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02-08-2003
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BIG RAP BOYS

Sexta-feira, 11 de Julho de 2003 TOMMY BOY GREATEST HITS Vários Tommy Boy, distri. Warner 8/10 Como quem não quer a coisa, a editora Tommy Boy já chegou à maioridade. Fundada em 1981 por Tom Silverman, um DJ e editor de fanzine nova-iorquino, é "apenas" uma das fundadoras do rap. E se a Sugar Hill, com Grandmaster Flash e "Rappers Delight", e a Def Jam, com LL Cool J, também foram forças decisivas na introdução e divulgação da nova música negra urbana, a verdade é que muitas das principais novidades estéticas vieram da Tommy Boy. Qual Motown para a da década de 80, deu a primazia a artistas independentes, com direcções políticas e musicais bem definidas, que juntavam a inovação a uma clara tendência para perceber as inclinações e desejos da sua audiência - os jovens negros do Bronx e Queens, que viam no rap a tradução nas ondas da rádio e nos gira-discos da pobreza, violência e racismo das ruas. A compilação agora editada, dois CD com 33 temas, abre com a fonte de muito do que se passou depois: "Planet Rock", de Africa Bambaataa. Citado por praticamente todos os rappers e hip-hoppers, produzido por Arthur Baker, mais tarde por trás das aventuras mais dançantes do New Order, "Planet Rock" definia as coordenadas básicas - caixas de ritmos, Lynn drums, samples dos Kraftwerk, vocoders, e os MC por cima e nos espaços entre todos estes níveis sonoros, por vezes ainda cantando, quais reminiscências soul. A remistura para 2001, a cargo de Paul Oakenfold, mostra a actualidade do tema. Passada a fase electro, a segunda grande vaga do rap surge com a apropriação do jazz, e aqui a sorte grande sorriu de novo à Tommy Boy, com a edição do álbum de estreia dos De La Soul, "3 Feet High and Rising", que juntava samples de velhos discos de bebop, uma mensagem neo-hippie e uma inventiva rítmica longe já dos pioneiros - veja-se "The Magic Number". Ao longo dos anos 90, o rap endureceu, transformando-se em "gangsta", e a Tommy Boy, juntamente com a Death Row e a Bad Boy (de Sean "Puff Daddy" Combs), viu-se como casa de sons que, se não traziam nada de especialmente novo a nível sónico de batidas, atacava nos vocais e na dureza da mensagem (ou falta dela), passando os limites do sexismo e da homofobia. Por aqui passarem Naughty By Nature e Capone-N-Noreaga, mas também Coolio, que, fazendo jus ao nome, acabou por fazer o "crossover" para as tabelas mais "mainstream", com o oleoso "Gangsta's Paradise", em grande parte baseado num sample de Stevie Wonder. Houve ainda oportunidade para iniciação de brancos, com os "irlandeses" House of Pain e o festivo "Jump Around", e das senhoras, com a imponente Queen Latifah. Agora, e quando Eminem, um branco, e a Interscope, uma falsa independente, mandam no mundo do rap e a audiência-alvo são os "teenagers" bancos dos subúrbios americanos e europeus, a Tommy Boy está em fase de reavaliação, à procura de direcção. Mas mesmo só os contributos atrás referidos chegariam para lhe dar um lugar cimeiro na história das modernas linhas de força musicais. Nota 9 para o primeiro disco, 7 para o segundo. E.M Mundo Complexo Acredites ou Não Loop Recordings; distri. EMI-VC (7/10) "Acredites ou Não", álbum de estreia dos Mundo Complexo, é um disco bem representativo do estado do hip-hop em Portugal. Se ainda não surgiu aquele grande álbum que a nação hip-hop espera, o certo é que depois do regresso à estaca zero que aconteceu no final do século passado, a quantidade e a qualidade têm subido em flecha. Aqui já não há MCs que se atropelam no ensejo de chegar mais à frente, a banda sonora é sensivelmente mais madura e a produção tem garantido, na generalidade, um profissionalismo que era raro ou inexistente à meia dúzia de anos. Os Mundo Complexo não serão uma pedrada no charco mas não têm medo de rimar canções de amor (como no single "Carta de amor"), de arriscar cruzamentos com outro géneros, nem de deixar fluir um baixo que se não é genial torna-se decisivo enquanto alicerce de cada uma das faixas. Quer dizer, é este o caminho para um hip-hop apostado numa identidade própria, que pensa pela própria cabeça e executa com as suas próprias mãos. E