- [a barriga de um arquitecto]

01-07-2011
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Segunda-feira

A questão era uma faca de dois gumes. Ao decidir pela continuidade do mandato do governo Jorge Sampaio sujeita-se às críticas dos seus apoiantes e aos azedos elogios dos seus antigos opositores. São os aspectos mais tristes desta crise política, as retiradas de apoio de figuras de relevo da esquerda portuguesa ao Presidente da República.

Tenho orgulho em dizer que votei em Jorge Sampaio nas duas eleições presidenciais. Alegra-me ver como ele tem evoluído nestes anos. Recordo-me de como era algo nebuloso nos discursos, abrindo parêntesis dentro de parêntesis até já não se compreender qual era afinal a conclusão das suas ideias. Sampaio é hoje um homem diferente: lúcido e objectivo. Não é difícil imaginar como a presidência deve ser uma experiência de vida riquíssima.

Em alguns anos vimo-lo tornar-se de competente presidente de câmara num verdadeiro homem de estado à altura dos grandes momentos. Sim, eu tenho orgulho neste presidente e parece-me de todo injusto que se venha agora “cobrar” o voto que nele se depositou só porque a sua decisão desagrada as “nossas” expectativas.

Persistem desta crise várias evidências, em primeiro lugar que Jorge Sampaio tomou a decisão pessoalmente mais difícil mas também a mais digna de um presidente. Independente dos nossos gostos ou desgostos pessoais (incluindo os de Sampaio) relativamente a Santana Lopes e ao novo governo, a substituição de Durão Barroso nunca poderia ser invocada como motivo bastante para anular a legitimidade eleitoral (formal) do actual quadro parlamentar. E por mais voltas que se dê à questão, essa é a realidade que cabe a um presidente preservar: como ele bem disse, ao presidente não compete governar. Sampaio toma assim a decisão mais impopular no seu círculo de apoiantes ao sobrevalorizar a questão formal sobre a questão (da legitimidade) política, mas essa decisão é claramente a mais correcta do ponto de vista da formalidade institucional e da doutrina que é devida a um presidente. O estado tem regras e dessas regras depende a estabilidade do regime democrático. O Presidente da República é o garante da estabilidade dessas regras que não podem ser postas em causa pela transitoriedade da popularidade de um governo. Ao assumir esse papel, Jorge Sampaio fez o que um presidente deve fazer, subindo acima da interpretação partidária e tomando uma decisão “de Estado”. Algo que, contraditoriamente, devia orgulhar os seus colegas e amigos de partido, em vez de os desiludir.

O Presidente da República Jorge Sampaio discursando nas Nações Unidas em 2002.

Segunda-feira

A questão era uma faca de dois gumes. Ao decidir pela continuidade do mandato do governo Jorge Sampaio sujeita-se às críticas dos seus apoiantes e aos azedos elogios dos seus antigos opositores. São os aspectos mais tristes desta crise política, as retiradas de apoio de figuras de relevo da esquerda portuguesa ao Presidente da República.

Tenho orgulho em dizer que votei em Jorge Sampaio nas duas eleições presidenciais. Alegra-me ver como ele tem evoluído nestes anos. Recordo-me de como era algo nebuloso nos discursos, abrindo parêntesis dentro de parêntesis até já não se compreender qual era afinal a conclusão das suas ideias. Sampaio é hoje um homem diferente: lúcido e objectivo. Não é difícil imaginar como a presidência deve ser uma experiência de vida riquíssima.

Em alguns anos vimo-lo tornar-se de competente presidente de câmara num verdadeiro homem de estado à altura dos grandes momentos. Sim, eu tenho orgulho neste presidente e parece-me de todo injusto que se venha agora “cobrar” o voto que nele se depositou só porque a sua decisão desagrada as “nossas” expectativas.

Persistem desta crise várias evidências, em primeiro lugar que Jorge Sampaio tomou a decisão pessoalmente mais difícil mas também a mais digna de um presidente. Independente dos nossos gostos ou desgostos pessoais (incluindo os de Sampaio) relativamente a Santana Lopes e ao novo governo, a substituição de Durão Barroso nunca poderia ser invocada como motivo bastante para anular a legitimidade eleitoral (formal) do actual quadro parlamentar. E por mais voltas que se dê à questão, essa é a realidade que cabe a um presidente preservar: como ele bem disse, ao presidente não compete governar. Sampaio toma assim a decisão mais impopular no seu círculo de apoiantes ao sobrevalorizar a questão formal sobre a questão (da legitimidade) política, mas essa decisão é claramente a mais correcta do ponto de vista da formalidade institucional e da doutrina que é devida a um presidente. O estado tem regras e dessas regras depende a estabilidade do regime democrático. O Presidente da República é o garante da estabilidade dessas regras que não podem ser postas em causa pela transitoriedade da popularidade de um governo. Ao assumir esse papel, Jorge Sampaio fez o que um presidente deve fazer, subindo acima da interpretação partidária e tomando uma decisão “de Estado”. Algo que, contraditoriamente, devia orgulhar os seus colegas e amigos de partido, em vez de os desiludir.

O Presidente da República Jorge Sampaio discursando nas Nações Unidas em 2002.

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