Sem título

20-06-2015
marcar artigo

A X Comissão Parlamentar de Inquérito à Tragédia de Camarate voltou a concluir que Sá Carneiro, Adelino Amaro da Costa e os outros ocupantes do Cessna que se despenhou em Camarate morreram devido a um atentado, na noite de 4 de Dezembro de 1980. E não só: o relatório preliminar, a que a SÁBADO teve acesso, acrescenta mais duas mortes ao rol de vítimas do caso, adensando a aura de conspiração e mistério que sempre envolveu o caso: "Foi evidenciado com elevado grau de confiança, que José Moreira e Elisabete Silva [sua companheira] foram assassinados no início de Janeiro de 1983." José Moreira era o proprietário de outro avião – que colocou ao serviço da campanha presidencial de Soares Carneiro –, e apareceu morto em casa, em Carnaxide, por inalação de monóxido de carbono, nas vésperas de ir testemunhar numa das comissões de inquérito aos acontecimentos de Camarate. As mortes foram nessa época dadas como acidentais. A suspeita agora recai sobre a PJ e a PGR, cuja investigação o relatório classifica como "deficitária, com gritantes e evidentes lacunas". E aponta para um eventual encobrimento, embora não use esta palavra.

"Embora seja equacionável que o motivo para o duplo homicídio esteja relacionado com as revelações que José Moreira havia afirmado ir revelar no seu futuro depoimento em sede de Comissão Parlamentar de Inquérito, não foi possível estabelecer um nexo de causalidade entre a sua morte e o atentado que vitimou, entre outros, o primeiro-ministro e o ministro da Defesa", conclui o relatório preliminar, da autoria do deputado do PSD Pedro do Ó Ramos. José Moreira tinha chegado a financiar a expensas próprias uma investigação particular ao sucedido em Camarate. A causa da morte, de acordo com a Polícia Judiciária, à época, foi estabelecida como sendo acidental pela inalação de monóxido de carbono. A comissão de inquérito solicitou uma nova análise dos tecidos da vítima ao Instituto de Medicina Legal de Coimbra. E concluiu que antes da intoxicação houve asfixia causada por meios mecânicos, ou seja, de alguma forma José Moreira foi impedo de respirar.

Duarte Nuno Vieira, presidente do conselho directivo do Instituto de Medicina Legal e Ciências Forenses corroborou a hipótese da inalação do monóxido de carbono, mas acrescentou um dado importante: a análise aos tecidos de José Moreira revelou uma ruptura dos alvéolos pulmonares, o que só acontece "nas asfixias mecânicas, quando resultam de uma oclusão das vias respiratórias para abafar gritos ou para tentar matar a pessoa, tapando a boca e o nariz com as mãos, onde os esforços respiratórios levam de facto a que os alvéolos pulmonares se possam romper". O relatório enfatiza ainda que o corpo de José Moreira apresentava "algumas escoriações nos joelhos e no ombro esquerdo, para além de um desvio do septo e hemorragia nasal".

A comissão de inquérito aponta responsabilidades não só à Judiciária, mas também à Procuradoria-Geral da República. A actuação da PJ "foi deficiente e apresentou lacunas inequívocas, sendo difícil crer que se tenha devido, apenas, a eventuais descuidos", pode ler-se no relatório. Quando à PGR, que promoveu um inquérito disciplinar em 1992 à actuação da PJ e do Instituto de Medicina Legal foi "deficitária, com gritantes e evidentes lacunas, sendo igualmente difícil crer que se tenha devido, apenas, a eventuais descuidos". Se não são descuidos, só poderá ser encobrimento, embora o relator não seja taxativo neste aspecto.

O Fundo do Ultramar e as armas para o Irão

O objectivo da X comissão de inquérito a Camarate era aprofundar as conclusões relacionadas com o móbil do crime, ou seja, para perceber por que razões se deu o atentado. O relatório preliminar indica - embora nunca o faça de forma explícita -, que este poderá ter sido motivado pelas investigações que Amaro da Costa, ministro da Defesa, estava a fazer ao Fundo de Defesa Militar do Ultramar, assim como pelos obstáculos que estava a levantar à exportação de armas para o Irão.

Apesar de ter sido formalmente extinto em 1980, este Fundo do Ultramar permaneceu activo como fundo privativo até 1993, "tendo sido utilizados cerca de 481 milhões de escudos neste período sem qualquer escrutínio. O saldo inicial do fundo privativo, em 1981, e calculado aos dias de hoje, equivaleria a cerca de 30 milhões de euros. O saldo final, em 1993, corresponderia a cerca de 25 mil euros", escreve o deputado Pedro do Ó nas conclusões preliminares.

A inspectora de Finanças Maria da Conceição Rodrigues, que avaliou as contas do Fundo do Ultramar - na sequência do trabalho realizado em comissões de inquérito anteriores -, afirmou que o dinheiro saía do fundo e depois voltava a entrar sem se saber para que fins. "Nós vimos que havia dinheiro fora do Fundo, que saiu e que esteve, ou não, a financiar qualquer coisa, não sabemos o quê. Pode ter estado aplicado noutros bancos, não sabemos. Sabemos que esteve fora e que depois voltou". O fundo estava sob a alçada dos sucessivos chefes do Estado-Maior General das Forças Armadas.

