O Cachimbo de Magritte: A Política da Modernização

21-01-2012
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Em 1985, Portugal confiou uma missão ao PSD e ao seu líder, Cavaco Silva: a “modernização” e a “abertura” do País. Foi essa missão que justificou o governo monopartidário de dez anos que se seguiu. Bem ou mal, foi a essa tarefa que o PSD se dedicou. Em 1995, o País cansou-se do PSD. Cansou-se do clientelismo, da incompetência e da inconsequência que, no final do percurso, flutuavam à superfície, independentemente dos inegáveis méritos e feitos de dez anos de governação. Sobretudo, cansou-se de “eles estarem lá há muito tempo”. Em 1995, a alternativa era evidentemente o PS. O PS de António Guterres aparecia como o partido da (continuação da) “modernização” – com o dinamismo do que mais de moderno havia no “estrangeiro”, em contraste com a fossilização do PSD – e, em simultâneo, como o partido da correcção “humanista” da modernização meio abrutalhada ainda e eternamente em curso. Era um partido de uma certa esquerda, da esquerda “moderna”, que nem sequer estava assim tanto “à esquerda”, e que conhecia o caminho para a “modernização de rosto humano”. Mas Guterres tinha de ser diferente de Cavaco. Guterres encontrou o País disposto a aceitar as suas mudanças no estilo, no discurso público e na manipulação dos símbolos políticos. Foram os anos do Ministério da Igualdade e das lágrimas na televisão.Durante esses anos viveu-se num estranho clima de mal-estar adormecido. O governo não era muito credível, mas isso parecia não ter excessiva importância. O “resto” aparentemente “funcionava”. Afinal, tinha importância e o “resto” não respirava muita saúde. Depois de virada uma das páginas mais piegas da curta história da democracia portuguesa, o País voltou-se outra vez para o PSD. Desde o início que as coisas não correram particularmente bem, e tudo se desmoronou pouco tempo depois, após alguns meses de pura infantilidade. Sócrates, um político sem grande brilho, nem currículo, emergiu como uma espécie de “retorno à sobriedade”.A “modernização” e a “abertura” formam, mais uma vez, esse grande carimbo de legitimidade dos homens que hoje nos governam. Mas Sócrates, ao contrário de Guterres, não está obcecado com o ser diferente. Não inspira ninguém, mas também sabe que os portugueses, até haver evidência em contrário, não procuram inspiração. Depois de correr com os “humanistas” e disciplinar o seu próprio partido, Sócrates prepara-se para esvaziar o PSD. A “modernização” e a “abertura” não possuem cartão partidário. Distinguem o vermelho carregado, mas são daltónicas perante cores suaves como o laranja e o rosa. Como por enquanto o PSD não tem nada mais a acrescentar à “modernização” e à “abertura”, resta-lhe despedir o seu líder para evitar a catástrofe. É essa triste receita que anima e ilude aqueles que não querem esperar pelo momento em que se repetirá o protesto “eles estão lá há muito tempo”.


Em 1985, Portugal confiou uma missão ao PSD e ao seu líder, Cavaco Silva: a “modernização” e a “abertura” do País. Foi essa missão que justificou o governo monopartidário de dez anos que se seguiu. Bem ou mal, foi a essa tarefa que o PSD se dedicou. Em 1995, o País cansou-se do PSD. Cansou-se do clientelismo, da incompetência e da inconsequência que, no final do percurso, flutuavam à superfície, independentemente dos inegáveis méritos e feitos de dez anos de governação. Sobretudo, cansou-se de “eles estarem lá há muito tempo”. Em 1995, a alternativa era evidentemente o PS. O PS de António Guterres aparecia como o partido da (continuação da) “modernização” – com o dinamismo do que mais de moderno havia no “estrangeiro”, em contraste com a fossilização do PSD – e, em simultâneo, como o partido da correcção “humanista” da modernização meio abrutalhada ainda e eternamente em curso. Era um partido de uma certa esquerda, da esquerda “moderna”, que nem sequer estava assim tanto “à esquerda”, e que conhecia o caminho para a “modernização de rosto humano”. Mas Guterres tinha de ser diferente de Cavaco. Guterres encontrou o País disposto a aceitar as suas mudanças no estilo, no discurso público e na manipulação dos símbolos políticos. Foram os anos do Ministério da Igualdade e das lágrimas na televisão.Durante esses anos viveu-se num estranho clima de mal-estar adormecido. O governo não era muito credível, mas isso parecia não ter excessiva importância. O “resto” aparentemente “funcionava”. Afinal, tinha importância e o “resto” não respirava muita saúde. Depois de virada uma das páginas mais piegas da curta história da democracia portuguesa, o País voltou-se outra vez para o PSD. Desde o início que as coisas não correram particularmente bem, e tudo se desmoronou pouco tempo depois, após alguns meses de pura infantilidade. Sócrates, um político sem grande brilho, nem currículo, emergiu como uma espécie de “retorno à sobriedade”.A “modernização” e a “abertura” formam, mais uma vez, esse grande carimbo de legitimidade dos homens que hoje nos governam. Mas Sócrates, ao contrário de Guterres, não está obcecado com o ser diferente. Não inspira ninguém, mas também sabe que os portugueses, até haver evidência em contrário, não procuram inspiração. Depois de correr com os “humanistas” e disciplinar o seu próprio partido, Sócrates prepara-se para esvaziar o PSD. A “modernização” e a “abertura” não possuem cartão partidário. Distinguem o vermelho carregado, mas são daltónicas perante cores suaves como o laranja e o rosa. Como por enquanto o PSD não tem nada mais a acrescentar à “modernização” e à “abertura”, resta-lhe despedir o seu líder para evitar a catástrofe. É essa triste receita que anima e ilude aqueles que não querem esperar pelo momento em que se repetirá o protesto “eles estão lá há muito tempo”.

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