isso já não é pouco. Miguel Francisco Cadete Fairport Convention Fairport Convention 8/10 What We Did on our Holidays 9/10 Unhalfbricking 9/10 Island, distri. Universal No manifesto de intenções de "Fairport Convention", álbum de estreia de 1968 da banda que viria a tornar-se a instit P BOYS TOMMY BOY GREATEST HITS Vários Tommy Boy, distri. Warner 8/10 Como quem não quer a coisa, a editora Tommy Boy já chegou à maioridade. Fundada em 1981 por Tom Silverman, um DJ e editor de fanzine nova-iorquino, é "apenas" uma das fundadoras do rap. E se a Sugar Hill, com Grandmaster Flash e "Rappers Delight", e a Def Jam, com LL Cool J, também foram forças decisivas na introdução e divulgação da nova música negra urbana, a verdade é que muitas das principais novidades estéticas vieram da Tommy Boy. Qual Motown para a da década de 80, deu a primazia a artistas independentes, com direcções políticas e musicais bem definidas, que juntavam a inovação a uma clara tendência para perceber as inclinações e desejos da sua audiência - os jovens negros do Bronx e Queens, que viam no rap a tradução nas ondas da rádio e nos gira-discos da pobreza, violência e racismo das ruas. A compilação agora editada, dois CD com 33 temas, abre com a fonte de muito do que se passou depois: "Planet Rock", de Africa Bambaataa. Citado por praticamente todos os rappers e hip-hoppers, produzido por Arthur Baker, mais tarde por trás das aventuras mais dançantes do New Order, "Planet Rock" definia as coordenadas básicas - caixas de ritmos, Lynn drums, samples dos Kraftwerk, vocoders, e os MC por cima e nos espaços entre todos estes níveis sonoros, por vezes ainda cantando, quais reminiscências soul. A remistura para 2001, a cargo de Paul Oakenfold, mostra a actualidade do tema. Passada a fase electro, a segunda grande vaga do rap surge com a apropriação do jazz, e aqui a sorte grande sorriu de novo à Tommy Boy, com a edição do álbum de estreia dos De La Soul, "3 Feet High and Rising", que juntava samples de velhos discos de bebop, uma mensagem neo-hippie e uma inventiva rítmica longe já dos pioneiros - veja-se "The Magic Number". Ao longo dos anos 90, o rap endureceu, transformando-se em "gangsta", e a Tommy Boy, juntamente com a Death Row e a Bad Boy (de Sean "Puff Daddy" Combs), viu-se como casa de sons que, se não traziam nada de especialmente novo a nível sónico de batidas, atacava nos vocais e na dureza da mensagem (ou falta dela), passando os limites do sexismo e da homofobia. Por aqui passarem Naughty By Nature e Capone-N-Noreaga, mas também Coolio, que, fazendo jus ao nome, acabou por fazer o "crossover" para as tabelas mais "mainstream", com o oleoso "Gangsta's Paradise", em grande parte baseado num sample de Stevie Wonder. Houve ainda oportunidade para iniciação de brancos, com os "irlandeses" House of Pain e o festivo "Jump Around", e das senhoras, com a imponente Queen Latifah. Agora, e quando Eminem, um branco, e a Interscope, uma falsa independente, mandam no mundo do rap e a audiência-alvo são os "teenagers" bancos dos subúrbios americanos e europeus, a Tommy Boy está em fase de reavaliação, à procura de direcção. Mas mesmo só os contributos atrás referidos chegariam para lhe dar um lugar cimeiro na história das modernas linhas de força musicais. Nota 9 para o primeiro disco, 7 para o segundo. E.M Mundo Complexo Acredites ou Não Loop Recordings; distri. EMI-VC (7/10) "Acredites ou Não", álbum de estreia dos Mundo Complexo, é um disco bem representativo do estado do hip-hop em Portugal. Se ainda não surgiu aquele grande álbum que a nação hip-hop espera, o certo é que depois do regresso à estaca zero que aconteceu no final do século passado, a quantidade e a qualidade têm subido em flecha. Aqui já não há MCs que se atropelam no ensejo de chegar mais à frente, a banda sonora é sensivelmente mais madura e a produção tem garantido, na generalidade, um profissionalismo que era raro ou inexistente à meia dúzia de anos. Os Mundo Complexo não serão uma pedrada no charco mas não têm medo de rimar canções de amor (como no single "Carta de amor"), de arriscar cruzamentos com outro géneros, nem de deixar fluir um baixo que se não é genial torna-se decisivo enquanto alicerce de cada uma das faixas. Quer dizer, é