Exílio de Andarilho: As ventosas do polvo

01-07-2011
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Tenho do polvo a visão de um animal simpático que vai sobrevivendo num oceano de tubarões e peixes carnívoros como pode lançando uma nuvem de tinta quando se sente atacado. Confesso que é um "bicho" que gosto particularmente só cozido com legumes e batatas cozidas ou feito à moda da Madeira. Há no entanto um parente afastado deste molusco que nada aprecio pois vive no seio dos homens, estende as suas ventosas por onde pode e enxameia com corrupção, tráfico de influências e nepotismo tudo o que bordeja a política e os negócios fazendo do "mercado" uma espécie de mercenário, team de acólitos de alguns políticos. O que é mais asqueroso nesse polvo "político" é a imagem que passa que tudo lhe é permitido, que tudo é "comprável", e "corruptível" saiba-se exactamente o preço de cada homem, ou melhor daqueles que interessa. Uma carta publicada pelo Henrique Raposo creio que no Diário de Notícias recordou-me esta tarde essa dimensão grotesca do polvo "político" através de uma troca de correspondência com o ex-político do PS Jorge Coelho que revela como gente ilustre se pode perturbar por um convívio excessivo com a gamela do poder, com a pretensa impunidade que o exercício da política lhes conferiria e no caso particular com o estado de graça que tiveram da parte da comunicação social anos a fio. Personalidade simpática, o ex-político do PS, hoje capitão da indústria do betão revela-se pouco sensível ao direito à crítica exercido pelo comentador e ao facto notório da sua antiga condição de governante socialista, membro da Comissão Política e homem de confiança de dois secretários-gerais do PS (António Guterres e José Sócrates) lhe propiciarem acesso a concursos e contratos que o comum dos seus companheiros de indústria não terão. Aqui alguns excertos da resposta de Henrique Raposo:

Caro Dr. Jorge Coelho, como sabe, V. Exa. enviou-me uma carta, com para a direcção deste jornal. Aqui fica a minha resposta.*
Em 'O Governo e a Mota-Engil' (crónica do sítio do Expresso), eu apontei um facto que estava no Orçamento do Estado (OE): a Ascendi, empresa da Engil, iria receber 587 milhões de euros. Olhando para este pornográfico número, e seguindo o economista Álvaro Santos Pereira, constatei o óbvio: no mínimo, esta transferência de 587 milhões seria escandalosa (este valor representa mais de metade da receita que resultará do aumento do IVA). Eu escrevi este texto às nove da manhã. À tarde, quando o meu texto já circulava pela internet, a Ascendi apontou para um "lapso" do OE: afinal, a empresa só tem direito a 150 milhões, e não a 587 milhões. Durante a tarde, o sítio do Expresso fez uma notícia sobre esse lapso, à
qual foi anexada o meu texto. À noite, a SIC falou sobre o assunto. Ora, perante isto, V. Exa. fez uma carta a pedir que eu me retractasse. Mas, meu amigo, o lapso não é meu. O lapso é de Teixeira dos Santos e de
Sócrates. A sua carta parece que parte do pressuposto de que os 587 milhões saíram da minha pérfida imaginação. Meu caro, quando eu escrevi o texto, o 'lapso' era um 'facto' consagrado no OE. V. Exa. quer explicações? Peça-as ao ministro das Finanças. Mas não deixo de registar o seguinte: V. Exa. quer
que um Zé Ninguém peça desculpas por um erro cometido pelos dois homens mais poderosos do país. Isto até parece brincadeirinha. Depois, V. Exa. não gostou de ler este meu desejo utópico: "
que Jorge Coelho e a Mota-Engil desaparecem do centro da nossa vida política?"..A isto V. Exa espondeu com um excelso "servi a Causa Pública durante mais. Mas eu também sirvo a causa pública. Além de registar os  milhões, o meu serviço à causa pública passa por dizer o que penso. E, neste momento, estou farto das PPP de betão, estou farto das estradas que ninguém usa, e estou farto das construtoras que
fizeram esse mar de betão e alcatrão. No fundo, eu estou farto do actual modelo económico assente numa espécie de new deal entre políticos e as construtoras. Porque este modelo fez muito mal a Portugal, meu caro Jorge Coelho. O modelo económico que enriqueceu a sua empresa é o modelo económico
que empobreceu Portugal. Não, não comece a abanar a cabeça, porque eu nãoacredito em teorias da conspiração. Não estou a dizer que Sócrates tem como objectivo de enriquecer as construtoras. Nunca lhe faria esse caro. Estou apenas a dizer que esse modelo foi uma escolha política desastrosa para o país. A culpa não é sua, mas sim dos partidos, sobretudo do PS. Mas, se não se importa, eu tenho o direito a estar farto de ver os construtores no centro da vida colectiva do meu país. Foi este excesso de construção que arruinou Portugal, foi este excesso de investimento em bens não-transaccionáveis que destruiu o meu futuro próximo.No dia em que V. Exa. inventar a obra pública exportável, venho aqui retractar-me com uma simples frase: "eu estava errado, o dr. Jorge Coelho é um visionário e as construtoras civis devem ser o Alfa e o Ómega da nossa economia". Até lá, se não se importa, tenho direito a estar farto deste new deal entre políticos e construtores".


