59 velas acenderam-se em frente ao tribunal de Castelo de Paiva

27-04-2004
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59 Velas Acenderam-se em Frente ao Tribunal de Castelo de Paiva

Por LILIANA CARVALHO

Sábado, 27 de Março de 2004

"Iluminar a justiça portuguesa". Foi com este objectivo que, anteontem à noite, foram acesas 59 velas, em representação de outras tantas vítimas da queda da ponte de Hintze Ribeiro. No dia em que o juiz de instrução Nuno Melo tornou pública a sua decisão de não levar a julgamento nenhum dos arguidos no processo, cerca de 80 familiares das vítimas concentraram-se nas imediações do Tribunal de Castelo de Paiva para, quase sempre em silêncio, mostrarem que não concordam com o despacho do magistrado.

As poucas crianças presentes na vigília, que começou às 19h30, estavam alheias ao protesto "surdo" dos pais. Entre os adultos, na maioria em grupos, as conversas eram quase sussurradas. Muitos mantinham-se simplesmente em silêncio. Dos rostos mergulhados na roupa a proteger do gelo da noite só sobressaíam os olhos, que deixavam transparecer a "tristeza", a "frustração" e a "revolta" pela decisão de Nuno Melo.

"Vivemos num país em que a justiça está completamente apagada", reclama Joaquim Moreira. Álvaro Moreira, que o acompanha, é irmão. Diz estar na vigília porque, no dia em que a ponte decidiu desabar - baixa a voz para o dizer - , ficaram sem "os pais, dois irmãos e cinco primos". Ambos lamentam o facto de nem sequer poderem fazer o funeral aos pais.

Joaquim Moreira acredita que "todo o país sabe que há culpados" e chega mesmo a lembrar o episódio em que dois camionistas das redondezas cortaram a ponte por considerarem que esta não apresentava condições de segurança. "Antero Gaspar, que na altura era presidente da Câmara, moveu-lhes um processo crime. Após a queda da ponte, foi retirado o processo aos camionistas", relata, com amargura.

Mais à frente, quatro mulheres da mesma família conversam em círculo. Dilma Faria perdeu os pais, a tia que está consigo ficou sem os netos, a prima sem o filho e a nora, a irmã sem o primo e o cunhado. "Eles é que foram julgados", comentou Dilma. "Parece que nós é que temos que pedir desculpas pelos nossos familiares terem estado naquele local, naquele dia". A voz trémula continua: "A quem é que interessa que isto seja arquivado? Porque é que não esteve aqui connosco nenhum poder?".

Fernando Gonçalves foi à vigília com os pais porque perdeu a irmã. Agora só espera que o processo seja levado "às últimas consequências". O presidente da Associação dos Familiares das Vítimas da Tragédia de Entre-os-Rios, Horácio Moreira, garantiu que "a culpa não vai morrer solteira", nem que tenha que se recorrer aos tribunais europeus. Considera que "a justiça foi uma fraude", pois não encontrou culpados quando "o procurador admitiu culpados". Aquele responsável disse ainda que a vigília de anteontem foi uma acção "meramente simbólica" para mostrar que "a justiça portuguesa precisa de ser iluminada".

59 Velas Acenderam-se em Frente ao Tribunal de Castelo de Paiva

Por LILIANA CARVALHO

Sábado, 27 de Março de 2004

"Iluminar a justiça portuguesa". Foi com este objectivo que, anteontem à noite, foram acesas 59 velas, em representação de outras tantas vítimas da queda da ponte de Hintze Ribeiro. No dia em que o juiz de instrução Nuno Melo tornou pública a sua decisão de não levar a julgamento nenhum dos arguidos no processo, cerca de 80 familiares das vítimas concentraram-se nas imediações do Tribunal de Castelo de Paiva para, quase sempre em silêncio, mostrarem que não concordam com o despacho do magistrado.

As poucas crianças presentes na vigília, que começou às 19h30, estavam alheias ao protesto "surdo" dos pais. Entre os adultos, na maioria em grupos, as conversas eram quase sussurradas. Muitos mantinham-se simplesmente em silêncio. Dos rostos mergulhados na roupa a proteger do gelo da noite só sobressaíam os olhos, que deixavam transparecer a "tristeza", a "frustração" e a "revolta" pela decisão de Nuno Melo.

"Vivemos num país em que a justiça está completamente apagada", reclama Joaquim Moreira. Álvaro Moreira, que o acompanha, é irmão. Diz estar na vigília porque, no dia em que a ponte decidiu desabar - baixa a voz para o dizer - , ficaram sem "os pais, dois irmãos e cinco primos". Ambos lamentam o facto de nem sequer poderem fazer o funeral aos pais.

Joaquim Moreira acredita que "todo o país sabe que há culpados" e chega mesmo a lembrar o episódio em que dois camionistas das redondezas cortaram a ponte por considerarem que esta não apresentava condições de segurança. "Antero Gaspar, que na altura era presidente da Câmara, moveu-lhes um processo crime. Após a queda da ponte, foi retirado o processo aos camionistas", relata, com amargura.

Mais à frente, quatro mulheres da mesma família conversam em círculo. Dilma Faria perdeu os pais, a tia que está consigo ficou sem os netos, a prima sem o filho e a nora, a irmã sem o primo e o cunhado. "Eles é que foram julgados", comentou Dilma. "Parece que nós é que temos que pedir desculpas pelos nossos familiares terem estado naquele local, naquele dia". A voz trémula continua: "A quem é que interessa que isto seja arquivado? Porque é que não esteve aqui connosco nenhum poder?".

Fernando Gonçalves foi à vigília com os pais porque perdeu a irmã. Agora só espera que o processo seja levado "às últimas consequências". O presidente da Associação dos Familiares das Vítimas da Tragédia de Entre-os-Rios, Horácio Moreira, garantiu que "a culpa não vai morrer solteira", nem que tenha que se recorrer aos tribunais europeus. Considera que "a justiça foi uma fraude", pois não encontrou culpados quando "o procurador admitiu culpados". Aquele responsável disse ainda que a vigília de anteontem foi uma acção "meramente simbólica" para mostrar que "a justiça portuguesa precisa de ser iluminada".

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