A comissão também dá como confirmado o transbordo de armas para o Irão em 1980, assim como a exportação de armas com o mesmo destino, "mesmo após o corte de relações comerciais com o Irão e com a inexistência de autorização de exportação de armamento por parte do ministro da Defesa". A expedição das armas é próxima da data da morte de Amaro da Costa: terá ocorrido entre 9 de Dezembro de 1980 e Janeiro de 1981. Dois dias antes de morrer, a 2 de Dezembro, Adelino Amaro da Costa, que passara a andar armado, tinha pedido ao gabinete do chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas que o informasse com urgência sobre a exportação de material de guerra para o Irão. Nessa época, o CEMGFA coincidia com o Presidente da República, que era o general Ramalho Eanes.

Em finais de 2010, quando se realizou a IX comissão de inquérito parlamentar ao caso, Ramalho Eanes alertou para a existência de documentos nos EUA que poderiam ajudar a esclarecer o caso: "Esses documentos iriam fazer muita luz sobre esta questão, porque os Estados Unidos da América acompanharam de perto tudo isto e inclusivamente, a pedido do Governo, mandaram cá um conjunto de peritos".

"Conseguimos comprovar outros aspectos relevantes, mas não se consegue estabelecer um nexo de causalidade", diz à SÁBADO um deputado que participou na comissão de inquérito. Os vários grupos parlamentares vão enviar propostas de alteração ao texto preliminar da responsabilidade do PSD até segunda-feira e, na terça-feira, dia 23, às 12:00, será ouvido o antigo inspector da Polícia Judiciária Paulo Bernardino, responsável pelas investigações à morte de José Moreira.

Em 1995, a V Comissão de inquérito à tragédia de Camarate já se tinha pronunciado pelo atentado, pela "detecção de sulfato de bário em zonas do cockpit do avião sinistrado" e pela "verificação confirmada de novas substâncias explosivas", como "nitroglicerina, dinitrotolueno e trinitrotolueno". Há dez anos, os deputados concluíram que "os factos referidos permitem estabelecer a presunção de que o despenhamento da aeronave foi causado por um engenho explosivo, que visou a eliminação física de pessoas, tendo constituído, por isso, acção criminosa".

A X Comissão Parlamentar de Inquérito à Tragédia de Camarate voltou a concluir que Sá Carneiro, Adelino Amaro da Costa e os outros ocupantes do Cessna que se despenhou em Camarate morreram devido a um atentado, na noite de 4 de Dezembro de 1980. E não só: o relatório preliminar, a que a SÁBADO teve acesso, acrescenta mais duas mortes ao rol de vítimas do caso, adensando a aura de conspiração e mistério que sempre envolveu o caso: "Foi evidenciado com elevado grau de confiança, que José Moreira e Elisabete Silva [sua companheira] foram assassinados no início de Janeiro de 1983." José Moreira era o proprietário de outro avião – que colocou ao serviço da campanha presidencial de Soares Carneiro –, e apareceu morto em casa, em Carnaxide, por inalação de monóxido de carbono, nas vésperas de ir testemunhar numa das comissões de inquérito aos acontecimentos de Camarate. As mortes foram nessa época dadas como acidentais. A suspeita agora recai sobre a PJ e a PGR, cuja investigação o relatório classifica como "deficitária, com gritantes e evidentes lacunas". E aponta para um eventual encobrimento, embora não use esta palavra.

"Embora seja equacionável que o motivo para o duplo homicídio esteja relacionado com as revelações que José Moreira havia afirmado ir revelar no seu futuro depoimento em sede de Comissão Parlamentar de Inquérito, não foi possível estabelecer um nexo de causalidade entre a sua morte e o atentado que vitimou, entre outros, o primeiro-ministro e o ministro da Defesa", conclui o relatório preliminar, da autoria do deputado do PSD Pedro do Ó Ramos. José Moreira tinha chegado a financiar a expensas próprias uma investigação particular ao sucedido em Camarate. A causa da morte, de acordo com a Polícia Judiciária, à época, foi estabelecida como sendo acidental pela inalação de monóxido de carbono. A comissão de inquérito solicitou uma nova análise dos tecidos da vítima ao Instituto de Medicina Legal de Coimbra. E concluiu que antes da intoxicação houve asfixia causada por meios mecânicos, ou seja, de alguma forma José Moreira foi impedo de respirar.

