Igualdade no cinema fica longe como na sociedade

09-03-2015
marcar artigo

Igualdade no cinema fica longe como na sociedade

Paulo Jorge Pereira

paulo.pereira@economico.pt

07 Mar 2015

Trabalho igual, salário igual? O princípio é esse, a realidade deveria consagrá-lo fora dos livros, mas quanto mais o tempo passa mais as mulheres são discriminadas. Um estudo universitário confirma a situação no Cinema.

Tinha ritmo, história bem contada, elenco de alto nível, realização cuidada. Esta lista de ingredientes faz até lembrar a canção dos irmãos George e Ira Gershwin, ‘I Got Rythm', que Gene Kelly cantou e dançou no fabuloso "Um Americano em Paris" de 1951. Por tudo aquilo, "Golpada Americana", cujo orçamento se situou nos 40 milhões de dólares, foi um sucesso de bilheteira à escala mundial (receita de 251 milhões de dólares). O trabalho de Jennifer Lawrence e Amy Adams mereceu nomeação aos Óscares tal como o dos actores. E, no entanto, foram Christian Bale, Bradley Cooper e Jeremy Renner, os principais actores do filme, quem mais recebeu, uma vez que negociaram 9% do lucro, enquanto a dupla feminina não foi além dos 7%.

No ano passado, depois de terem sido atingidos por ‘hackers', os estúdios Sony viram exposta a informação de que, dos 17 executivos com salário superior a um milhão de dólares, só havia uma mulher: a vice-presidente Amy Pascal, que auferia três milhões e criticou as actrizes por receberem menos do que os actores. "Lidero um negócio - se as pessoas trabalham por menos dinheiro, pago menos. Ninguém deveria sentir-se tão grato em função do seu trabalho", afirmou à imprensa norte-americana.

Há mais de duas décadas que os números não se modificam em Hollywood, espelho da sociedade e dados da New York Film Academy confirma a realidade: entre os 12 salários mais elevados do Cinema no ano de 2013, 11 pertenciam a homens, sob a liderança de Robert Downey Jr. com 75 milhões, sendo Angelina Jolie, a 10ª classificada com 33 milhões de dólares, a única excepção.

Problema agravado acima dos 40 anos

Um estudo da Universidade de San Diego, no qual foram analisados mais de 23 mil personagens, alarga as diferenças no que diz respeito à desigualdade de género: se em 2002 só 16% das 100 maiores produções tinham actrizes como protagonistas, no ano passado o número baixou para 12%. O documento constata ainda que 93% dos filmes avaliados não tinham qualquer mulher a dirigir os diversos sectores, surgindo realizadoras somente em 9% dos casos; 79% dos argumentos e 56% dos produtores executivos eram homens.

Oproblema agrava-se para as actrizes com mais de 40 anos e Patrícia Arquette, melhor actriz secundária nos Óscares deste ano, relembrou o tema. Nos primeiros lugares da plateia, as câmaras registaram os aplausos entusiásticos de Meryl Streep e Jennifer López. O mesmo fizera a francesa Juliette Binoche no Festival de Cannes quando respondeu a uma pergunta sobre maior presença no cinema europeu do que no norte-americano. No ano passado, quando se dirigiu ao palco para receber o Óscar de melhor actriz pelo filme "Blue Jasmine", de Woody Allen, o discurso de Cate Blanchett voltou a reflectir a revolta feminina perante uma situação que tarda em alterar-se: "Obrigado a quem ainda acredita em filmes protagonizados por mulheres que não são produções para nichos de mercado, uma vez que rendem bom dinheiro", disse. Pouco depois, Meryl Streep e Juliette Binoche iriam acentuar o seu discurso. A película em causa valeu 97,5 milhões de dólares à escala mundial.

Uma estimativa recente indicava que os actores recebem, em média, salários 30% superiores aos que conseguem as actrizes em Hollywood. E, se alguém pensa que os reflexos das receitas exercem efeito nos salários, basta um exemplo para perceber que não é bem assim: "Lucy", com Scarlett Johansson, e "Hércules", protagonizado por Dwayne Johnson, tiveram estreia nas salas norte-americanas a 25 de Julho. O primeiro valeu 458 milhões de dólares, o segundo rendeu 243 milhões nas bilheteiras dos Estados Unidos. Como foi o salário de Johansson? Ficou bem distante do top 10 global com 17 milhões de dólares...

Na desigualdade, a televisão dá lições à 7ª Arte, pois Sofia Vergara, da série "Modern Family", liderou rendimentos entre Junho de 2013 e Julho de 2014 segundo a revista "Forbes" (37 milhões de dólares), bem à frente do actor com melhor salário - Ashton Kutcher ("Two and a half men"), que recebeu 26 milhões.

