Presidente e País têm de aceitar o casamento de conveniência

15-11-2013
marcar artigo

João Moreira Rato é provavelmente o português que está a passar a semana mais louca dos últimos dois anos, por causa de uma crise política desnecessária e cujos resultados - a confirmar-se o ‘novo' Governo - poderiam e deveriam ter sido obtidos de outra forma se Paulo Portas e Pedro Passos Coelho tivessem pensado, primeiro, no País.

João Moreira Rato é provavelmente o português que está a passar a semana mais louca dos últimos dois anos, por causa de uma crise política desnecessária e cujos resultados - a confirmar-se o ‘novo' Governo - poderiam e deveriam ter sido obtidos de outra forma se Paulo Portas e Pedro Passos Coelho tivessem pensado, primeiro, no País.

O presidente do instituto que gere a dívida pública portuguesa não deve largar o telemóvel para explicar o, ainda hoje, inexplicável a investidores que acreditaram no Governo português e voltaram a emprestar dinheiro ao País na última emissão a dez anos, em Maio. E para garantir que, desta vez, é que é, Portugal tem um ‘novo' Governo de coligação, agora, é que está mesmo sólido e vai fazer o que ainda não fez.

A história desta crise começa, mesmo, na demissão de Vítor Gaspar e, sobretudo, na carta que deixou, não a Pedro Passos Coelho, mas aos portugueses. O ex-ministro das Finanças foi decisivo para a recuperação da credibilidade do país, foi o rosto do Governo, mas não percebeu, a tempo, o que estava a fazer de errado, e não soube ajustar o programa de ajustamento. É tão fácil quanto indesculpável - e revelador - atirar agora as responsabilidades para Passos Coelho e para a coesão do Governo, mas a missiva de Gaspar foi o mais relevante acto de oposição ao Governo, ao que não fez e ao que não vai fazer nos dois anos que faltam.

Vítor Gaspar saiu da pior forma, sem honra nem glória, e foi, assim, o rastilho de uma decisão precipitada de um ministro que por experiência e formação, deveria ter sido o último a colocar em causa a estabilidade política e financeira de Portugal. Maria Luís Albuquerque foi apenas um pretexto numa guerra entre Portas e Passos Coelho.

Paulo Portas reviu-se na carta de Gaspar, o que não deixa de ser irónico tendo em conta a má relação entre os dois, e aproveitou para sair, para pôr os seus interesses à frente dos do partido, e os do partido à frente do País. Cansou-se de Passos, como Gaspar. O problema é que o País não pode escolher, e o Presidente da República também não, porque está sob intervenção externa, uma intervenção que tinha e tem um objectivo final, a recuperação da independência financeira.

Portas pôs isso em causa, jogou ‘poker' com Passos e com os portugueses, também, é certo, porque o primeiro-ministro o afastou das decisões de forma ostensiva e, agora, cedeu em toda a linha.

Portugal vai ter um ‘novo' Governo. O que Passos Coelho anunciou - e ainda não se sabe tudo - é muito mais do que uma remodelação, é uma alteração das relações de poder entre Passos e Portas, entre o PSD e o CDS, é um ‘novo' Governo sem eleições, que vai passar seguramente por uma refundação do seu programa de acção e por um novo acordo com a ‘troika', venha este a ter o nome e os contornos que tiver. Aliás, só isto pode justificar a permanência do ministro ‘irrevogável', tem de ser mais do que um novo ciclo, tem de ser uma nova política e um novo acordo.

Estará, aqui, provavelmente, uma das razões para a promoção de Paulo Portas. O crime compensou, Portas deu um tiro na credibilidade do Governo e acaba como vice-primeiro-ministro.

Passos Coelho revelou sentido de Estado, aguentou o que outros não aguentariam, aceita o vexame de passar a ser encarado como o primeiro-ministro ‘sombra' de Portas e tenta fazer o equilíbrio entre a imagem externa de que tudo continua na mesma e a realidade interna, de que tudo muda. Passos fica no meio do caminho. Claro, também responsabiliza Portas. É como diz o povo, mantém os teus amigos próximos e os teus inimigos ainda mais próximos.

