Crónicas de Lisboa: O fim do capitalismo popular

10-04-2015
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Aquando das privatizações das empresas nacionalizadas em 1975, os governos de então incentivaram os pequenos aforradores e os próprios empregados, a adquirirem acções dessas empresas, nas quais se incluíam alguns bancos, vários já desaparecidos por fusão ou aquisições de outros. Criaram, para esse objectivo, condições preferenciais, incluindo benefícios fiscais, para os pequenos accionistas e trabalhadores. A partir daí, muita gente, com pequenas poupanças, passaram a ser “donos” (accionistas) de grandes empresas e bancos e se alguns, mais conservadores, se limitavam a receber os dividendos que entretanto iam sendo distribuídos, embora não insensíveis às variações do valor de cotação dessas acções, outros adquiriram o “vício” do jogo da bolsa e deixaram-se contagiar por ganhos de mais-valias na compra e venda naquele que deveria ser um mercado perfeito, a Bolsa de Valores Mobiliários, mas não o é, porque ali se “joga” muito do actual poder do “dinheiro fácil e transnacional”. O sobe e desce do valor dos títulos cotados, na maioria das situações, não reflecte o valor patrimonial da respectiva empresa mas resulta de vários tipos de “jogos e manipulações”, por vezes pouco claras que até aos mais “experts” na matérias escapam.

É claro que sendo as acções uma parte de capital duma empresa, os reveses nos seus negócios reflectem-se no seu valor de cotação ou mesmo na falência, com a consequente perda dos valores investidos pelos accionistas, de outros credores, dos empregados, do Estado, etc. Se nalguns casos houve erros de gestão ou mesmo gestão danosa e crimes económicos, onde a ganância dos homens e a falta de ética se sobrepuseram a todos os outros valores, nalguns casos são as naturais consequências dos dos riscos inerentes aos negócios e das crises, por vezes cíclicas e de que o capitalismo precisa para “viver”, que levam à falência.

A diversificação em áreas de negócios, com participações de capital que mais parecem uma teia (ou polvo, este no mau sentido), e a globalização, incluindo-se o incontrolável poder do “mundo financeiro”, torna os negócios cada vez mais incertos e, por isso, de maiores riscos. Se assim não fosse, por que razão as diversas entidades envolvidas na regulação e fiscalização, não detectaram os enormes buracos que têm ocorrido, no estrangeiro e em Portugal, estes de terríveis consequências para todos nós, para uns de forma directa e para outros de forma indirecta, porque as crises ocorridas nos bancos portugueses e empresas com interdependência aos mesmo, afectaram-nos a todos, incluindo a imagem do nosso país junto dos mercados financeiros estrangeiros, aqueles que nos emprestam dinheiro, mas que, face a essa imagem de crise, acabam por cobrar um juro tão alto quanto possível, para “compensar” os riscos que correm com esses financiamentos. Até a odiada “Troika”, maioritariamente constituída por jovens tecno-burocratas e sem experiência, não foi capaz de detectar a real situação patrimonial em que se encontrava o BES (Banco) e o GES (Grupo Espírito Santo), ligados umbilicalmente e “alimentados” com balões de oxigénio que, mais cedo ou mais tarde, rebentariam.

E são tantas as entidades que têm por missão verificar todo o sistema financeiro (BdP, CMVM, Accionistas de referência – alguns eles próprios bancos, os Auditores, a AT-Autoridade Tributária, etc). É que um banco, embora seja uma empresa com fins lucrativos, e apesar da “inveja” de muita gente, que nem sequer pensa que o mundo não funcionaria sem bancos e sem dinheiro, é mau sinal quando não tem lucros, é muito diferente das outras empresas, porque, além da prestação de diversos serviços bancários, são os bancos que “produzem e vendem dinheiro”, ainda por cima que não é deles, pelo que é um negócio assente na confiança dos seus credores (depositantes, prestamistas, etc). Lembremos-nos que são os bancos as entidades que criam dinheiro, este um “papel físico ou escritural/virtual” representativo duma parte: i)da riqueza presente, fruto dum rendimento ou de ganhos obtidos no passado, por exemplo as poupanças, a venda dum património, etc; ii) da riqueza futura, porque a obtenção dum empréstimo permite ao devedor usufruir de algo que terá que pagar no futuro e, como tal, gerar a respectiva riqueza para liquidar a dívida que contraiu junto do seu banco e este, se os capitais forem insuficientes, refinanciar-se-à junto do banco emissor das notas, neste caso o BCE que, sabe-se agora, se preparava para “asfixiar” o BES se o BdP não tivesse criado o Novo Banco naquele fim de semana apenas com a “carne limpa” do banco mau, para aquele transitando o “lixo tóxico” e os accionistas e outros devedores e credores.

