Segundo Orçamento Rectificativo pode servir para pagar salários militares

03-08-2011
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Corte nos efectivos e na LPM, risco de ruptura de tesouraria, sistema retributivo ilegal e fusão dos hospitais dos ramos. Decisões para tomar rapidamente envolvem milhões de euros e milhares nas fileiras

A portaria foi publicada em Diário da República na passada quinta-feira com a assinatura do chefe de Estado-Maior da Armada. Em 17 linhas, o almirante Saldanha Lopes determinava a redução de 164 para 156 da lotação das fragatas da classe Bartolomeu Dias. Não era consequência da imposição de cortes nas Forças Armadas. O comandante Alexandre Fernandes, porta-voz da Marinha, explicou que o emagrecimento da guarnição resultava do esforço de "optimização tendo em conta a eficiência" do navio. E que a "experiência" adquirida desde 2007 na gestão destes navios permitiu perceber que era possível "conduzir os navios com esta redução". Mas a publicação confirmava a tendência entre as fileiras das Forças Armadas, que se verifica há dezenas de anos - uma das batatas quentes que caiu no colo de José Pedro Aguiar-Branco assim que assumiu a pasta da Defesa Nacional.

Juntamente com esta, Aguiar-Branco terá de lidar nos próximos meses com a falta de dinheiro para salários, o imbróglio à volta do sistema de remunerações, a revisão da Lei de Programação Militar (LPM) e a reforma da Saúde Militar.

A crónica desorçamentação que afecta a Defesa poderá ser uma das razões para o Governo avançar com um segundo Orçamento Rectificativo. Os problemas de tesouraria deverão chegar aos ramos no Outono, como aliás, já é tradição de há anos a esta parte. O caso mais preocupante reporta ao pagamento dos vencimentos onde existe o risco da torneira fechar por essa altura. E é um problema que afecta todos os ramos, embora a situação seja mais premente no Exército. Nos ramos, apesar de tudo, a tranquilidade é o sentimento dominante por terem recebido sinais de que o Executivo pode resolver o problema recorrendo a um segundo Orçamento Rectificativo a apresentar em Outubro. O ministro das Finanças já havia admitido como possível um segundo rectificativo numa audição parlamentar.

Outra das prioridades reside no número de efectivos. O Memorando de Entendimento assinado com a troika definiu como mandatório uma redução de efectivos na ordem dos 10 por cento. Em resposta a perguntas enviadas pelo PÚBLICO, o gabinete do ministro lembrou que a redução tinha até 2014 para se aplicar: "Até lá o Governo saberá encontrar o ponto de equilíbrio." Mas há quem avise que, para tal, o governante tem até Setembro para definir a aplicação do corte numa estrutura que ainda está a digerir uma redução de três mil efectivos definida em 2009.

Estado "deplorável"

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As associações representativas dos militares assumem-se preocupadas e classificam o actual estado das Forças Armadas como "deplorável". Avisam que mais cortes no pessoal podem afectar o cumprimento das missões. Mas o caderno de encargos imposto pelanão se limita ao número de militares. Até Dezembro, o governante terá de definir quais os projectos que vai deixar cair da LPM. O processo será dramático já que o acordo estabeleceu uma redução de 40 por cento. Embora alguns dos cinco mil milhões já tenham sido gastos, o corte será significativo e há projectos emblemáticos para os ramos que esperam ainda ver a luz dia. Como os helicópteros NH-90 considerados essenciais pelo Exército ou o navio polivalente para a Marinha cujo investimento de 300 milhões de euros poderia ajudar a salvar os Estaleiros Navais de Viana do Castelo.

Outro dos fogos que Aguiar-Branco tem de apagar rapidamente prende-se com o novo regime remuneratório. O ministro não pode protelar uma decisão para lá de Dezembro deste ano. A lei fez aumentar os gastos com salários nas Forças Armadas e implicou um conjunto de promoções na carreira militar. Um relatório da Inspecção-Geral das Finanças torpedeou o processo ao considerar ilegal o mecanismo implementado no início do ano passado. E os militares viram-se expostos na praça pública como "bodes expiatórios" do poder político. A expressão é do coronel Manuel Cracel, presidente da Associação das Forças Armadas (AOFA), que classifica todo o processo como uma "desconsideração" do poder político às próprias chefias militares e também gerador de "desmotivação" entre as fileiras.

O sargento-chefe Lima Coelho, presidente da Associação Nacional de Sargentos, culpa igualmente o antecessor de Aguiar-Branco. Assegura que "o legislador deixou buracos na lei" e que as opções tomadas "tiveram cobertura da tutela política". Por seu turno, Cracel lembra que não foram os militares que aprovaram a lei: "Aplicaram-na. E o ministro [na altura, Augusto Santos Silva] foi informado dos custos da aplicação da lei". Por isso caiu mal nos ramos o despacho do ministro, assinado quatro dias antes de sair, que dava razão ao relatório. Devolução dos valores dos salários tidos como ilegais e despromoção pessoal, portanto. Até ao final do ano, o governante terá de decidir se concorda com o despacho, provocando a revolta nos quartéis, se suspende o despacho do antecessor, adiando o problema, ou se o revoga, podendo com isso comprar uma guerra com as Finanças ou o Tribunal de Contas.

Nas fileiras, a convicção é que - afirma Lima Coelho - os militares estão a pagar por "erros grosseiros feitos por teimosia política para forçar a aplicação do novo sistema".

