Impostos e cidades - quem dá mais

11-08-2004
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Impostos e Cidades - Quem Dá Mais

Por TIAGO CAIADO GUERREIRO

Segunda-feira, 19 de Julho de 2004

Quando falamos em concorrência fiscal pensamos de imediato em concorrência entre países e nas taxas de imposto sobre as empresas, pessoas ou no IVA. No entanto, a concorrência fiscal entre cidades tem hoje em dia um papel fundamental na captação do investimento. Basta ver os inúmeros "rankings" internacionais sobre quais as cidades mais atraentes para se viver e investir.

Portugal não é excepção, visto que os impostos locais, com a descentralização e o reforço dos recursos e funções municipais, são cada vez mais relevantes e têm um peso crescente nas decisões de investimento das pessoas e empresas. A responsabilidade na captação do investimento recai então também sobre os presidentes das câmaras. Não chega que os Estados definam uma política fiscal internacionalmente competitiva para captar investimento. Os municípios e as cidades têm de adoptar uma estratégia que lhes permita competir com os outros municípios, em Portugal ou no estrangeiro, para atraírem para si a melhor e maior parte do bolo do investimento. Ora vejamos: os municípios cobram aos munícipes impostos sobre os imóveis (IMI), derrama sobre os lucros e inúmeras taxas municipais.

Cada município tem o poder de fixar anualmente o montante a pagar do Imposto Municipal sobre os Imóveis. A taxa poderá variar entre 0,2 e 0,5 por cento sobre o valor do prédio urbano avaliado já segundo as novas regras e de 0,4 a 0,8 por cento quanto aos restantes prédios urbanos. Isto é, um município pode fixar um imposto em menos de metade do que fixará um outro município. Imagine-se que o Sr. Manuel pretende comprar um andar no distrito de Aveiro. Tem dois prédios em vista, um em Vale de Cambra, outro em Vagos, ambos com um valor 200 mil euros. Se comprar o prédio sito em Vale de Cambra, o Sr. Manuel terá de pagar imposto municipal sobre o imóvel no montante de 400 euros, correspondente a 0,2 por cento do valor do prédio. Já se decidir adquirir o prédio de Vagos, irá pagar imposto no montante de mil euros, correspondente a 0,5 por cento do valor do imóvel.

Imagine-se ainda que o Sr. Manuel pensa em abrir uma empresa. Num dos municípios não pagará derrama e no outro pagará derrama correspondente a 10 por cento do IRC. Se tiver um lucro de um milhão de euros, num nada pagará, no outro pagará 25 mil euros de imposto. Mas a "história" não acaba aqui. É que a empresa também paga IMI e inúmeras taxas, como, por exemplo, taxas pelo licenciamento de obras, de urbanização, saneamento, exercício de actividade económica, etc, etc. Assim, a diferença de um município para outro será maior e agravada pelo facto de estes impostos serem na maior parte periódicos (anuais).

A importância dos impostos municipais atingiu uma dimensão tal que cada vez mais se fala na ideia de serem cobrados na totalidade pelos próprios municípios (medida com a qual concordo por diversas razões, nomeadamente porque contribui para uma divisão mais honesta e transparente do custo político de cobrar o imposto).

Da análise das várias taxas estabelecidas para 2003 pelos municípios portugueses, verificamos uma total falta de sensibilidade para esta questão, já que mais de 60 por cento optou, por exemplo, por fixar as taxas máximas de IMI. Isto é, muitos municípios queixam-se da falta de investimento privado, mas nada fazem para o atrair. Na maior parte são entidades pesadas, caras de manter, com baixos níveis de eficiência e péssima gestão de recursos, que têm de ser financiadas por elevadas taxas de imposto. Muitos autarcas afirmam querer menos Estado e melhor Estado, mas poucos olham para o seu próprio umbigo. É que os poderes locais também devem ser "menos Estado e melhor Estado", consumindo menos recursos económicos aos seus munícipes.

A concorrência fiscal e a boa gestão dos recursos levará naturalmente a uma maior competitividade na captação do investimento gerador do crescimento económico e do desenvolvimento, que por sua vez aumentará a receita fiscal, gerando-se um ciclo virtuoso de crescimento económico/desenvolvimento/aumento da receita fiscal nos municípios mais competitivos.

A responsabilidade do desenvolvimento económico do país deve pois ser partilhada entre o Governo e os presidentes das câmaras. Perdem-se e ganham-se inúmeros projectos de investimento em Portugal por boas ou más decisões do Governo, mas muitas também por boas e más decisões das autarquias locais. Num país que se quer competitivo e atraente, chegou a altura dos presidentes das câmaras assumirem o papel determinante que têm no desenvolvimento de Portugal e deixarem de ser como os governos locais de que se queixava o imperador romano Tibério, que dizia que os governadores locais o aconselhavam permanentemente a aumentar e criar novos impostos, pelo que por fim lhes respondeu que "o dever de um bom pastor é tosquiar o rebanho permitindo o seu aumento, mas não esfolá-lo".