Muita gente contesta a opção tomada pelo BdP para evitar a falência do BES, que a ocorrer teria terríveis consequências e provocaria no sistema financeiro português a propalada crise sistémica ou efeito dominó, mas também na economia em geral, porque isso é tipicamente português, principalmente por parte daqueles que não têm que tomar decisões (oposição, etc) : “Preso por ter cão e preso por não o ter” . Contudo, esta parece ter sido a melhor opção, face às outras duas que existiam (bancarrota ou nacionalização), apenas com a ressalva dos pequenos accionistas (% máxima a definir) não terem sido protegidos, mesmo que parcialmente. Assim, este modelo de “salvação” de bancos em dificuldade, criado pela UE e aplicada pela primeira vez em Portugal, acaba por dar uma machada no capitalismo popular. Eu, como pequeníssimo accionista e consequente perdedor na falência do BES, não é só essa perda que me dói, apesar da falta que esse valor me faz e embora as perdas potencias já venham desde a crise de 2008, mas sim e muito mais porque tudo aconteceu aos olhos da comunidade, dos poderes políticos, dos reguladores, dos auditores e dos concorrentes (bancos que perderiam muito com o colapso de um deles), sem que cada um cumprisse a sua missão, “alheando-se” por incompetência, por laxismo/inércia, por compadrio, por interesses político-partidários e pessoais, etc. Voltarei a este assunto, porque o “inexplicável” continua a atormentar-me a alma. E depois desta hecatombe, que justiça teremos para julgar este caso, porque o BES é o mais grave escândalo financeiro da nossa história, e abalou a nossa economia, a credibilidade do nosso país e as pessoas que ficaram desconfiadas dos bancos? Faça-se justiça isenta e objectiva, doa a quem doer, porque sem bancos, fortes e credíveis e sem dinheiro as sociedades modernas não funcionariam.

Aquando das privatizações das empresas nacionalizadas em 1975, os governos de então incentivaram os pequenos aforradores e os próprios empregados, a adquirirem acções dessas empresas, nas quais se incluíam alguns bancos, vários já desaparecidos por fusão ou aquisições de outros. Criaram, para esse objectivo, condições preferenciais, incluindo benefícios fiscais, para os pequenos accionistas e trabalhadores. A partir daí, muita gente, com pequenas poupanças, passaram a ser “donos” (accionistas) de grandes empresas e bancos e se alguns, mais conservadores, se limitavam a receber os dividendos que entretanto iam sendo distribuídos, embora não insensíveis às variações do valor de cotação dessas acções, outros adquiriram o “vício” do jogo da bolsa e deixaram-se contagiar por ganhos de mais-valias na compra e venda naquele que deveria ser um mercado perfeito, a Bolsa de Valores Mobiliários, mas não o é, porque ali se “joga” muito do actual poder do “dinheiro fácil e transnacional”. O sobe e desce do valor dos títulos cotados, na maioria das situações, não reflecte o valor patrimonial da respectiva empresa mas resulta de vários tipos de “jogos e manipulações”, por vezes pouco claras que até aos mais “experts” na matérias escapam.

É claro que sendo as acções uma parte de capital duma empresa, os reveses nos seus negócios reflectem-se no seu valor de cotação ou mesmo na falência, com a consequente perda dos valores investidos pelos accionistas, de outros credores, dos empregados, do Estado, etc. Se nalguns casos houve erros de gestão ou mesmo gestão danosa e crimes económicos, onde a ganância dos homens e a falta de ética se sobrepuseram a todos os outros valores, nalguns casos são as naturais consequências dos dos riscos inerentes aos negócios e das crises, por vezes cíclicas e de que o capitalismo precisa para “viver”, que levam à falência.

