COMUNIDADE PORTUGUESA

19-08-2004
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Terça-feira, 17 de Agosto de 2004 VIVE "UMA CALMA TENSA" Emigrantes - polarizados como o resto da sociedade venezuelana, mas mais inclinados para a oposição - enfrentam o desalento próprio da derrota. "As pessoas estão cansadas, tanta luta e, afinal, vamos ter Chávez até 2021!". Por Ana Cristina Pereira Os portugueses residentes na Venezuela estão "apreensivos". O referendo revogatório do passado domingo não reconciliou os dois blocos que se opõem dentro do país por causa do mandato do presidente Hugo Chávez. "A situação é bastante delicada", considera Alda Sousa, da associação Portugal Mira, que fez campanha pela saída do militar. "Vivemos uma calma tensa". Caracas adormeceu muito tarde à espera dos resultados da consulta eleitoral. Ontem de manhã, não havia nem sinal do típico trânsito infernal. "Muitos ficaram em casa", disse ao PÚBLICO o luso descendente Fernando Pereira, da ONG de defesa dos direitos dos menores CECODAP. O Governo decretou tolerância de ponto na função pública e apelou aos empresários que lhe seguissem o exemplo. Inúmeros portugueses, à semelhança dos cidadãos de outras nacionalidades, mantiveram as portas dos seus estabelecimentos comerciais fechadas - menos para celebrar a vitória esmagadora de Chávez do que por medo de sofrer extensões de eventuais confrontos. A Venezuela é um país polarizado, a comunidade lusa não constitui excepção. São 400 mil emigrantes chegados na década de 60 e 70, um milhão se contarmos com os descendentes. Alguns engrossam as fileiras dos oficialistas, como Guido Freitas, deputado pelo Movimento V República, que ontem celebrava: "A revolução avança!". Outros integram a oposição, como Nelson da Gama, dono de uma das mais importantes redes de super-mercados da Venezuela, que se juntou à greve de dois meses iniciada em Dezembro de 2002. Dantes, "os portugueses nem sequer se davam ao trabalho de votar, agora não há na Venezuela quem seja indiferente à política", frisa Olavo Manica, do Centro Social das Comunidades Madeirenses. Muitos até substituiram as tradicionais férias de Agosto por Julho para poderem votar. Na sua opinião, a posição dos emigrantes não se explica pela sua qualidade de estrangeiros, mas pela actividade que desenvolvem: a maior parte dedica-se à indústria e ao comércio, áreas que têm contestado a política económica de Hugo Chávez. Durante a longa greve, os portugueses geriram-se mais pela garantia de segurança do que pela convicção política: fecharam as portas nas zonas controladas pela oposição, mantiveram-nas abertas nas zonas controladas pelos oficialistas. Os resultados obtidos nas urnas montadas em Portugal, contudo, revelam para onde pendem: no Funchal, houve 387 votos contra Hugo Chávez e 39 a favor; em Lisboa contaram-se 126 votos pelo "Sim" à revogação e 28 pelo "Não". Vitória ou fraude? O embaixador de Portugal em Caracas, Vasco Bramão Ramos, pediu já ontem "uma reflexão aprofundada" à comunidade portuguesa radicada naquele país. "Espero que todos os venezuelanos - e estou a pensar mais especificamente nos luso-venezuelanos - tirem desta jornada as devidas ilações", disse, segundo a Lusa. Na opinião de Vasco Bramão Ramos, a "muitíssima afluência às urnas é um sinal de vitalidade política e democrática da Venezuela". Os resultados - sublinhou - "aparentemente são claros o que em democracia é muito bom". A posição de Bramão Ramos não encontra eco nas alas opositoras da comunidade. "A situação é grave", considera Jorge Machado, da Portugal Mira, associação que se aliou à Coordenadora Democrática. No domingo à noite, "tudo indicava que o resultado seria exactamente o inverso ao que foi anunciado pelo Conselho Nacional Eleitoral". Razão pela qual não se fia na vitória chavista. Activistas opositores como Alda Sousa dizem manter "uma esperança". "O resultado divulgado pelo Conselho Nacional Eleitoral é impossível", afirma a emigrante, alegando que os membros que representam a oposição naquele órgão foram afastados da contagem e que há actas que "provam fraude". A turbulência política dura há dois anos e meio e, para além da greve, inclui um golpe e um contra golpe. "As pessoas estão cansadas, tanta luta e, afinal, vamos ter Chávez até 2021!", suspira Vanesa Pereira, filha do presidente do Centro Português de Caracas. O desencanto é evidente: "Fiquei nove horas na fila para votar, houve gente que ficou doze, e agora há rumores de que houve fraude! Para quê isto? para quê votar em 2006?" Fernando Pereira, que esteve a acompanhar a consulta através da ONG a que pertence, acredita que "nada fundamenta a ideia de fraude" - opinião partilhada pelos observadores internacionais: Se Chávez tivesse perdido, seriam os chavistas a falar em fraude. As ameaças existiam nos dois blocos. "É o delírio tropical", interpreta Olavo Manica. Durante todo o dia, as linhas telefónicas venezuelanas deram sinais de excesso de fluxo. "A situação parece calma, mas não está", caracteriza o director do Correio de Caracas, Aleixo Vieira. Os portugueses, como a maior parte dos venezuelanos, estão "apreensivos". "Se os opositores insistirem em contestar os resultados, vai haver confronto de certeza", avaliava Fernando Pereira. "Eu diria que vivemos uma calma tensa", diz também Alda Sousa. As manifestação retomavam-se já ontem. A reconciliação nacional adia-se, uma vez mais. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Chávez derrota oposição com "vitória limpa"

