A derrota de Cavaco Silva

07-10-2015
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Nestas eleições, ouvindo as diferentes sensibilidades, parece que todos perderam, tirando o Bloco de Esquerda e o surpreendente PAN.

Há quem consiga defender, de cara séria, que a coligação PSD/CDS perdeu, porque desceu votos e perdeu a maioria absoluta. Há muita gente a defender que a CDU perdeu, apesar de ter mais votos e deputados. E, claro, acho que ninguém consegue discutir a derrota de António Costa, apesar do clima algo bizarro de festa que se viveu aquando do seu discurso.

Mas há um derrotado claro que, para além de Costa, apostava tudo nestas eleições. Esse derrotado é Aníbal Cavaco Silva. Antes da campanha eleitoral, o Presidente forçou os limites do razoável pedindo aos portugueses que elegessem uma maioria absoluta, na prática desaconselhando um voto em qualquer partido que não PSD, PS ou CDS. Uma postura pragmática, sem dúvida, mas de espírito democrático no mínimo questionável. O voto é livre, felizmente, e os portugueses são quase sempre mais lúcidos do que se quer fazer crer. E a resposta dada pelos portugueses, através do instrumento mais importante que detêm, foi um desrespeito pelo sobrolho carregado do Presidente.

Em Portugal, há uma obsessão com a maioria absoluta. É verdade que a história nos conta que é difícil governar sem ela; mas também é verdade que os governos de coligação costumam ter vida curta, e o último mostrou que não é impossível contrariar a história, e começar a construir uma nova, mais saudável.

Os portugueses não elegeram uma maioria absoluta. Escolheram que PSD e CDS continuassem a governar, mas sem rédea livre para o fazer sem ter de prestar atenção ao resto dos partidos que ganharam assento parlamentar, e que representam tanto os portugueses como os de PSD e CDS.

À volta de tudo isto, vive-se o drama, que o próprio Presidente vincou em tempo útil, e que decidiu ontem acentuar.

Eu não vejo drama nenhum nisto. Vejo a normalidade de um sistema que funciona e cujas regras deixam claro o que há a fazer. Vejo a capacidade de negociação e a responsabilidade como algo essencial para partidos de poder ou que querem ser poder.

É claro que boa parte da solução está no PS e no que este irá fazer (continuo a não ver como pode António Costa fingir que nada se passou e manter-se no cargo, mas enfim). Mas há que pedir-lhe responsabilidade e respeito institucional pelos resultados das eleições. Não podemos considerar que o PS é à partida um partido responsável para governar (se tivesse ganho as eleições) mas admitir sem exigência cívica que se comporte irresponsavelmente no momento da derrota. O partido é o mesmo, num caso ou noutro.

Temos todos, enquanto cidadãos, de exigir mais qualidade dos nossos políticos. Exigir respeito e negociação de quem está no poder, e bom senso, responsabilidade e ideias construtivas a quem não está.

Quem não o fizer, sofrerá no local indicado - nas urnas - as consequências. Também aqui os portugueses costumam demonstrar uma lucidez assinalável. E sem precisar de recados paternalistas vindos de Belém.

O discurso de ontem do Presidente, que foi tão previsível como se previa, deixou-nos, no final, com a única dúvida que já existia antes dessa intervenção: Cavaco defende um governo de bloco central a três ou apenas um compromisso do PS de que deixará passar o Orçamento?

Conteúdo publicado no Económico à Uma. Subscreva aqui.

Nestas eleições, ouvindo as diferentes sensibilidades, parece que todos perderam, tirando o Bloco de Esquerda e o surpreendente PAN.

Há quem consiga defender, de cara séria, que a coligação PSD/CDS perdeu, porque desceu votos e perdeu a maioria absoluta. Há muita gente a defender que a CDU perdeu, apesar de ter mais votos e deputados. E, claro, acho que ninguém consegue discutir a derrota de António Costa, apesar do clima algo bizarro de festa que se viveu aquando do seu discurso.

Mas há um derrotado claro que, para além de Costa, apostava tudo nestas eleições. Esse derrotado é Aníbal Cavaco Silva. Antes da campanha eleitoral, o Presidente forçou os limites do razoável pedindo aos portugueses que elegessem uma maioria absoluta, na prática desaconselhando um voto em qualquer partido que não PSD, PS ou CDS. Uma postura pragmática, sem dúvida, mas de espírito democrático no mínimo questionável. O voto é livre, felizmente, e os portugueses são quase sempre mais lúcidos do que se quer fazer crer. E a resposta dada pelos portugueses, através do instrumento mais importante que detêm, foi um desrespeito pelo sobrolho carregado do Presidente.

Em Portugal, há uma obsessão com a maioria absoluta. É verdade que a história nos conta que é difícil governar sem ela; mas também é verdade que os governos de coligação costumam ter vida curta, e o último mostrou que não é impossível contrariar a história, e começar a construir uma nova, mais saudável.

Os portugueses não elegeram uma maioria absoluta. Escolheram que PSD e CDS continuassem a governar, mas sem rédea livre para o fazer sem ter de prestar atenção ao resto dos partidos que ganharam assento parlamentar, e que representam tanto os portugueses como os de PSD e CDS.

À volta de tudo isto, vive-se o drama, que o próprio Presidente vincou em tempo útil, e que decidiu ontem acentuar.

Eu não vejo drama nenhum nisto. Vejo a normalidade de um sistema que funciona e cujas regras deixam claro o que há a fazer. Vejo a capacidade de negociação e a responsabilidade como algo essencial para partidos de poder ou que querem ser poder.

É claro que boa parte da solução está no PS e no que este irá fazer (continuo a não ver como pode António Costa fingir que nada se passou e manter-se no cargo, mas enfim). Mas há que pedir-lhe responsabilidade e respeito institucional pelos resultados das eleições. Não podemos considerar que o PS é à partida um partido responsável para governar (se tivesse ganho as eleições) mas admitir sem exigência cívica que se comporte irresponsavelmente no momento da derrota. O partido é o mesmo, num caso ou noutro.

Temos todos, enquanto cidadãos, de exigir mais qualidade dos nossos políticos. Exigir respeito e negociação de quem está no poder, e bom senso, responsabilidade e ideias construtivas a quem não está.

Quem não o fizer, sofrerá no local indicado - nas urnas - as consequências. Também aqui os portugueses costumam demonstrar uma lucidez assinalável. E sem precisar de recados paternalistas vindos de Belém.

O discurso de ontem do Presidente, que foi tão previsível como se previa, deixou-nos, no final, com a única dúvida que já existia antes dessa intervenção: Cavaco defende um governo de bloco central a três ou apenas um compromisso do PS de que deixará passar o Orçamento?

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