este o caminho para um hip-hop apostado numa identidade própria, que pensa pela própria cabeça e executa com as suas próprias mãos. E isso já não é pouco. Miguel Francisco Cadete Fairport Convention Fairport Convention 8/10 What We Did on our Holidays 9/10 Unhalfbricking 9/10 Island, distri. Universal No manifesto de intenções de "Fairport Convention", álbum de estreia de 1968 da banda que viria a tornar-se a instituição da folk rock inglesa, pode ler-se: "What we played - The best of the singers-songwriters, music of almost suicidal variety, mind boggling complicated arrangements of ostensibly simple songs, anything that other groups wouldn?t touch". Ainda com Judy Dyble e Martin Lamble (que viria a morrer num acidente de viação), "Fairport Convention" arranca para este rally com o que poderia ser um clássico dos The Byrds, "Time will show the wiser", de Emitt Rhodes, e prossegue com "I don't know where I stand", título apropriado para uma vocalização frágil e tocante de Dyble, na linha do que faria nos Trader Horne. Álbum variado, integra influências da pop psicadélica, britânica e americana (como na delirante versão de "Jack O'Diamonds", de Dylan, algures entre os Grateful Dead e os Jefferson Airplane), com Ashley Hutchings, futuro fundamentalista da tradição rural, a revelar inusitada destreza na escrita de coisas tão bizarras como "The lobster". A reedição, remasterizada, inclui quatro temas extra, entre os quais "Suzanne", de Cohen, e "Morning glory", de Tim Buckley. Um clássico menor e, para os que apenas conhecem fases posteriores do grupo, uma surpresa estonteante. No ano seguinte, Alexandra Elene MacLean Denny, Sandy Denny, entrara já para o grupo, em substituição de Judy Dyble, fazendo de "What we Did on our Holidays" algo de especial que abre com o clássico que daria nome ao seu primeiro projecto fora do grupo, "Fotheringay". Abrangendo ainda temas de Dylan ("I'll keep it with mine") e Joni Mitchell ("Eastern rain"), o psicadelismo, o "cajun" ou os "espirituais" (Denny a fazer de Joplin em "The Lord is in this place, how dreadful is this place?"), bem como um "Book song" de Ian Matthews, o álbum introduz o conceito de "folk eléctrica" em "Mr. Lacey" ao mesmo tempo que aparecem os primeiros arranjos de tradicionais, entre os quais "Nottamun town" e "She moves through the fair", prenúncio da direcção que o grupo viria a seguir. "I'll keep with mine" vale pela vocalização de Denny, em veia já explorada no álbum de 1967 de apresentação dos Strawbs, "All of our Own Work", e "Meet on the ledge", um original de Thompson, com aquele "swing" característico dos The Byrds que os Fairport tão bem adaptaram a uma inconfundível "britishnes", figura na galeria dos melhores temas do grupo. Ainda de 1969, outra peça-chave, "Unhalfbricking", título sugerido por Denny em mais do que provável estado de euforia etílica. "Genesis hall" ostenta a marca de uma voz em estado de graça. Poucas vezes Sandy Denny terá cantado como nesta canção de abandono, capaz de nos arrebatar naquele tom que apenas se encontrará, na música inglesa, em "I Want to See the Bright Lights Tonight", de Richard e Linda Thompson. Denny que em "Si tu dois partir", versão "cajun" e cantada em francês de um tema de Dylan, volta a abrir caminho ao "boom" do folk rock inglês dos anos 70, por bandas como os Steeleye Span, Matthews Southern Comfort ou Albion Country Band, e se mostra superlativa no jazzy "Autopsy", onde está já tudo o que se pode encontrar na sua brilhante discografia a solo. O mantra de 11 min. e único tradicional do álbum, "A sailor's life", é apresentado pela cantora de "world" Sheila Chandra como contendo os genes da música de fusão, na síntese de 2000 anos de canto tradicional védico com os timbres e modos da música irlandesa. O mesmo que, sem que ninguém desse conta, e na mesma altura, também fizeram os Mr. Fox e que em "Liege and Lief" iria ainda mais fundo. Depois, foi neste disco que os Fairport contrataram a sua estrela, o violinista Dave Swarbrick, aqui ainda um dos convidados, a par de Ian Matthews, Dave Mattacks (baterista que marcaria a rítmica futura dos FC) e Trevor Lucas (pilar dos Fotheringay). Apesar de três originais de Dylan, "Unhalfbricking" apresenta, pela primeira vez, o