A periferia a duas velocidades

25-06-2011
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Depois de ter sido o bom aluno europeu, Portugal terá de ser o bom arrependido europeu

Portugal ensaiou em Bruxelas, na estreia de Passos Coelho em cimeiras europeias, uma estratégia que assenta em separar a crise grega da crise portuguesa. É a boa estratégia - tanto quanto pode ser boa uma estratégia num contexto dominado por tantos imponderáveis como é a crise das dívidas soberanas europeias. E é, de algum modo, uma tentativa de regresso à estratégia do "bom aluno europeu" do tempo de Cavaco, para nos redimirmos de nos termos andado a portar mal. Mas como já não temos idade para sermos alunos da Europa, resta-nos tentar ser o "bom arrependido europeu". Com Portugal obrigado a aplicar o duríssimo memorando da troika para não entrar em bancarrota, essa estratégia só pode funcionar porque, no outro extremo da Europa do Sul, está uma Grécia que falhou na aplicação das medidas e na construção de consensos políticos para enfrentar a ameaça do default. E Lisboa olha para Atenas com medo: acreditamos que a oriente está o nosso futuro, que a tragédia grega de hoje será o nosso drama de amanhã. Uma máquina do tempo que nos alerta para um desastre inevitável. Perante esta visão, tão típica do nosso fatalismo, precisamos de ser capazes de responder a uma pergunta: está a Grécia a falhar por culpa própria, por culpa do plano de resgate ou as duas coisas? Não sabemos. Mas sabemos que Portugal jogou a sua cartada no plano de resgate europeu e que os outros caminhos - da renegociação da dívida à saída do euro - dificilmente seriam melhores. Resta-nos portanto olhar para as causas internas do fracasso grego e esperar que não repetir os erros seja remédio suficiente. Mas a nossa melhor esperança é que a periferia europeia não funcione a duas velocidades. É que, para o desastre grego, não há mesmo nenhum remédio conhecido.

Um negócio que deve servir de exemplo

Oque se passou com o negócio que envolve o edifício-sede do SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras) em Lisboa é exemplar do desnorte com que se utitilizam os dinheiros públicos. Há dois anos, o prédio de onze pisos onde o SEF se encontrava instalado foi vendido por 6 milhões de euros, e os serviços transferidos para o Taguspark, em Oeiras. Para um edifício alugado, claro, com uma renda mensal de 125 mil euros. Como muitos dos trabalhadores do SEF moravam em Lisboa, alugou-se um autocarro para todos os dias os levar e trazer: mais 34 mil euros por ano. Além de 23 mil para arranjos paisagísticos. Mais 247 mil para segurança. Mais 15 mil para sinalética. No total, 1,1 milhões de euros. Porque, extraordinária descoberta, o edifício não estava preparado para receber os serviços (fizeram-se obras) nem os servidores informáticos, que acabaram por ficar na antiga sede... em dois pisos e a pagar renda. Antes deste rol de gastos, diz o sindicato respectivo, o SEF seria auto-suficiente e ainda canalizaria milhões para os cofres do Estado. Agora, com estes e outros episódios de má memória, há-de entrar na lista negra. E os autores desta lamentável operação? Ninguém os coloca na lista negra, pedindo-lhes responsabilidades?

Depois de ter sido o bom aluno europeu, Portugal terá de ser o bom arrependido europeu

Portugal ensaiou em Bruxelas, na estreia de Passos Coelho em cimeiras europeias, uma estratégia que assenta em separar a crise grega da crise portuguesa. É a boa estratégia - tanto quanto pode ser boa uma estratégia num contexto dominado por tantos imponderáveis como é a crise das dívidas soberanas europeias. E é, de algum modo, uma tentativa de regresso à estratégia do "bom aluno europeu" do tempo de Cavaco, para nos redimirmos de nos termos andado a portar mal. Mas como já não temos idade para sermos alunos da Europa, resta-nos tentar ser o "bom arrependido europeu". Com Portugal obrigado a aplicar o duríssimo memorando da troika para não entrar em bancarrota, essa estratégia só pode funcionar porque, no outro extremo da Europa do Sul, está uma Grécia que falhou na aplicação das medidas e na construção de consensos políticos para enfrentar a ameaça do default. E Lisboa olha para Atenas com medo: acreditamos que a oriente está o nosso futuro, que a tragédia grega de hoje será o nosso drama de amanhã. Uma máquina do tempo que nos alerta para um desastre inevitável. Perante esta visão, tão típica do nosso fatalismo, precisamos de ser capazes de responder a uma pergunta: está a Grécia a falhar por culpa própria, por culpa do plano de resgate ou as duas coisas? Não sabemos. Mas sabemos que Portugal jogou a sua cartada no plano de resgate europeu e que os outros caminhos - da renegociação da dívida à saída do euro - dificilmente seriam melhores. Resta-nos portanto olhar para as causas internas do fracasso grego e esperar que não repetir os erros seja remédio suficiente. Mas a nossa melhor esperança é que a periferia europeia não funcione a duas velocidades. É que, para o desastre grego, não há mesmo nenhum remédio conhecido.

Um negócio que deve servir de exemplo

Oque se passou com o negócio que envolve o edifício-sede do SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras) em Lisboa é exemplar do desnorte com que se utitilizam os dinheiros públicos. Há dois anos, o prédio de onze pisos onde o SEF se encontrava instalado foi vendido por 6 milhões de euros, e os serviços transferidos para o Taguspark, em Oeiras. Para um edifício alugado, claro, com uma renda mensal de 125 mil euros. Como muitos dos trabalhadores do SEF moravam em Lisboa, alugou-se um autocarro para todos os dias os levar e trazer: mais 34 mil euros por ano. Além de 23 mil para arranjos paisagísticos. Mais 247 mil para segurança. Mais 15 mil para sinalética. No total, 1,1 milhões de euros. Porque, extraordinária descoberta, o edifício não estava preparado para receber os serviços (fizeram-se obras) nem os servidores informáticos, que acabaram por ficar na antiga sede... em dois pisos e a pagar renda. Antes deste rol de gastos, diz o sindicato respectivo, o SEF seria auto-suficiente e ainda canalizaria milhões para os cofres do Estado. Agora, com estes e outros episódios de má memória, há-de entrar na lista negra. E os autores desta lamentável operação? Ninguém os coloca na lista negra, pedindo-lhes responsabilidades?

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