Igualdade no cinema fica longe como na sociedade

Paulo Jorge Pereira

paulo.pereira@economico.pt

07 Mar 2015

Trabalho igual, salário igual? O princípio é esse, a realidade deveria consagrá-lo fora dos livros, mas quanto mais o tempo passa mais as mulheres são discriminadas. Um estudo universitário confirma a situação no Cinema.

Tinha ritmo, história bem contada, elenco de alto nível, realização cuidada. Esta lista de ingredientes faz até lembrar a canção dos irmãos George e Ira Gershwin, ‘I Got Rythm', que Gene Kelly cantou e dançou no fabuloso "Um Americano em Paris" de 1951. Por tudo aquilo, "Golpada Americana", cujo orçamento se situou nos 40 milhões de dólares, foi um sucesso de bilheteira à escala mundial (receita de 251 milhões de dólares). O trabalho de Jennifer Lawrence e Amy Adams mereceu nomeação aos Óscares tal como o dos actores. E, no entanto, foram Christian Bale, Bradley Cooper e Jeremy Renner, os principais actores do filme, quem mais recebeu, uma vez que negociaram 9% do lucro, enquanto a dupla feminina não foi além dos 7%.

No ano passado, depois de terem sido atingidos por ‘hackers', os estúdios Sony viram exposta a informação de que, dos 17 executivos com salário superior a um milhão de dólares, só havia uma mulher: a vice-presidente Amy Pascal, que auferia três milhões e criticou as actrizes por receberem menos do que os actores. "Lidero um negócio - se as pessoas trabalham por menos dinheiro, pago menos. Ninguém deveria sentir-se tão grato em função do seu trabalho", afirmou à imprensa norte-americana.

Há mais de duas décadas que os números não se modificam em Hollywood, espelho da sociedade e dados da New York Film Academy confirma a realidade: entre os 12 salários mais elevados do Cinema no ano de 2013, 11 pertenciam a homens, sob a liderança de Robert Downey Jr. com 75 milhões, sendo Angelina Jolie, a 10ª classificada com 33 milhões de dólares, a única excepção.

Problema agravado acima dos 40 anos

Um estudo da Universidade de San Diego, no qual foram analisados mais de 23 mil personagens, alarga as diferenças no que diz respeito à desigualdade de género: se em 2002 só 16% das 100 maiores produções tinham actrizes como protagonistas, no ano passado o número baixou para 12%. O documento constata ainda que 93% dos filmes avaliados não tinham qualquer mulher a dirigir os diversos sectores, surgindo realizadoras somente em 9% dos casos; 79% dos argumentos e 56% dos produtores executivos eram homens.

Oproblema agrava-se para as actrizes com mais de 40 anos e Patrícia Arquette, melhor actriz secundária nos Óscares deste ano, relembrou o tema. Nos primeiros lugares da plateia, as câmaras registaram os aplausos entusiásticos de Meryl Streep e Jennifer López. O mesmo fizera a francesa Juliette Binoche no Festival de Cannes quando respondeu a uma pergunta sobre maior presença no cinema europeu do que no norte-americano. No ano passado, quando se dirigiu ao palco para receber o Óscar de melhor actriz pelo filme "Blue Jasmine", de Woody Allen, o discurso de Cate Blanchett voltou a reflectir a revolta feminina perante uma situação que tarda em alterar-se: "Obrigado a quem ainda acredita em filmes protagonizados por mulheres que não são produções para nichos de mercado, uma vez que rendem bom dinheiro", disse. Pouco depois, Meryl Streep e Juliette Binoche iriam acentuar o seu discurso. A película em causa valeu 97,5 milhões de dólares à escala mundial.

Uma estimativa recente indicava que os actores recebem, em média, salários 30% superiores aos que conseguem as actrizes em Hollywood. E, se alguém pensa que os reflexos das receitas exercem efeito nos salários, basta um exemplo para perceber que não é bem assim: "Lucy", com Scarlett Johansson, e "Hércules", protagonizado por Dwayne Johnson, tiveram estreia nas salas norte-americanas a 25 de Julho. O primeiro valeu 458 milhões de dólares, o segundo rendeu 243 milhões nas bilheteiras dos Estados Unidos. Como foi o salário de Johansson? Ficou bem distante do top 10 global com 17 milhões de dólares...

Na desigualdade, a televisão dá lições à 7ª Arte, pois Sofia Vergara, da série "Modern Family", liderou rendimentos entre Junho de 2013 e Julho de 2014 segundo a revista "Forbes" (37 milhões de dólares), bem à frente do actor com melhor salário - Ashton Kutcher ("Two and a half men"), que recebeu 26 milhões.

marcar artigo