estilo distinto que levaria os Fairport ao estatuto mítico de que ainda hoje gozam. Mesmo que Denny lançasse ao vento as dúvidas e a interrogação ao destino - que para si seria trágico - em "Who knows where the time goes?". "Não receio o tempo", canta. E é todo um tempo de beleza gloriosa que desaba sobre nós. Fernando Magalhães THE KLEZMATICS Rise Up! Piranha; distri. Megamúsica 8/10 Robin Williams comentou um dia sobre os Klezmatics: "with music like this, if you don't see God, you're fucking blind." Ou seja, também ele - como aliás a maioria dos discursos sobre a música klezmer (música tradicional judia) - faz remontar a importância desta música a uma questão essencialmente religiosa. Contudo, mais do que apreciadas através do prisma da religação de gerações segundo uma determinada tábua de valores, as canções dos Klezmatics podem (devem?) ser ouvidas como um exercício musical em que a recuperação de uma música ancestral não se esquiva ao confronto com a modernidade. Nem sequer se furta à apropriação de músicas de outras coordenadas geográficas, como a herança qwaali, ainda que não fugindo aos parâmetros orientais. Também por isso, "Rise Up!" não deve ser reduzido a um mero panfleto político - apesar da ligação aos acontecimentos de 11 de Setembro ser explícita em temas como o inexcedível "I ain't afraid" - precisamente porque o poder da música dos Klezmatics ultrapassa as circunstâncias em que foi produzida. Basta ouvir o piano tonitruante de "Klezmorimlekh mayne libinke" para entender que por ali passa uma pulsão que não é exclusivamente judia, de hoje ou ou do Médio Oriente. MFC ARTUR PAREDES Acompanhado por Carlos Paredes e Arménio Santos Movieplay 5/10 CARLOS PAREDES Os Verdes Anos de Carlos Paredes Movieplay 5/10 Não está em causa a importância artística de Carlos Paredes e de seu pai Artur Paredes. Ou o papel fundamental que um e outro tiveram na evolução da guitarra portuguesa, no desenvolvimento da música produzida em Coimbra e no efeito que, gostávamos de crer, obtiveram sobre a música e os músicos de todo o mundo. Nem sequer vale a pena colocar em dúvida a elegância gráfica da embalagem destas duas colectâneas que reproduzem com garbo capas das edições originais em EP; é ainda de menor utilidade pôr em questão a remasterização a que os oito temas de Carlos e Artur Paredes foram submetidos. As notas que acompanham o livreto, da pena de José Niza, voltam a ser preciosas ao enquadrarem devidamente dois músicos deste calibre. O que não se entende é que estas duas colectâneas, recentemente colocadas no mecado, não acrescentem absolutamente nenhum tema novo às compilações similares "O Melhor dos Melhores" e "Clássicos da Renascença" publicadas, respectivamente, em 1994 e 2000 (em CD, pois a edição em vinilo remonta a 1972). As peças de Carlos Paredes aqui incluídas fazem também parte da integral "O Mundo Segundo Carlos Paredes" que chegou aos escaparates no Natal. O que leva a crer que estes discos se destinam em exclusivo a ouvintes desatentos ou amantes de capas renovadas para as mesmas gravações. MFC ROY HARGROVE presents THE RH FACTOR Hard Groove Verve; distri. Universal 7/10 Roy Hargrove é um emérito trompetista que no início da sua carreira, em finais dos anos 80, foi apadrinhado por Wynton Marsalis. Geralmente reconhecido pelo seu virtuosismo ao atacar baladas, aposta decididamente neste "Hard Groove" em temas up-tempo capazes de fazer dançar um paralítico. Para o efeito, contratou os préstimos de D'Angelo, Common, Q-Tip (dos A Tribe Called Quest), Meshell Ndegeocello e Erykah Badu e inventou a fusão mais anacrónica e suculenta de jazz, hip-hop, soul e funk que foi publicada nos últimos tempos. É toda esta trupe que resgata a música de "Hard Groove" aos domínios do hard-bop para a transportar para uma qualquer esquina em que tudo pode ser possível, apesar do resultado tresandar a anos 70. "Poetry", com Badu e Q-Tip, é tão laid-back quanto a lagartada ao sol, enquanto Common se aplica no "free style" com vigor e sensibilidade suficientes para entusiasmar uma freira. Não fosse o classicismo omnipresente e "Hard Groove" até podia ser um dos discos do ano ou um novo "Jazzmatazz". Assim é apenas um rebuçado escondido no fundo do pote. M.F.C. OUTROS TÍTULOS EM Y