A diversificação em áreas de negócios, com participações de capital que mais parecem uma teia (ou polvo, este no mau sentido), e a globalização, incluindo-se o incontrolável poder do “mundo financeiro”, torna os negócios cada vez mais incertos e, por isso, de maiores riscos. Se assim não fosse, por que razão as diversas entidades envolvidas na regulação e fiscalização, não detectaram os enormes buracos que têm ocorrido, no estrangeiro e em Portugal, estes de terríveis consequências para todos nós, para uns de forma directa e para outros de forma indirecta, porque as crises ocorridas nos bancos portugueses e empresas com interdependência aos mesmo, afectaram-nos a todos, incluindo a imagem do nosso país junto dos mercados financeiros estrangeiros, aqueles que nos emprestam dinheiro, mas que, face a essa imagem de crise, acabam por cobrar um juro tão alto quanto possível, para “compensar” os riscos que correm com esses financiamentos. Até a odiada “Troika”, maioritariamente constituída por jovens tecno-burocratas e sem experiência, não foi capaz de detectar a real situação patrimonial em que se encontrava o BES (Banco) e o GES (Grupo Espírito Santo), ligados umbilicalmente e “alimentados” com balões de oxigénio que, mais cedo ou mais tarde, rebentariam.

E são tantas as entidades que têm por missão verificar todo o sistema financeiro (BdP, CMVM, Accionistas de referência – alguns eles próprios bancos, os Auditores, a AT-Autoridade Tributária, etc). É que um banco, embora seja uma empresa com fins lucrativos, e apesar da “inveja” de muita gente, que nem sequer pensa que o mundo não funcionaria sem bancos e sem dinheiro, é mau sinal quando não tem lucros, é muito diferente das outras empresas, porque, além da prestação de diversos serviços bancários, são os bancos que “produzem e vendem dinheiro”, ainda por cima que não é deles, pelo que é um negócio assente na confiança dos seus credores (depositantes, prestamistas, etc). Lembremos-nos que são os bancos as entidades que criam dinheiro, este um “papel físico ou escritural/virtual” representativo duma parte: i)da riqueza presente, fruto dum rendimento ou de ganhos obtidos no passado, por exemplo as poupanças, a venda dum património, etc; ii) da riqueza futura, porque a obtenção dum empréstimo permite ao devedor usufruir de algo que terá que pagar no futuro e, como tal, gerar a respectiva riqueza para liquidar a dívida que contraiu junto do seu banco e este, se os capitais forem insuficientes, refinanciar-se-à junto do banco emissor das notas, neste caso o BCE que, sabe-se agora, se preparava para “asfixiar” o BES se o BdP não tivesse criado o Novo Banco naquele fim de semana apenas com a “carne limpa” do banco mau, para aquele transitando o “lixo tóxico” e os accionistas e outros devedores e credores.

Muita gente contesta a opção tomada pelo BdP para evitar a falência do BES, que a ocorrer teria terríveis consequências e provocaria no sistema financeiro português a propalada crise sistémica ou efeito dominó, mas também na economia em geral, porque isso é tipicamente português, principalmente por parte daqueles que não têm que tomar decisões (oposição, etc) : “Preso por ter cão e preso por não o ter” . Contudo, esta parece ter sido a melhor opção, face às outras duas que existiam (bancarrota ou nacionalização), apenas com a ressalva dos pequenos accionistas (% máxima a definir) não terem sido protegidos, mesmo que parcialmente. Assim, este modelo de “salvação” de bancos em dificuldade, criado pela UE e aplicada pela primeira vez em Portugal, acaba por dar uma machada no capitalismo popular. Eu, como pequeníssimo accionista e consequente perdedor na falência do BES, não é só essa perda que me dói, apesar da falta que esse valor me faz e embora as perdas potencias já venham desde a crise de 2008, mas sim e muito mais porque tudo aconteceu aos olhos da comunidade, dos poderes políticos, dos reguladores, dos auditores e dos concorrentes (bancos que perderiam muito com o colapso de um deles), sem que cada um cumprisse a sua missão, “alheando-se” por incompetência, por laxismo/inércia, por compadrio, por interesses político-partidários e pessoais, etc. Voltarei a este assunto, porque o “inexplicável” continua a atormentar-me a alma. E depois desta hecatombe, que justiça teremos para julgar este caso, porque o BES é o mais grave escândalo financeiro da nossa história, e abalou a nossa economia, a credibilidade do nosso país e as pessoas que ficaram desconfiadas dos bancos? Faça-se justiça isenta e objectiva, doa a quem doer, porque sem bancos, fortes e credíveis e sem dinheiro as sociedades modernas não funcionariam.

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