Tenho do polvo a visão de um animal simpático que vai sobrevivendo num oceano de tubarões e peixes carnívoros como pode lançando uma nuvem de tinta quando se sente atacado. Confesso que é um "bicho" que gosto particularmente só cozido com legumes e batatas cozidas ou feito à moda da Madeira. Há no entanto um parente afastado deste molusco que nada aprecio pois vive no seio dos homens, estende as suas ventosas por onde pode e enxameia com corrupção, tráfico de influências e nepotismo tudo o que bordeja a política e os negócios fazendo do "mercado" uma espécie de mercenário, team de acólitos de alguns políticos. O que é mais asqueroso nesse polvo "político" é a imagem que passa que tudo lhe é permitido, que tudo é "comprável", e "corruptível" saiba-se exactamente o preço de cada homem, ou melhor daqueles que interessa. Uma carta publicada pelo Henrique Raposo creio que no Diário de Notícias recordou-me esta tarde essa dimensão grotesca do polvo "político" através de uma troca de correspondência com o ex-político do PS Jorge Coelho que revela como gente ilustre se pode perturbar por um convívio excessivo com a gamela do poder, com a pretensa impunidade que o exercício da política lhes conferiria e no caso particular com o estado de graça que tiveram da parte da comunicação social anos a fio. Personalidade simpática, o ex-político do PS, hoje capitão da indústria do betão revela-se pouco sensível ao direito à crítica exercido pelo comentador e ao facto notório da sua antiga condição de governante socialista, membro da Comissão Política e homem de confiança de dois secretários-gerais do PS (António Guterres e José Sócrates) lhe propiciarem acesso a concursos e contratos que o comum dos seus companheiros de indústria não terão. Aqui alguns excertos da resposta de Henrique Raposo:

Caro Dr. Jorge Coelho, como sabe, V. Exa. enviou-me uma carta, com para a direcção deste jornal. Aqui fica a minha resposta.*
Em 'O Governo e a Mota-Engil' (crónica do sítio do Expresso), eu apontei um facto que estava no Orçamento do Estado (OE): a Ascendi, empresa da Engil, iria receber 587 milhões de euros. Olhando para este pornográfico número, e seguindo o economista Álvaro Santos Pereira, constatei o óbvio: no mínimo, esta transferência de 587 milhões seria escandalosa (este valor representa mais de metade da receita que resultará do aumento do IVA). Eu escrevi este texto às nove da manhã. À tarde, quando o meu texto já circulava pela internet, a Ascendi apontou para um "lapso" do OE: afinal, a empresa só tem direito a 150 milhões, e não a 587 milhões. Durante a tarde, o sítio do Expresso fez uma notícia sobre esse lapso, à
qual foi anexada o meu texto. À noite, a SIC falou sobre o assunto. Ora, perante isto, V. Exa. fez uma carta a pedir que eu me retractasse. Mas, meu amigo, o lapso não é meu. O lapso é de Teixeira dos Santos e de
Sócrates. A sua carta parece que parte do pressuposto de que os 587 milhões saíram da minha pérfida imaginação. Meu caro, quando eu escrevi o texto, o 'lapso' era um 'facto' consagrado no OE. V. Exa. quer explicações? Peça-as ao ministro das Finanças. Mas não deixo de registar o seguinte: V. Exa. quer
que um Zé Ninguém peça desculpas por um erro cometido pelos dois homens mais poderosos do país. Isto até parece brincadeirinha. Depois, V. Exa. não gostou de ler este meu desejo utópico: "
que Jorge Coelho e a Mota-Engil desaparecem do centro da nossa vida política?"..A isto V. Exa espondeu com um excelso "servi a Causa Pública durante mais. Mas eu também sirvo a causa pública. Além de registar os  milhões, o meu serviço à causa pública passa por dizer o que penso. E, neste momento, estou farto das PPP de betão, estou farto das estradas que ninguém usa, e estou farto das construtoras que
fizeram esse mar de betão e alcatrão. No fundo, eu estou farto do actual modelo económico assente numa espécie de new deal entre políticos e as construtoras. Porque este modelo fez muito mal a Portugal, meu caro Jorge Coelho. O modelo económico que enriqueceu a sua empresa é o modelo económico
que empobreceu Portugal. Não, não comece a abanar a cabeça, porque eu nãoacredito em teorias da conspiração. Não estou a dizer que Sócrates tem como objectivo de enriquecer as construtoras. Nunca lhe faria esse caro. Estou apenas a dizer que esse modelo foi uma escolha política desastrosa para o país. A culpa não é sua, mas sim dos partidos, sobretudo do PS. Mas, se não se importa, eu tenho o direito a estar farto de ver os construtores no centro da vida colectiva do meu país. Foi este excesso de construção que arruinou Portugal, foi este excesso de investimento em bens não-transaccionáveis que destruiu o meu futuro próximo.No dia em que V. Exa. inventar a obra pública exportável, venho aqui retractar-me com uma simples frase: "eu estava errado, o dr. Jorge Coelho é um visionário e as construtoras civis devem ser o Alfa e o Ómega da nossa economia". Até lá, se não se importa, tenho direito a estar farto deste new deal entre políticos e construtores".

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