O‘novo' Governo viverá num paradoxo: a coligação é mais forte, os dois partidos estão mais ‘amarrados' - até por causa do objectivo de se candidatarem em lista única às europeias dentro de um ano - a orgânica do Governo é a que deveria ser desde o início, independentemente dos nomes que vierem a ser escolhidos, mas o seu sucesso depende do ministro mais desacreditado e ferido de credibilidade, precisamente Paulo Portas.

O novo ‘vice' - que mais parece o ‘primeiro' - tem todas as responsabilidades, pelo menos as mais relevantes, isto é, a coordenação das pastas económicas, a relação com a ‘troika' e ainda a reforma do Estado. O Governo passa a ter dois centros de poder, de facto e de direito, o CDS é o mais pequeno dos partidos da coligação, mas tem um peso brutal nas pastas decisivas. Porque, além de Portas, e de Cristas, Pedro Mota Soares está na Segurança Social e ainda deve assumir a área do trabalho.

Tudo isto faria sentido se não tivesse existido este filme de série B, que nos custou meses de credibilidade e milhares de milhões de dinheiro. Só uma nota: a Standard & Poors demorou mais de um ano a passar o ‘outlook' de Portugal de negativo para estável, mas bastou uma semana para o ‘cortar' novamente para negativo. E esta é uma condição essencial para a revisão do rating da República Portuguesa, por seu turno, condição sine qua non para o regresso aos mercados, mesmo para um regresso efectivo.

Portugal está hoje mais longe de um regresso aos mercados, e mais perto do segundo resgate. E se isso suceder, ninguém lhes perdoará, sairão, os dois, pior do que José Sócrates, e não haverá espaço televisivo que lhes valha, nem dez anos depois. O ‘novo' Governo - uma clarificação desta crise política sem eleições antecipadas - é uma condição necessária, mas está muito longe de ser suficiente para evitarmos o precipício. Porque, de tudo o que se passou nos últimos oito dias, só existe uma virtude: a interiorização de que está ainda muito por fazer, o susto que se transformou em pesadelo e em medo, a confirmação de que os últimos dois anos foram um começou de um ajustamento que, mesmo corrigidos os erros, não terminou nem vai terminar no fim deste acordo com a ‘troika' e das visitas trimestrais a Lisboa de técnicos qualificados.

Na política, o que é verdade hoje é mentira amanhã e se Paulo Portas está descredibilizado - até já tem direito a cartazes na volta à França, ao melhor estilo de Miguel Relvas há um ano - a forma como conduzir as relações do país com a ‘troika' poderá ser o seu renascimento. Portas é o novo Gaspar de Passos Coelho, é ainda mais, tem mais poder, porque tem o poder funcional e o poder político, e vai tentar um novo acordo, um segundo resgate sem esse nome, um programa cautelar como estava previsto apenas para Julho de 2014, mas de carácter reforçado. Não bastará a revisão da meta do défice público de 4% para 2014, será muito mais.

Cavaco Silva vai vender cara a derrota, porque é disso que se trata, a forma como o Governo destratou o Presidente da República, logo este, que se atravessou por ele, mesmo discordando de muitas das opções de política económica e financeira, não merecem outra resposta. E a sorte do Governo é o estado de necessidade do país, que retira qualquer margem efectiva de intervenção do Presidente e as eleições antecipadas. Por responsabilidade própria, porque afastou o PS, porque hipotecou a sua margem de intervenção. Agora, vai fazer de conta que as reuniões dos partidos vão ser determinantes na decisão de dar posse ao ‘novo' Governo. Mas vai ter a oportunidade de voltar a ser o referencial, e a balança entre Passos e Portas e Seguro. Porque este casamento de conveniência é, para já, o melhor lhe pode, e nos pode, suceder.