Duarte Nuno Vieira, presidente do conselho directivo do Instituto de Medicina Legal e Ciências Forenses corroborou a hipótese da inalação do monóxido de carbono, mas acrescentou um dado importante: a análise aos tecidos de José Moreira revelou uma ruptura dos alvéolos pulmonares, o que só acontece "nas asfixias mecânicas, quando resultam de uma oclusão das vias respiratórias para abafar gritos ou para tentar matar a pessoa, tapando a boca e o nariz com as mãos, onde os esforços respiratórios levam de facto a que os alvéolos pulmonares se possam romper". O relatório enfatiza ainda que o corpo de José Moreira apresentava "algumas escoriações nos joelhos e no ombro esquerdo, para além de um desvio do septo e hemorragia nasal".

A comissão de inquérito aponta responsabilidades não só à Judiciária, mas também à Procuradoria-Geral da República. A actuação da PJ "foi deficiente e apresentou lacunas inequívocas, sendo difícil crer que se tenha devido, apenas, a eventuais descuidos", pode ler-se no relatório. Quando à PGR, que promoveu um inquérito disciplinar em 1992 à actuação da PJ e do Instituto de Medicina Legal foi "deficitária, com gritantes e evidentes lacunas, sendo igualmente difícil crer que se tenha devido, apenas, a eventuais descuidos". Se não são descuidos, só poderá ser encobrimento, embora o relator não seja taxativo neste aspecto.

O Fundo do Ultramar e as armas para o Irão

O objectivo da X comissão de inquérito a Camarate era aprofundar as conclusões relacionadas com o móbil do crime, ou seja, para perceber por que razões se deu o atentado. O relatório preliminar indica - embora nunca o faça de forma explícita -, que este poderá ter sido motivado pelas investigações que Amaro da Costa, ministro da Defesa, estava a fazer ao Fundo de Defesa Militar do Ultramar, assim como pelos obstáculos que estava a levantar à exportação de armas para o Irão.

Apesar de ter sido formalmente extinto em 1980, este Fundo do Ultramar permaneceu activo como fundo privativo até 1993, "tendo sido utilizados cerca de 481 milhões de escudos neste período sem qualquer escrutínio. O saldo inicial do fundo privativo, em 1981, e calculado aos dias de hoje, equivaleria a cerca de 30 milhões de euros. O saldo final, em 1993, corresponderia a cerca de 25 mil euros", escreve o deputado Pedro do Ó nas conclusões preliminares.

A inspectora de Finanças Maria da Conceição Rodrigues, que avaliou as contas do Fundo do Ultramar - na sequência do trabalho realizado em comissões de inquérito anteriores -, afirmou que o dinheiro saía do fundo e depois voltava a entrar sem se saber para que fins. "Nós vimos que havia dinheiro fora do Fundo, que saiu e que esteve, ou não, a financiar qualquer coisa, não sabemos o quê. Pode ter estado aplicado noutros bancos, não sabemos. Sabemos que esteve fora e que depois voltou". O fundo estava sob a alçada dos sucessivos chefes do Estado-Maior General das Forças Armadas.

A comissão também dá como confirmado o transbordo de armas para o Irão em 1980, assim como a exportação de armas com o mesmo destino, "mesmo após o corte de relações comerciais com o Irão e com a inexistência de autorização de exportação de armamento por parte do ministro da Defesa". A expedição das armas é próxima da data da morte de Amaro da Costa: terá ocorrido entre 9 de Dezembro de 1980 e Janeiro de 1981. Dois dias antes de morrer, a 2 de Dezembro, Adelino Amaro da Costa, que passara a andar armado, tinha pedido ao gabinete do chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas que o informasse com urgência sobre a exportação de material de guerra para o Irão. Nessa época, o CEMGFA coincidia com o Presidente da República, que era o general Ramalho Eanes.

Em finais de 2010, quando se realizou a IX comissão de inquérito parlamentar ao caso, Ramalho Eanes alertou para a existência de documentos nos EUA que poderiam ajudar a esclarecer o caso: "Esses documentos iriam fazer muita luz sobre esta questão, porque os Estados Unidos da América acompanharam de perto tudo isto e inclusivamente, a pedido do Governo, mandaram cá um conjunto de peritos".

"Conseguimos comprovar outros aspectos relevantes, mas não se consegue estabelecer um nexo de causalidade", diz à SÁBADO um deputado que participou na comissão de inquérito. Os vários grupos parlamentares vão enviar propostas de alteração ao texto preliminar da responsabilidade do PSD até segunda-feira e, na terça-feira, dia 23, às 12:00, será ouvido o antigo inspector da Polícia Judiciária Paulo Bernardino, responsável pelas investigações à morte de José Moreira.

Em 1995, a V Comissão de inquérito à tragédia de Camarate já se tinha pronunciado pelo atentado, pela "detecção de sulfato de bário em zonas do cockpit do avião sinistrado" e pela "verificação confirmada de novas substâncias explosivas", como "nitroglicerina, dinitrotolueno e trinitrotolueno". Há dez anos, os deputados concluíram que "os factos referidos permitem estabelecer a presunção de que o despenhamento da aeronave foi causado por um engenho explosivo, que visou a eliminação física de pessoas, tendo constituído, por isso, acção criminosa".

marcar artigo