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No laboratório do dr. Ang Lee

que a força da net esteja contigo

o companheiro das dores de crescimento

CINEMA

era uma vez em Nova Iorque 1968-1972

ícones&factos

Jean-François Stévenin, raro, transbordante

as duas mulheres de françois ozon

Acordo Final

TEATRO

Brecht e laranjas vão sair da mala de Beno Besson

Édipo em delírio

DANÇA

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Strip-Tease na Casa Conveniente

MÚSICA

ainda e sempre Tindersticks

o encanto reencontrado

da timidez como revelação

Blackalicious

Festival Hip-Hop 4 Elementos

Festival Bor Land energia ao vivo

Big Fat Mamma amor de mãe

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NEON

Miss Witherspoon vai para Washington

O Verão é uma sequela

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Sexta-feira, 11 de Julho de 2003 TOMMY BOY GREATEST HITS Vários Tommy Boy, distri. Warner 8/10 Como quem não quer a coisa, a editora Tommy Boy já chegou à maioridade. Fundada em 1981 por Tom Silverman, um DJ e editor de fanzine nova-iorquino, é "apenas" uma das fundadoras do rap. E se a Sugar Hill, com Grandmaster Flash e "Rappers Delight", e a Def Jam, com LL Cool J, também foram forças decisivas na introdução e divulgação da nova música negra urbana, a verdade é que muitas das principais novidades estéticas vieram da Tommy Boy. Qual Motown para a da década de 80, deu a primazia a artistas independentes, com direcções políticas e musicais bem definidas, que juntavam a inovação a uma clara tendência para perceber as inclinações e desejos da sua audiência - os jovens negros do Bronx e Queens, que viam no rap a tradução nas ondas da rádio e nos gira-discos da pobreza, violência e racismo das ruas. A compilação agora editada, dois CD com 33 temas, abre com a fonte de muito do que se passou depois: "Planet Rock", de Africa Bambaataa. Citado por praticamente todos os rappers e hip-hoppers, produzido por Arthur Baker, mais tarde por trás das aventuras mais dançantes do New Order, "Planet Rock" definia as coordenadas básicas - caixas de ritmos, Lynn drums, samples dos Kraftwerk, vocoders, e os MC por cima e nos espaços entre todos estes níveis sonoros, por vezes ainda cantando, quais reminiscências soul. A remistura para 2001, a cargo de Paul Oakenfold, mostra a actualidade do tema. Passada a fase electro, a segunda grande vaga do rap surge com a apropriação do jazz, e aqui a sorte grande sorriu de novo à Tommy Boy, com a edição do álbum de estreia dos De La Soul, "3 Feet High and Rising", que juntava samples de velhos discos de bebop, uma mensagem neo-hippie e uma inventiva rítmica longe já dos pioneiros - veja-se "The Magic Number". Ao longo dos anos 90, o rap endureceu, transformando-se em "gangsta", e a Tommy Boy, juntamente com a Death Row e a Bad Boy (de Sean "Puff Daddy" Combs), viu-se como casa de sons que, se não traziam nada de especialmente novo a nível sónico de batidas, atacava nos vocais e na dureza da mensagem (ou falta dela), passando os limites do sexismo e da homofobia. Por aqui passarem Naughty By Nature e Capone-N-Noreaga, mas também Coolio, que, fazendo jus ao nome, acabou por fazer o "crossover" para as tabelas mais "mainstream", com o oleoso "Gangsta's Paradise", em grande parte baseado num sample de Stevie Wonder. Houve ainda oportunidade para iniciação de brancos, com os "irlandeses" House of Pain e o festivo "Jump Around", e das senhoras, com a imponente Queen Latifah. Agora, e quando Eminem, um branco, e a Interscope, uma falsa independente, mandam no mundo do rap e a audiência-alvo são os "teenagers" bancos dos subúrbios americanos e europeus, a Tommy Boy está em fase de reavaliação, à procura de direcção. Mas mesmo só os contributos atrás referidos chegariam para lhe dar um lugar cimeiro na história das modernas linhas de força musicais. Nota 9 para o primeiro disco, 7 para o segundo. E.M Mundo Complexo Acredites ou Não Loop Recordings; distri. EMI-VC (7/10) "Acredites ou Não", álbum de estreia dos Mundo Complexo, é um disco bem representativo do estado do hip-hop em Portugal. Se ainda não surgiu aquele grande álbum que a nação hip-hop espera, o certo é que depois do regresso à estaca zero que aconteceu no final do século passado, a quantidade e a qualidade têm subido em flecha. Aqui já não há MCs que se atropelam no ensejo de chegar mais à frente, a banda sonora é sensivelmente mais madura e a produção