Corte nos efectivos e na LPM, risco de ruptura de tesouraria, sistema retributivo ilegal e fusão dos hospitais dos ramos. Decisões para tomar rapidamente envolvem milhões de euros e milhares nas fileiras

A portaria foi publicada em Diário da República na passada quinta-feira com a assinatura do chefe de Estado-Maior da Armada. Em 17 linhas, o almirante Saldanha Lopes determinava a redução de 164 para 156 da lotação das fragatas da classe Bartolomeu Dias. Não era consequência da imposição de cortes nas Forças Armadas. O comandante Alexandre Fernandes, porta-voz da Marinha, explicou que o emagrecimento da guarnição resultava do esforço de "optimização tendo em conta a eficiência" do navio. E que a "experiência" adquirida desde 2007 na gestão destes navios permitiu perceber que era possível "conduzir os navios com esta redução". Mas a publicação confirmava a tendência entre as fileiras das Forças Armadas, que se verifica há dezenas de anos - uma das batatas quentes que caiu no colo de José Pedro Aguiar-Branco assim que assumiu a pasta da Defesa Nacional.

Juntamente com esta, Aguiar-Branco terá de lidar nos próximos meses com a falta de dinheiro para salários, o imbróglio à volta do sistema de remunerações, a revisão da Lei de Programação Militar (LPM) e a reforma da Saúde Militar.

A crónica desorçamentação que afecta a Defesa poderá ser uma das razões para o Governo avançar com um segundo Orçamento Rectificativo. Os problemas de tesouraria deverão chegar aos ramos no Outono, como aliás, já é tradição de há anos a esta parte. O caso mais preocupante reporta ao pagamento dos vencimentos onde existe o risco da torneira fechar por essa altura. E é um problema que afecta todos os ramos, embora a situação seja mais premente no Exército. Nos ramos, apesar de tudo, a tranquilidade é o sentimento dominante por terem recebido sinais de que o Executivo pode resolver o problema recorrendo a um segundo Orçamento Rectificativo a apresentar em Outubro. O ministro das Finanças já havia admitido como possível um segundo rectificativo numa audição parlamentar.

Outra das prioridades reside no número de efectivos. O Memorando de Entendimento assinado com a troika definiu como mandatório uma redução de efectivos na ordem dos 10 por cento. Em resposta a perguntas enviadas pelo PÚBLICO, o gabinete do ministro lembrou que a redução tinha até 2014 para se aplicar: "Até lá o Governo saberá encontrar o ponto de equilíbrio." Mas há quem avise que, para tal, o governante tem até Setembro para definir a aplicação do corte numa estrutura que ainda está a digerir uma redução de três mil efectivos definida em 2009.

Estado "deplorável"

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As associações representativas dos militares assumem-se preocupadas e classificam o actual estado das Forças Armadas como "deplorável". Avisam que mais cortes no pessoal podem afectar o cumprimento das missões. Mas o caderno de encargos imposto pelanão se limita ao número de militares. Até Dezembro, o governante terá de definir quais os projectos que vai deixar cair da LPM. O processo será dramático já que o acordo estabeleceu uma redução de 40 por cento. Embora alguns dos cinco mil milhões já tenham sido gastos, o corte será significativo e há projectos emblemáticos para os ramos que esperam ainda ver a luz dia. Como os helicópteros NH-90 considerados essenciais pelo Exército ou o navio polivalente para a Marinha cujo investimento de 300 milhões de euros poderia ajudar a salvar os Estaleiros Navais de Viana do Castelo.

Outro dos fogos que Aguiar-Branco tem de apagar rapidamente prende-se com o novo regime remuneratório. O ministro não pode protelar uma decisão para lá de Dezembro deste ano. A lei fez aumentar os gastos com salários nas Forças Armadas e implicou um conjunto de promoções na carreira militar. Um relatório da Inspecção-Geral das Finanças torpedeou o processo ao considerar ilegal o mecanismo implementado no início do ano passado. E os militares viram-se expostos na praça pública como "bodes expiatórios" do poder político. A expressão é do coronel Manuel Cracel, presidente da Associação das Forças Armadas (AOFA), que classifica todo o processo como uma "desconsideração" do poder político às próprias chefias militares e também gerador de "desmotivação" entre as fileiras.

O sargento-chefe Lima Coelho, presidente da Associação Nacional de Sargentos, culpa igualmente o antecessor de Aguiar-Branco. Assegura que "o legislador deixou buracos na lei" e que as opções tomadas "tiveram cobertura da tutela política". Por seu turno, Cracel lembra que não foram os militares que aprovaram a lei: "Aplicaram-na. E o ministro [na altura, Augusto Santos Silva] foi informado dos custos da aplicação da lei". Por isso caiu mal nos ramos o despacho do ministro, assinado quatro dias antes de sair, que dava razão ao relatório. Devolução dos valores dos salários tidos como ilegais e despromoção pessoal, portanto. Até ao final do ano, o governante terá de decidir se concorda com o despacho, provocando a revolta nos quartéis, se suspende o despacho do antecessor, adiando o problema, ou se o revoga, podendo com isso comprar uma guerra com as Finanças ou o Tribunal de Contas.

Nas fileiras, a convicção é que - afirma Lima Coelho - os militares estão a pagar por "erros grosseiros feitos por teimosia política para forçar a aplicação do novo sistema".

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