Advogado do Estado queixou-se de falta de informação do Governo

14-08-2012
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Bernardo Ayala esteve dois meses sem ter acesso à documentação das condições de pagamento apresentadas a Paulo Portas pelos alemães. Dados que eram essenciais para a adjudicação do negócio

O coordenador da equipa que apoiou juridicamente o Ministério da Defesa Nacional (MDN), Bernardo Ayala, queixa-se num email de Setembro de 2003 não ter recebido, durante mais de dois meses, informações sobre as condições de pagamento apresentadas pelo consórcio alemão, que mais tarde veio a ganhar o concurso dos submarinos. A documentação foi entregue no gabinete do então ministro de Estado e da Defesa Nacional, Paulo Portas, em final de Junho desse ano, mas seguiu apenas para a Marinha, não tendo sido remetida nem à secretaria-geral do ministério nem à equipa que assessorava juridicamente o processo de aquisição dos submergíveis.

O PÚBLICO tentou contactar sem sucesso o gabinete do actual ministro dos Negócios Estrangeiros, e na altura titular da pasta da Defesa, Paulo Portas. Mas entre os seus mais próximos, esta polémica é recebida com um encolher de ombros. "Old news [notícias velhas]", reagiu um membro da direcção do partido, antes de argumentar que o desaparecimento dos documentos do MDN foi, acima de tudo, um argumento jurídico usado pelo Ministério Público para justificar o acesso aos arquivos de Bernardo Ayala.

O email é citado no despacho de arquivamento do inquérito que investigou a actuação de Ayala em todo o processo de venda dos submarinos. "Até ontem, o problema era relevantíssimo, porque sendo o "preço e condições de pagamento" um factor de adjudicação, era absolutamente essencial utilizar números correctos, por isso, a discrepância entre a Marinha e a secretaria-geral causou-me preocupação", escreveu Ayala a 4 de Setembro de 2003, sete meses antes de Portas assinar o contrato de aquisição com o consórcio alemão. O advogado continua dizendo que o problema está ultrapassado, mas não deixa de retirar uma lição: "A inexistência de um (e apenas um!) gestor do programa (como mandam as boas regras) leva a que a malta trabalhe, por vezes, sem ter toda a informação que necessita (pior: sem sequer saber que a informação existe...)". O desabafo foi remetido a vários colegas da equipa jurídica e também ao responsável da área financeira do Ministério da Defesa.

O procurador que arquivou o caso (o processo principal que investiga suspeitas de corrupção no negócio ainda continua) justifica a decisão com o facto de "grande parte dos elementos referentes ao concurso público de aquisição dos submarinos não se encontrar arquivada nos respectivos serviços, desconhecendo-se qual o destino que foi dado à maioria da documentação", como noticiou o Jornal de Notícias. Já antes, por mais de uma vez, o PÚBLICO denunciara o desaparecimento de vários documentos relacionados com este negócio. Uns relativos ao aumento da margem de lucro (spread) dos bancos que financiaram a operação de compra dos submergíveis, um consórcio composto pelo BES/Crédit Suisse First Boston, já depois da adjudicação daquele financiamento. E outros no âmbito do programa de contrapartidas dos submarinos que desapareceram da Comissão Permanente de Contrapartidas (CPC), que fiscaliza os negócios que o consórcio alemão se comprometeu a intermediar, no valor de 1,2 mil milhões de euros, para fortalecer o tecido empresarial nacional.

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Entretanto, o actual ministro da Defesa, José Pedro Aguiar-Branco, optou por desvalorizar o reacendimento desta polémica. Ontem, em Gouveia, garantiu não ter recebido "qualquer notificação" por parte da Procuradoria-Geral da República (PGR) para apresentar documentos ou explicar o que fosse. Mas assegurou estar "totalmente colaborante" para esclarecer o que houver para esclarecer. "Antes de falar, devemos saber do que falamos. Se são documentos relativos aos contratos, eles estão no Ministério da Defesa, têm o visto prévio do Tribunal de Contas e não há qualquer problema. Sobre outro tipo de documentos, desconheço", acrescentou. Não deixou, no entanto, de fazer um reparo: "A PGR tem os meios para realizar perícias, auditorias, de forma a que esta questão seja esclarecida", disse, frisando que, "até ao momento" nem o seu gabinete nem o ministério receberam qualquer pedido ou notificação.

Também Augusto Santos Silva, antecessor de Aguiar-Branco na pasta, se desviou do tema. Lembrou que a sua passagem fora já numa fase posterior do processo, "nas últimas duas fases da aquisição, a recepção dos submarinos e o pagamento", adiantando ainda ter colaborado com as autoridades judiciais: "O Ministério Público pediu documentos ao Ministério da Defesa. Mandei responder afirmativamente aos pedidos do MP e determinei à sociedade de advogados, Sérvulo Correia Associados, que fizesse o mesmo. Entre Outubro de 2009 e Setembro de 2011 todos os pedidos do MP foram respondidos".