tem garantido, na generalidade, um profissionalismo que era raro ou inexistente à meia dúzia de anos. Os Mundo Complexo não serão uma pedrada no charco mas não têm medo de rimar canções de amor (como no single "Carta de amor"), de arriscar cruzamentos com outro géneros, nem de deixar fluir um baixo que se não é genial torna-se decisivo enquanto alicerce de cada uma das faixas. Quer dizer, é este o caminho para um hip-hop apostado numa identidade própria, que pensa pela própria cabeça e executa com as suas próprias mãos. E isso já não é pouco. Miguel Francisco Cadete Fairport Convention Fairport Convention 8/10 What We Did on our Holidays 9/10 Unhalfbricking 9/10 Island, distri. Universal No manifesto de intenções de "Fairport Convention", álbum de estreia de 1968 da banda que viria a tornar-se a instit P BOYS TOMMY BOY GREATEST HITS Vários Tommy Boy, distri. Warner 8/10 Como quem não quer a coisa, a editora Tommy Boy já chegou à maioridade. Fundada em 1981 por Tom Silverman, um DJ e editor de fanzine nova-iorquino, é "apenas" uma das fundadoras do rap. E se a Sugar Hill, com Grandmaster Flash e "Rappers Delight", e a Def Jam, com LL Cool J, também foram forças decisivas na introdução e divulgação da nova música negra urbana, a verdade é que muitas das principais novidades estéticas vieram da Tommy Boy. Qual Motown para a da década de 80, deu a primazia a artistas independentes, com direcções políticas e musicais bem definidas, que juntavam a inovação a uma clara tendência para perceber as inclinações e desejos da sua audiência - os jovens negros do Bronx e Queens, que viam no rap a tradução nas ondas da rádio e nos gira-discos da pobreza, violência e racismo das ruas. A compilação agora editada, dois CD com 33 temas, abre com a fonte de muito do que se passou depois: "Planet Rock", de Africa Bambaataa. Citado por praticamente todos os rappers e hip-hoppers, produzido por Arthur Baker, mais tarde por trás das aventuras mais dançantes do New Order, "Planet Rock" definia as coordenadas básicas - caixas de ritmos, Lynn drums, samples dos Kraftwerk, vocoders, e os MC por cima e nos espaços entre todos estes níveis sonoros, por vezes ainda cantando, quais reminiscências soul. A remistura para 2001, a cargo de Paul Oakenfold, mostra a actualidade do tema. Passada a fase electro, a segunda grande vaga do rap surge com a apropriação do jazz, e aqui a sorte grande sorriu de novo à Tommy Boy, com a edição do álbum de estreia dos De La Soul, "3 Feet High and Rising", que juntava samples de velhos discos de bebop, uma mensagem neo-hippie e uma inventiva rítmica longe já dos pioneiros - veja-se "The Magic Number". Ao longo dos anos 90, o rap endureceu, transformando-se em "gangsta", e a Tommy Boy, juntamente com a Death Row e a Bad Boy (de Sean "Puff Daddy" Combs), viu-se como casa de sons que, se não traziam nada de especialmente novo a nível sónico de batidas, atacava nos vocais e na dureza da mensagem (ou falta dela), passando os limites do sexismo e da homofobia. Por aqui passarem Naughty By Nature e Capone-N-Noreaga, mas também Coolio, que, fazendo jus ao nome, acabou por fazer o "crossover" para as tabelas mais "mainstream", com o oleoso "Gangsta's Paradise", em grande parte baseado num sample de Stevie Wonder. Houve ainda oportunidade para iniciação de brancos, com os "irlandeses" House of Pain e o festivo "Jump Around", e das senhoras, com a imponente Queen Latifah. Agora, e quando Eminem, um branco, e a Interscope, uma falsa independente, mandam no mundo do rap e a audiência-alvo são os "teenagers" bancos dos subúrbios americanos e europeus, a Tommy Boy está em fase de reavaliação, à procura de direcção. Mas mesmo só os contributos atrás referidos chegariam para lhe dar um lugar cimeiro na história das modernas linhas de força musicais. Nota 9 para o primeiro disco, 7 para o segundo. E.M Mundo Complexo Acredites ou Não Loop Recordings; distri. EMI-VC (7/10) "Acredites ou Não", álbum de estreia dos Mundo Complexo, é um disco bem representativo do estado do hip-hop em Portugal. Se ainda não surgiu aquele grande álbum que a nação hip-hop espera, o certo é que depois do regresso à estaca zero que aconteceu no final do século passado, a quantidade e a qualidade têm subido em flecha. Aqui já não há MCs que se atropelam no ensejo de chegar mais à frente, a banda sonora é sensivelmente mais madura e a produção tem garantido, na generalidade, um profissionalismo que era