao presidente a responsabilidade pela "resolução da crise governativa". A posição do PR pode passar, segundo o constitucionalista, por duas vias: "(...) é perfeitamente admissível a formação de um novo Governo no quadro parlamentar existente, com outro primeiro-ministro"; ou, escreve, "conferindo a Constituição ao PR uma grande liberdade de actuação nesta matéria (...) não é menos lícita a opção pela convocação de eleições antecipadas". Portanto, sublinha Vital Moreira, "a questão é exclusivamente política", estando dependente do julgamento de Sampaio diante das "alternativas disponíveis".

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