João Moreira Rato é provavelmente o português que está a passar a semana mais louca dos últimos dois anos, por causa de uma crise política desnecessária e cujos resultados - a confirmar-se o ‘novo' Governo - poderiam e deveriam ter sido obtidos de outra forma se Paulo Portas e Pedro Passos Coelho tivessem pensado, primeiro, no País.

João Moreira Rato é provavelmente o português que está a passar a semana mais louca dos últimos dois anos, por causa de uma crise política desnecessária e cujos resultados - a confirmar-se o ‘novo' Governo - poderiam e deveriam ter sido obtidos de outra forma se Paulo Portas e Pedro Passos Coelho tivessem pensado, primeiro, no País.

O presidente do instituto que gere a dívida pública portuguesa não deve largar o telemóvel para explicar o, ainda hoje, inexplicável a investidores que acreditaram no Governo português e voltaram a emprestar dinheiro ao País na última emissão a dez anos, em Maio. E para garantir que, desta vez, é que é, Portugal tem um ‘novo' Governo de coligação, agora, é que está mesmo sólido e vai fazer o que ainda não fez.

A história desta crise começa, mesmo, na demissão de Vítor Gaspar e, sobretudo, na carta que deixou, não a Pedro Passos Coelho, mas aos portugueses. O ex-ministro das Finanças foi decisivo para a recuperação da credibilidade do país, foi o rosto do Governo, mas não percebeu, a tempo, o que estava a fazer de errado, e não soube ajustar o programa de ajustamento. É tão fácil quanto indesculpável - e revelador - atirar agora as responsabilidades para Passos Coelho e para a coesão do Governo, mas a missiva de Gaspar foi o mais relevante acto de oposição ao Governo, ao que não fez e ao que não vai fazer nos dois anos que faltam.

Vítor Gaspar saiu da pior forma, sem honra nem glória, e foi, assim, o rastilho de uma decisão precipitada de um ministro que por experiência e formação, deveria ter sido o último a colocar em causa a estabilidade política e financeira de Portugal. Maria Luís Albuquerque foi apenas um pretexto numa guerra entre Portas e Passos Coelho.

Paulo Portas reviu-se na carta de Gaspar, o que não deixa de ser irónico tendo em conta a má relação entre os dois, e aproveitou para sair, para pôr os seus interesses à frente dos do partido, e os do partido à frente do País. Cansou-se de Passos, como Gaspar. O problema é que o País não pode escolher, e o Presidente da República também não, porque está sob intervenção externa, uma intervenção que tinha e tem um objectivo final, a recuperação da independência financeira.

Portas pôs isso em causa, jogou ‘poker' com Passos e com os portugueses, também, é certo, porque o primeiro-ministro o afastou das decisões de forma ostensiva e, agora, cedeu em toda a linha.

Portugal vai ter um ‘novo' Governo. O que Passos Coelho anunciou - e ainda não se sabe tudo - é muito mais do que uma remodelação, é uma alteração das relações de poder entre Passos e Portas, entre o PSD e o CDS, é um ‘novo' Governo sem eleições, que vai passar seguramente por uma refundação do seu programa de acção e por um novo acordo com a ‘troika', venha este a ter o nome e os contornos que tiver. Aliás, só isto pode justificar a permanência do ministro ‘irrevogável', tem de ser mais do que um novo ciclo, tem de ser uma nova política e um novo acordo.

Estará, aqui, provavelmente, uma das razões para a promoção de Paulo Portas. O crime compensou, Portas deu um tiro na credibilidade do Governo e acaba como vice-primeiro-ministro.

Passos Coelho revelou sentido de Estado, aguentou o que outros não aguentariam, aceita o vexame de passar a ser encarado como o primeiro-ministro ‘sombra' de Portas e tenta fazer o equilíbrio entre a imagem externa de que tudo continua na mesma e a realidade interna, de que tudo muda. Passos fica no meio do caminho. Claro, também responsabiliza Portas. É como diz o povo, mantém os teus amigos próximos e os teus inimigos ainda mais próximos.