raro ou inexistente à meia dúzia de anos. Os Mundo Complexo não serão uma pedrada no charco mas não têm medo de rimar canções de amor (como no single "Carta de amor"), de arriscar cruzamentos com outro géneros, nem de deixar fluir um baixo que se não é genial torna-se decisivo enquanto alicerce de cada uma das faixas. Quer dizer, é este o caminho para um hip-hop apostado numa identidade própria, que pensa pela própria cabeça e executa com as suas próprias mãos. E isso já não é pouco. Miguel Francisco Cadete Fairport Convention Fairport Convention 8/10 What We Did on our Holidays 9/10 Unhalfbricking 9/10 Island, distri. Universal No manifesto de intenções de "Fairport Convention", álbum de estreia de 1968 da banda que viria a tornar-se a instituição da folk rock inglesa, pode ler-se: "What we played - The best of the singers-songwriters, music of almost suicidal variety, mind boggling complicated arrangements of ostensibly simple songs, anything that other groups wouldn?t touch". Ainda com Judy Dyble e Martin Lamble (que viria a morrer num acidente de viação), "Fairport Convention" arranca para este rally com o que poderia ser um clássico dos The Byrds, "Time will show the wiser", de Emitt Rhodes, e prossegue com "I don't know where I stand", título apropriado para uma vocalização frágil e tocante de Dyble, na linha do que faria nos Trader Horne. Álbum variado, integra influências da pop psicadélica, britânica e americana (como na delirante versão de "Jack O'Diamonds", de Dylan, algures entre os Grateful Dead e os Jefferson Airplane), com Ashley Hutchings, futuro fundamentalista da tradição rural, a revelar inusitada destreza na escrita de coisas tão bizarras como "The lobster". A reedição, remasterizada, inclui quatro temas extra, entre os quais "Suzanne", de Cohen, e "Morning glory", de Tim Buckley. Um clássico menor e, para os que apenas conhecem fases posteriores do grupo, uma surpresa estonteante. No ano seguinte, Alexandra Elene MacLean Denny, Sandy Denny, entrara já para o grupo, em substituição de Judy Dyble, fazendo de "What we Did on our Holidays" algo de especial que abre com o clássico que daria nome ao seu primeiro projecto fora do grupo, "Fotheringay". Abrangendo ainda temas de Dylan ("I'll keep it with mine") e Joni Mitchell ("Eastern rain"), o psicadelismo, o "cajun" ou os "espirituais" (Denny a fazer de Joplin em "The Lord is in this place, how dreadful is this place?"), bem como um "Book song" de Ian Matthews, o álbum introduz o conceito de "folk eléctrica" em "Mr. Lacey" ao mesmo tempo que aparecem os primeiros arranjos de tradicionais, entre os quais "Nottamun town" e "She moves through the fair", prenúncio da direcção que o grupo viria a seguir. "I'll keep with mine" vale pela vocalização de Denny, em veia já explorada no álbum de 1967 de apresentação dos Strawbs, "All of our Own Work", e "Meet on the ledge", um original de Thompson, com aquele "swing" característico dos The Byrds que os Fairport tão bem adaptaram a uma inconfundível "britishnes", figura na galeria dos melhores temas do grupo. Ainda de 1969, outra peça-chave, "Unhalfbricking", título sugerido por Denny em mais do que provável estado de euforia etílica. "Genesis hall" ostenta a marca de uma voz em estado de graça. Poucas vezes Sandy Denny terá cantado como nesta canção de abandono, capaz de nos arrebatar naquele tom que apenas se encontrará, na música inglesa, em "I Want to See the Bright Lights Tonight", de Richard e Linda Thompson. Denny que em "Si tu dois partir", versão "cajun" e cantada em francês de um tema de Dylan, volta a abrir caminho ao "boom" do folk rock inglês dos anos 70, por bandas como os Steeleye Span, Matthews Southern Comfort ou Albion Country Band, e se mostra superlativa no jazzy "Autopsy", onde está já tudo o que se pode encontrar na sua brilhante discografia a solo. O mantra de 11 min. e único tradicional do álbum, "A sailor's life", é apresentado pela cantora de "world" Sheila Chandra como contendo os genes da música de fusão, na síntese de 2000 anos de canto tradicional védico com os timbres e modos da música irlandesa. O mesmo que, sem que ninguém desse conta, e na mesma altura, também fizeram os Mr. Fox e que em "Liege and Lief" iria ainda mais fundo. Depois, foi neste disco que os Fairport contrataram a sua estrela, o violinista Dave Swarbrick, aqui ainda um dos convidados, a par de Ian Matthews, Dave Mattacks (baterista que marcaria a rítmica