O PS reagiu, classificando o "episódio" como "impróprio de um Estado de Direito": "O actual ministro tem de apurar em primeiro lugar a veracidade dos factos, que, a serem verdadeiros, implicam apurar responsabilidades. E deve fazer também uma auditoria de procedimentos internos", afirmou o socialista João Ribeiro. com Nuno Ribeiro

Bernardo Ayala esteve dois meses sem ter acesso à documentação das condições de pagamento apresentadas a Paulo Portas pelos alemães. Dados que eram essenciais para a adjudicação do negócio

O coordenador da equipa que apoiou juridicamente o Ministério da Defesa Nacional (MDN), Bernardo Ayala, queixa-se num email de Setembro de 2003 não ter recebido, durante mais de dois meses, informações sobre as condições de pagamento apresentadas pelo consórcio alemão, que mais tarde veio a ganhar o concurso dos submarinos. A documentação foi entregue no gabinete do então ministro de Estado e da Defesa Nacional, Paulo Portas, em final de Junho desse ano, mas seguiu apenas para a Marinha, não tendo sido remetida nem à secretaria-geral do ministério nem à equipa que assessorava juridicamente o processo de aquisição dos submergíveis.

O PÚBLICO tentou contactar sem sucesso o gabinete do actual ministro dos Negócios Estrangeiros, e na altura titular da pasta da Defesa, Paulo Portas. Mas entre os seus mais próximos, esta polémica é recebida com um encolher de ombros. "Old news [notícias velhas]", reagiu um membro da direcção do partido, antes de argumentar que o desaparecimento dos documentos do MDN foi, acima de tudo, um argumento jurídico usado pelo Ministério Público para justificar o acesso aos arquivos de Bernardo Ayala.

O email é citado no despacho de arquivamento do inquérito que investigou a actuação de Ayala em todo o processo de venda dos submarinos. "Até ontem, o problema era relevantíssimo, porque sendo o "preço e condições de pagamento" um factor de adjudicação, era absolutamente essencial utilizar números correctos, por isso, a discrepância entre a Marinha e a secretaria-geral causou-me preocupação", escreveu Ayala a 4 de Setembro de 2003, sete meses antes de Portas assinar o contrato de aquisição com o consórcio alemão. O advogado continua dizendo que o problema está ultrapassado, mas não deixa de retirar uma lição: "A inexistência de um (e apenas um!) gestor do programa (como mandam as boas regras) leva a que a malta trabalhe, por vezes, sem ter toda a informação que necessita (pior: sem sequer saber que a informação existe...)". O desabafo foi remetido a vários colegas da equipa jurídica e também ao responsável da área financeira do Ministério da Defesa.

O procurador que arquivou o caso (o processo principal que investiga suspeitas de corrupção no negócio ainda continua) justifica a decisão com o facto de "grande parte dos elementos referentes ao concurso público de aquisição dos submarinos não se encontrar arquivada nos respectivos serviços, desconhecendo-se qual o destino que foi dado à maioria da documentação", como noticiou o Jornal de Notícias. Já antes, por mais de uma vez, o PÚBLICO denunciara o desaparecimento de vários documentos relacionados com este negócio. Uns relativos ao aumento da margem de lucro (spread) dos bancos que financiaram a operação de compra dos submergíveis, um consórcio composto pelo BES/Crédit Suisse First Boston, já depois da adjudicação daquele financiamento. E outros no âmbito do programa de contrapartidas dos submarinos que desapareceram da Comissão Permanente de Contrapartidas (CPC), que fiscaliza os negócios que o consórcio alemão se comprometeu a intermediar, no valor de 1,2 mil milhões de euros, para fortalecer o tecido empresarial nacional.

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Entretanto, o actual ministro da Defesa, José Pedro Aguiar-Branco, optou por desvalorizar o reacendimento desta polémica. Ontem, em Gouveia, garantiu não ter recebido "qualquer notificação" por parte da Procuradoria-Geral da República (PGR) para apresentar documentos ou explicar o que fosse. Mas assegurou estar "totalmente colaborante" para esclarecer o que houver para esclarecer. "Antes de falar, devemos saber do que falamos. Se são documentos relativos aos contratos, eles estão no Ministério da Defesa, têm o visto prévio do Tribunal de Contas e não há qualquer problema. Sobre outro tipo de documentos, desconheço", acrescentou. Não deixou, no entanto, de fazer um reparo: "A PGR tem os meios para realizar perícias, auditorias, de forma a que esta questão seja esclarecida", disse, frisando que, "até ao momento" nem o seu gabinete nem o ministério receberam qualquer pedido ou notificação.

Também Augusto Santos Silva, antecessor de Aguiar-Branco na pasta, se desviou do tema. Lembrou que a sua passagem fora já numa fase posterior do processo, "nas últimas duas fases da aquisição, a recepção dos submarinos e o pagamento", adiantando ainda ter colaborado com as autoridades judiciais: "O Ministério Público pediu documentos ao Ministério da Defesa. Mandei responder afirmativamente aos pedidos do MP e determinei à sociedade de advogados, Sérvulo Correia Associados, que fizesse o mesmo. Entre Outubro de 2009 e Setembro de 2011 todos os pedidos do MP foram respondidos".

O PS reagiu, classificando o "episódio" como "impróprio de um Estado de Direito": "O actual ministro tem de apurar em primeiro lugar a veracidade dos factos, que, a serem verdadeiros, implicam apurar responsabilidades. E deve fazer também uma auditoria de procedimentos internos", afirmou o socialista João Ribeiro. com Nuno Ribeiro

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