O‘novo' Governo viverá num paradoxo: a coligação é mais forte, os dois partidos estão mais ‘amarrados' - até por causa do objectivo de se candidatarem em lista única às europeias dentro de um ano - a orgânica do Governo é a que deveria ser desde o início, independentemente dos nomes que vierem a ser escolhidos, mas o seu sucesso depende do ministro mais desacreditado e ferido de credibilidade, precisamente Paulo Portas.

O novo ‘vice' - que mais parece o ‘primeiro' - tem todas as responsabilidades, pelo menos as mais relevantes, isto é, a coordenação das pastas económicas, a relação com a ‘troika' e ainda a reforma do Estado. O Governo passa a ter dois centros de poder, de facto e de direito, o CDS é o mais pequeno dos partidos da coligação, mas tem um peso brutal nas pastas decisivas. Porque, além de Portas, e de Cristas, Pedro Mota Soares está na Segurança Social e ainda deve assumir a área do trabalho.

Tudo isto faria sentido se não tivesse existido este filme de série B, que nos custou meses de credibilidade e milhares de milhões de dinheiro. Só uma nota: a Standard & Poors demorou mais de um ano a passar o ‘outlook' de Portugal de negativo para estável, mas bastou uma semana para o ‘cortar' novamente para negativo. E esta é uma condição essencial para a revisão do rating da República Portuguesa, por seu turno, condição sine qua non para o regresso aos mercados, mesmo para um regresso efectivo.

Portugal está hoje mais longe de um regresso aos mercados, e mais perto do segundo resgate. E se isso suceder, ninguém lhes perdoará, sairão, os dois, pior do que José Sócrates, e não haverá espaço televisivo que lhes valha, nem dez anos depois. O ‘novo' Governo - uma clarificação desta crise política sem eleições antecipadas - é uma condição necessária, mas está muito longe de ser suficiente para evitarmos o precipício. Porque, de tudo o que se passou nos últimos oito dias, só existe uma virtude: a interiorização de que está ainda muito por fazer, o susto que se transformou em pesadelo e em medo, a confirmação de que os últimos dois anos foram um começou de um ajustamento que, mesmo corrigidos os erros, não terminou nem vai terminar no fim deste acordo com a ‘troika' e das visitas trimestrais a Lisboa de técnicos qualificados.

Na política, o que é verdade hoje é mentira amanhã e se Paulo Portas está descredibilizado - até já tem direito a cartazes na volta à França, ao melhor estilo de Miguel Relvas há um ano - a forma como conduzir as relações do país com a ‘troika' poderá ser o seu renascimento. Portas é o novo Gaspar de Passos Coelho, é ainda mais, tem mais poder, porque tem o poder funcional e o poder político, e vai tentar um novo acordo, um segundo resgate sem esse nome, um programa cautelar como estava previsto apenas para Julho de 2014, mas de carácter reforçado. Não bastará a revisão da meta do défice público de 4% para 2014, será muito mais.

Cavaco Silva vai vender cara a derrota, porque é disso que se trata, a forma como o Governo destratou o Presidente da República, logo este, que se atravessou por ele, mesmo discordando de muitas das opções de política económica e financeira, não merecem outra resposta. E a sorte do Governo é o estado de necessidade do país, que retira qualquer margem efectiva de intervenção do Presidente e as eleições antecipadas. Por responsabilidade própria, porque afastou o PS, porque hipotecou a sua margem de intervenção. Agora, vai fazer de conta que as reuniões dos partidos vão ser determinantes na decisão de dar posse ao ‘novo' Governo. Mas vai ter a oportunidade de voltar a ser o referencial, e a balança entre Passos e Portas e Seguro. Porque este casamento de conveniência é, para já, o melhor lhe pode, e nos pode, suceder.

marcar artigo