futura dos FC) e Trevor Lucas (pilar dos Fotheringay). Apesar de três originais de Dylan, "Unhalfbricking" apresenta, pela primeira vez, o estilo distinto que levaria os Fairport ao estatuto mítico de que ainda hoje gozam. Mesmo que Denny lançasse ao vento as dúvidas e a interrogação ao destino - que para si seria trágico - em "Who knows where the time goes?". "Não receio o tempo", canta. E é todo um tempo de beleza gloriosa que desaba sobre nós. Fernando Magalhães THE KLEZMATICS Rise Up! Piranha; distri. Megamúsica 8/10 Robin Williams comentou um dia sobre os Klezmatics: "with music like this, if you don't see God, you're fucking blind." Ou seja, também ele - como aliás a maioria dos discursos sobre a música klezmer (música tradicional judia) - faz remontar a importância desta música a uma questão essencialmente religiosa. Contudo, mais do que apreciadas através do prisma da religação de gerações segundo uma determinada tábua de valores, as canções dos Klezmatics podem (devem?) ser ouvidas como um exercício musical em que a recuperação de uma música ancestral não se esquiva ao confronto com a modernidade. Nem sequer se furta à apropriação de músicas de outras coordenadas geográficas, como a herança qwaali, ainda que não fugindo aos parâmetros orientais. Também por isso, "Rise Up!" não deve ser reduzido a um mero panfleto político - apesar da ligação aos acontecimentos de 11 de Setembro ser explícita em temas como o inexcedível "I ain't afraid" - precisamente porque o poder da música dos Klezmatics ultrapassa as circunstâncias em que foi produzida. Basta ouvir o piano tonitruante de "Klezmorimlekh mayne libinke" para entender que por ali passa uma pulsão que não é exclusivamente judia, de hoje ou ou do Médio Oriente. MFC ARTUR PAREDES Acompanhado por Carlos Paredes e Arménio Santos Movieplay 5/10 CARLOS PAREDES Os Verdes Anos de Carlos Paredes Movieplay 5/10 Não está em causa a importância artística de Carlos Paredes e de seu pai Artur Paredes. Ou o papel fundamental que um e outro tiveram na evolução da guitarra portuguesa, no desenvolvimento da música produzida em Coimbra e no efeito que, gostávamos de crer, obtiveram sobre a música e os músicos de todo o mundo. Nem sequer vale a pena colocar em dúvida a elegância gráfica da embalagem destas duas colectâneas que reproduzem com garbo capas das edições originais em EP; é ainda de menor utilidade pôr em questão a remasterização a que os oito temas de Carlos e Artur Paredes foram submetidos. As notas que acompanham o livreto, da pena de José Niza, voltam a ser preciosas ao enquadrarem devidamente dois músicos deste calibre. O que não se entende é que estas duas colectâneas, recentemente colocadas no mecado, não acrescentem absolutamente nenhum tema novo às compilações similares "O Melhor dos Melhores" e "Clássicos da Renascença" publicadas, respectivamente, em 1994 e 2000 (em CD, pois a edição em vinilo remonta a 1972). As peças de Carlos Paredes aqui incluídas fazem também parte da integral "O Mundo Segundo Carlos Paredes" que chegou aos escaparates no Natal. O que leva a crer que estes discos se destinam em exclusivo a ouvintes desatentos ou amantes de capas renovadas para as mesmas gravações. MFC ROY HARGROVE presents THE RH FACTOR Hard Groove Verve; distri. Universal 7/10 Roy Hargrove é um emérito trompetista que no início da sua carreira, em finais dos anos 80, foi apadrinhado por Wynton Marsalis. Geralmente reconhecido pelo seu virtuosismo ao atacar baladas, aposta decididamente neste "Hard Groove" em temas up-tempo capazes de fazer dançar um paralítico. Para o efeito, contratou os préstimos de D'Angelo, Common, Q-Tip (dos A Tribe Called Quest), Meshell Ndegeocello e Erykah Badu e inventou a fusão mais anacrónica e suculenta de jazz, hip-hop, soul e funk que foi publicada nos últimos tempos. É toda esta trupe que resgata a música de "Hard Groove" aos domínios do hard-bop para a transportar para uma qualquer esquina em que tudo pode ser possível, apesar do resultado tresandar a anos 70. "Poetry", com Badu e Q-Tip, é tão laid-back quanto a lagartada ao sol, enquanto Common se aplica no "free style" com vigor e sensibilidade suficientes para entusiasmar uma freira. Não fosse o classicismo omnipresente e "Hard Groove" até podia ser um dos discos do ano ou um novo "Jazzmatazz". Assim é apenas um rebuçado escondido no fundo do pote. M.F.C. OUTROS TÍTULOS EM Y

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