Preço do petróleo teve ligeira descida

O chavismo é um fenómeno duradouro

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Terça-feira, 17 de Agosto de 2004 VIVE "UMA CALMA TENSA" Emigrantes - polarizados como o resto da sociedade venezuelana, mas mais inclinados para a oposição - enfrentam o desalento próprio da derrota. "As pessoas estão cansadas, tanta luta e, afinal, vamos ter Chávez até 2021!". Por Ana Cristina Pereira Os portugueses residentes na Venezuela estão "apreensivos". O referendo revogatório do passado domingo não reconciliou os dois blocos que se opõem dentro do país por causa do mandato do presidente Hugo Chávez. "A situação é bastante delicada", considera Alda Sousa, da associação Portugal Mira, que fez campanha pela saída do militar. "Vivemos uma calma tensa". Caracas adormeceu muito tarde à espera dos resultados da consulta eleitoral. Ontem de manhã, não havia nem sinal do típico trânsito infernal. "Muitos ficaram em casa", disse ao PÚBLICO o luso descendente Fernando Pereira, da ONG de defesa dos direitos dos menores CECODAP. O Governo decretou tolerância de ponto na função pública e apelou aos empresários que lhe seguissem o exemplo. Inúmeros portugueses, à semelhança dos cidadãos de outras nacionalidades, mantiveram as portas dos seus estabelecimentos comerciais fechadas - menos para celebrar a vitória esmagadora de Chávez do que por medo de sofrer extensões de eventuais confrontos. A Venezuela é um país polarizado, a comunidade lusa não constitui excepção. São 400 mil emigrantes chegados na década de 60 e 70, um milhão se contarmos com os descendentes. Alguns engrossam as fileiras dos oficialistas, como Guido Freitas, deputado pelo Movimento V República, que ontem celebrava: "A revolução avança!". Outros integram a oposição, como Nelson da Gama, dono de uma das mais importantes redes de super-mercados da Venezuela, que se juntou à greve de dois meses iniciada em Dezembro de 2002. Dantes, "os portugueses nem sequer se davam ao trabalho de votar, agora não há na Venezuela quem seja indiferente à política", frisa Olavo Manica, do Centro Social das Comunidades Madeirenses. Muitos até substituiram as tradicionais férias de Agosto por Julho para poderem votar. Na sua opinião, a posição dos emigrantes não se explica pela sua qualidade de estrangeiros, mas pela actividade que desenvolvem: a maior parte dedica-se à indústria e ao comércio, áreas que têm contestado a política económica de Hugo Chávez. Durante a longa greve, os portugueses geriram-se mais pela garantia de segurança do que pela convicção política: fecharam as portas nas zonas controladas pela oposição, mantiveram-nas abertas nas zonas controladas pelos oficialistas. Os resultados obtidos nas urnas montadas em Portugal, contudo, revelam para onde pendem: no Funchal, houve 387 votos contra Hugo Chávez e 39 a favor; em Lisboa contaram-se 126 votos pelo "Sim" à revogação e 28 pelo "Não". Vitória ou fraude? O embaixador de Portugal em Caracas, Vasco Bramão Ramos, pediu já ontem "uma reflexão aprofundada" à comunidade portuguesa radicada naquele país. "Espero que todos os venezuelanos - e estou a pensar mais especificamente nos luso-venezuelanos - tirem desta jornada as devidas ilações", disse, segundo a Lusa. Na opinião de Vasco Bramão Ramos, a "muitíssima afluência às urnas é um sinal de vitalidade política e democrática da Venezuela". Os resultados - sublinhou - "aparentemente são claros o que em democracia é muito bom". A posição de Bramão Ramos não encontra eco nas alas opositoras da comunidade. "A situação é grave", considera Jorge Machado, da Portugal Mira, associação que se aliou à Coordenadora Democrática. No domingo à noite, "tudo indicava que o resultado seria exactamente o inverso ao que foi anunciado pelo Conselho Nacional Eleitoral". Razão pela qual não se fia na vitória chavista. Activistas opositores como Alda Sousa dizem manter "uma esperança". "O resultado divulgado pelo Conselho Nacional Eleitoral é impossível", afirma a emigrante, alegando que os membros que representam a oposição naquele órgão foram afastados da contagem e que há actas que "provam fraude". A turbulência política dura há dois anos e meio e, para além da greve, inclui um golpe e um contra golpe. "As pessoas estão cansadas, tanta luta e, afinal, vamos ter Chávez até 2021!", suspira Vanesa Pereira, filha do presidente do Centro Português de Caracas. O desencanto é evidente: "Fiquei nove horas na fila para votar, houve gente que ficou doze, e agora há rumores de que houve fraude! Para quê isto? para quê votar em 2006?" Fernando Pereira, que esteve a acompanhar a consulta através da ONG a que pertence, acredita que "nada fundamenta a ideia de fraude" - opinião partilhada pelos observadores internacionais: Se Chávez tivesse perdido, seriam os chavistas a falar em fraude. As ameaças existiam nos dois blocos. "É o delírio tropical", interpreta Olavo Manica. Durante todo o dia, as linhas telefónicas venezuelanas deram sinais de excesso de fluxo. "A situação parece calma, mas não está", caracteriza o director do Correio de Caracas, Aleixo Vieira. Os portugueses, como a maior parte dos venezuelanos, estão "apreensivos". "Se os opositores insistirem em contestar os resultados, vai haver confronto de certeza", avaliava Fernando Pereira. "Eu diria que vivemos uma calma tensa", diz também Alda Sousa. As manifestação retomavam-se já ontem. A reconciliação nacional adia-se, uma vez mais. OUTROS TÍTULOS EM DESTAQUE Chávez derrota oposição com "vitória limpa"

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