Os banqueiros fazem o trabalho de Deus. E nós estamos a ficar pouco crentes

07-12-2014
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Os banqueiros fazem o trabalho de Deus. E nós estamos a ficar pouco crentes

Pedro Sousa Carvalho

22 Jan 2013

Porque é que os tubarões não atacam os banqueiros? Por cortesia profissional

Porque é que os tubarões não atacam os banqueiros? Por cortesia profissional! Esta anedota que se conta nos meios financeiros é verdade para alguns banqueiros, e mentira para outros. Mas resume bem a má imagem que os banqueiros foram construindo para si próprios. Seja por fraude, má gestão, ganância ou incompetência. Perante reguladores condescendentes, muitos dos quais com ambição de um dia vir a trabalhar nos bancos por si regulados, os banqueiros e supervisores andaram durante muitos anos a jogar ao monopólio com os mercados. Uns foram parar à cadeia, outros regressaram à casa da partida e alguns foram promovidos.

Há uma frase do presidente do todo poderoso Goldman Sachs que ficou para a história: "os banqueiros fazem o trabalho de Deus". Mas a verdade é que a crise financeira - que obrigou os contribuintes a desembolsar biliões para tapar as muitas asneiras e falcatruas na banca - fez com que as pessoas se tornassem menos crentes nas virtualidades dos banqueiros.

Bastou a queda dos mercados e bastou espremer um pouco a regulação para que toda a porcaria que estava escondida na banca começasse a vir ao de cima: o suíço Wegelin que na semana passada fechou portas depois de ter confessado que ajudou cidadãos americanos a fugir ao fisco; o Northern Rock que caiu de podre e o Lehman Brothers... o Lehman que deu cabo disto tudo. Mas há mais: o Chuck Prince que encheu o Citigroup de CDS e saiu do banco com um bónus 38 milhões; o Barclays que achou que manipular a Libor era uma boa ideia; as suspeitas de ‘inside trading' que fizeram tremer o Nomura; o Standard Chartered que terá colaborado na lavagem de dinheiro de bancos iranianos ou o HSBC que pelos vistos também montou uma lavandaria no México.

Por cá, à nossa escala, a coisa não é muito diferente. Durante anos, os reguladores andaram a olhar para o ar e por debaixo do nariz de Vítor Constâncio e dos outros reguladores iam-se fazendo balcões virtuais, contabilidades paralelas, ‘offshores', e produtos estruturados de alto risco mas que prometiam retorno garantido. Vítor Constâncio entretanto foi promovido para vice do BCE e foi trabalhar com Jean-Claude Trichet que assumiu a presidência do BCE a seguir ao seu julgamento no caso das alegadas irregularidades cometidas no Crédit Lyonnais. Entretanto já foi substituído por Mario Draghi, que desempenhou o cargo de director-geral no Goldman Sachs na altura em que o banco terá ajudado a Grécia a falsificar as suas contas.

Estamos todos mais descansados.

Por cá, o mais preocupante da regulação é que os casos que até agora vieram a lume não resultaram propriamente de investigações do Ministério Público ou de diligências atempadas feitas pelos reguladores. O BPN e o BPP afundaram por causa dos alertas das agência de ‘rating' e porque o valor dos seus activos caiu de tal maneira que se tornou impossível montar qualquer espécie de engenharia financeira que escondesse as perdas. E onde se pensava que havia um buraco, encontrou-se uma cratera que pode custar até oito mil milhões aos contribuintes portugueses. E no caso do BCP foi graças às dissidências que resultaram da guerra de poder e às denúncias de Joe Berardo que se descobriu o que havia para descobrir. O banco apodreceu por dentro e os reguladores limitaram-se a seguir-lhe o rasto. Jardim Gonçalves e outros ex-gestores do BCP foram condenados na sexta-feira a pagar mais de 4 milhões de euros e alguns ficaram inibidos de exercer funções na banca. Outros se seguirão.

Os banqueiros andaram a fazer o trabalho de Deus. Agora é preciso que os reguladores e a Justiça façam o seu trabalho. E de preferência com um espírito agnóstico.