Advogado

tguerreiro@fcguerreiro.com

Impostos e Cidades - Quem Dá Mais

Por TIAGO CAIADO GUERREIRO

Segunda-feira, 19 de Julho de 2004

Quando falamos em concorrência fiscal pensamos de imediato em concorrência entre países e nas taxas de imposto sobre as empresas, pessoas ou no IVA. No entanto, a concorrência fiscal entre cidades tem hoje em dia um papel fundamental na captação do investimento. Basta ver os inúmeros "rankings" internacionais sobre quais as cidades mais atraentes para se viver e investir.

Portugal não é excepção, visto que os impostos locais, com a descentralização e o reforço dos recursos e funções municipais, são cada vez mais relevantes e têm um peso crescente nas decisões de investimento das pessoas e empresas. A responsabilidade na captação do investimento recai então também sobre os presidentes das câmaras. Não chega que os Estados definam uma política fiscal internacionalmente competitiva para captar investimento. Os municípios e as cidades têm de adoptar uma estratégia que lhes permita competir com os outros municípios, em Portugal ou no estrangeiro, para atraírem para si a melhor e maior parte do bolo do investimento. Ora vejamos: os municípios cobram aos munícipes impostos sobre os imóveis (IMI), derrama sobre os lucros e inúmeras taxas municipais.

Cada município tem o poder de fixar anualmente o montante a pagar do Imposto Municipal sobre os Imóveis. A taxa poderá variar entre 0,2 e 0,5 por cento sobre o valor do prédio urbano avaliado já segundo as novas regras e de 0,4 a 0,8 por cento quanto aos restantes prédios urbanos. Isto é, um município pode fixar um imposto em menos de metade do que fixará um outro município. Imagine-se que o Sr. Manuel pretende comprar um andar no distrito de Aveiro. Tem dois prédios em vista, um em Vale de Cambra, outro em Vagos, ambos com um valor 200 mil euros. Se comprar o prédio sito em Vale de Cambra, o Sr. Manuel terá de pagar imposto municipal sobre o imóvel no montante de 400 euros, correspondente a 0,2 por cento do valor do prédio. Já se decidir adquirir o prédio de Vagos, irá pagar imposto no montante de mil euros, correspondente a 0,5 por cento do valor do imóvel.

Imagine-se ainda que o Sr. Manuel pensa em abrir uma empresa. Num dos municípios não pagará derrama e no outro pagará derrama correspondente a 10 por cento do IRC. Se tiver um lucro de um milhão de euros, num nada pagará, no outro pagará 25 mil euros de imposto. Mas a "história" não acaba aqui. É que a empresa também paga IMI e inúmeras taxas, como, por exemplo, taxas pelo licenciamento de obras, de urbanização, saneamento, exercício de actividade económica, etc, etc. Assim, a diferença de um município para outro será maior e agravada pelo facto de estes impostos serem na maior parte periódicos (anuais).

A importância dos impostos municipais atingiu uma dimensão tal que cada vez mais se fala na ideia de serem cobrados na totalidade pelos próprios municípios (medida com a qual concordo por diversas razões, nomeadamente porque contribui para uma divisão mais honesta e transparente do custo político de cobrar o imposto).

Da análise das várias taxas estabelecidas para 2003 pelos municípios portugueses, verificamos uma total falta de sensibilidade para esta questão, já que mais de 60 por cento optou, por exemplo, por fixar as taxas máximas de IMI. Isto é, muitos municípios queixam-se da falta de investimento privado, mas nada fazem para o atrair. Na maior parte são entidades pesadas, caras de manter, com baixos níveis de eficiência e péssima gestão de recursos, que têm de ser financiadas por elevadas taxas de imposto. Muitos autarcas afirmam querer menos Estado e melhor Estado, mas poucos olham para o seu próprio umbigo. É que os poderes locais também devem ser "menos Estado e melhor Estado", consumindo menos recursos económicos aos seus munícipes.

A concorrência fiscal e a boa gestão dos recursos levará naturalmente a uma maior competitividade na captação do investimento gerador do crescimento económico e do desenvolvimento, que por sua vez aumentará a receita fiscal, gerando-se um ciclo virtuoso de crescimento económico/desenvolvimento/aumento da receita fiscal nos municípios mais competitivos.

A responsabilidade do desenvolvimento económico do país deve pois ser partilhada entre o Governo e os presidentes das câmaras. Perdem-se e ganham-se inúmeros projectos de investimento em Portugal por boas ou más decisões do Governo, mas muitas também por boas e más decisões das autarquias locais. Num país que se quer competitivo e atraente, chegou a altura dos presidentes das câmaras assumirem o papel determinante que têm no desenvolvimento de Portugal e deixarem de ser como os governos locais de que se queixava o imperador romano Tibério, que dizia que os governadores locais o aconselhavam permanentemente a aumentar e criar novos impostos, pelo que por fim lhes respondeu que "o dever de um bom pastor é tosquiar o rebanho permitindo o seu aumento, mas não esfolá-lo".

Advogado

tguerreiro@fcguerreiro.com

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