Os banqueiros fazem o trabalho de Deus. E nós estamos a ficar pouco crentes

Pedro Sousa Carvalho

22 Jan 2013

Porque é que os tubarões não atacam os banqueiros? Por cortesia profissional

Porque é que os tubarões não atacam os banqueiros? Por cortesia profissional! Esta anedota que se conta nos meios financeiros é verdade para alguns banqueiros, e mentira para outros. Mas resume bem a má imagem que os banqueiros foram construindo para si próprios. Seja por fraude, má gestão, ganância ou incompetência. Perante reguladores condescendentes, muitos dos quais com ambição de um dia vir a trabalhar nos bancos por si regulados, os banqueiros e supervisores andaram durante muitos anos a jogar ao monopólio com os mercados. Uns foram parar à cadeia, outros regressaram à casa da partida e alguns foram promovidos.

Há uma frase do presidente do todo poderoso Goldman Sachs que ficou para a história: "os banqueiros fazem o trabalho de Deus". Mas a verdade é que a crise financeira - que obrigou os contribuintes a desembolsar biliões para tapar as muitas asneiras e falcatruas na banca - fez com que as pessoas se tornassem menos crentes nas virtualidades dos banqueiros.

Bastou a queda dos mercados e bastou espremer um pouco a regulação para que toda a porcaria que estava escondida na banca começasse a vir ao de cima: o suíço Wegelin que na semana passada fechou portas depois de ter confessado que ajudou cidadãos americanos a fugir ao fisco; o Northern Rock que caiu de podre e o Lehman Brothers... o Lehman que deu cabo disto tudo. Mas há mais: o Chuck Prince que encheu o Citigroup de CDS e saiu do banco com um bónus 38 milhões; o Barclays que achou que manipular a Libor era uma boa ideia; as suspeitas de ‘inside trading' que fizeram tremer o Nomura; o Standard Chartered que terá colaborado na lavagem de dinheiro de bancos iranianos ou o HSBC que pelos vistos também montou uma lavandaria no México.

Por cá, à nossa escala, a coisa não é muito diferente. Durante anos, os reguladores andaram a olhar para o ar e por debaixo do nariz de Vítor Constâncio e dos outros reguladores iam-se fazendo balcões virtuais, contabilidades paralelas, ‘offshores', e produtos estruturados de alto risco mas que prometiam retorno garantido. Vítor Constâncio entretanto foi promovido para vice do BCE e foi trabalhar com Jean-Claude Trichet que assumiu a presidência do BCE a seguir ao seu julgamento no caso das alegadas irregularidades cometidas no Crédit Lyonnais. Entretanto já foi substituído por Mario Draghi, que desempenhou o cargo de director-geral no Goldman Sachs na altura em que o banco terá ajudado a Grécia a falsificar as suas contas.

Estamos todos mais descansados.

Por cá, o mais preocupante da regulação é que os casos que até agora vieram a lume não resultaram propriamente de investigações do Ministério Público ou de diligências atempadas feitas pelos reguladores. O BPN e o BPP afundaram por causa dos alertas das agência de ‘rating' e porque o valor dos seus activos caiu de tal maneira que se tornou impossível montar qualquer espécie de engenharia financeira que escondesse as perdas. E onde se pensava que havia um buraco, encontrou-se uma cratera que pode custar até oito mil milhões aos contribuintes portugueses. E no caso do BCP foi graças às dissidências que resultaram da guerra de poder e às denúncias de Joe Berardo que se descobriu o que havia para descobrir. O banco apodreceu por dentro e os reguladores limitaram-se a seguir-lhe o rasto. Jardim Gonçalves e outros ex-gestores do BCP foram condenados na sexta-feira a pagar mais de 4 milhões de euros e alguns ficaram inibidos de exercer funções na banca. Outros se seguirão.

Os banqueiros andaram a fazer o trabalho de Deus. Agora é preciso que os reguladores e a Justiça façam o seu trabalho. E de preferência com um espírito agnóstico.

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